lastop escrita por Gab Murphy


Capítulo 5
i fell right through the cracks, now I'm trying to get back


Notas iniciais do capítulo

Oi gente, tudo bem? Sei que falei sobre atualizações diárias, mas na correria do fim de semana não consegui escrever, mas aqui estou eu com três novos capítulos. Melhor impossível, hein?

Espero que gostem, boa leitura!! ♥

(TW: Homofobia e abuso familiar/psicológico).



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30 de agosto de 2021, 17:21.

Os dois homens passaram as quatro horas enquanto esperavam o trem seguinte conversando, comendo e tirando pequenos cochilos. Sirius reparou, em um dos momentos que ficou de guarda das coisas dos dois, que Ryan parecia sempre dormir com alguma coisa no rosto, quando entrou na cabine deles, antes de se conhecerem, o homem tinha um travesseiro no rosto e enquanto resmungava baixinho, sentado de olhos fechados na cadeira do lado, um de seus braços cobria seus olhos.

Sirius fez duas anotações mentais: aquilo era engraçado e fofo na mesma proporção, e ele iria perguntar o motivo depois. Talvez fosse como sua mania de morder a parte de dentro da bochecha.

Mas a oportunidade não surgiu durante aquelas quatro horas ou quando chegaram em sua cabine. Estavam tão cansados que apenas se jogaram nas camas, cada um em uma, e apagaram. Sem conversas ou troca de olhares, apenas silêncio e muita vontade de dormir.

Black foi o primeiro a acordar, se espreguiçou ainda de olhos fechados e demorou alguns segundos para se situar. Sabia onde estava, é claro, mas, por um momento, se perguntou se Ryan e como tinha se sentido com ele realmente existiu. 

Claro que existiu, resmungou em pensamento para si mesmo, não era assim tão criativo para criar tudo aquilo. E era um pouco idiota pensar que sim, se querem saber, ninguém nunca poderia criar esse sentimento.

Ok, bom, talvez eu possa, mas não Sirius ou o homem do outro lado da cabine. Não eles. E então você deve estar questionando o que eles sentem e eu tenho que confessar que não sei e talvez nunca saiba.

Não é amor, mas é. 

Faltam apenas mais 3 outros capítulos para essa história acabar, mas sinto que é nesse momento que tenho que te contar, enquanto Sirius Black está de olhos fechados, tentando se situar ao mesmo tempo em que o sol está batendo de leve em seu rosto e o homem que nem ao menos sabe o nome ressoa baixinho, sonhando com seja lá o que for.

Sirius Black não sairá dessa história apaixonado, não romanticamente, pelo menos. Sim, eu sei, é um baque, tire um tempo para respirar ou digitar alguns xingamentos para essa narradora que vos fala. Eu entendo perfeitamente, mas é a verdade.

Essa não é uma história de amor e nunca foi. Sirius e quem ele chama de Ryan não vão trocar números, e-mails ou qualquer outro jeito de se comunicar. Eles não estão e nunca estiveram destinados a se unirem, seja por amizade ou romance.

Em nossas vidas sempre há o momento em que nos questionamos quem somos e quem queremos ser, às vezes esses momentos acontecem por causa de pessoas que nos marcam de jeitos que nunca vamos apagar. E você está presenciando tal momento na vida deles, mas no fim, quando o último ponto final for escrito e a última palavra for lida, eles não vão passar de memórias um para o outro.

E eu espero que entenda, apesar de os desejar juntos, que não é para ser. Eles sabem, sempre souberam. Não há sofrimento nas frases e diálogos, não há expectativas sendo criadas (por eles), pois é apenas um trem os levando a caminhos diferentes, mas para onde precisam ir.

Bom, espero ter esclarecido, pois preciso continuar minha narração, Sirius está começando a ficar completamente desperto e preciso contar seus próximos passos, como ele se levantando (sim, agora mesmo) e dando uma checada no seu companheiro que ainda parece estar sonhando. 

Black sabe que não pode acordá-lo, então apenas pega suas coisas e vai até o banheiro mais próximo, rezando para que não tenha nenhuma fila.

30 de agosto de 2021, 19:47.

Havia fila, não uma grande, mas ainda assim o suficiente para que quando ele voltasse, Ryan já estivesse acordado, pegando suas coisas também.

— Oi - Sirius falou assim que entrou, sorrindo. - Dormiu bem?

— Maravilhosamente - Ryan sorriu e Sirius adorou - e você?

Antes de responder, o Black foi até o seu lado e ficou de costas para Ryan.

— Estou um pouco ansioso - deu de ombros. - Faz um tempo que não vejo minha família. E, apesar de amar Liverpool, voltar traz coisas estranhas.

Ele falou tudo isso de costas, mas ouviu quando o outro homem parou de mexer na mochila e se sentou. Sirius adicionou mais um item às coisas que gostava em Ryan, ele lhe ouvia.

— Que coisas?

— Você acredita que nós escolhemos nossa família ou é daqueles que acham que o sangue é o mais importante?

