Revoada escrita por Lily A R


Capítulo 2
Retorno secreto... ou quase isso


Notas iniciais do capítulo

E aqui está mais um capítulo e juro que eu estou me dobrando para tentar manter um ritmo corrido na fanfic, mas sem deixá-la vazia. Tá sendo uma tarefa árdua, mas vamos conseguir!
Gostaria de agradecer à Sarah Black pelo comentário no prólgo ♥
Espero que gostem!



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Renesmee

Por definição, lar é o lugar a qual se habita, geralmente remetendo ao domicílio. Também era adequado descrever como o local de origem, a cidade-natal. Contudo, a conceituação também pode ser outra. Lar não é algo necessariamente físico, imóvel e tampouco imutável; lar pode significar sentimentos, costumeiramente atrelados ao reconforto; lar pode ser uma pessoa, que serve como porto-seguro, como base para estabilidade emocional.

Há sete anos, eu havia deixado para trás meu principal alicerce, meu alento; a cidade a qual eu nasci e vivi por anos. Não havia sido uma decisão súbita, sem motivação fundamentada, pelo contrário, tinha sido a única alternativa a qual minha família e eu enxergávamos naquele momento.

Foi doloroso, mais do que eu era capaz de explicar. Era como se uma lâmina afiada, banhada com fogo, tivesse atravessado o meu coração e o destruído, de tal forma que não parecia ser possível fazê-lo se regenerar um dia. O pior, é que eu sabia que não tinha sido assim só para mim e ter a certeza de que alguém que eu amava compartilhava da mesma dor não era acalentador, mas sim desesperador.

Eu não tinha planos de voltar para Forks, ainda que todos os dias o desejo de retornar ao meu lar nunca tivesse me deixado de fato. No entanto, eu já havia aproveitado todas as chances de me banhar no egoísmo de minhas escolhas, era hora de fazer o que era certo, mesmo que agonia se alastrasse em minha mente, impedindo-me de ter pensamentos coerentes.

Os paredões de decíduas, que circundam a estrada 101, ligando Port Angeles, minha última parada, à Forks, tinham um ar pitoresco com a ponta das folhas amareladas, em contraste ao cinzento céu nublado, que anunciava o outono. Ainda que estivesse numa temperatura baixa o suficiente para ser considerada desagradável para se ter contra o rosto estando o carro em alta velocidade, abaixei a janela do passageiro, apoiando meu rosto nos braços cruzados sobre a porta. Sentia o vento cortante contra a minha pele pálida, bagunçando meus cabelos tal qual as folhas em tons terrosos que caiam como uma chuva.

Existia uma parte de mim, que provavelmente herdei do meu lado materno, que tinha um talento incrível para autocomiseração. Então, ainda que a angústia estivesse presente, a sensação de aconchego batia de frente com qualquer sentimento negativo que pudesse se apoderar completamente da minha alma. Era interessante como uma pequena cidade poderia  me causar tantos conflitos internos.

Meus olhos se prenderam à estrada à direita que saia da rota de Forks. Era a rodovia que levava até La Push. Automaticamente, lembranças desagradáveis teimavam a invadir minha mente e se sobressair diante as doces memórias que eu guardava daquele local. O carro passou em alta velocidade pela ponte que cortava o rio Calawah. Eu queria dizer que as águas plácidas refletiam os sentimentos que se apoderaram de mim, mas isso seria uma falácia.

A placa cinza que desejava as boas-vindas à Forks nada tinham de especial para me chamar a atenção, mas para uma pessoa nostálgica era motivo para um pequeno sorriso surgir no rosto. Quando deixamos a mata densa para trás e passamos pelo Sully 's Burgers,  a imagem do meu melhor amigo tentando me forçar a engolir um pote de batata-frita se formou em minha mente, causando-me risos. Imagino o que ele diria se soubesse que agora eu comia todas aquelas porcarias que ele amava.

O motorista me encarou pelo retrovisor, estranhando o meu súbito divertimento. Deveria ser estranho mesmo para ele observar uma pessoa com uma grande facilidade para variar de humor. Mas, eu não podia fazer nada quanto a isso, era um puro traço genético recebido do meu pai.

Deixamos o centro da cidade, pegando a estreita rodovia que já continha as casas mais separadas. Novamente, o caminho foi cercado por extensas árvores, porém estas não tinham o tom amarelado, mas sim escuros, fazendo jus ao clima sobrenatural que rondava aquele lugar.

Talvez o percurso fosse mais fácil para mim se eu tivesse permitido que meu avô fosse me buscar no aeroporto, porém foi minha escolha descer do avião em outra cidade e pegar um táxi. Assim, teria mais tempo para pensar — não que Charlie fosse a pessoa mais falante do mundo, mas sei que teria me esforçado para manter uma conversa se estivesse presa em um automóvel com ele.

