Entre Lobos e Monstros escrita por Nc Earnshaw


Capítulo 6
Falando no diabo...




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Capítulo 5

por N.C Earnshaw

 

FICAR DE RESSACA era algo que ela já deveria estar acostumada. Era comum para Erin ir trabalhar após uma noitada de muita bebida e sexo — mesmo que a noite passada, para sua tristeza, tivesse sido regada de bebida barata e uma briga desnecessária com a sua melhor amiga. 

Ela podia aguentar o estômago revirado, a dor de cabeça infernal e o arrependimento de ter bebido. No entanto, naquele dia, cada passo que ela dava parecia pesar toneladas. Erin mal conseguiu levantar sem gemer de agonia, desejando imensamente aproveitar sua cama e dormir o dia inteiro. 

Sua mãe bateu em sua porta pela quinta vez nos últimos dez minutos, lembrando-a que se ela se atrasasse novamente, iria ser demitida. A Landfish bufou, ignorando seu chamado. Já estava se arrumando e não era criança para precisar ser avisada de suas responsabilidades. 

Carl tinha dado mais ultimatos que o normal nos últimos dias, e ela apostava que tinha sido Andy a fazer sua caveira para o chefe. Aparentemente, ela não gostava de falar sobre sua vida sexual tão abertamente. Sempre que ambas tinham o mesmo turno, a outra garçonete a encarava com nojo, e evitava dirigir a palavra a ela até que fosse estritamente necessário. Erin não se importava. Era até melhor, na verdade, uma vez que odiava as bobagens que a mulher mais velha conversava. 

A quileute vestiu o uniforme lentamente, agradecendo o seu eu do passado por ter tomado banho antes de se deitar algumas horas antes, arrumou sua bolsa com alguns itens necessários e abriu a porta no momento em que batiam de novo.

Ela sentiu vontade de vomitar o que estava na sua barriga assim que deu de cara com Carter, seu padrasto maldito que adorava infernizar sua vida. 

A aparência dele não era horripilante. Ele era alto, tinha tudo nos seus devidos lugares e o rosto não era de se jogar fora. Erin lembrava de quando era apenas uma menininha e se gabava na escola por ter um “pai” bonito. Pouco tempo antes de descobrir que o homem era podre por dentro e nunca seria um pai de verdade para ela. 

— O que você quer? — indagou Erin, segurando a porta para bater na cara dele no instante que ele a provocasse. Sabia que não era um bom sinal quando Carter vinha com aquela expressão de bom samaritano.

Ele suspirou dramaticamente, apoiando o braço na parede.

— Você tem que aprender a me respeitar, garota. Deveria se sentir grata por eu proporcionar um teto sobre sua cabeça e comida no seu estômago.

A garota mordeu a bochecha com força, a ponto de sentir o gosto do seu próprio sangue. Ele não proporcionava porra nenhuma! O teto sobre suas cabeças foi herdado pela sua mãe quando seus avós faleceram, e ela se lembrava de todo mês dar uma quantia gorda do seu salário para ajudar nas compras. 

Ela abriu a boca para lhe falar todas aquelas verdades, mas percebeu um pedaço do avental de sua mãe escondido no final do corredor. Kayla estava os espionando. 

— Olha, imbecil, não tenho tempo para papear essa hora da manhã, então me faça um favor e desapareça da minha frente! 

Carter colocou a mão sobre o peito esquerdo com uma expressão ofendida. 

— Vamos ver se vai continuar com essa pompa toda quando for demitida daquele seu empreguinho de merda. 

Erin abriu a boca para xingá-lo novamente, entretanto, o sorrisinho presunçoso do seu padrasto a fez congelar.

— Carl falou comigo ontem — contou ele, cruzando os braços. A sensação de deixá-la desesperada era gratificante. — Gente boa, o Carl. — Carter parecia querer torturá-la. — É um homem honesto, apesar de ser um cara-pálida tentando ganhar dinheiro do nosso povo com aquela lanchonete de merda.

A Landfish cerrou um dos punhos. Aquele filho de uma puta estava tirando-a do sério.

— Vá logo ao ponto — disse ela entredentes. 

Ele sorriu, e um arrepio desceu pela sua coluna. Como o odiava! 

— Ele me disse que anda se atrasando para os seus turnos, tratando mal os clientes…

— Isso não é da sua conta! — vociferou Erin, empurrando para o lado e passando por ele com agilidade. Estava de ressaca e não aguentaria muito mais daquele resto de esterco. 

Ela passou pela mãe, encontrando-a no exato local em que imaginava que ela tinha se escondido, e lançou-a um olhar ferrenho. Apesar de amá-la, ficava irritada como ela deixava seu padrasto fazer o que quisesse. 

Ela pegou seu casaco, jogou sobre o ombro em que sua bolsa estava pendurada, agarrou as chaves do carro e saiu porta afora, pensando no quanto queria ganhar o bastante para sair daquela maldita casa.

O tempo em que estava no seu carro era o único momento em que conseguia relaxar de verdade. Os bancos acolchoados cobertos por couro marrom eram mais confortáveis do que pareciam, e já haviam abrigado-na diversas vezes nos momentos de desespero. O interior era limpo e cheirava a tabaco — algo que nada tinha a ver com ela, mas com o antigo dono, que era obcecado por cigarros. O odor com o passar do tempo se tornou reconfortante.

Ela estacionou na sua vaga de sempre, xingando-se mentalmente por ter gasto seu tempo com Carter. Tinha apenas três minutos para começar a trabalhar, ou o atraso seria descontado do seu salário. Carl parecia cada vez menos paciente com ela.

A quileute correu até a porta de trás, guardou suas coisas no armário pequeno separado para empregados, e correu pela cozinha cumprimentando Big John e Ivy, o casal que tomava conta da cozinha.

— Foi por muito pouco, menina — repreendeu o cozinheiro, entregando uma bandeja. 

Erin sorriu para ele. