Presos Por Um Olhar escrita por Carol McGarrett


Capítulo 38
Sozinha


Notas iniciais do capítulo

Domingo acabando, mas aqui estou eu!!
Aproveitem porque o passado nos chama!
Boa leitura!



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“Yo-ho, all together

Hoist the colors high

Heave ho, thieves and beggars

Never shall we die”

Hoist The Colors – Hans Zimmer

(Trilha Sonora de Piratas do Caribe: No Fim do Mundo)

Saí do escritório já era mais de dez e meia da noite. Estava morta de cansada, a reunião com os japoneses foi tensa, demorada e cheia de pequenas nuances, como sempre, esses clientes são extremamente detalhistas e querem a perfeição. Isso não me irritava, já estava além de acostumada.

Diferente da manhã, voltar para casa, mesmo debaixo de chuva foi tranquilo. Não tinha trânsito e depois de parar no Subway mais próximo e comprar um sanduiche para mim, cheguei em casa.

Em uma casa completamente vazia. E cheia de caixas para serem esvaziadas.

Ignorei as caixas e fui direto para o quarto. Precisava de um banho e da minha cama. E foi o que fiz. Tomei um banho demorado e mergulhei na cama, para ficar rolando de um lado para o outro, sem conseguir dormir.

Uma olhada no relógio e este me mostrou ser meia-noite. Ainda cedo para os meus padrões.

Com sono, mas sem conseguir dormir, peguei meu travesseiro e uma coberta e fui para a sala, me jogando no sofá.

Mandei uma mensagem para Alex, torcendo para que ele estivesse acordado, mas ele não me respondeu.

— Droga... – Murmurei.

Decidi ler as mensagens do grupo criado por Olivia e me diverti com a troca de mensagens entre minha mãe e Dona Amelia e entre Kim, Ian e Alex. Os três pareciam estar se entendendo bem. O que era um ótimo sinal!

Quando acabei de ler, ainda estava sem sono e comecei a acreditar que a minha falta de sono se devia à solidão. Assim, liguei a televisão e zapeei pelos canais, não achei nada que me interessasse.

Até que tive uma ideia. Novamente peguei o celular e abri o aplicativo do IMDB, e coloquei o nome de Alex na pesquisa. Sua filmografia apareceu na tela do meu celular e eu fiquei impressionada com a quantidade de entradas.

Escolhi o título mais antigo e dei sorte de encontrar o filme em um aplicativo de streaming.

Sabia, já pela sinopse que Alex não era o personagem principal, mas tinha um tempo de tela considerável.

Corri na cozinha, fiz uma bacia de pipoca, peguei uma garrafa de água e dei o play, começando a ver meu namorado na única área que eu ainda não tinha visto.

Sendo um ator.

Me surpreendi com a qualidade do filme e, sem querer ser chata, acabei realmente torcendo para o vilão – o papel de Alex – que eu não conseguia associar ao homem que eu conhecia, pois o gângster era tudo, menos parecido com o Alex que eu tanto amava.

Quando os créditos subiram, ao invés de ir dormir, procurei pelo próximo filme dele. E, com mais uma bacia de pipoca, assisti. Amei o filme do início ao fim! Ao final, desliguei a TV e fiquei ali no sofá mesmo, me perguntando como Suzanna pôde falar o que falou para Alex.

Ele é um grande ator. E olha que eu vi só os dois primeiros filmes dele. Pela lista do IMDB ainda tinha uns dez, e depois alguns episódios de séries e a tal série que Milena comentou comigo. Isso, fora uns quatro curtas, que me surpreendi serem dirigidos por Will e escritos por ele e Alex.

— Aquela modelinho de quinta categoria não faz ideia da besteira que falou! – Disse com raiva. – Ela quase que acabou com a carreira de um excelente ator, só para ser notícia! Ah se ela passa na minha frente!

