A Maravilhosa Loja de Argoluli — O Terrível escrita por Félix de Souza


Capítulo 25
Uma Eternidade


Notas iniciais do capítulo

Bem vindos de volta, caros clientes que não desistiram dessa loja.

Primeiramente e mais uma vez devo-lhes desculpas.
As últimas semanas foram intensas e não tive muito tempo para descansar, nem escrever.
A vida deste proletariado é cruel.

Todavia, entretanto, porém, se você lê estas palavras, provavelmente esperava por mais esse capítulo suado.
Então aproveite, meu cliente. Não tomarei mais seu tempo.
Bem vindo á mais um capitulo de A Maravilhosa Loja de Argoluli - O Terrível.
Boa leitura.

Não esqueça de comentar. Recomende se gostar.

Atenciosamente
A gerencia.



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Você pode contar até cinco?

Cinco segundos.

Esse é o tempo que Argoluli levou para invocar sua mágica.

Se você não está acostumado a lutar e principalmente lutar pela vida, saiba que cinco segundos em uma luta, ainda por cima em uma luta tão desleal quanto a que Altman estava prestes a travar, pode parecer uma eternidade.

Antes de acompanhar a contagem, vamos recapitular a situação.

Zaya a feiticeira descendente da linhagem de Shaofaw encontrou a carruagem de Argoluli atolada nas areias das Terras Escarlates.

Reconhecendo-a como um veículo estrangeiro e mágico, resolveu averiguar a identidade dos seus ocupantes em simultâneo, em que armava uma emboscada.

Ela deu ordens a areia do deserto que afrouxassem seu aperto sobre a carruagem, pois sendo uma feiticeira, portadora de magia intuitiva, é assim que funciona na sua mente o seu poderio mágico. Ela crer comandar as forças do deserto. Talvez tenha razão.

Com isso facilitou a saída de Altman, porém, na verdade, qualquer um poderia sair com um pouco mais de dificuldade que o homenzarrão, mas sairia ainda assim.

Ao vislumbrar a beldade em perigo, todos seus instintos primitivos de homem protetor foram instigados, como era de se esperar.

Todavia o nosso tolo, porém bem-intencionado Altman se dirigia para uma armadilha.

Zaya o reconheceu com um dos Malafith que vira em sonhos.

A feiticeira estava acompanhada de três escorpiões atrozes sob seu poder, e Léia saiu a tempo de ter um vislumbre do drama e quando chegou a esse palco, Altman não estava disposto a permitir que ninguém roubasse sua cena.

Sorriu confiante para a barda, pediu para ela aguardar e se lançou valente ao embate.

É tão fácil enganar os homens.

Zaya planejava esperar que ele chegasse perto demais para fugir, montaria em um escorpião e comandaria os outros. Infelizmente para ela, o destino, mais uma vez não estava ao seu favor.

Um retardatário do último embate da feiticeira contra o Legado de Safira surgiu.

Pelo que tudo indicava um verme gigante seguiu toda a agitação daquela região até aquele local.

Não tão gigante quanto a “mãe”, só o suficiente para tornar a situação perigosa para todos.

Ele cavou por baixo da terra, causando uma erosão que usou como uma espécie de arapuca para dragar Zaya e assim, Altman de fato resgatou a “mocinha” no último instante, vendo-se obrigado a abdicar da espada. Uma situação deveras desfavorável, como você pode ver.

A espada deslizou pelo buraco aberto do verme.

Adianta eu dizer que Altman tinha duas adagas, contra três escorpiões e um verme ambos gigantes? Esse verme sendo um pouco maior que um elefante?

Enquanto isso Argoluli surgiu ao lado de Léia como que abandonando sua inércia, tal qual um urso saindo da hibernação em pleno deserto.

— Deixe comigo. — ele olhou para a barda e viu sua incredulidade e atordoamento, porém antes que ela o respondesse qualquer coisa disse-lhe. — Feche bem os olhos se quiser viver.

