Por uma festa apenas escrita por


Capítulo 1
Capítulo único




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A festa de ano novo promovida pela equipe da Emma estava alguns dias atrasada. Quatro dias atrasada, para ser mais preciso; afinal, os anfitriões passaram a virada do ano no jato particular do FBI, indo para outro estado a fim de encontrar e prender um assassino que estava começando a causar pânico em uma cidade. Com o assassino preso e sendo levado à justiça, a equipe composta de sete membros pôde voltar para casa na cidade de Quitar, interior do estado de Vírginia. Ninguém sabia realmente dizer como aquele lugar tão pacato, quase esquecido e escondido nos mapas, podia abrigar uma das melhores equipes do serviço secreto, mas o que todos admitiam era que o enorme prédio onde a sede se localizava era a coisa mais interessante que se havia para se olhar.

A cobertura, com paredes de vidro que possibilitavam olhar para toda a cidade, estava apinhada de gente naquele dia. Ali não era apenas a sede da equipe do FBI, mas também abrigava uma organização muito mais antiga e secreta: a Resistência, o pequeno grupo de pessoas que sabia a verdade sobre os mundos e a magia existente. A festa promovida por Emma reunia pessoas de ambos os mundos, humanos e sensitivos, e trazia um clima de tranquilidade e familiaridade enquanto as pessoas se abraçavam, bebiam, comiam e dançavam ao comemorar a chegada de um novo ano.

No canto mais afastado, onde a música baixa possibilitava a conversa, um homem e uma mulher dialogavam, os olhos se cruzando vez ou outra, as bochechas coradas com o esforço de esconder o que sentiam um pelo outro.

— Em Mitéra nós não comemoramos a passagem do ano apenas no primeiro dia. A festa dura quatro dias: os três primeiros para cada deusa e o quarto para Ihé e Uwa. — Eulëyn comentou, jogando o cabelo para trás e sorrindo. Bruce observou, encantado, as covinhas surgirem nas bochechas dela. Aquele pequeno detalhe era um dos que o cientista mais amava olhar.

— Meus pais nunca comemoraram o ano novo por algum motivo — Bruce respondeu, dando de ombros. — Eu nunca me importei; sempre consegui ver os fogos da janela do meu quarto, então comemorava sozinho. Quando conheci a Emma... bem, quando ela descobriu que eu também fazia parte da Resistência, começou a me convidar para participar dessa festa. Essa deve ser a quarta ou quinta vez que eu participo. Um spoiler: todas elas foram atrasadas.

Ele se calou ao achar que estava falando demais. Ela o fazia se sentir assim, inseguro com suas ações; Bruce não queria magoá-la ou aborrecê-la, então fechou a boca e pigarreou. A elfa não pareceu se incomodar com o falatório dele. Ela sorriu de novo e apontou com a cabeça para a outra sala:

— Desde quando a Emma dá uma festa no dia certo? — Perguntou. Os dois riram. — Sabe, eu levei um tempo para acreditar que você era parte da Resistência. — Confessou de repente. Bruce revirou os olhos e sorriu de canto.

— Não vou fingir que não sabia disso. Você vivia me olhando estranho, falando em enigmas.

— Eu fui criada com elfos, Bruce. Eu sempre falo em enigmas.

Os dois começaram a rir. Bruce tinha um jeito engraçado de dar risada: ele se inclinava para frente e apertava os olhos; o riso dele era seco e parecia uma tosse, o que chamou a atenção de Eulëyn logo na primeira vez que ele riu.

Ela não queria confessar, mas sentia que ele estava tomando espaço em sua vida, começando a fazer parte dela de um jeito que ela nunca imaginou. Um sentimento que ela não sentia a muito, muito tempo voltou a aparecer, se fazendo presente cada vez que ela olhava nos olhos cor de mel dele, no jeito como ele ria ou até na maneira como Bruce se esforçava para fazê-la se sentir confortável.

