Bem-vindo à Apolo, festa! escrita por Yuushirou


Capítulo 1
One-shot




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Que vida infeliz esta que Apolo ganhara de presente de seu pai, Zeus! Não bastava ter sido reduzido a um mortal como castigo e de ter passado por maus bocados nos últimos dias, os quais lhe renderam bons traumas, físicos e mentais, ele ainda tinha que passar por situações bem constrangedoras e nada divinas.

Ele, Febo Apolo, o deus-Sol, aquele que tinha a mais legal das carruagens olimpianas e que invocava as pragas e trazia a cura à humanidade; o belo e luminoso deus da arte, da música e da poesia – e dos haikais –, das cantadas baratas e do amor livre, do uso impecável do arco e flecha, das Pítons mortas e das profecias... Agora era só um rapazinho de aparentes dezesseis anos de idade em um corpo pálido coberto de hematomas e cicatrizes e com um curativo cuidadosamente enrolado em volta dos cabelos escuros e encaracolados.

Demorou um pouco para perceber, talvez devido ao ambiente aconchegante somado à sua recém-retomada da consciência, mas estava vestindo apenas uma cueca e estava deitado em uma cama confortável em um quarto dentro de uma residência antiquada que talvez datasse do século passado. A Casa Grande! Dioniso deve ter mandado que ele fosse posto ali depois que Will cuidou de seus ferimentos, logo após Apolo acabar protagonizando uma vergonhosa cena de desmaio depois um traumático e estressante dia de semideus deprimido pós-missão.

De repente, as luzes se acenderam. Não completamente, mas de forma que dava para enxergar melhor a mobília e a arquitetura em estilo ocidental, que destoavam de todo o restante do acampamento de semideuses gregos.

— Então, ele acordou.

A voz repentina e muito próxima fez Apolo quase saltar da cama, e embora ela lhe parecesse um pouco diferente, ele sabia a quem pertencia.

— Dioniso. Estou absolutamente encantado com a sua hospitalid...

As palavras morreram em sua boca. Surgido do nada, como era de praxe de um deus, Dioniso se fazia presente no quarto, parado de pé diante dele a apenas alguns centímetros da cama onde Apolo estava. Mas não era o Sr. D, aquele senhor baixo de barriga e papada salientes, vestido com uma estranha combinação de camisa havaiana com estampa de leopardo, bermuda malva, meias pretas e tênis roxo de corrida; era Dioniso de fato.

— O que está acontecendo aqui...? – o "ex-deus" quase não conseguiu falar, tão surpreso estava, sua voz soando quase chorosa.

— Ora, Apolo – o deus do vinho sorria, ridículo e abusado como era de seu feitio – Não está mais me reconhecendo? Parece até que nunca me viu assim.

Apolo não tinha uma memória ruim, longe disso. Ele sabia que aquela era uma das formas de Dioniso, só não esperava vê-lo assim novamente: jovem, com aparentes quinze anos de idade, o cabelo preto e encaracolado usado longo, o corpo esguio fazendo uma ótima combinação com um rosto bonito demais para um homem mortal comum... Só podia ser uma armadilha! Apolo enrijeceu o próprio corpo e puxou os lençóis para si em um movimento instintivo – e patético – de defesa, como se achasse que Dioniso fosse ataca-lo a qualquer momento e ele não tivesse como correr. O deus, no entanto, não fez nada. Apenas sorriu e ergueu uma espécie de taça para o irmão, como em um brinde.

— Bem vindo à Apolo, festa!

O que? Por que ele estava falando daquele jeito? E por que sua voz parecia tão...

— Você bebeu – concluiu e logo se percebia ridículo, coberto pelos lençóis até a altura do peito como se quisesse esconder seus seios de um horrível homem que se aproximava.

— Como adivinhou? – Dioniso agora se sentava na cama, bem ao lado de Apolo, o que o fez se encolher mais ainda.

— Sabe que se nosso pai souber que bebeu uma única gota disto, ele vai...

— Me dar um castigo ainda pior que o meu atual – a voz dele soava como um ronronar, ou seria impressão? – Eu sei, irmão!

Então ele inclinou o corpo na direção do jovem mortal, como se fosse lhe cochichar alguma coisa ao ouvido ou fazê-lo beber do vinho na caneca, mas Apolo rolou para o lado, deixando-se cair no chão, o que o fez sentir dor. Logo se punha de pé novamente, andando de costas até encostar na parede.

— E o que pretende? O que está fazendo?