E cá estamos.

— Diga-lhes para virem até aqui e quando passarem por mim, sob hipótese nenhuma olhem para trás. Entendido? — Indagou aquele homem que mais parecia um duende aquela barda alta e esbelta de olhos azulados. O feio e a bela lado a lado.

Léia assentiu por instinto. Não confiava naquele homem, mas não tinha escolha.

Argoluli deu um passo à frente. Léia notou então que ele trazia alguns frascos presos a uma cinta que estavam cheios do que parecia um líquido fosforescente e carregava uma bengala fina e ornamentada de arabescos intricados.

Ela olhou mais de perto, não se contendo de curiosidade, algo nato de sua personalidade.

Teve a impressão de que o líquido em um dos frascos moveu-se por conta própria, apesar de Argoluli estar imóvel.

— Não pode ser... — Léia resmungou para si mesmo.

— Chame-os agora! — Exclamou Argoluli, ignorando-a.

— Altman! — Berrou a barda, com as mãos em concha sobre a boca. — Venha! — e apontou para Argoluli que começou a riscar nas areias algo com sua bengala e pronunciar algumas palavras. — E não olhe para trás. — concluiu a barda.

— Microprosopio. — foi a primeira palavra que recitou enquanto entrava em transe e traçou uma linha horizontal, o primeiro risco na areia.

Altman somente assentiu e começou a dura labuta de resgatar a jovem que foi salvar.

Assim começou a luta.

Um.

Após puxada, Zaya se lançou para fora do buraco. Entendeu o que aqueles estrangeiros falaram e ainda via uma oportunidade de quem sabe ver um deles cair sem ter que fazer maiores esforços. Apenas correu na direção da figura atarracada que mais parecia um duende, aquele que nas suas visões foi intitulado como o Terrível.

Se ele era tão terrível assim, ela teve a boa ideia de deixá-lo se desgastar antes de confrontá-lo. O uso de magia exigia um preço. O mínimo era o desgaste físico ou mental do seu usuário ao manipular a força que permeia o mundo, a que os magos chamam Allure.

Então ela correu naquela direção, pois estava prestando atenção em tudo que disseram e havia ouvido e entendido perfeitamente. Correr sem olhar para trás.

O verme gigante que surgiu, no entanto, não parecia muito satisfeito com uma das suas presas escapando, entretanto, um deles ficou para trás.

Um Altman impressionado que uma donzela em perigo tenha encontrado tanto vigor subitamente á ponto até de deixar seu salvador para trás. Ocorreu-lhe que ela devia estar em pânico, e se compadeceu disso.

Nada disso interessava ao verme, é claro. Que tentou arrancar um naco da carne de Altman, antes que esse encontrasse pernas para correr.

Porém, o ataque do verme foi canhestro e não causou mais que um susto que despertou Altman para sua situação. O movimento da areia deslizando fez o verme arremeter seu ataque de modo desastrado, levantando poções de areia no ar e fazendo mais alarde do que dano.

Desperto e livre de empecilhos, e com a sorte que os deuses só delegam aos heróis, Altman tal como o exemplo de Zaya, se lançou para fora do buraco e se pôs a correr.

É evidente que nada seria tão fácil. Ainda havia três escorpiões famintos e ferozes do tamanho de cavalos para impedi-los.

Léia não era uma guerreira e por si mesma, nem era uma conjuradora muito poderosa.

Seu poder era o conhecimento e suas magias auxiliavam no seu ofício. Não havia nenhum palco ali ou plateia para entreter.

Ela buscou seu violino na esperança de que talvez pudesse ao menos distrair as criaturas e para seu desespero constatou que na pressa saiu da carruagem sem se lembrar de trazê-lo.

— Burra! Burra! Burra! — se repreendeu. “Não é melhor você voltar para a carruagem, meu anjo”? — disse-lhe a voz na sua cabeça. Foi o que ela fez.