E planejando uma vingança e tanto contra a ex de Alex, acabei pegando no sono, para, mais uma vez, me ver de volta a um passado.

~~~~~~~~~~~~~~~~~~

Foi um dia atípico na Fazenda e na Plantação de Cana, os capatazes, ao invés de chicotearem os escravos, estavam empenhados em contabilizar os prejuízos do canavial que fora queimado no assalto.

Alguns homens ajudavam a controlar as chamas, mas a maioria deles, ficou parada em um canto, enquanto meu pai, em cima de um cavalo que era tão sem coração quanto ele, ficava gritando ordens e mais ordens para os capatazes e os demais que ainda trabalhavam para controlar o fogo.

Passei por trás de meu pai e logo cheguei ao lado da senzala, do cesto que carregava, tirei várias qualidades de comida e fui passando para a Mama – a mais velha das escravas, que sempre sabia quem estava precisando de um pouco mais de comida.

— Sinhazinha... tome cuidado. Seu pai não está em um humor muito bom.

— Não se preocupe, Mama. Ele nem vai ver. – Garanti.

Ainda contrabandeei, durante a manhã, mais quatro cestos repletos de comida, que foi devidamente estocada e guardada para que os escravos pudessem comer mais tarde.

De tarde, minha mãe e irmãs, cansadas de todos os gritos que meu pai dava durante o dia, resolveram ir andar à toa na vila e me arrastaram junto. Eu não queria ir, queria ficar pensando na estranha proposta da noite anterior. Porém, não tive como recusar, e me vi andando atrás das três, entediada com tudo o que elas falavam e sobre cada fofoca que elas ouviam em um ponto e logo repassavam em outro.

Passamos em frente à uma adega, pude ouvir as risadas dos homens já bêbados e de algumas mulheres também. A cara que minha mãe fez para uma delas foi terrível, ela simplesmente julgou a mulher que deveria ter a minha idade, sem saber o seu passado ou o que a levou a ser o que ela era.

— Prostitutas. São todas prostitutas. – Disse com desdém.

Continuei calada atrás dela, contudo, desde que passamos pelo bar, eu podia jurar que estava sendo observada. Comecei a, discretamente, olhar por sobre o ombro, para os lados, porém não vi ninguém.

Suspirei frustrada. Eu queria voltar para o meu quarto, queria poder fechar os olhos e sonhar com o pirata com os mais belos olhos azuis que já vira.

Minha irmã mais velha, Mia, quis entrar em uma loja de fitas, disse que precisava de uma para seu novo vestido.

Revirei meus olhos, Mia sempre queria algo que jamais usaria.

Diminui a velocidade de meus passos e deixei que as três entrassem na loja, passei direto e estava indo na direção de uma livraria, quando um braço envolveu a minha cintura e me puxou para as sombras de um beco. Minha reação natural foi querer gritar, mas uma mão tampou a minha boca.

— Quieta, Katerina! Sou eu. – Falou uma voz em meu ouvido. E eu não deveria, mas a reconheci e meu corpo a reconheceu ainda mais, pois bastou uma palavra e eu me arrepiei toda.

— Posso tirar a minha mão e você vai ficar quieta? – Perguntou baixo novamente.

Aquiesci.

— Bom... – Disse e duas mãos me seguram pelos ombros e me viraram. E lá estava ele, sorriso de covinhas, olhos azuis brilhantes, mesmo jeito meio arrogante, meio moleque. – Pensou na minha oferta? – Quis saber.

— Você é maluco? – Perguntei.

Alexander levantou uma sobrancelha.

— Se te pegam aqui, te prendem!

— Preocupada comigo?

Mordi a língua para não falar mais nada que pudesse me entregar. Porém ele é esperto e deveria saber me ler muito bem, pois logo ele levou uma mão até meu queixo e com a ponta do indicador, levantou o meu rosto, para que nossos olhares se encontrassem.

— Sim... Você está! – Disse presunçoso. – Sonhou comigo depois que deixei o seu quarto? – Chegou o rosto perto do meu e sua boca se encostava de leve no lóbulo da minha orelha.

Mordi com mais força meus lábios. Dessa vez não era para ficar calada, era para evitar a tentação de querer beijá-lo.

— Não vai dizer nada? – Me encarou. E lá estava eu, completamente hipnotizada pelo azul do Caribe que eram seus olhos.