Ela percebia também pequenos detalhes, detalhes que passavam despercebidos pelos outros. O jeito como o cabelo dele se curvava na testa, como as mãos dele nunca ficavam paradas e em como ele gostava de se mover de maneira silenciosa, quase imperceptível aos ouvidos humanos. Eulëyn via o jeito que ele olhava para ela, ouvia o coração dele bater mais rápido quando estavam perto; ela mesma sentia aquilo em si, o coração disparado no peito, a vontade de fazê-lo feliz.

— Bruce... — Ela começou, lambendo os lábios para se acalmar. Bruce a olhou, esperando que ela falasse, mas de repente se endireitou e olhou para a sala principal. Emma chamava os dois para lá, acenando freneticamente. Ele mordeu o lábio, preocupado com o jeito que Emma agia.

— Você acha que aconteceu algo? Ela parece preocupada? — perguntou, alarmado; ás vezes, Emma e a equipe precisavam sair de repente do meio das festas para atender algum chamado. Eulëyn balançou a cabeça, desconcentrada por um momento. Estava prestes a confessar o que sentia por Bruce, mas não pareceu mais o momento certo.

— Não aconteceu nada, relaxa. Ela quer que participemos mais da festa; acha que estamos nos sentindo... isolados.

— Como você sabe de tudo isso? — Ele perguntou, impressionado. Sabia que ela podia ler sentimentos e controlar os quatro elementos, mas não entendia como aquilo poderia ter feito-a descobrir o que Emma queria.

— Eu sou parte elfa, Bruce. Escuto bem.

Bruce corou violentamente, se sentindo idiota por não ter percebido aquilo antes. Era óbvio que ela escutava melhor que os humanos, ela nunca deixava passar um detalhe e nunca era pega desprevenida. Provavelmente ela escutava até enquanto ele falava dormindo, já que seus quartos eram próximos e as paredes, finas. Eulëyn sorriu ao vê-lo desconcentrado e pegou a mão dele.

— Vem. Vamos ficar um pouco com o resto do pessoal, antes que a Emma mande o FBI inteiro atrás da gente.

Bruce riu, entrelaçando os dedos dela nos seus. Aqueles pequenos gestos, como dar as mãos, andar juntos, passar o dia conversando, era o que fazia todos na sede saber que os dois ficariam juntos mesmo enquanto eles fingiam não sentir nada. Eulëyn o puxou com ela para a outra sala, onde o restante dos convidados se encontrava. No momento que chegaram, a música envolvendo seus corpos, Emma se aproximou carregando dois copos de cervejas e entregou uma para cada.

— Finalmente vocês decidiram se juntar à nós, meros mortais — a agente comentou, fingindo irritação. Bruce e Eulëyn continuaram de mãos dadas e a mulher revirou os olhos.

— Desculpa Emma. Eu deveria estar sendo mais respeitável com você e seus convidados — ela provocou. Emma revirou os olhos e apontou para Bruce.

— Vocês dois parecem estar se dando bem. Parecem até dois cachorrinhos.

Bruce corou de novo e, constrangido, soltou a mão de Eulëyn. Ela lançou um olhar irritado para Emma, mas a agente a fizera lembrar de algo.

— Ah, Bruce, eu tenho um presente para você — Eulëyn avisou, com um sorriso. O cientista olhou confuso para ela, depois deu um sorriso sem graça.

— Você não precisava gastar dinheiro comigo, Lyn...

— Não se preocupe, não gastei dinheiro algum. Ele está no meu quarto, vou buscar — ela avisou, dando o copo de bebida para ele segurar. Bruce se pegou observando a caminhada dela, o jeito como seu corpo se movia de maneira graciosa e como sua cintura balançava de um lado ao outro.

— Cuidado com a baba, Brucezinho, vai molhar meu chão todo — Emma provocou, cutucando ele de lado; a relação dos dois sempre foi como de irmãos. Bruce tinha que admitir que não conseguia tirar os olhos de Eulëyn. Para disfarçar, tomou um gole de cerveja e se virou para Emma.