Os escorpiões agora fora do controle de Zaya começaram a vê-la como um interessante petisco, antes do suculento Altman. Um deles tentou instintivamente bloquear a passagem dos dois, os outros imitaram o primeiro.

Altman conseguiu passar por eles com facilidade, os escorpiões eram lentos demais para ele. Já Zaya, ficou para trás, também não era uma guerreira e os escorpiões não lhe pareciam tão lentos afinal.

Conseguiram bloquear sua passagem se interpondo entre ela e seu pretenso guardião.

— Essa não. — praguejou Altman sacando duas adagas. Zaya estava encurralada.

Argoluli fez outro traço no chão com a ponta da bengala que parecia incandescer por onde traçava os arabescos no cabo e recitava algo.

— Ruach Adamah. — Argoluli acrescentou um traço paralelo descendendo em diagonal ao primeiro.

Dois

Zaya não encontrava brechas para passar pelos escorpiões e agora eram três, e um verme gigante atrás dela. Seria seu fim? Ela se indagava. Uma situação difícil.

Resolveu poupar suas forças restantes para um ataque final. Tinha pouca reserva de energia Allure ainda, mas se fosse preciso queimaria sua força vital.

Se era chegada a hora de morrer, levaria o maior número de corpos consigo em nome de Shaofaw.

O coração martelava como a forja de um anão Karmakhel alucinado, e o sangue bombeado pelo coração rugiam como um rio nos ouvidos, a respiração pesada. O deserto nunca pareceu tão quente quanto naquela hora.

Aguardou o próximo movimento dos monstros e alguma brecha para atacar. Deu um passo para trás se afastando dos escorpiões e ignorou que isso significava um passo mais próximo do verme gigante a suas costas.

Todavia ela não pode deixar de notar que o sol subitamente foi encoberto.

O verme se arrastou finalmente do buraco e se posicionou atrás dela pronto para o bote.

Altman viu mais dificuldade em voltar para a luta do que sair, agora que a garota estava cercada, e se você estiver se perguntando, sim, ele procurava um meio de se interpor entre os escorpiões e a garota voltando para o meio dessa situação perigosa e fatal, munido de dois espetos de ferro.

Até que, um dos escorpiões resolveu lhe dar atenção.

Enquanto isso, Léia alcançou a carruagem e adentrou.

“Deixo-os, meu amor. Eles não valem seu esforço”. — disse-lhe a voz de uma mulher em sua cabeça atormentada.

— Você é sempre tão egoísta. — rebateu Léia em voz alta.

“Isso não são modos de me tratar, mocinha”. — a voz lhe repreendeu. “Eu apenas me preocupo com sua segurança”.

— Você poderia dar um jeito nisso sozinha se quisesse. — resmungou a barda. — Ou Ortelis. — foi então que ela notou. — Ortelis nunca foge de uma boa briga. Porque está quieto agora?

O escorpião diretamente a frente de Altman, incomodado que sua maior presa tivesse tanta necessidade de atenção, girou 180 graus para encarar o homenzarrão.

Já que ele tinha pressa de ser o jantar.

Aproximou-se um pouco mais e desferiu um golpe com sua cauda pontiaguda, característica de escorpiões, onde ostentava um ferrão que bem poderia ser comparado a uma lança.

A cauda sacudiu inutilmente, zunindo no ar e errando o agente por pouco, mas errando. A sorte estava mesmo do lado de Altman por enquanto, de modo que ele só tomou um susto, que feriu mais seu ego do que o corpo.

— Ruach Ur. — e com isso Argoluli cruzou um terceiro traço no chão, que seguiu do segundo subindo em diagonal ascendente e cruzando com o horizontal.

Três.

Zaya viu o cerco se afrouxar quando o fantasma conseguiu chamar atenção de um dos escorpiões. Era uma chance remota, ainda assim melhor do que tentar a sorte sozinha e sem forças contra um verme e dois escorpiões ambos atrozes.

