Até você chegar escrita por Little Alice


Capítulo 5
I can feel you sneakin' in as if you are a mythical thing


Notas iniciais do capítulo

Oi, todo mundo! Como você estão?

Antes de tudo, eu queria agradecer a todos que favoritaram (Lady Anna, Lu, Dorinda, sileyfeelz, Callie, Trice e Siaht) e também a todos que comentam. Muito obrigada, galera ♥

Bom, agora ao capítulo. Espero que gostem e boa leitura!



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Head on the pillow, I can feel you sneakin' in
As if you are a mythical thing

Rose estava em seu lugar favorito da casa. Foi que a Sra. Weasley lhe dissera, com um sorriso bastante simpático no rosto. A matriarca, embora deixasse transparecer certa prudência em relação aos últimos acontecimentos, como se ainda estivesse testando o terreno sob seus pés, o recebeu com cordialidade e até mesmo, julgou, com alguma ternura. Como combinado, Scorpius viera para uma visita formal. Ele esperava encontrar o Sr. Weasley, mas o pai de Rose saíra às pressas depois do almoço para receber alguns carregamentos na Gemialidades Weasley e não voltaria até o jantar.

No entanto, não era como se o rapaz se lamentasse, o Sr. Weasley sempre fora um homem um tanto assustador ― na verdade, o seu olhar julgador era dedicado apenas à Scorpius, mais ninguém ― e, portanto, não estava realmente ansioso por vê-lo. A alternativa oferecida pela Sra. Weasley, ao se dar conta do desencontro, parecia-lhe muito melhor, muito mais agradável: passar algum tempo com Rose.

Fora Hugo quem o guiara até a estufa. O lugar, que ficava nos jardins, não era grandioso e tinha proporções muito modestas. Com suas paredes e teto de vidro, contudo, a luz do dia podia incendiar por toda parte de um modo muito bonito, dando-lhe uma aparência de algo quase celestial. Havia tantas flores, tantas cores e tantos perfumes diversos que Scorpius sentiu-se um pouco desnorteado ali dentro. Isso até ver Rose.

Quando a viu, no meio de tudo aquilo, quase esqueceu-se de si mesmo. Porque ali estava ela, em um vestido simples, iluminada pelo sol e com as mãos sujas de terra, enquanto trabalhava em um vaso de girassol. Às suas costas, Hugo disse, entre ameaçador e brincalhão:

― Eu vou deixá-los sozinhos, mas não pense em avançar qualquer limite com a minha irmã. Não me importo se vocês são almas gêmeas ou não. Se você tentar qualquer coisa, eu te desafio para um duelo.

Scorpius reprimiu uma risada, não conseguia imaginar Hugo, com todo o seu ar de intelectual careta, se envolvendo em duelos. Quando o rapaz saiu, fechando a porta atrás de si, Scorpius andou pelo corredor de flores, em direção à Rose, que ainda não havia se dado conta da sua presença. Ele pigarreou e a garota se virou, com uma expressão surpresa no rosto.

Rapidamente, Rose tirou os cabelos da frente dos olhos e limpou o suor da testa com as costas da mão, deixando-se sujar mais de terra. Ela praguejou e correu até um balde cheio de água. Parecia muito simples naquele momento, percebeu Scorpius. Muito diferente da noite anterior, quando vestia uma elegante roupa de baile. Entretanto, havia algo de deslumbrante em toda aquela simplicidade, algo que fazia o seu coração se sentir calmo e tranquilo. Vê-la assim era como contemplá-la em seu habitat natural, portanto, uma visão muito mais sincera e honesta. Enquanto se lavava, ela abriu um sorriso e comentou:

― Eu não esperava vê-lo até o jantar. ― Depois de secar as mãos, ela voltou e encarou Scorpius. ― Meu pai precisou sair, ele e tio George tiveram alguns problemas na fábrica.

― Sinto muito. Achei que o chá da tarde seria um bom momento. Esta noite vou receber um antigo tutor da faculdade, preciso de algumas orientações, então… Temo que teremos que adiar o encontro para amanhã. Ao menos, pude conversar um pouco com sua mãe. Não foi muito, porque ela logo me mandou para cá ― riu.

― Ela desconfia ― revelou. ― Papai ficou bastante surpreso e, como pode imaginar, não muito contente, mas não duvidou. Mamãe é naturalmente cética e, por mais que tenha abaixado um pouco a guarda, sinto que vamos ter mais trabalho com ela.