— Você sabia que ela vai me dar um presente?

— Sabia. Ela me contou, pediu ajuda.

— E por que você não me avisou, Emma? Eu poderia ter comprado algo para ela! Droga, eu nunca faço nada direito.

Emma também bebeu sua cerveja antes de responder:

— Pare com isso, Bruce. Você deve ter feito alguma coisa muito certa para a Lyn querer te presentear. EU nunca recebi um presente dela.

Os dois riram. A porta do quarto de Eulëyn se abriu e ela saiu de lá, carregando um filhote de cachorro nos braços; discretamente, Emma se afastou dos dois enquanto Bruce mantinham o olhar no filhote, que balançava o rabo de um lado ao outro.

— Gatinha... o que? — O apelido escapou sem ele perceber. Eulëyn riu com a forma como era chamada e passou o vira-lata para os braços dele.

— Fofo, não é? Eu a encontrei no parque, dentro de uma caixa. Ela está perfeitamente saudável e eu não a nomeei ainda... quero que você escolha. — A mulher afagou o pescoço do animal, que balançava ainda mais a cauda e olhava diretamente para Bruce com enormes olhos cor de mel. — Ela tem os olhos iguais os seus, Grandão.

Eles se entreolharam e sorriram. Bruce não sabia o que falar; seu sonho era adotar um cachorro, mas ele nunca tivera a oportunidade. E agora ali estava ele, segurando um filhote nas mãos.

— Quando eu a encontrei, lembrei que uns meses atrás nós estávamos conversando e você disse que queria um cachorro; achei que você gostaria.

— Você lembrou disso? Lyn, nós conversamos sobre isso há muito tempo, nem eu lembrava! — Bruce olhou para ela, cético. Eulëyn ergueu os olhos para ele e sorriu de novo, revelando as covinhas. Os dois se esqueceram do resto da festa.

— Claro que eu lembrei, Bruce. Eu raramente esqueço o que a gente conversou, Grandão. Não consigo.

Bruce sorriu e passou o cachorrinho para apenas uma mão. Com a outra, puxou Eulëyn para um abraço. Ela passou os braços ao redor da cintura dele e fechou os olhos, apoiando a cabeça no peito dele. Não era a primeira vez que eles se abraçavam, mas certamente era a mais prazerosa; Bruce cheirava a livros – já que ele passava os dias na biblioteca, concertando os livros que ficavam ali. Eulëyn, como sempre, cheirava à floresta. Eles ficaram abraçados por um tempo maior do que estavam acostumados, o cachorrinho encolhido entre eles.

— Não sei como te agradecer, Gatinha... — Ele comentou, ainda abraçado à ela.

Eulëyn ergueu a cabeça. Seus narizes se tocaram rapidamente. Ela sorriu e, sem que ele esperasse, levantou os calcanhares; seus lábios se tocaram rapidamente, deixando Bruce e todos os convidados ao redor deles chocados. O beijo durou poucos segundos, mas foi o suficiente para mexer com os sentimentos dos dois.

— Não precisa me agradecer, Bruce. Você já fez isso — ela respondeu, afastando um passo dele. Ainda sem reação, o cientista sorriu e esticou a mão para segurar a mão dela de novo. Nos braços dele, o cachorrinho latiu, chamando a atenção deles. — Você já pensou em um nome para ela?

Bruce olhou para Eulëyn e reparou, não pela primeira e nem pela última vez, que os olhos dela estavam mudando de cor – literalmente. Mudando de azul para verde, então para castanho e preto. Ele sorriu.

— Já. O nome dela vai ser Arco-íris.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado, é a segunda história de Ano Novo que escrevo de Eulëyn e Bruce e, honestamente, eu amo eles demais.

Vejo vocês por ai!



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