Quando o carro parou em frente à típica casa americana de madeira, com fachada branca e piso suspenso, meu coração falhou uma batida. Se eu fosse como qualquer humano, provavelmente era naquele momento que eu correria sérios riscos de ter um infarto. Eu podia ouvir a movimentação do lado de dentro da residência e mal havia saído do veículo quando um homem de modos apressados abriu a porta.

Os cabelos, antes cobertos predominantemente de fios escuros e alguns poucos acinzentados, agora possuíam completamente um tom grisalho, quase branco. As rugas já se destacavam por todo seu rosto e à medida que ele descia para as escadas, não tão velozmente quanto era costumeiro, pude perceber que o passar dos anos começava a fazer efeito na vida de Charlie.

Eu nem mesmo me dei ao trabalho de retirar minha malas, antes de me lançar contra o corpo de meu avô, tomando cuidado para não machucá-lo. Seu abraço era estranho para mim: era apertado, quase desesperado, diferentemente dos muitos que recebi na infância. Era óbvio o que aquilo significava.

— Também senti sua falta, vô. — murmurei. O cheiro de espuma de barbear se misturou ao aroma adocicado que exalava seu sangue. Para um vampiro, Charlie seria uma apetitosa refeição. Para uma híbrida que se restringia à dieta humana, não passava de um cheiro bom de sentir.

Quando o abraço foi desfeito, suas mãos me seguravam pelos ombros, fixando os olhos em meu rosto.

— Você está tão...— começou a murmurar. — igual. —a observação me causou risos.

Charlie não sabia muito sobre o mundo sobrenatural — sua experiência se limitava a admitir a existência de “lobisomens”. Talvez, lá no fundo, ele tivesse uma desconfiança sobre o que verdadeiramente era minha família por parte de pai, e agora sua filha e neta, mas ele aceitava, e agradecia, a ignorância sobre nossa natureza, mesmo que não parasse de se espantar pela nossa forte amizade com o tempo.

—Isso é bom, certo? — revirou os olhos, exatamente como mamãe fazia.

— Como se você não soubesse disso. — resmungou.

A leve risada atrás dele colocou nossa atenção para a mulher morena que se aproximava. O cabelo escuro, com apenas uma fina mecha grisalha, que parecia mais proposital do que obra da idade, casava perfeitamente com a pele de oliva. O rosto, ainda que marcado por linhas de expressão, ainda trazia um aspecto jovial, provavelmente devido ao formato redondo — ou só a predisposição genética mesmo.

— Acho que Charlie ainda não se acostumou com o fato de ter uma neta absurdamente bonita. — brincou ela. Desvencilhei-me de meu avô para poder cumprimentar Sue.

— E nem eu com o charmoso cabelo grisalho dele — retruquei, causando um sorriso dele. — Você está linda, Sue. — elogiei sinceramente.

— Obrigada, querida.

— Certo, Nessie, eu sabia que você vinha morar para cá, mas não sabia que iria trazer toda a sua casa junto. — comentou vovô quando viu as duas grandes malas de rodinhas e as três de mão que o motorista tirava do carro.

—Tia Alice insistiu. — dei de ombros, como se apenas isso bastasse para explicar o exagero. Alice Cullen não era conhecida pela humildade e recato mesmo.

Assim que paguei o motorista, Charlie se responsabilizou pelas duas malas de rodinha, ainda que eu tivesse insistido para levá-la, enquanto ficaram pra mim e Sue as três de mão, a qual apenas uma foi carregada pela mulher. Depois de duas viagens na pequena escadaria verde escura, todas as bagagens estavam dentro da casa.

Do hall de entrada, eu tinha a visão periférica do andar debaixo. De lá, era possível ver o piso vinílico bem ilustrado que se estendia até a sala de estar, que estava coberta por um carpete grafite, diferentemente do anterior que tinha um tom quase semelhante às paredes verdes do local. A cozinha continuava em tons mais claros e pastéis se comparados com o resto da residência, não combinando muito bem com o ladrilhado geométrico do piso.

— Eu não sei se você já quer subir para seu quarto ou comer alguma coisa, se bem que pelo o que eu lembre você não é de comer muito. – tinha quase certeza que Charlie falava mais aquilo para si do que para mim.

— Na verdade, estou faminta. — disse. Eu realmente estava, era bem comum na verdade, mas isso ocorria mais pela falta do meu principal alimento que pelo déficit de carboidrato e proteína.

