Porto Maribel escrita por Sensei Oji Mestre Nyah Fanfic


Capítulo 6
Confissão




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O grito de Júlio me deixou chocado. Nunca havia conhecido alguém tão desbocado, e com certeza os meus amigos também não. Todos olharam para ele com os seus olhos inquisidores. Isso com certeza o deixou com vergonha. Tanto que a sua irmã precisou intervir e puxá-lo para a mesa em que estavam. Deixei o engradado de cerveja ao lado da churrasqueira e pedi um amigo para ajudar a distribuir aos outros.

— Tenho que resolver pendências — falei um pouco constrangido à mesa com os meus amigos. Uma colega da escola puxou o meu antebraço e sussurrou no meu ouvido.

— Dá para perceber o cheiro do ciúme. Não se tocou, querido? Lila e eu estávamos te tocando antes porque percebemos que aquele lá só fica te comendo com os olhos.

As palavras de Jennifer foram certeiras. Também percebi os olhares nada discretos.

— Espertinhas. Agora preciso ir.

Júlio puxou o meu braço. Seus olhos marejavam. Estava bêbado. Pedi que me esperasse um pouco até terminar de ajudar o meu pai na cozinha. Ele assentiu e falou que me aguardaria.

Momentos depois, tirei o avental da cintura e saí de casa. Olhei para os lados, vi tanto ele quanto a irmã parados cochichando algo como se estivessem falando algum segredo cabuloso que eu não poderia saber. Bom... talvez eu saiba de algo.

— Tenho que deixá-los sozinhos. Voltarei para casa.

Vi Sabrina se distanciar a cada passo. Eu fiquei sozinho com Júlio Anderson pela primeira vez à noite. Ele abaixou a cabeça como se quisesse me dizer algo.

— Sinto muito pelo grito que dei. Deve ter ficado mega envergonhado comigo.

— Confesso que fiquei paralisado. Nunca havia te visto assim antes. — Suspirei. — Mas não é nada grave. Você ficou bêbado só com cerveja, e isso é um feito e tanto. Também bebo muitas latinhas, mas nunca cheguei a esse ponto.

— É que eu sou fraco para bebida. Desde minha vida no Rio, eu decidi moderar o que ingiro com álcool.

A cara dele era bem diferente dos meses anteriores. Pela primeira vez vi um ser humano de carne e osso em Júlio. Antes era apenas um homem tentando ser forte. Hoje, porém, a carapaça caiu do seu corpo.

— Acho melhor conversarmos amanhã. Você está bêbado...

Ele me puxou e me beijou. Não quis empurrá-lo, portanto pude sentir o gosto do álcool em sua boca. Paramos um pouco e ele começou a rir.

— Eu gosto muito de você, Caio.

— Conta uma novidade.

— Sério! Aquele grito foi por puro... ciúme. Vi você com aquelas piriguetes te tocando...

— Elas têm nome, sabia? É falta de respeito falar assim com pessoas que não conhece. Não se preocupe. Aquelas lá estavam te provocando.

O semblante dele voltou a brilhar como uma pérola recém achada da ostra.

— Sério?

— Até parece que eu inventaria algo do tipo. Elas me contaram. Mas acho que você precisa voltar para casa. Sua condição não e boa.

— Juro que te contarei algo importantíssimo.

Ele me beijou mais uma vez e foi embora. Não foi tão ruim. Era tudo um mal entendido. Resolvemos da forma mais pacífica possível. Mas o que me deixou pensativo era o conteúdo do que seria a fala dele de amanhã. O que tem para me falar? 

Assim que me virei, Sabrina surgiu diante de mim como se tivesse materializado. A irmã dele podia ser meio doidinha e rivalizadora com ele, mas gostava dele. Eram irmãos.

— Você sabe, não é?

A pergunta dela era de alguém que não poderia ser enganada. Aquela tal Sabrina era uma mulher extremamente esperta. E ela sabia que eu já estava desconfiando há algum tempo.

— Seu irmão é alfa.

Desde que transamos pela primeira vez, desconfiei. Sou beta, não idiota.

— É muito bom ouvir isso saindo da sua boca. Júlio está fazendo das tripas coração para achar coragem de contar sobre o seu gênero.

— Eu sei. E agradeço a ele por tentar tirar forças para me contar. Ficarei aqui apenas para aguardar a sua confissão.

Ela sorriu e me agradeceu. Voltou para mim e perguntou se eu não havia ficado desapontado por Júlio não ser ômega. Neguei com a cabeça. Que mané ômega que nada!! Gostava dele do jeitinho como ele era, por isso sempre correspondi aos seus sentimentos.

— Teu irmão vive no meu coração por ele ser quem é, e nada tem a ver com o o gênero alfa dele. 

— Obrigada.

A noite hoje foi um pouco diferente. Certamente no Nordeste, a noite costumava ser amena e não tão fria assim; temperatura por volta dos 26° e muito vento. Hoje o calor dominou. Talvez por causa da fumaça do churrasco impregnada na minha pele, talvez o meu nervosismo com a presença de Júlio, talvez a mistura dos dois. Meu suor molhou a minha camisa; a noite amena não deu conta do recado.

...

Fiz o que pude para acordar disposto na manhã seguinte e assim conversar com Júlio sobre o seu gênero e o motivo de ter escondido de mim durante todo esse tempo. Fiquei curioso, confesso. Mas não posso forçá-lo a contar; talvez ele tenha um motivo bem forte para não fazer isso.

