Presente de Grego escrita por Vic


Capítulo 3
Gabrielle: Parte 2




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Quase todas as coisas no mundo são mais fáceis de falar do que fazer. É mais fácil falar que irá prender uma terrível vilã e arqui-inimiga em um rio de lava para toda a eternidade, do que de fato fazer isto. Você não pode prever as reviravoltas que podem acontecer, uma criança demoníaca que você achava que a sua companheira havia matado há muito tempo pode simplesmente aparecer diante do que fora o rio de lava e libertar a vilã, que em seguida ameaçaria a vida do seu único filho. Mas foi quando Xena observou Gabrielle e Solan juntos, treinando com seus cajados naquela fatídica tarde que ela percebeu que os dois na verdade eram muito parecidos. Um tempo depois, quando Xena soube da ameaça de Callisto, soube também que disfarçar Gabrielle de Solan seria muito mais fácil fazer do que falar.

— Você entendeu o que tem que fazer? –Xena se dirigiu a barda, preocupada com o pouco tempo que tinham para discutir seu plano.

— Sim, na verdade é bem simples. É genial a sua ideia de me fazer usar uma capa para me fazer passar por Solan. –Gabrielle sorriu com tranquilidade e a guerreira soube que com a companheira atenta as particularidades do plano, seria muito mais fácil enganar Callisto.

— O material com o qual estou trabalhando ajuda bastante. –Xena puxou a destra da barda para perto de seu rosto e deu um beijinho. – Sabe, é engraçado você e meu filho terem a mesma altura. –Xena sorriu ao pensar nos dois lutando com seus cajados algumas horas atrás.

— Ele puxou isso de você. –Gabrielle deu um tapinha no ombro de Xena, ela não gostava de piadas a respeito de sua estatura.

— Puxou muitas outras coisas também... –A guerreira não precisou citar nenhuma daquelas outras coisas para que Gabrielle entendesse do que a mulher estava falando.

— Muitas outras coisas boas. Ele tem o seu sorriso, Xena. –Gabrielle apertou mais forte a mão da guerreira, para que ela entendesse que o passado deveria ficar apenas no passado.

O clima entre as duas estava tão agradável que quase se esqueceram que estavam ali para atrair Callisto, a guerreira voltou sua atenção para seu plano assim que sentiu o cheiro de fogo ao seu redor, e dirigiu para a loira as seguintes palavras:

— Vamos, Gabrielle. Algumas coisas no mundo são mais fáceis de fazer do que de ficar apenas falando. –Gabrielle assentiu e colocou o capuz de sua capa na cabeça, ficando assim totalmente coberta, assim, ninguém a identificaria com facilidade. Xena segurou com mais firmeza a mão da mulher mais nova e ambas começaram a correr floresta adentro, os galhos das árvores açoitavam seus ágeis corpos e tudo no ambiente denunciava uma feroz perseguição.

— Por que tanta pressa, Xena? Não quer dividir um pouco da atenção do seu adorado filho com a sua velha amiga? –Callisto sorriu com desdém, ao se materializar diante de Xena e a pessoa que ela acreditava ser o filho da guerreira.

— Não se aproxime dele, ou...

— Ou o que? Vai acabar com a minha raça? –Callisto apontou o dedo para a pessoa encapuzada e está caiu no chão, um pouco distante delas. – Novidade, querida. Você já fez isso quando transformou a minha família em cinzas em Cirra... não está lembrada? –Callisto desviou o olhar da guerreira e passou a olhar a pessoa caída no chão com entusiasmo. – Mas agora é a minha vez de acabar com a sua raça. Solan... Solan, querido. Venha conhecer a sua titia Callisto, tenho certeza que você vai queimar de felicidade. –Callisto deu pequenos passos em direção a pessoa que estava se levantando, a mulher possuía um falso sorriso amigável em seu rosto.

— Não! –Xena gritou, na tentativa de parar a mulher, mas era tarde demais. A pessoa desconhecida aos olhos de Callisto ficou de pé e retirou a capa que ocultava a sua identidade, de dentro do engenhoso disfarce saiu uma loira encantadora, a quem os olhos de Xena amavam apreciar.

— Gabrielle. O velho truque da falsa isca. –Callisto abaixou o dedo que tinha preparado para incendiar o filho de sua inimiga, a decepção em seu rosto era evidente, o que fez surgir uma expressão de triunfo nos rostos da barda e da guerreira.

— Você não achou que eu ia trazer o meu filho direto para os seus braços, achou? –Xena debochou.