— Eu sou adotado - Ryan falou com tanta naturalidade que Sirius teve que olhá-lo, um pouco admirado. Não que não se orgulhasse dos Potter ou de fazer parte da família, longe disso, mas sempre tinha sido mais uma razão para ser inseguro. - Minha mãe morreu no parto e meu pai fugiu assim que soube de mim, minha madrinha me criou, então não acho que o sangue conta muito.

— O meu irmão, aquele que te contei…

— O do óculos - Ryan riu baixinho.

— Conheci quando tinha 11 anos e os pais deles me adotaram depois que fui expulso da casa deles.

Silêncio. Sirius quase podia ver as engrenagens no cérebro de Ryan girando, tentando encaixar o quebra-cabeça, mas também podia sentir que ele estava dando espaço, caso o Black quisesse falar mais.

Eles eram fanáticos religiosos… - Sirius hesitou, franzindo a testa. - Na verdade, ainda são e eu sempre fui meio rebelde a isso, sempre odiei ir à  igreja ou qualquer coisa assim, mas era arrastado, acho que por causa do nome da família. Um Black não podia ser um pecaminoso, alguém impuro, sabe? 

Sirius suspirou e sentou na cama, desviando os olhos para baixo, para as próprias mãos.

— Mas parecia tão errado o que eles falavam, todos eles. O jeito que pareciam se sentir os donos da razão enquanto pisavam em quem era “inferior’ - ele olhou para Ryan quando fez as aspas com as mãos, mas logo desviou - E então veio os castigos… primeiro tive que rezar por horas quando me pegaram brincando com as bonecas de uma prima, tive que me confessar muitas vezes, sabe? E por coisas que não pareciam… não deveriam ser erradas. Então eu comecei a odiar Deus, me trancava no quarto aos domingos e arranjava discos das bandas “do diabo”. Eu passei muito tempo com fome nessa época.

Ele riu sem realmente achar graça, uma parte de si gritando para que parasse. Nunca tinha contado com tantos detalhes para alguém, James sabia, é claro, mas não porque Sirius contou.

— Conheci James quando estava indo para um internato renomado. Ele ia por causa da qualidade de ensino, os pais queriam lhe dar o melhor, e eu para “me consertar”, era minha última chance de me tornar alguém decente, sabe? Alguém como eles. Mas não deu certo, Hogwarts se tornou minha casa, encontrei pessoas que me amavam como eu era e me senti à vontade para não ser o que eles queriam, mas as férias eram um inferno.

Outra risada, dessa vez irônica, como alguém tão crente em Deus podia ter tornado a vida de alguém o próprio inferno?

Eles sabiam que não estavam conseguindo e as coisas pioraram, James descobriu quando tínhamos 15, voltei para escola com as costas ferida e cheia de cicatrizes, eles me pegaram beijando um menino. Tinha sido o primeiro, mas Jamie já sabia que eu estava me descobrindo como bi. Enfim, ele viu enquanto eu trocava de roupa no dormitório e, se era possível, começou a cuidar ainda mais de mim. Os pais dele… nossos pais já me conheciam e já me tratavam como um filho, mas eu achava que era só por sentirem pena.

Sirius limpou o rosto molhado, respirando fundo para se acalmar.

— Bom, no verão seguinte eles me deram de presente uma noiva, outra adolescente que vinha de uma família igual, que tinha crescido no mesmo ambiente que eu, mas que acreditava que tudo aqui era o certo. Eu estourei - Sirius levantou a cabeça, olhando para Ryan e mais lágrimas escorreram quando viu que o homem também estava chorando. - Falei um monte de coisa na frente de um monte de gente importante, gente do mundo deles, e uma dessas coisas era que gostava de homens também… você deve imaginar que não foi a coisa mais linda, então vou te poupar dos detalhes, mas algumas horas depois estava na porta de James com nada mais além das roupas que estava usando.

No silêncio, Sirius fungou algumas vezes, passando as mãos nas bochechas numa tentativa falha de limpar o rosto. 

— Passei um mês na casa do James e não houve uma ligação para saber onde eu estava. Os Potter começaram a pagar o colégio para mim, lá encontrei meu irmão de sangue e ele me contou que tinha tentado falar comigo, tentado descobrir onde eu estava, mas que não teve  jeito, eu tinha sido “apagado da família”. Eu sabia o que queria dizer, uma prima tinha passado pela mesma coisa uns anos antes, era como se ela nunca tivesse existido. Regulus, meu irmão, me apoiou, mas tinha medo de ir contra eles, então nos falávamos escondidos. Foi um período estranho, mas eu tinha os Potter, sabe? - Sirius sorriu sem mostrar os dente. - Eles não me adotaram no papel, mas me colocaram na família e me apoiaram em todos os momentos, ir pra Grécia, viver longe deles, é difícil, mas…

— Tem uma parte de você que se sente feliz por não estar mais no mesmo país que eles.

Sirius concordou com a cabeça e, sem falar mais nada, Ryan sentou ao lado dele e o abraçou enquanto a cabine era preenchida pelos soluços abafados do Black.


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Notas finais do capítulo

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