Na verdade, queria perguntar especificamente por qual motivo seu irmão mais jovem estava ali, diante dele, na melhor de suas formas, com uma taça de vinho e um sorriso maldoso que brincava tanto nos lábios manchados de tinto quanto nos olhos de írises violeta, como se estivesse se oferecendo para ele. Mas preferiu, por hora, fingir não ter tido nenhum pensamento impróprio com aquela situação. Era incrível como certas coisas o faziam perder a linha, e mais incrível ainda era o quanto Dioniso o conhecia a ponto de saber bem como brincar com elas. Ele com certeza sabia que o já fragilizado deus mortal ficaria confuso e até desejoso se de repente se deparasse com um cara bonito e receptivo demais.

Quase deixando o vinho escorrer da caneca que segurava, Dioniso andou de joelhos sobre a cama atravessando-a até que estava finalmente na sua outra beirada e pôde pôr os pés descalços no chão, ficando de pé novamente diante de Apolo.

— Uma pequena, hum... – ele pensou um pouco, como se tivesse esquecido a palavra que iria utilizar, e então continuou: - Festa de comemoração. A dois. Pelo nosso reencontro. E o seu sucesso.

Uma festa de comemoração a dois. Ok. Isso era claramente um convite. Um golpe baixo. Agora Apolo estava mesmo com medo dele. Já fazia algum tempo que não se entregava a prazeres carnais, que agora era como se estivesse lutando para manter um celibato. Bem, ele estava mesmo tentando se manter na linha. Estava mudando, mas certas coisas não mudavam em deuses. Abriu a boca para dizer-lhe alguma ordem para que ficasse longe ou fosse embora, mas não conseguiu falar nada. Seus olhos azuis acompanharam, quase hipnotizados, o belo rapaz vestido com uma túnica grega roxa e uma coroa de folhas de carvalho repousada em sua cabeça se aproximar dele com um sorriso mais contido, porém agora vitorioso, de quem dizia "Peguei!", até que estavam próximos o suficiente para Apolo acreditar que não conseguiria escapar efetivamente se fosse atacado.

— Achei que gostasse de homens bonitos – disse o deus do vinho.

— Achei que gostasse de mulheres – rebateu.

— E gosto.

Apolo acreditava naquilo. Dioniso era o deus das orgias, conhecido por suas festas escandalosas, onde comumente era visto rodeado de garotas lindas que podiam estar tanto vestidas com peles de veado quanto podiam estar simplesmente nuas, sendo o único acessório inalterável a coroa de víboras em suas cabeças. Ele também havia se casado com uma mulher, Ariadne, a quem era bastante devotado. Mas, da mesma forma que ele podia ser bastante previsível em certos aspectos, noutros podia apresentar comportamentos caóticos. Ele era o deus da loucura, afinal. Ser constante não era a sua especialidade. Com certeza alguma vez em sua vida já havia caído com algum cara por aí.

O "ex-deus" agora fechava os olhos, esperando pelo menor toque do outro. Ele desistia, pois era um desastre quando a matéria escolar era Autocontrole Em Momentos Convenientes. No entanto, sentiu Dioniso abraçar seu pescoço com um dos braços, tirando-o da parede, trazendo-o consigo em uma desengonçada caminhada pelo quarto, o que não seria tão suspeito ou assustador se pelo menos Apolo não estivesse seminu.

— Venha, venha beber comigo, Apolo!

— Você não ia me beijar? – perguntou, e logo se arrependeu.

De onde havia tirado aquela pergunta embaraçosa? Dioniso agora o encarava com uma sobrancelha erguida, tendo interrompido seus passos bêbados para perguntar:

— É o que quer?

"NÃO!", quis gritar, mas seu corpo queria outra coisa. Apolo agarrou o rosto do irmão mais novo com as duas mãos e o puxou para um beijo.

Que beijo estranho. Tinha um forte gosto de uva prensada e de... Aspartame? Estévia? Algo bem doce e industrializado. No mais, era um beijo bom. O maldito deus do vinho beijava muito melhor do que aparentava! Agora Apolo se sentia ridículo e derrotado. Ridículo por estar tentando não encostar seus quadris nele, como se isso fosse recuperar a sua já perdida honra, e derrotado por gemer, ainda que quase inaudivelmente, só porque uma das mãos dele foi para a sua cintura enquanto a outra ainda segurava a taça para que não fosse derramado mais vinho. Quando finalmente os rostos se separaram, um alívio para o fôlego mortal de Apolo, ele se deparou com mais um dos sorrisos irritantes de Dioniso.

— O que é engraçado?

— Sua previsibilidade.

Ah, deuses... O deus do teatro querendo induzir uma cena.

— E então? O que fará comigo? – desafiou.

— O que quiser. A festa é nossa.

Deuses... O que daria para que aquele filme de horror não tivesse acontecido! O pior seria o dia seguinte, quando Apolo acordasse, provavelmente em outro lugar, e encontrasse o Sr. D de novo, agindo naturalmente como se nada tivesse acontecido.


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Notas finais do capítulo

:D



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