Então ela fez o impensável. Arremeteu em direção ao escorpião que estava de costas para ela e se propôs a monta-lo no intuito de doma-lo e equilibrar os números.

Correu na direção do escorpião desprecavido de costas para ela, aproveitando a brecha no momento em que a cauda do escorpião desceu para atacar Altman e montou.

Agora ela tinha um segundo para tomar o controle da fera ou o próximo alvo da cauda venenosa seria ela mesma.

O verme estava faminto e via um banquete a sua frente, seja lá como os vermes enxergam. Optou por atacar justamente o escorpião que Zaya cavalgava. Suponho que lhe pareceu mais apetitoso abocanhar dois com um ataque só.

O verme conseguiu abocanhar a cauda do escorpião em que Zaya estava montada e chegou mesmo a sacudi-lo e tentar levantar ambos, mas somado ao peso de Zaya parecia algo mais do que sua força permitia.

Porém, naquele dia, o verme conseguiu ao menos se alimentar de uma suculenta cauda de artrópode. Partiu-a e imediatamente engoliu.

O som que o escorpião emitiu transmitia dor e surpresa assustadoramente quase humanos.

O Escorpião ferido sacudiu-se de dor alucinante e derrubou Zaya de cima dele, mas Altman estava lá pronto para ampara-la.

Ela caiu diretamente em seus braços e por uma fração de segundos, seus olhares se cruzaram. Os olhos dele, negros como a profunda noite e os dela ardiam dourados como o sol incremente. Houve um fascínio mutuo nesse instante eterno.

— Vamos sair daqui. — disse Altman pousando ela no chão bruscamente para logo em seguida a puxar pelo braço em disparada. Ela não resistiu.

— Onde está você, Ortelis, o caçador de monstros? — indagou Léia às vozes na sua cabeça.

— Não é você que se gaba de caçar monstros? — não havia ninguém na carruagem a não ser Travis, que observava a humana comicamente com os olhos revirados para o alto e as mãos levadas a própria cintura. Travis não podia ouvir as respostas, é obvio.

“Também não vou me meter nisso, minha flor”. — respondeu-lhe Ortelis.

— Mas que ótimo! — esbravejou Léia, pondo-se a procurar seu instrumento. — Hora perfeita para vocês concordarem. Teremos muito que conversar depois.

Um dos escorpiões à direita de Altman resolveu ter misericórdia do companheiro ferido.

Um ato improvável. Certamente a intenção era guardar o amigo para jantar, já que ele não ia sobreviver mesmo, garantiu sua morte.

Que ninguém diga não haver praticidade no mundo animal.

O outro escorpião achou mais interessante atacar o casal em fuga, á saber, Altman e Zaya. Primeiro o maior e mais suculento. O agente fantasma.

Foi por puro reflexo que Altman constatou a ponta de lança daquele escorpião vindo em direção a seu corpo e por muito pouco que se desviou do ataque, até mesmo sentindo a cauda resvalar pela ombreira de sua couraça, chegando mesmo a quase o desiquilibrar.

— Ruach Mayim.— com o quarto traço cruzado no chão, que continuava interligado ao terceiro numa diagonal agora descendente cruzando pelo traço horizontal, a insígnia que Argoluli traçava, começava a se tornar mais nítida. Os arabescos da bengala se tornaram mais brilhantes, revelando sem margem de dúvida, que não se tratava apenas de uma bengala e sim um cajado de mago a sua maneira.

Quatro.

Zaya abriu distancia entre a escaramuça de escorpiões e vermes, e embora menos hábil mostrava-se mais ligeira que seu salvador, correndo a sua frente e com isso ela reconheceu o símbolo que o homenzinho riscava no chão, sem dúvida era um mago.

Estava conjurando um pentagrama.