― Eu também senti isso.

― Sentiu? ― Rose virou-se para sua mesa de trabalho. Afastando o vaso de girassol, pegou outro e começou a se dedicar à ele, porém, tomando cuidado para não se sujar de terra novamente.

― Sim, mas acho que consegui passar a imagem de alguém perdidamente apaixonado ou às vias disso. Consegui fingir que estava mesmo muito ansioso em vê-la aqui. ― Aquilo não era bem uma mentira, ele estava mesmo ansioso por aquilo, mas não achou que Rose precisasse saber disso. 

― Hum, não sei. Talvez você devesse ser mais comedido, as pessoas nem sempre caem de amores umas pelas outras após a conexão… Isso pode levar algum tempo.

― Mas o nosso caso seria diferente, não acha? Nós somos amigos de longa data e, de certa forma, já caíamos de amores um pelo outro, só que de um modo diferente.

― Faz sentido. ― Deu de ombros. ― E quanto aos seus pais, enviou uma carta a eles?

Scorpius anuiu.

― Eles devem me responder até amanhã, imagino.

― Bom, então o que está feito está feito ― comentou Rose, sem esconder a própria inquietação. ― Hoje cedo, quando contei à mamãe, eu me senti como uma verdadeira vadia manipuladora. 

Weasley! ― riu. ― Isso são modos?

― São modos, sim. Não tem palavras que me descrevam melhor no momento e logo você vai se sentir como um vadio manipulador também, é só uma questão de tempo. Antes, eu estava dividida entre achar que eles mereciam isso, por terem se recusado a me escutar, por não terem cedido de modo algum, e entre me sentir uma pessoa horrível. Mas, agora que está acontecendo, o segundo está levando a melhor.

Scorpius tomou uma das suas mãos e, apertando-a com leveza, sussurrou:

― Vai dar tudo certo. ― prometeu. Rose abriu um sorriso mínimo. Ele, então, decidiu tentar mudar de assunto, tentar algo um pouco mais ameno, longe da mentira que contavam: ― Sua mãe disse que este é o seu lugar favorito da casa.

― De toda Londres, na verdade. É bobeira minha, mas, às vezes, sinto que as plantas conseguem me entender como ninguém. Elas precisam de cuidados, é claro. Porém, cuidado demais pode sufocar. Algumas, inclusive, preferem se cuidar sozinhas. Você sente todo esse perfume?

― Sim.

― E gosta?

― Eu não sei, é um pouco…

― … Enjoativo? Hugo também acha. Ele nunca fica por muito tempo e Lily é pior ainda. Ela é alérgica a quase tudo e, diferente de mim, este é possivelmente o lugar que ela mais odeia no mundo. Ou, ao menos, é o lugar que a faz espirrar muito. Eu, no entanto, gosto demais de todos esses aromas diferentes. Nunca me vi como uma pessoa excepcional, mas sei que sou boa com isso: em identificar as fragrâncias, até mesmo as mais sutis, em apreciá-las e em combiná-las de um jeito único. Papai costuma dizer que tenho um superolfato.

Enquanto Rose devaneava sobre aquilo, Scorpius quis interrompê-la e enumerar todas as coisas em que a amiga era excepcional. Ela era excepcional em escrever cartas. Durante o período em que as enviava continuamente, Rose sempre soube como alegrá-lo, mesmo em seus dias mais cinzentos. Sempre soube como usar as palavras. Ela era excepcional lendo poesias. Se tivesse nascido nos tempos clássicos, talvez pudesse ter sido um aedo¹, a cantar os mitos que mais tarde inspirariam Homero. Scorpius se lembrava, com perfeita clareza, dos saraus que os barões de Gryffindor ofereciam e como Rose, ainda menina, brilhava naqueles momentos. Mais do que isso, ela era uma amiga excepcional. Uma amiga que ele nunca mereceu. O rapaz tinha ciência disso, fora ele quem a abandonara e não o contrário. Rose só desistiu quando continuar tentando se mostrou inútil. Contudo, não disse nada daquilo. Tempos depois, Scorpius se indagaria se as coisas teriam sido diferentes se tivesse dito. Provavelmente sim.

― Eu queria ter a minha própria perfumaria ― confessou Rose, com um suspiro. ― Esse é o meu plano a longo prazo ou, como alguns dizem, o meu plano de vida. Quero poder investir o dinheiro do meu dote nisso. Mas, cada dia que passa, é um dia que não vivo esse sonho.  