— Então, enquanto eu termino o jantar, você ajuda sua neta a se acomodar. — Sue sugeriu. Charlie deu um beijo casto em seu rosto, como gesto de agradecimento, e meu coração se aqueceu pela demonstração de afeto. Era bom que ele tivesse alguém com quem contar desde a partida de mamãe.

Antes que o homem teimasse em carregar as bagagens escada acima sozinho, eu me precipitei, pegando três delas de uma vez e começando a subir as escadas. Ainda pude ouvir alguns resmungos por trás, mas não me atentei.

No corredor da escadaria, havia vários porta-retratos pendurados na parede, que antes não estavam lá. As fotos variavam: havia uma de Charlie e Sue no cartório. Eu lembrava daquele dia, eu tinha acabado de completar 6 anos e foi divertido que mesmo sendo um casamento civil e que eu nada parecesse ter a idade que tinha, ainda assim a noiva do meu avô fez questão de me ter como “daminha de honra”.

A segunda foto, era de Charlie, Renée junto com meus pais no casamento destes, era uma das minhas preferidas. Subindo mais dois degraus, tinha uma minha com mamãe e Charlie no natal. Havia mais outra de Charlie e Sue, mas dessa vez acompanhados dos filhos da mulher, Leah e Seth. Ambos pareciam muito um com o outro e, comparando com a aparência do casal de donos da casa, a foto não havia sido tirada há muito tempo. Era reconfortante saber que os irmãos Clearwater também não mudaram muito após uma década, principalmente Seth.

Já quase no andar de cima, eu estanquei. Na imagem, era noite de ano novo e pela primeira vez eu tinha ido para Port Angeles para ver a queima de fogos. Seth, Leah, Charlie e Sue foram comigo, e, juntamente nós, meu melhor amigo, Jacob. Havia sido uma noite incrível e a última virada de ano que havia passado com ele. Na foto, a minha aparência era bem semelhante com a atual e meu sorriso quase não cabia no rosto, literalmente. Meus braços enlaçaram o pescoço de Jake, enquanto os seus contornavam meu corpo. Seus olhos estavam radiantes, quase sendo possível ver o brilho reluzindo nas íris negras. Ao lado dele, Seth fazia uma pose engraçada, enquanto Leah apenas encarava o irmão com reprovação.

— Ele sente sua falta. — comentou Charlie. Virei-me para ele, observando parado no meio das escadas, apoiado no corrimão enquanto a bagagem maior estava pousada no degrau. — Ainda não entendi o porquê você não querer que ninguém soubesse sobre sua vinda. Forks é um lugar pequeno demais. Não demorará muito para descobrirem que está aqui.

— Eu sei. — minha resposta servia para todas as suas afirmações. Sem me prolongar, continuei o percurso.

Ele não precisava dizer em qual dos três quartos eu ficaria, pois antes mesmo de partir, o antigo quarto de mamãe já havia sido passado para mim. Em decorrência disso, era perceptível as poucas mudanças que foram feitas ao longo do tempo, como se o fato de estar quase tudo igual fosse uma prova que estava aguardando a minha volta.

— Sua cor favorita ainda é marrom avermelhado? — indagou, apontando para a colcha de cama do tom quase semelhante ao que eu amava.

— Para sua idade, você tem uma memória muito boa, vovô.— brinquei, rindo com a falsa carranca que assumiu seu rosto.

— Ainda nem vivi metade da minha vida, garota. — retrucou. Por um breve momento, eu me prendi à ideia de que ainda teria algumas centenas de anos com Charlie.

Largando as bagagens no chão, voltei a abraçá-lo, daquele vez mais forte que antes. Ainda era complicado para mim ter que digerir que nem todos viveriam por anos, talvez até a eternidade, como eu, e que na realidade aquele era o curso natural das coisas. Vovô se surpreendeu, mas não hesitou em retribuir meu carinho. Era reconfortante saber que, mesmo depois de tanto tempo, algo não havia sido mudado: não importava o que acontecesse, eu ainda teria minha família para me dar suporte.

Depois de nos separarmos, suas mãos se fecharam em meu rosto, em formato de concha. Seus olhos, tão assustadoramente parecidos com os meus, encaravam-me compenetrados. Eu sabia que o assunto Jacob não havia sido deixado para trás e sabendo do carinho que Charlie nutria por ele, era óbvio que ele retornaria ao tópico.

— Ele precisa de você, Renesmee. —proferiu. Eu também preciso, disse mentalmente.

— Eu estou aqui por ele. — assumi, temendo, minimamente, que meu avô pudesse se magoar com aquilo. Surpreendentemente, ouvir aquilo pareceu deixá-lo satisfeito.