— Essa batalha você ganhou, Xena. Veremos se pode ganhar a guerra. –Callisto sorriu, desafiadora. – Espero que o verdadeiro Solan esteja seguro nas cavernas Íxion. –A vilã observou, com felicidade, uma expressão de completo pavor surgir no rosto da guerreira. Callisto desapareceu tão rápido quanto havia surgido, deixando Xena e Gabrielle imaginando o pior a respeito do que poderia estar acontecendo nas cavernas Íxion.

— Ela não está sozinha nisto. Temos que chegar até Kaleipus e Solan. –Xena segurou a mão da barda e as duas começaram a correr pelo caminho de volta. Xena nunca foi de rezar, de fato, mas enquanto corria para fora da floresta, a guerreira fazia preces para todo e qualquer tipo de deus que pudesse proteger a vida de Solan naquele momento.

Nas cavernas Íxion, a criança demoníaca gerada por Gabrielle se mostrava habilidosa em colocar a terceira parte de seu perverso plano em ação. A menina caminhava com passos curtos e silenciosos no interior da caverna, estava ansiosa para encontrar Solan, mas não contava com a possibilidade de encontrar outra pessoa naquela caverna, ou melhor dizendo, um centauro.

— Solan? Solan! Eu disse para você me esperar! –O centauro agitava a tocha freneticamente no interior da caverna, foi quando por um infeliz acaso, iluminou a malvada criança. – Criança? O que faz aqui? –Esperança não o respondeu com palavras, a resposta veio por meio de uma afiada espada, movida através dos poderes da menina na direção do centauro.

A terceira parte do plano não saiu como o esperado, mas haveriam outras chances para executá-la, mas dessa vez o alvo seria outro. Esperança se sentou no chão da caverna e se encostou em uma das muitas pedras, precisava descansar para recuperar suas forças e seguir em frente.

— Esperança? Esperança, onde você está? –Callisto andava no escuro da caverna, procurando pela menina.

— Estou aqui. –Esperança esticou a mão para que Callisto a ajudasse a ficar de pé, mas a vilã não se mexeu.

— Olha só para você. Tão indefesa... acho que Solan será meu. –Callisto deu as costas para a debilitada criança e deu alguns passos rumo a saída da caverna, até que foi interrompida pela menina.

— Não! Traía meu pai e junte-se aos infelizes dos deuses em seu crepúsculo. –Callisto se virou novamente para a criança, caminhou de volta até ela e se sentou ao seu lado.

— Tudo bem, quando você se recuperar, mataremos Solan. –Callisto sorriu com entusiasmo.

— Não, Solan estará bem protegido agora que Xena sabe que há duas pessoas atrás dele. Vamos envenenar sua alma, roubar sua vida, vamos matar o que ela mais ama... mamãe. –Esperança sorriu de um jeito tão perverso, que Callisto ficou ainda mais feliz com a ideia de matar Gabrielle, depois de todas as suas tentativas, finalmente iria ter uma vingança adequada.

Não demorou muito para que Xena e Gabrielle chegassem as cavernas Íxion, mas ao chegarem se depararam com uma cena horrível que desejariam jamais ver. Kaleipus estava caído no meio da estrada, sozinho e sangrando. Tudo o que veio na mente da guerreira foi aonde Solan estava, estaria ferido, sangrando, ou... ou até mesmo morto? Afastou aqueles pensamentos terríveis de sua mente e correu junto com Gabrielle ao encontro de um Kaleipus muito machucado. A mulher mais velha se agachou, e segurou a mão direita de seu velho inimigo, e agora amigo querido, na tentativa de amenizar sua dor.

— Kaleipus, quem fez isso? Onde está Solan? –Xena tentou ficar no foco do olhar do amigo.

— Ele foi procurar ajuda. –O centauro reunia o máximo de forças que ainda possuía. - A men... menin...

— O que? Não estou entendendo. –Xena pôs a mão livre debaixo da cabeça do centauro, para ergue-la um pouco mais, na tentativa de escutar melhor o que ele estava tentando dizer, mas Kaleipus já estava muito fraco, a morte era inevitável, então como suas últimas palavras, o centauro disse apenas:

— Solan... cui... cuide dele. –Kaleipus respirou fundo uma última vez, não havia mais ar para puxar, ele apenas deixou sua cabeça deslizar suavemente das mãos da guerreira, assim como sua vida deslizou para os braços de Celesta.