― Também é um dia mais perto de vivê-lo ― ponderou.

― Bom, isso prova que tudo é uma questão de perspectiva ― permitiu-se rir.

― O seu perfume? ― indagou Scorpius, aproximando-se um pouco mais de Rose. Com o rosto ligeiramente inclinado, ele o exalou e novamente recordou-se da própria infância. ― Você mesmo o fez?

― Sim.

― Ele me lembra algo…

― Gérberas… havia uma plantação de gérberas na casa dos meus avós… ― Rose se afastou rapidamente e, em seguida, voltou com um vaso novo entre os braços. Era uma flor muito parecida a um girassol, no entanto, suas pétalas eram de um laranja vivo e inconfundível. Scorpius recordava-se delas. Elas estiveram presentes em sua infância. O passado de Rose e de Scorpius estavam tão intrincados um ao outro, que às vezes era difícil distingui-los ou separá-los. ― É uma flor é de origem africana ― explicou Rose. ― Lord Longbottom, um amigo da nossa família, presenteou vovó com algumas mudas décadas atrás². Acredito que sejamos os únicos a possuir essa espécie em toda Inglaterra. E, bom, este é o coração do meu perfume. Gérberas. Embora haja também notas de maracujá e verbena.

― É isso, então ― sorriu.

― Está vendo essas florezinhas bem pequeninhas no centro? ― indicou Rose. Scorpius se abaixou um pouco. ― Estas são as verdadeiras flores. Gérberas são muito parecidas com girassóis, na verdade. São várias flores e não só uma, como a maioria das pessoas tenderia a pensar. É meio como os próprios seres humanos, não acha? Só podemos conhecer alguém verdadeiramente quando nos aproximamos, quando nos permitimos ver além daquilo que é aparente. Somente assim enxergamos outras facetas.

Scorpius conseguia compreender aquilo. Naquele exato momento, ele estava conhecendo um novo lado de Rose. Da Rose adulta, que sonhava com algo até então jamais imaginado por ele. 

― Qual sua flor favorita? ― quis saber ao se dar conta, pela primeira vez, de que não sabia a resposta.

― Eu tenho muitas flores favoritas, Scorpius. Acho que cada uma é minha favorita em um momento específico.

― As minhas agora são gérberas. ― Rose não pôde deixar de rir e balançou a cabeça em descrença. ― Você bem que poderia criar um perfume para mim. Eu poderia ser o seu primeiro cliente.

― Você não seria. Victoire é.

― Ah, claro, me esqueci que estou competindo com toda a família Weasley ― disse, fingindo-se de chateado.

― Isso não é uma competição. Além do mais, eu gosto do seu perfume. ― Da mesma maneira como Scorpius fizera antes, Rose se aproximou dele. A garota ficou nas pontas dos pés, colocou as mãos nos ombros do rapaz e então murmurou: ― Sândalos, cânfora e mirra³. Me lembra você. ― Sentindo-se subitamente desnorteado, ele se afastou e forçou um sorriso. A amiga estivera tão perto de si, que Scorpius quase pôde sentir a textura macia da pele dela sob a sua. E aquilo lhe causou um estremecimento engraçado, que oscilava entre a estranheza e algo ainda sem nome.

 

 

― Amanhã voltaremos para Burrow Hall ― proferiu Ron, ao entrar na sala de jantar. Com o rosto agitado e a postura rígida, ele ergueu um dedo em riste, sobressaltando a esposa e os filhos, que antes tomavam o desjejum em silêncio, apenas aproveitando o fato de que a Sra. Hale comprara frutas frescas no dia anterior e fizera novas geleias e compotas. ― Amanhã ― repetiu.

Rose sorriu com a notícia. Era o que ela queria, desde o princípio: estar em Burrow Hall, na antiga propriedade dos seus avós, onde nasceu e cresceu, e onde poderia principiar uma nova vida. Queria aproveitar a primavera no lugar, quando os campos se enchiam de todos os perfumes possíveis. Queria aproveitar uma tarde ao Lago Negro e fazer piqueniques. Queria voltar a ser ela mesma e estar outra vez protegida dos olhares de censura que frequentemente experimentava ali, em Londres. Finalmente estava conseguindo o que desejava. Esse era o objetivo, afinal. No entanto, Rose precisou disfarçar seu próprio contentamento, que a qualquer momento poderia transbordar, e retornou a uma expressão neutra o quanto antes. O que não significava que sua mãe não houvesse percebido a discreta alteração em seu humor. Ela percebera.