O verme atroz não estava disposto a compartilhar sua presa com o outro escorpião e tratou de devorar o escorpião abatido naquele momento.

Altman agradeceu essa pequena graça mentalmente aos deuses grandes e pequenos e tratou de seguir o exemplo de sua protegida, ou pelo menos é o que ele tinha em mente, e sair dali a toda velocidade que suas pernas permitissem.

Juntos, ele e Zaya deram a impressão de levantarem uma pequena nuvem de areia enquanto corriam. Isso somado aos movimentos bruscos que o verme gigante fazia atrás deles.

Enquanto isso Léia havia encontrado seu violino e o arco do instrumento, que servia também de varinha mágica. Só não encontrava as próprias pernas.

“Não, querida. Não vou deixar você sair”. — disse-lhe a voz feminina em sua cabeça. Léia não conseguia se mexer.

— Me solta! — esbravejou a barda. — Nós podemos resolver isso!

“E vamos”! — respondeu à voz de Ortelis. “Se eles falharem”.

Um dos três escorpiões não estava em conflito com ninguém. Nem abateu seu companheiro, nem estava em combate com o verme gigante. Logo tratou de perseguir um alvo mais plausível. Pôs-se a perseguir Altman e também tentou atacá-lo pelas costas.

Bem certo que Altman tomou a dianteira naquele pandemônio e para o escorpião, aquilo se revelaria uma tarefa ingrata, mas nada o impediria de insistir.

Naquele primeiro instante a vantagem era de Altman e o escorpião começou a persegui-lo.

Entretanto, ele teria concorrência.

O outro, aquele que havia abatido o próprio companheiro, supôs que não valia a pena disputar a carcaça do escorpião morto com o verme gigante e também se colocou a perseguir Altman em disputa com o companheiro ainda vivo e intacto.

Como Altman era o retardatário no momento ele foi visado pelos dois. Não que isso justifique a personalidade ignóbil desse escorpião. Ele poderia muito bem perseguir Zaya e dividir as presas, mas não. Altman parecia mais apetitoso, não é mesmo?

Se fosse um ser humano, esse escorpião seria um traste de pessoa.

Com isso Argoluli fechou o pentagrama e os monstros começaram a se deslocar em sua direção.

— Ruach shamayim. — Com o quinto traço o pentagrama estava fechado. Uma energia verde bruxuleante se acendeu e ressaltou cada risco no chão. A luz que emanou da insígnia girou no sentido horário interligando ponta á ponta e formando um círculo em torno do que lembrava um símbolo em forma de estrela de cinco pontas.

Para em cada espaço deixado entra uma ponta e outra, havia uma palavra arcana que se acendeu e representava Terra, fogo, água, ar e espirito.

Estava no centro do pentagrama que o protegeria do que haveria de fazer e a mais ninguém.

Cinco.

Agora, eu sei que o que vou dizer parece a coisa mais improvável do mundo, mas aconteceu.

No último instante, no momento crucial, Zaya achou por bem tropeçar na areia e cair.

Caiu vergonhosamente no chão, aqueles tombos em que você sente o gosto do solo.

Pode ter sido o nervosismo, que afetou a ansiedade de chegar a um lugar seguro, sendo esse lugar atrás do mago. Pode ser que isso tenha turvado sua concentração. O medo tomou e enfraqueceu suas pernas, enfim, o fato é que ela caiu.

Acontece.

Acontece de verdade.

E como pouco azar é bobagem, ainda com pedaços de escorpião na boca, o verme gigante pareceu ter notado aquela agitação na areia.

Mergulhou pelo chão como um golfinho no mar e foi em busca das suculentas pernas da feiticeira. Inclusive ignorando a presença de todos os outros petiscos no caminho, ele se deslocou por baixo do solo arenoso de forma impressionante, porém nada sutil, de modo que Altman teve um vislumbre do que iria acontecer se não agisse rápido.