— O que você quer? – Murmurei.

— Vai fugir comigo?

— Não.

Ele tombou a cabeça e me estudando, apenas disse:

— O que falta para você ter a coragem de ouvir o seu coração?

Tentei sair de sua influência nada benta, mas ele me impediu, agarrando a minha cintura e me prendendo com mais força entre ele e a parede da, olha a ironia, Igreja.

— Eu não vou.

— Você não vai ser uma pirata. – Ele me garantiu.

Olhei-o.

— Nem uma meretriz. Se te serve de consolo, sou uma criatura naturalmente egoísta. Não gosto de dividir o que é meu, nem a mulher que amo. Você seria minha e só minha, Katerina.

— Sou nova demais para casamento. – Murmurei.

— Quantos anos você tem?

— Essa não é uma pergunta que se faz a uma dama! – Retruquei.

— Eu te disse na noite passada, eu deixei as boas maneiras para trás há muito tempo.

— Quantos anos você tem? – Perguntei.

— Por que se interessa?

Fiquei quieta.

— Vinte e três. Agora é a minha vez de saber quantos anos você tem...

— Dezessete. – Respondi de pronto.

— Uhm... já foi apresentada na Corte...

— Sim... ano passado.

— Quantos te fizeram uma proposta de casamento? Será que te contaram sobre isso?

— Não sei.

— Claro que não... você é uma moeda de troca valiosa, Katerina, seu pai tentará arranjar um casamento para você que seja extremamente vantajoso... para ele.

Desviei meus olhos.

— A menos que você fuja, sinto muito, bela, mas a sua vida amorosa pertence ao seu pai. Você vai se casar com quem ele quiser. Nunca com quem você quer. Me pergunto se tem alguém que tenha conquistado a sua atenção...

Abaixei ainda mais meus olhos. Eu não poderia deixá-lo saber que nas últimas catorze horas, ele era o dono de todos os meus pensamentos. E que ele tinha sido o primeiro a quem eu me vi interessada.

— Quem é? – Demandou, levando a mão ao cabo da espada. – Diga-me o nome dele, e vou convocá-lo para um duelo!

— V...Você. – Me peguei falando.

Sua mão deixou o cabo da espada, e ele me cercou, apoiando cada uma de suas mãos em um lado da minha cabeça.

— Eu?! Então você pensou na minha proposta! – Abriu um sorriso.

— Sim. – Novamente fui sincera demais.

— E?

Eu não resisti, não quando ele estava tão perto de mim e quando vi, puxei-o pela gola da casaca, dando-lhe um beijo faminto. Ele logo me respondeu, tirando a mão da parede e a deslizando até que parasse na base de minhas costas. Não sei como, mas ele chegou ainda mais perto de mim, e eu pude senti-lo por todo o meu corpo.

— Sentindo falta daquela bela cama que você tem em seu quarto. – Alex murmurou no meu ouvido, sua respiração entrecortada, devido ao beijo.

— Eu... eu... – Busquei por ar. – Preciso ir.

— Se você aparecer desse jeito na frente da sua mãe, ela vai desconfiar de algo. Se recupere primeiro. – Me falou.

Balancei minha cabeça, mas era tão difícil pensar em algo, em tentar me recompor quando ele estava tão perto.

— O que foi? – Perguntou diante do meu olhar.

— Beije-me novamente. – Ordenei.

Alexander abriu um sorriso de lado e fez exatamente o que eu pedi, indo além, me levantando pela cintura e me segurando por uma das pernas, fez com que eu me enlaçasse a ele, acabei abraçando-o com os braços e com as pernas, quando precisamos de ar, ele apoiou sua cabeça em meu peito, seu nariz em meu decote, seu ouvido em cima do meu coração.

— Respire fundo, mas de forma lenta. Precisa recuperar o ar de boneca de porcelana. – Ele avisou, sua voz abafada, pois ainda não tinha levantado o rosto.

— Difícil quando você está... – Deixei a frase no ar e ele, deliberadamente, afundou o rosto em meu decote e me beijou ali.

— O que você está dizendo? – Perguntou quando levantou a cabeça e me encarou, seus olhos brilhavam.

— Como faço para... – Ofeguei, pois sua mão subiu pela minha perna até as minhas costas.

Ele riu e me colocou no chão, com muito cuidado e se afastou de mim.