― Eu preciso ir? ― indagou Hugo, infeliz. ― Eu realmente prefiro continuar em Londres neste momento. Não quero interromper a minha pesquisa agora e, vocês sabem, preciso visitar a biblioteca pública de quando em quando se desejo avançar nela.

― Você pode ficar. ― Ron sentou-se à mesa, desdobrou o guardanapo e o colocou sobre o colo. ― É melhor mesmo que fique, você ainda precisa frequentar a temporada. Mas nós… ― Ele indicou a si mesmo, Hermione e Rose. ― Nós iremos amanhã. Quero conversar pessoalmente com os pais de Scorpius e decidir tudo o que é necessário para a festa de noivado.

Rose engasgou com o seu suco de laranja. Ela levou uma mão ao peito, dando algumas batidinhas rápidas, e olhou incrédula para o pai. Não achava que tinha escutado direito.

― Festa de noivado? ― conseguiu perguntar.

― Claro ― Ron se serviu com um pouco de leite. ― E os pais do Malfoy vão pagar por tudo, escute o que estou dizendo.

― A tradição é que os pais da noiva paguem pelo noivado e pelo casamento ― interferiu Hugo.

― Para o inferno as tradições! ― bradou. ― Hermione está certa sobre isso, são tradições arcaicas, que privilegiam um gênero ao outro. Eles vão pagar. Ponto. Se são mais ricos que nós, não é lógico que seja assim?

― Você está sendo apenas vingativo ― censurou Hermione ―, nós podemos muito bem dividir as despesas.

Rose assistia a tudo átona, como se uma peça de teatro se desenrolasse bem diante dos seus olhos. E não uma peça qualquer, mas uma tragédia grega. Ela havia conseguido o que queria, porém, não do modo como imaginava. Aquilo parecia-lhe uma grande e perversa ironia. Tentara enganar o destino, mas o destinou tornava a colocar outra festa em seu caminho.

― Não precisamos de uma festa de noivado! ― resolveu reagir. ― Vocês sabem como me sinto sobre isso, sobre como prefiro evitar qualquer tipo de festa.

Hermione arqueou uma sobrancelha.

― Até mesmo uma festa para comemorar uma união de almas?

― Tenho certeza que Scorpius também não quer uma festa de noivado ― disse. Aquele era o ponto principal. Por mais que odiasse bailes grandiosos, Rose até poderia lidar com isso uma vez mais, desde que fosse somente uma vez mais. O problema residia em Scorpius. Isso não fazia parte do que planejaram e um noivado formal mudava tudo. Absolutamente tudo. Exigiria muito mais do amigo. ― Na verdade, ele pretende voltar para Edimburgo em algumas semanas.

― De jeito nenhum! ― Ron negou com um aceno veemente de cabeça. ― Ele vai ficar aqui, na Inglaterra, até o noivado de vocês se oficializar realmente. Aliás, quero que ele faça à corte devida a você nesse meio tempo. Portanto, nada de pressa. Eu não vou permitir que o infeliz do Draco Malfoy pense que não temos os nossos próprios princípios, porque temos. O filho dele não terá a nossa Rose sem uma festa de noivado à altura ou sem que a corteje por alguns meses. Além disso, o garoto concordou com isso ontem à noite, quando conversamos em particular depois do jantar.

― Concordou? ― arfou. Isso não fazia sentido algum. O que Scorpius mais queria, com aquele acordo, era poder voltar para Edimburgo. Se não retornasse, perderia o semestre e tudo seria em vão… ao menos, para ele. O plano inicial se resumia a algumas visitas durante aquele mês. Apenas isso. Eles visitariam a família um do outro e, então, forjariam alguns encontros que indicassem que Scorpius a estava cortejando de fato. Não duraria muito. Depois cada um seguiria o seu caminho e, durante um ano, manteriam contanto por meio de cartas e fingiriam estar com saudades um do outro, além de demonstrarem estar ansiosos pelo casamento. Rose não acreditava que Scorpius pudesse ter concordado com algo diferente, principalmente considerando que, dos dois, ele era o que mais perderia com aquilo.