Com o coração latejando no peito e os pulmões ardendo pelo esforço, Altman disputou essa corrida contra a besta do deserto, coisa que só era possível, francamente, porque nosso herói já estava na dianteira e percebeu o que se aproximava e como isso se desenrolaria.

Contudo, ele nunca chegou a tempo.

Zaya não teve chance.

O verme gigante surgiu debaixo dela e de uma bocada só a engoliu por inteiro. Um verme de cinco metros de altura por três de largura engoliu facilmente uma mulher que não teria mais que um metro e setenta ou menos. Zaya tinha um corpo muito delgado, parecia até mesmo frágil.

A frustração de Altman foi expressa em um grito de terror, ódio e frustração.

Na carruagem, Léia ouviu impotente, o grito de lamento do companheiro.

— Vocês vão me pagar por isso! — jurou a barda às vozes na sua cabeça.

“Não”. “Não vamos”. — disse a voz masculina com frieza. “Você precisa de nós”. — respondeu Ortelis.

“Só querermos lhe proteger, meu anjo”. — respondeu à mulher.

O verme gigante estava empenhado em engolir Zaya por inteiro e mergulhar de volta ao solo, quando Altman o alcançou.

Não havia nada que o agente fantasma pudesse fazer munido de duas adagas comuns contra um monstro daquela proporção.

Os escorpiões não o alcançaram em tempo hábil e ele passou pelo mago, mas não sem murmurar as palavras. — Acabe com eles.

Argoluli bem que tentou ainda pegar o verme gigante antes que esse escapasse, porém, tinha esperanças que este já houvesse se fartado.

Era hora de pôr fim ao restante da ameaça.

Protegido em seu pentagrama, sacou um dos frascos preso à cintura, o arremessou em direção dos escorpiões e recitou a senha mágica que romperia o lacre.

— Cherut. — O selo se rompeu, houve um rápido clarão, uma forma de luz que solidificou em carne. Altman não viu, pois, sabia que não deveria arriscar olhar para trás, mas Argoluli pode observar o que soltara no mundo.

Uma górgona.

Puderam-se ouvir vários sibilos em conjuntos como se houvessem repentinamente descobrido um ninho de cobras. Pelo menos assim foi para Altman. Para Argoluli que podia ter a visão, os sibilos vinham da cabeça da criatura cheia de serpentes. Um verdadeiro pesadelo em carne e osso com um troco desnudo de mulher e um corpo de serpente da cintura para baixo com um grande chocalho na ponta da cauda.

O primeiro alvo da monstruosidade foi Argoluli. Ele já previa, por isso o pentagrama.

— Maaaaldiiitoooo! — uivou o monstro, todo ódio e olhos faiscantes. Argoluli não se balou. Sabia muito bem como aquilo funcionava.

— Obedeça meu comando! — Disse com uma autoridade incomum e inesperada vinda da figura atarracada daquele homem. — Destrua estes monstros e serás livre.

A górgona não perdeu mais tempo. Seja por opção ou por ser forçada pela vontade do mago, virou-se para os escorpiões com seu olhar furioso e sibilou para eles, irradiando uma luz esverdeada de todos os olhos de serpentes na sua cabeça.

Os escorpiões foram petrificados ali mesmo, a criatura despareceu logo em seguida. Não antes de jurar vingança ao mago.

Rápido assim, tudo havia acabado.

Quando o silêncio se fez presente, Altman ousou olhar para trás e se aproximou de Argoluli que também vinha em sua direção.

Os dois ficaram se encarando por alguns segundos. O muito alto e o muito baixo.

Altman franziu o cenho pensativo, enquanto desviava o olhar e encarava os escorpiões petrificados diante dele.

— Uma górgona? — perguntou o agente, meio confuso e incrédulo.

— Exatamente, meu caro, Alfred. — disse o mago acompanhando o olhar de Altman.

— Pensei que tivesse que olhar uma para ser transformado em pedra. — ponderou Altman. — Essas criaturas não têm exatamente olhos.

— Ah eles têm, meu amigo. Cinco pares para ser exato. — disse-lhe Argoluli assumindo sua postura professoral convencional. — Não são muito efetivos, entretanto os escorpiões se valem de outros sentidos mais apurados. Todavia seu equivoco é crer que a górgona depende de ser vislumbradas para transformar carne em pedra.

— E não é? — indagou Altman curioso.

— Falando grosso modo, tudo que a górgona precisa é que seja carne. — respondeu Argoluli. — O resto é mito e historinhas de taverna.

De repente o desanimo se abateu sobre Altman.

— Eu falhei. — falava sobre o resgate da jovem em que ele se atirou na batalha de modo a resgatá-la. Falava de Zaya, mesmo sem saber seu nome.

Eis que nesse mesmo instante o solo tremeu, a areia do deserto revolveu-se, abrindo um novo buraco no chão a poucos metros dos dois, chegando a lançar nuvens de poeiras perigosamente densas o suficiente para turvar a visão deles, que levou ambos a proteger os olhos com os braços erguidos.

O pior do cenário, no entanto, é que isso foi causado pelo retorno súbito do verme gigante.

Todavia ao invés de aproveitar a vantagem, muito pelo contrário, o verme deu-lhes tempo de se recompor, da poeira abaixar e apenas se ergueu sobre eles em movimentos espasmódicos.

Altman rangeu os dentes em fúria repentina e estava prestes a fazer uma bobagem quando anunciou. — Que bom que você voltou, desgraçado.

Argoluli, tal como fez antes com Léia o deteve ao retê-lo pelo braço.

— Espere. — apontou para a criatura. — Observe. — Tinha um aperto surpreendentemente firme, Altman não deixou de notar.

Altman notou que a criatura não avançou sobre eles quando teve oportunidade e apenas ficou ali se sacudindo em espasmo quando sem aviso, seu tronco se rompeu. Espalhando vísceras e gosma fedorenta para todos os lados.

O rompimento do seu ventre se dava por uma súbita aparição de várias pontas de pedras que se projetaram de dentro para fora da criatura como se fossem lanças.

A criatura tombou ao chão e logo após essa cena chocante e sem sentido, em poucos segundos depois, saia de dentro do ventre da criatura, uma donzela feita de rocha, como se fosse uma estátua em movimento, com punhos em garras de pedra.

Altman reconheceu pelos olhos dourados ser a mesma que ele pretendia resgatar.

A feiticeira.

Zaya de Shaofaw.

 


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Notas finais do capítulo

º O Pentagrama

É um símbolo de uma estrela envolto em um círculo.
Sempre com 5 pontos (uma apontando para cima), cada um tem seu próprio significado.
O ponto para cima da estrela é representativo do espírito.
Os outros quatro pontos todos representam um elemento; terra, ar, fogo e água. Todas estas coisas contribui-te à vida e são uma parte de cada um de nós.

O Microprosopio é o equivalente rabino para microcosmo, e foi a linguagem que esse autor usou para representar a magia do protagonista.
Não tem a intenção de ser uma aula de ocultismo e não é fiel aos seus parâmetros.
Ou sejam, NÃO TENTEM ISSO EM CASA.
É tudo fictício. As palavras são ligeiramente baseadas em hebraico, sem compromisso com a ortografia.

º Górgona
A Górgona é uma criatura da mitologia grega, representada como um monstro feroz, de aspecto feminino e com grandes presas. Tinha o poder de transformar todos que olhassem para ela em pedra, o que fazia com que, muitas vezes, imagens suas fossem utilizadas como uma forma de amuleto.
A Górgona também vestia um cinto de serpentes entrelaçadas.
É a raça de monstro ao qual pertence a famosa Medusa.
Existem várias versões dessa historia que por si só já dariam um livro.



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