Se você já perdeu um ente querido, deve imaginar como Solan se sentiu ao receber a notícia da morte de Kaleipus, o único pai que havia conhecido. Se nunca perdeu, não pode imaginar como é a dor de se encontrar completamente sozinho nesse mundo cruel e inóspito que habitamos. Mas como Callisto sugeriu, nem ela, e muito menos você ou eu podemos estar em dois lugares ao mesmo tempo. Então vamos deixar a dor de Solan para outro momento, e vamos fazer uma descoberta incrível (pelo menos para ela) junto de Gabrielle.

— Pobre Solan, perder Kaleipus foi um golpe duro demais para ele. –Gabrielle conversava com Ephiny, enquanto ia até um comerciante para comprar algumas coisas de que Xena necessitava para o funeral de Kaleipus.

— A vida desse menino não é nada fácil. Já perdeu o pai e a mãe... e agora perdeu o tio. –Ephiny concluiu tristemente ao deixar Gabrielle na porta do comércio. As amigas se despediram e Gabrielle entrou para comprar o que precisava.

— Obrigada. –Ela agradeceu ao comerciante, segurou as coisas e a capa em suas mãos e foi em direção a saída. Estava distraída demais para notar que havia uma criança em seu caminho, só percebeu isso quando ela e a criança se chocaram, fazendo com que algumas coisas caíssem no chão. Gabrielle e a menina se abaixaram para recolher as coisas, foi quando a barda notou um objeto conhecido no meio dos demais, era sua ovelha de madeira. A ovelha que Xena tinha dado a ela de presente de Solstício de inverno e que ela tinha dado à Esperança quando a colocou na cesta no rio. — Onde achou isto? –Gabrielle pegou a ovelha de madeira do chão e agitou na frente da criança.

— Eu não roubei. Juro! Ela é minha desde que eu era bebê. –A garota puxou a ovelha das mãos da mulher e a abraçou com o máximo de força que conseguia.

— Ela é sua? –Gabrielle perguntou, espantada com a possibilidade de estar falando com sua filha, ela deu alguns passinhos para trás.

— Sim, meus pais me deram. Disseram que estava em uma cesta junto comigo. –Esperança olhou nos olhos de Gabrielle com uma falsa inocência, que passou despercebida pela mulher. A barda não conseguia acreditar no que estava ouvindo, aquela criança... era sua filha, sua Esperança, o bebezinho que ela abandonou há um tempo atrás. Gabrielle deu uma boa olhada na filha e não conseguiu notar nenhum vislumbre de maldade no semblante infantil da menina, o que deixou seu coração profundamente contente.

— Gabrielle. Xena está te chamando. –Ephiny segurou no braço da amiga, tirando-a de seu transe. – Tudo bem? –A amazona indagou, notando o clima estranho entre sua amiga e a criança.

— O que você disse? –Gabrielle olhou para a amiga, ainda estava atônita com sua recém-descoberta.

— Xena... precisa de você. –Ephiny fez careta ao notar a falta de atenção da barda.

— Tudo bem, já estou indo. –Gabrielle deu um sorriso fraco para a amazona e se virou novamente para a filha. – Fayla, me espere na minha cabana. Preciso saber que está segura. –A barda passou a mão livre no rosto da menina.

— Por que se importa? –Esperança apertou mais a ovelha de madeira em seus braços.

— Você entenderá, só me espere lá. Está bem? –Gabrielle colocou uma mecha do cabelo da menina atrás da orelha.

— Tudo bem. –A criança deu um sorriso fraco para a mãe.

— Até logo. –A loira passou a mão na cabeça da criança e saiu.

— Até logo, mamãe. –A menina tinha uma expressão de nojo em seu rosto, mas estava feliz com o fato de Gabrielle ter sido tão facilmente manipulada.

Enquanto uma malvada criança planejava cruelmente a morte de sua própria mãe, na cabana de Kaleipus, uma outra criança desejava mais do que qualquer outra coisa que sua mãe ainda estivesse viva para abraça-lo e confortá-lo naquele momento de grande dor.

— Sinto muito. Kaleipus era uma criatura maravilhosa. Lamento não estar lá para protegê-lo. –Xena observava o traje de Kaleipus muito bem arrumado em cima da mesa, as velas que Gabrielle comprou estavam espalhadas em cima da mesa.

— Não é culpa sua, é minha culpa. Minha mãe, meu pai e agora o tio... todos que estão ao meu redor morrem. –Solan se virou para olhar para a guerreira, e ela pôde notar algumas lágrimas resvalando de seu rosto.

— Isso não é sua culpa. –A guerreira passou as mãos nas costas do filho. Gostaria de poder fazer mais alguma coisa por ele, mas não podia revelar para ele que era sua mãe, se ele soubesse iria querer partir com ela e estaria ainda mais em perigo.