Talvez Scorpius só tivesse concordado porque não pudera negar. Não no momento, não com um Ron encarando-o furioso e, definitivamente, não sem a oportunidade de conversar com Rose primeiro. Ele era um homem justo, não agiria antes de esclarecer as coisas com ela. Talvez Scorpius ainda lhe enviasse uma carta desistindo de tudo, agora que os termos se mostravam diferentes. E então, a mentira que os dois contaram precisaria ser revelada antes do tempo, antes mesmo que pudessem ter usufruído dela. Deus, Rose não se sentia preparada para aquilo ainda! Nervosa, ela mordeu a pontinha da unha.

― Ei, não se preocupe, Rosie ― disse Ron, num tom mais afetuoso. ― Eu sei que não gosta de festas, por isso mesmo será algo íntimo. Grandioso, porque temos direito a isso, mas íntimo. Apenas a nossa família e, infelizmente, a dele também.

A garota, ainda muito pálida, forçou um sorriso pouco convincente. Aquilo não a acalmava de modo algum. Tudo mudara de repente e Rose não sabia como agir. Não sabia se deveria esperar uma carta de Scorpius ou se ela mesma deveria mandar-lhe uma.

 

 

Depois de um dia bastante exaustivo, que consistira principalmente em mandar cartas para os seus professores e para o reitor da Universidade de Edimburgo, explicando-lhes que precisaria se ausentar por um semestre, e em arrumar os preparativos para a viagem que aconteceria amanhã, Scorpius finalmente pôde fechar os olhos sobre o travesseiro e relaxar. Em questão de minutos, entretanto, ouviu uma carruagem parar em frente à sua casa e, em seguida, uma campainha ressoar por todos os cômodos. Por alguma razão, soube quem era antes mesmo de atender a porta, exatamente como se Rose fosse uma criatura mística e sua presença pudesse ser pressentida no ar. Ele se levantou da cama, vestiu um sobretudo por cima dos pijamas e saiu do quarto. Já estava no último degrau quando a campainha tocou novamente. Scorpius não esperou que o mordomo atendesse. Ele mesmo a abriu, deparando-se justamente com Rose, junto de sua dama de companhia ― esta última com uma aparência não muito feliz.

― Bem, esta não é uma hora muito apropriada para uma visita ― observou, com uma risada irônica. Ainda assim, se afastou, abrindo passagem para as duas mulheres entrarem.

― Foi a única hora que deu, meus pais me mantiveram ocupada durante todo o dia, não tive nem tempo para lhe escrever. ― Rose tirou o manto que utilizava e entregou-o a Scorpius. O rapaz olhou para a Srta. Creevey, esperando que ela fizesse o mesmo. Contudo, a dama de companhia permaneceu rígida e olhando-o com azedume. ― Mas os dois saíram com Hugo agora à noite para assistirem a uma ópera, então aproveitei.

Enquanto falava, Rose andava pelo hall de entrada como se fosse a dona do lugar e já ia virando à esquerda quando Scorpius disse:

― A sala de visitas é do outro lado.

― Ah ― desculpou-se, sem graça. Ela mudou de direção e Scorpius a acompanhou, rindo baixinho. Antes de entrar, no entanto, Rose voltou-se para sua dama de companhia. ― Mary Ann, você pode nos esperar do lado de fora? Eu preciso conversar em particular com Scorpius.

― Sinto muito, Srta. Weasley, mas isso não posso fazer.

― Vamos deixar a porta aberta, não vamos? ― perguntou a Scorpius, que assentiu. ― E se ele me atacar, eu grito.

― Eu não te atacaria, pelo amor de Deus!

― Se ele passar um pouquinho só do limite ― reformulou ―, eu grito.

A Srta. Creevey não parecia convencida, mas aceitou aqueles termos com um suspiro resignado. Pelo seu ar cansado, Scorpius percebeu que a jovem já estava habituada a ter que ceder aos caprichos de Rose.

― Então ― pigarreou. Scorpius caminhou até o bar e se serviu com um pouco de uísque. Já que não podia dormir, uma dose lhe pareceu uma boa ideia. ― A que devo a honra de sua visita, ainda mais num horário como este?

Rose já havia se ajeitado no sofá e seus olhos estavam fixos nele de um modo bem estranho. Ela aparentava querer algo.

― Aceita? ― indagou, indicando o próprio copo.

― Achei que não fosse me oferecer ― falou.