— Respire devagar e fundo. E ajeite o seu vestido... não quero que ninguém mais te veja assim. Essa visão é só minha.

Arrumei o vestido e ia tentando regular a minha respiração, quando ele abriu uma porta lateral e me guiou para dentro da livraria que era o meu destino inicial.

— Deixe-me ver... ainda está tentadoramente atraente para mim, eu poderia te levar agora, mas não. Porém, duvido que sua mãe vá te notar. Ela não te nota, não é mesmo? Até porque, você é tão branquinha que qualquer sol mais forte te deixa vermelha. – Disse passando a ponta do nariz em minha bochecha. Agora vá. – Me entregou um livro qualquer. – Tem vejo à noite, Katerina.

Comprei o livro, sem nem ao menos ver a capa, coloquei-o na bolsa de pano que tinha comigo e saí da livraria bem a tempo de ver minha mãe e irmãs saindo da loja de fitas. Mentalmente rezei para que não estivesse muito desarrumada e cheguei perto delas.

— Outro livro?! Desse jeito nunca vai se casar. – Mia disse.

Não me importei. Eu já tinha escolhido alguém.

Voltamos para a Fazenda, meu pai ainda dava ordens e mais ordens, minha mãe nos mandou para os quartos e nos ordenou para ficarmos por lá nessa noite. Subi de bom grado para o segundo andar e quando abri a porta, tive que reprimir o grito. Pois, deitado, muito confortavelmente em minha cama, estava Alexander.

— O que você está fazendo aqui? – Sibilei e tranquei a porta.

— O que seu pai diria se soubesse que a filha caçula está trancando a porta do quarto e que tem um homem lá dentro?

— Não sei. – Fui sincera. – Mas você não me respondeu.

— Vim buscar a minha resposta.

— Não está de noite.

— Sou apressado. Tem uma resposta para mim?

— Sim. – Falei.

— Sim, você tem uma resposta...

— Sim, eu vou com você. – Falei.

Ele abriu um enorme sorriso e se levantou da cama.

— Devo levar alguma coisa? – Perguntei quando ele chegou perto de mim.

— Deve. Um vestido assim seria interessante. Mas para onde vamos, não terá lá muita utilidade. Você não teria uma calça comprida, teria?

— Não sou homem para ter calças.

— Arrume suas peças preferidas, então. Você deve saber do que precisa. – Disse e voltou para a cama. – Se precisar de ajuda....

Para falar a verdade, ele não ficou deitado, logo veio me ajudar, sempre dando a sua opinião quanto às poucas coisas que eu pegava. Até que bateram na porta.

— Você tem que...

— Fique calada e não olhe para seu guarda-roupa. – Me orientou. – Aja normalmente.

— Pois não? – Perguntei.

— A água para o seu banho. – Me avisaram.

Destranquei a porta, e permiti a entrada da pessoa. Preparam o meu banho e depois saíram.

Com a porta fechada, não me permiti olhar na direção de Alexander. Somente fechei a outra porta que ligava ao banheiro e tentei tomar um banho. Assim que me vesti novamente, fui em direção ao quarto e lá estava ele, novamente deitado em minha cama e com os olhos brilhando.

— Achei que iria me convidar.

Senti meu rosto corar.

— Mais alguém vai vir aqui hoje?

— Meu jantar.

— Nosso.

E não demorou, bateram na porta, entregaram o jantar e se foram. Dividi a comida com Alexander e vi que ele, por mais que negasse, tinha boas maneiras.

— Você fez parte da Corte. – Falei diante de seus modos.

— Fiz.

— E por que fugiu?

— Pelo mesmo motivo que você. – Me respondeu.

Quando acabamos o jantar, me vi sem ter o que fazer, ainda não era noite e não poderíamos sair.

— Não fique olhando na janela. – Ele me avisou.

— Posso saber o motivo?

— Não é o seu hábito.

— E como??

— Ah... Katerina, eu venho te observado por um tempo. – Admitiu.

— Se não posso ficar na janela, o que vou fazer? – Questionei.

Alexander se levantou e com um movimento rápido me levou consigo para a cama.

— Só me prometa que não vai gritar.

Entendi o seu recado antes mesmo que ele começasse a me beijar.

— Mas temos que...

— Temos tempo, Katerina. E, podemos usar essa cama por mais uma noite. Você confia em mim?

— Sim, eu confio. – Respondi e ele começou a me beijar apaixonadamente.