— Senão é minha culpa, então porque todos que eu amo morrem? –Solan a encarou.

— Existem muitas muitas pessoas ruins no mundo, Solan. –Xena passou a mão nos cabelos do garoto. – Mas há muitas pessoas boas também, seus amigos. Eles querem que você vá viver com eles...

— Mas eu não quero. –Solan a surpreendeu.

— O que? –O encarou, confusa.

— Eu não quero... quero viver com você! Quero viver com você e Gabrielle... na estrada! –Xena não podia negar que estava muito feliz em ouvir aquelas palavras, mas não podia arriscar ainda mais a vida de Solan.

— Não quer ficar aqui? Com pessoas que te conhecem? Que gostam de você?

— Eu quero... você e Gabrielle. Você disse que amigos são como família, certo? –Xena sorriu ao se lembrar que disse exatamente essas mesmas palavras para Gabrielle alguns anos atrás.

— Como família. –Ela sorriu.

— Então me leve com você, por favor. Não me deixe...

— Arrume suas coisas, quando acabar o que tenho que fazer, iremos embora. Temos muito o que conversar, faremos isso quando estivermos na estrada. –A guerreira limpou as lágrimas que escorriam pelo rosto do filho, e dando um último sorriso para ele, saiu pela porta. Do lado de fora a guerreira deixou três homens a postos, com ordens expressas para não deixar que ninguém entrasse na cabana.

A vilania é um ramo curioso, principalmente porque pode estar associada à uma pessoa que aparenta muita bondade e doçura. É difícil de se imaginar que uma criança pode ser a vilã de uma história, porque no geral, crianças são seres bondosos e inocentes. Gabrielle também não imaginava que sua filha fosse mesmo um instrumento maligno, porque é muito difícil para uma mãe ver maldade em seus filhos. Foi com esse ideal em mente, que Gabrielle abriu a porta de sua cabana, torcendo para que sua filha estivesse a esperando.

— Fayla! –Gabrielle gritou ao abrir a porta e adentrar na cabana.

— Oi. –A menina respondeu ao chamado da mãe, ainda estava firmemente agarrada com sua ovelha de madeira.

— Pensei que não estava aqui. –A mulher puxou a criança para um abraço apertado.

— Você pediu para que eu viesse e eu vim. –Esperança se desvencilhou do abraço da mãe.

— Preciso te contar uma coisa. –Gabrielle segurou as duas mãos da menina e se esforçou para não chorar. – Eu... eu sou sua mãe. –A criança sorriu com maldade.

— Eu já sabia. –Gabrielle sorriu aliviada e abraçou a criança. – Foi por isso que vim... para te matar, mamãe. –Tudo aconteceu tão rápido que não houve tempo para uma reação da parte de Gabrielle. Em questão de segundos, a barda já estava morta, sentada em uma posição muito estranha no chão. Os maus presságios de Xena a respeito da criança estavam certos, e infelizmente com esta confirmação veio também a morte de Gabrielle, pelas mãos de sua própria filha, a mesma criança que ela protegera da espada de Xena no passado. – Boa noite, mamãe. –Esperança deu um último sorriso cheio de desdém para a loira e colocou a ovelha de madeira estrategicamente posicionada em um canto da cabana, estava feliz por conseguir concluir a última parte de seu plano.

Com o luto ainda pesando em seu peito, Solan finalmente saiu de sua cabana e pediu para que dois dos homens na porta o acompanhasse até a cabana de Xena e Gabrielle. Os homens prontamente fizeram o que lhes foi solicitado, e acompanharam o garoto até a cabana. Ao chegar na porta, Solan bateu e esperou ser atendido, mas isso não aconteceu.

— Gabrielle! Xena! – A criança gritou, mas ninguém podia lhe escutar. – Posso entrar? Já estou pronto para partir. –Solan perguntou, não obteve nenhuma resposta. O garoto segurou a maçaneta da porta e a abriu vagarosamente. A primeira visão que teve foi de Gabrielle sentada no chão, em uma posição muito diferente do habitual. Solan colocou parte do corpo para dentro da cabana, dando um passo, o garoto se aproximou mais da mulher, até notar que havia algo de errado com ela, de sua boca escorria um pequeno filete de sangue.

— Chame a Xena. –Solan pediu para um dos homens, sem entender o homem fez o que foi pedido e saiu para chamar a guerreira.

— Solan, o que houve? Você está bem? –A guerreira pôs a mão no ombro do garoto.

— Eu estou bem... a Gabrielle é que não está. –A expressão da guerreira mudou, ao ver o semblante preocupado de seu filho.