Scorpius entregou seu copo à Rose, que o pegou com bastante animação, e serviu outro para si.

― Tem um gosto bem ruim ― comentou Rose ao provar. Apesar da careta de desaprovação que fez, continuou bebendo golinho por golinho. Ela estava se divertindo com aquilo. ― Mamãe não nos deixa tomar, nem mesmo papai pode beber… A única bebida aceitável, na opinião dela, é vinho. O resto faz mal para a saúde.

― A minha mãe é exatamente assim.

Rose sorriu para ele, sussurrando um “Mães”.

― De toda maneira, não é uma bebida adequada para damas, não é o que dizem? Não que mamãe se importe com isso, ela gosta de coisas que não são adequadas para damas. ― riu. Ela bebeu outro gole e, então, ficou séria de repente. ― Eu vim porque tem uma questão me incomodando.

― É sobre a festa de noivado?

― Sim ― assentiu. ― Eu preciso saber como se sente sobre isso. Sei que aceitou quando meu pai sugeriu, mas comigo você pode ser honesto. Você sempre pode ser honesto comigo, Scorpius. Você quer… desistir?

― As coisas continuam como antes. Ao menos, de minha parte.

― Mas isso altera todos os seus planos. Você não vai poder voltar para Edimburgo e terminar o seu semestre. Só eu vou me beneficiar… e é injusto, não?

― Meu Deus, Rosie, o que eu preciso fazer para convencê-la de que está tudo bem? Com ou sem noivado, eu perderia o semestre. Portanto, prefiro o noivado.

Ela concordou com um movimento suave de cabeça.

― E você, o que prefere? ― foi a vez de Scorpius perguntar.

― Eu vou estar em Burrow Hall ― respondeu, com um sorriso discreto. ― Eu, os campos de flores, meus perfumes e, agora, você. Vou estar bem. Mas não quero que seja injusto para…

― Não será ― interrompeu. Com delicadeza, Scorpius a puxou pela mão, fazendo-a se levantar e se aproximar dele. ― Também não será totalmente justo para você, Rosie. Nós teremos que dar uma festa.

― Com ou sem noivado, haveria festa no futuro. Portanto, prefiro o noivado ― brincou. ― E será só uma festa. Uma festa íntima, ainda por cima. Eu vou ficar bem, desde que não me obrigue a dançar.

― Eu jamais a obrigaria ― sussurrou Scorpius, sorrindo com carinho. Então, fez algo um pouco inesperado para si mesmo: ele a abraçou. Não era como o primeiro abraço que trocaram, cheio de saudade. Dessa vez, era um abraço diferente. De conforto, notou. Havia amenidade naquele gesto. Ele sentiu o cheiro das gérberas no cabelo de Rose e suspirou. Parecia certo tê-la assim, aconchegada entre os seus braços. E, quando ela também suspirou, soube que Rose sentia o mesmo. Sobre a certeza daquele abraço. Daquela amizade que os unia, não importasse quanto tempo houvesse passado e quantos erros ele tivesse cometido no meio do caminho. ― Tudo vai ficar bem ― prometeu uma segunda vez. ― Para mim e para você. 


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Notas finais do capítulo

¹Aedo: na Grécia antiga, cantor que apresentava suas composições religiosas ou épicas, acompanhando-se ao som da cítara. Por extensão: poeta divino, grandioso; bardo, vate.
²As gérberas obviamente não foram descobertas pelo Neville (risos). Mas liberdade criativa, né?
³Eu não faço ideia se esses aromas dariam certo juntos, afinal, infelizmente eu não sou uma perfumista como a Rose. Mas vamos fingir que sim. Eu só queria colocar alguma das fragrâncias que a minha amiga secreta gosta (oi, Callie). Novamente, liberdade criativa, né? Eu não tenho qualquer compromisso com a realidade aqui.


As coisas começaram a não dar tão certo assim. Eu acho que o Scorpius já cadela pela Rose e nem se deu conta disso ainda. O que vocês acham? Eu amo escrever um Ron implicante com o Scorpius, então eu amei escrever esse capítulo.

Bom, nós já chegamos ao meio da fic. Como estamos em pleno Junho Scorose e temos tantas fics do casal pipocando por aí, vou esperar esse mês passar para postar o restante. Aliás, dia 17 e dia 28, eu posto fics para o Junho Scorose. Volto com o próximo capítulo desta no dia 1 de julho, é uma promessa.



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