E se eu achei que jamais seria capaz de soltá-lo por conta dos beijos que tínhamos trocado, eu não estava preparada para o que essa noite significou. Eu agora estava ligada à Alexander em um nível que jamais pensei que me ligaria a alguém. Ele era o meu mundo. O amor da minha vida.

Estava dormindo confortavelmente em seus braços, quando Alex me acordou, beijando meu rosto e minha boca.

— Sei que esse conforto é tentador, mas está na hora. Ainda quer fugir comigo? – Me perguntou, tirando o meu cabelo de meu rosto.

— Eu vou a qualquer lugar com você, Alexander!

— E eu com você, Katerina.

Me vesti e com a ajuda de Alex, saímos para o corredor, para ganharmos o átrio e, por fim, o pátio. Não vi ninguém, nem quando alcançamos o portão principal.

— Você tem certeza, Katerina?

— Sim. – Garanti.

Ele me deu um beijo e ganhamos a rua da vila, que estava completamente deserta. Andamos de mãos dadas por todo o tempo, até que ele enveredou para o meio da mata.

— Para onde estamos indo? – Perguntei.

— Até aqui. – Me mostrou uma clareira onde tinha um belo cavalo preto como a noite pastando calmamente.

Alex montou no animal e estendeu a mão para que eu me juntasse a ele. Não pensei duas vezes e logo estava sentada na sua frente, e ele me abraçava com um braço, enquanto com o outro segurava a rédea do cavalo.

Cavalgamos por quase quatro horas e quando chegamos ao nosso destino, o dia já tinha amanhecido.

— Que lugar é esse? – Perguntei quando ele me ajudou desmontar.

— Aqui, Katerina, é onde eu trago cada um dos escravos que eu consigo libertar.

Olhei para o lugar.

— Aqui não tem Senhor, Senhora, Senzala, Escravos. Somos todos iguais. Todos trabalham, todos ajudam.

— Isso... isso... – Me faltaram palavras para descrever o sentimento. – Liberdade, enfim. – Murmurei.

— Sabia que você me entenderia. – Falou ao me abraçar e foi me levando até uma das casas. – Nossa casa. – Explicou.

Me virei e o beijei.

Nossa vida na vila escondida no meio da mata era simples, mas infinitamente melhor do que a que eu tinha na Casa Grande. Nunca procurei saber o que de fato falaram do meu desaparecimento. Aquela vida não me importava mais.

Com o passar do tempo e à medida que eu fui conhecendo a todos, notei que Alex era tido como o Chefe do lugar, não alguém que mandava nos demais, mas aquele a quem buscavam quando tinham um problema. E eu, acabei virando essa pessoa também, pois ali, eu era a esposa de Alexander.

Não havia sobrenomes, não havia linhagem. Éramos iguais.

Alex foi me ensinando tudo o que eu precisava saber, começou em como montar um cavalo, e assim que eu aprendi, ele passou a me ensinar a atirar, a caçar e as demais coisas. As mulheres me ensinaram a costurar, até a cozinhar. Depois de um ano, não existia mais nada da Katerina filha de um Dom em mim.

Não vou negar, às vezes, para sobrevivermos, era preciso fazer um ou outro saque, e eu fazia sem remorsos. Não machucávamos ninguém, e só tirávamos dos ricos. E essa foi outra arte que Alex me ensinou muito bem. Entrávamos e saíamos de casas sem sermos notados, sempre carregados de ouro. E, não raro, ainda libertávamos alguns escravos, que sempre tinham a opção de fugirem conosco ou viver por eles mesmos. Eram poucos os que não nos seguiam.

Cinco anos haviam se passado desde que a minha vida tinha efetivamente começado, e agora, bem, éramos uma família de verdade, pois há menos de seis meses, nosso filho veio ao mundo. Tom era a cópia do pai, em tudo, desde os olhos azuis até a covinha no canto da boca. Era o orgulho do papai e eu nunca pensei que eu seria capaz de amar tanto uma pessoa como eu amava os homens da minha vida. E todas as noites, quando Alex acaba de colocá-lo no berço, que ele mesmo havia feito, ele sempre me abraçava e sussurrava no meu ouvido:

—  Obrigado, Katerina. Vocês são a minha vida. Mas eu ainda quero uma cópia sua. – Me falava antes de começar a me beijar.