— Como assim? O que houve com Gabrielle? –Xena voltou seus olhos para o interior da cabana e viu Gabrielle sentada no meio do cômodo, recostada em um dos muitos baús que estavam espalhados. – Gabrielle. –A guerreira a chamou, mas a mulher mais nova não respondeu. – Gabrielle. Ei, Gabi... –Xena perdeu a voz ao puxar Gabrielle pelo braço e notar que seu corpo estava completamente mole. – Gabrielle! -Xena sussurrou para a loira e a arrumou em seus braços. Ao conferir os sinais vitais da moça, constatou que ela estava morta, a expressão de tristeza e decepção em seu rosto surgiu de imediato. Callisto e seu aliado a enganaram para que ela acreditasse que o alvo era Solan, e foram atrás de Gabrielle, que estava completamente desprotegida.

— Xena... ela está morta? –Solan a indagou, o garoto estava parado em frente a porta, completamente em choque com a cena que estava vendo.

— Sai. –A guerreira disse em um tom de voz muito baixo, mas a criança não a obedeceu. – Solan, sai. –Pediu novamente, ainda usando o mesmo tom de voz.

— Ela morreu? –Solan insistiu, dando pequenos passos para se aproximar das duas.

— Solan, sai! Volta para a sua cabana, agora! –Era a primeira vez que Xena falava com a criança daquela forma. Assustado, o garoto finalmente a obedeceu e saiu correndo da cabana, sendo seguido pelos dois homens que faziam sua segurança. – Gabrielle, por favor. Já estou aqui... para proteger você, como eu prometi... você se lembra? –A guerreira segurou o rosto da barda em suas mãos, mas Gabrielle não reagiu ao carinho da mulher. – Meu amor, por favor. Estou aqui agora... –A barda não se mexeu, nem abriu seus lindos olhos verdes como Xena tanto queria que fizesse. Com a dor em seu peito e alma, a guerreira apenas gritou e chorou a morte de sua amada, gritos esses que foram escutados por Callisto, que ficou imensamente feliz por finalmente ter conseguido destruir Xena com um golpe que ela jamais esperaria receber.

O luto é uma experiência particularmente única, porque cada pessoa o vive de um jeito, mas todos o sentem da mesma forma. Estar de luto é saber que o amor ainda não foi embora, mas o amado já...

— Solan, você lembra que eu disse que tínhamos muito o que conversar na estrada? –Xena tentou puxar assunto com o filho, que chorava copiosamente diante da pira funerária de Gabrielle.

— Não estamos na estrada. Estamos na frente da pira funerária da Gabrielle. –O garoto respondeu friamente, olhando para Xena, ela percebeu que as partes de baixo dos olhos do garoto já ganhavam uma cor avermelhada.

— Solan, por favor... sei que você está magoado, mas precisamos conversar. –A guerreira via o seu filho chorar, estava inconsolável com tantas perdas.

— Não. Eu não quero falar com você, Xena. Eles confiaram em você para protegê-los e agora estão mortos. Meu tio e Gabrielle estão mortos... por sua causa. – O garoto a encarou novamente, ela pôde notar um misto de tristeza e raiva naqueles olhos azuis que ele havia herdado dela. A guerreira achou que nada mais a magoaria tanto depois da morte de Gabrielle, mas ao notar o desprezo no rosto de seu único filho, sabia que a dor de não conseguir mais alcança-lo era insuportável, era como se uma espada estivesse atravessando sua alma repetidamente.

— Solan... eu não queria...

— Eu não quero ouvir, Xena. Você pode sair? –O garoto estava irredutível, deu apenas uma última olhada para Xena e se sentou próximo a pira funerária de Gabrielle.

De certa forma, Solan estava certo. Tudo aquilo era culpa dela, se ela não tivesse tantos inimigos, Kaleipus e Gabrielle ainda estariam vivos. A guerreira se afastou com passos lentos, a vida já não fazia mais sentido para ela. Tinha perdido o amor de sua vida e agora seu filho não queria mais nem olhar para ela. Em seu íntimo, ela queria simplesmente se sentar e chorar por dias. Sentia vontade de ir aos céus, aos Campos Elíseos, ou onde quer que tivesse que ir, e lutar com quem quer que fosse para recuperar Gabrielle. Mas a guerreira tinha plena consciência de que como sua alma, sua amada também estava definitivamente morta. Xena pensava e sonhava com ideias mirabolantes para recuperar Gabrielle, falava consigo mesma e chegava à beira da loucura. No fundo, ela sabia que aquela era uma das muitas situações em que falar algo era literalmente mais fácil do que fazer.


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