Papai estava alegre com o trabalho. Havia pesca logo pela manhã e resolvi ir com ele para o barco. Passamos um bom tempo juntos e falamos acerca de Júlio e o meu interesse nele.

— Ele não é ômega, papai.

— E o que isso significa para você?

— Eu fiquei surpreso quando desconfiei, e o Júlio sempre bastante reticente quando falávamos do seu gênero. Mas acostumei com o fato de estarmos juntos independente da situação. Hoje conversaremos sobre isso. Ele vai me falar tudo sobre o porquê escondeu de mim.

Papai era um homem compreensível. Sempre apoiando as minhas decisões. Ele confiava em mim.

Às 11 da manhã, retornamos para o porto e descarregamos as cargas de peixes. Olhei para o píer e vi o antigo companheiro de Júlio falar com o dono de um barco de pesca que sempre era usado como barco de turismo. Não parei de olhar até ser subitamente chamado por meu pai com um tapa na nuca.

— Tá moscando?

— Talvez...

Peguei o caixote e levei a mercadoria.

...

Preocupado? Sim. Só não sei o quanto de gravidade aquela cena era para mim. O ex-namorado dele conversando casualmente com o dono do barco. Por quê? O que aquele homem veio fazer aqui? Não bastou ter drogado Júlio naquele dia?

Por volta das 14 horas, ele apareceu em frente de casa ainda com o uniforme do supermercado. Horário de almoço. Estava com hambúrgueres e dois copos com vitamina de açaí.

— Vamos passear?

— Estou pura peixe. Tem como me esperar tomar banho? Será rapidinho.

— Claro.

— Entra e senta aí.

Convidei aquele falso ômega para a sala da minha casa e o deixei sentado no sofá. Fui tão rápido para o banheiro que havia esquecido a minha toalha; e saí pelado, andando pelo corredor até o meu quarto sem nada. Se ele me visse assim, provavelmente atacaria.

Pronto e cheiroso. Saímos de casa. Papai me liberou a tarde toda. Fomos para a praça da cidade e sentamos no banco próximos a um conjunto de aparelhos de musculação. Ele tirou o hambúrguer de dentro da sacola de papel e me deu junto com o copo com o açaí. Falamos, comemos e passamos tempo.

— Tá cheio de gente aqui. Podemos voltar à praia?

— É... — respondi monossílabico.

Saímos da praça com apenas as forças dos nossos pés. A praia não era longe. Uns três quarteirões de onde estávamos.

— Tem um motivo grande para eu esconder o meu gênero e tudo relacionado à minha vida no Rio de Janeiro. Quero que me escute com atenção, pois não é fácil.

Caminhamos e conversamos.

— Aquele dia que fizemos sexo, lembra?

— Lembro. Jamais esqueceria.

— Você insinuou para mim que eu era um ômega, e eu não neguei. Pode parecer estranho falar só agora... mas não sou ômega.

Como esperado.

— Meu verdadeiro gênero é alfa. Perdão.

— Perdão por quê?

Os olhos dele ficaram vivos e com brilho após eu falar aquilo. Ele não acreditou na minha pergunta.

— Desconfiei que fosse alfa. — Ele puxou o meu ombro e parou o meu caminhar.

— Quando?!

— Após a transa. Você não tem característica física de um ômega. Já estudei a biologia deles. Costumam ser lubrificados naturalmente. Eu precisei te lubrificar com creme.

Ele pôs seus braços em meus ombros. Pensei que Júlio estivesse prestes a desmaiar. Até mesmo um alfa podia ser fraco. Talvez apenas ele.

— E por que você disse que eu era um ômega?

— Não sei ao certo. Fiquei na dúvida em saber quem você realmente é após vê-lo drogado com o seu ex. Daí falei sobre ser ômega já na expectativa de uma resposta sua diferente, mas, para a minha surpresa, não houve negação.

Júlio soltou um suspiro e olhou para o lado. Ouvir o que falei foi forte demais? Ele criou uma tempestade num copo d'água desnecessariamente.

— O problema de tudo isso não é o fato de eu ser alfa. Caio, por favor, escute-me.

— Fala.

— Vinícius não foi o meu ex-namorado. Ele e eu não fomos nada. Há um vazio emocional entre mim e ele. Entende o que falo?

— Não se preocupe, Júlio. A sua vida no RJ foi antes da gente se conhecer. Esse tal Vinícius não me importa.

Menti. Sim, ele me importava. Fiquei pensando na cena que vi hoje de manhã. Tentei não focar a minha mente naquele canalha.

E chegamos à praia. O mar ficou agitado, a maré aumentou em tão pouco tempo. Júlio segurou a minha mão e colocou algo na palma. Olhei o objeto minúsculo. Franzi o cenho. Perguntei a ele o que era.

— Um comprimido.

— Isso é óbvio. — Ri por um momento. — Não estou doente.

— Caio, isso não é um remédio, e sim uma droga. Lembra que falei para ti sobre a minha relação com o Vinícius? Não fomos namorados. Fomos colegas de trabalho. Trabalhei com ele na venda de entorpecentes e desinibidores de feromônios. Esse comprimido era um produto que eu vendia para que ômegas entrassem no ciclo de calor obrigatoriamente. 

Por essa eu não esperava.


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