O desejo de Alex foi satisfeito dezoito meses depois. Poucos dias depois do aniversário de Tom, eu dei à luz à uma menina, tão loira quanto eu. Meu marido, que ficou do meu lado por todo o tempo em que estive em trabalho de parto, só faltava estourar de tanta alegria.

— O nome dela vai ser... – Alex pegou a nossa menina no colo. – Isabela. Assim eu poderei chamá-la de Bela.

Tive que rir diante de sua felicidade, enquanto apresentava Bela para Tom.

O tempo foi passando e eu via os meus filhos crescerem no meio de um ambiente saudável, feliz. Era gratificante poder ver Alex com os dois. O carinho e o amor que ele tinha pelos pequenos. O cuidado com o qual ele sempre os tratava. E, lógico, a forma como ele sempre me olhava. Não tinha um dia em que ele não falasse que me amava. E eu não passava um dia sem respondê-lo da mesma forma. Ali, aquilo era a definição de felicidade. E tudo isso era graças a ele.

Eu era a mulher mais sortuda do mundo.

Como eu falei, eu nunca mais pensei na minha outra vida, essa era minha vida, tomar conta dos meus filhos, amar o meu marido e ajudar a quem precisava.

Mas a minha outra vida me encontrou. E eu nunca soube como.

Acharam nossa vila. E quem liderava o ataque era meu irmão. Eu o reconheci. Porém, antes que ele me visse ou pior, visse meus filhos, eu pedi para um casal de amigos escondê-los. Alex tinha sido precavido e achado um lugar seguro, para que, se isso acontecesse, pudéssemos fugir e recomeçar. O plano dele era que eu fugisse e ele ficasse. Porém, eu jamais abandonaria o meu marido.

— Katerina, vá. – Ele me ordenou.

— Não. Eu fico ao seu lado até o fim, Alex.

— Tom e Bela.

— Eles estão seguros. Sabe que Vitória e Joaquim não deixariam que nada acontecesse com eles. – Garanti.

E nós lutamos lado a lado em defesa de nossa vila, de nossas vidas. Muitos se salvaram, só os que ficaram ali, foram pegos. Alguns caíram, outros presos. Eu e Alex entre eles. Fomos levados à vila onde tudo começou. Agora lá era uma cidade, e me surpreendi que haviam se passado dez anos desde que fugira daquele terror, mas que nada havia mudado.

Quando pisamos na praça central, reconheci as pessoas que um dia chamei de minha família, eles me olharam com nojo e me minha mãe me chamou de prostituta.

Ah, se ela soubesse que era avó de duas crianças lindas.

Um julgamento em praça pública foi realizado. Fomos condenados. Alguns à forca, outros ao fuzilamento.

Eu e Alex iríamos para o fuzilamento, por sermos os líderes do bando de desordeiros. Ainda fomos chamados de saqueadores, destruidores dos bons costumes e por ajudarmos aos escravos a fugir.

Duas horas depois fomos colocados contra uma parede, virados para o pelotão que já preparava as armas.

Um padre pediu que disséssemos nossas últimas palavras.

Olhei para Alexander, ele me olhou de volta. Mesmo diante da morte, ele ainda sorria para mim.

— Eu te amo, Katerina. Obrigado pelos últimos dez anos.

— Eu te amo, Alexander, você me salvou naquela noite. – Respondi. Eu não poderia beijá-lo, estávamos presos a argolas, mas pude pegar a sua mão.

— Vamos nos encontrar novamente. – Ele me falou, olhando nos meus olhos.

—  Até que tenhamos nosso felizes para sempre.

Ele deu um meio sorriso.

— Nós plantamos a semente, Kat... Eles estão por aí. – Falou, se referindo aos nossos filhos.

— Obrigada por eles também. – Falei sem emitir nenhum som.

Ao fundo, alguém deu uma ordem, pôs o pelotão em guarda.

— Eu te amarei pela eternidade. – Foram as últimas palavras que falei e ouvi. E eu não me arrependia nem por um segundo, de ter seguido Alexander, mesmo que esse fora o nosso fim. Pois, no fundo, eu sabia, nós dois nos encontraríamos novamente.


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Notas finais do capítulo

Bem... é isso!
Espero que tenham gostado. E os nomes das pessoas nessa parte do passado de Alex e Kat não são aleatórios!
Muito obrigada por lerem!
Até o próximo capítulo.
xoxo



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