Minha audição captou o momento exato em que um carro começou a reduzir a velocidade próximo à casa de Charlie. Franzi o cenho quando o barulho das rodas contra o asfalto cessou e daquela vez vovô também percebeu isso. Ele saiu do meu quarto, indo até o de visitas para poder ter uma visão da parte da frente da casa, já que a minha janela dava para o quintal.

Ele nem precisou voltar para dizer quem era, pois o cheiro amadeirado, misturado com terra molhada, rapidamente invadiu minhas narinas, ativando minha memória e fazendo meu sangue gelar.

— Droga. —verbalizou Charlie exatamente aquilo que passava pela minha cabeça naquele instante. Ele voltou para meu quarto, parecendo ligeiramente nervoso. — Eu não faço ideia do porquê ele está aqui. — garantiu.

— A mãe dele mora aqui. Não tem nada de estranho Seth aparecer para vê-la. — repliquei, tentando passar uma tranquilidade na minha voz a qual não sentia.

— Eu sei, mas ele podia avisar.— rezingou Charlie. Era claro que o desconforto do homem não era pela presença do rapaz, até porque ele o adorava quase como um filho, mas pela culpa infundada que sentia por não ter impedido de manter minha volta em segredo por mais tempo como achava que eu queria. — Eu vou me livrar dele. —comunicou, mas eu o impedi de ir até Seth.

Naquele momento, eu já podia ouvir Sue abrindo a porta para o filho e percebi o exato segundo que o início de conversa com sua mãe foi interrompido e ele prendeu a respiração, para, em seguida, inspirar profundamente. Ele já sabia que eu estava ali.

— Agora já é tarde. — falei para Charlie, sem exprimir o fato de que, naquele exato momento, os sentidos de Seth se aguçaram ao ouvir minha voz, ainda que eu falasse em um tom baixo o suficiente para que a mãe dele fosse incapaz de escutar. — Não ia demorar muito para saberem que estou aqui, certo?— devolvi seu comentário, bem-humorada, querendo lhe mostrar que estava tudo bem.

Voltei para a escada e, de cima, pude observar as expressões de Seth mudarem drasticamente à medida que eu descia cada degrau. Primeiro, choque; segundamente, incredulidade; posteriormente, alegria; por fim, quando eu já havia me aproximado o bastante para que ele me puxasse para um abraço, a euforia.  Seu corpo alto e corpulento me girava pelo ar, dando-me a sensação que, a qualquer momento, eu seria lançada para o outro lado da sala.

— Cuidado, menino! — repreendeu Sue. Ainda que ela nutrisse as mesmas desconfianças de Charlie sobre a minha natureza e que este tivesse lhe contado sobre o que provavelmente os filhos da mulher também eram, já que Jacob havia se exibido há muito anos a sua forma animal para vovô, a mulher mais velha ainda não se acostumava com a ideia do diferente.

— Puta merda! — exclamou, sem poder se segurar e aquilo acabou me arrancando a primeira gargalhada. Seus cabelos continuavam curtos e repicados, fazendo com que seu rosto jovial não harmonizasse com a barba rala que começava a despontar em seu rosto castanho.

— Seth! — censurou Sue, horrorizada pelos modos do garoto. Eu achava divertido o fato de tanto os Cullens, quanto os Swans, me tratarem como uma personagem dos contos de fadas que não pode ser corrompida de nenhuma forma.

— Desculpe, é que eu só... eu não acredito que você está mesmo aqui! —expressou. Eu não podia julgar sua reação, se fosse na situação contrária, provavelmente eu agiria do mesmo modo.

— Estava na hora de alguém voltar a bater você na corrida. —provoquei, ainda que nunca tivesse conseguido de fato ganhá-lo quando estava em sua forma de lobo.

— Como sempre sonhadora, doce Nessie. — devolveu. — Jacob vai ficar maluco quando souber. — declarou, entusiasmado.

Por muito pouco, eu quase não me entreguei ao desejo de lhe implorar para ficar quieto, ou mesmo ao instinto de ameaçá-lo. Jacob e Seth eram melhores amigos e, mais que isso, faziam parte da mesma matilha. Não seria apenas difícil para o Clearwater guardar aquilo para si, seria impossível.

— Deixe a garota respirar, Seth. — Charlie interrompeu, parecendo o único a perceber o meu desconforto. Protetoramente, seu braço passou pelo meu ombro, levando-me em direção à sala de jantar. — Agora, vamos atrás das costelinhas antes que seus pais me denunciem por deixar a filha deles definhando.

E era em um daqueles momentos que meu avô se mostrava ser perfeito.


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Notas finais do capítulo

O que será que aconteceu no passado de Jacob e Renesmee? Temos palpites?
O próximo capítulo será narrado pelo Jake.
Beijinhos!



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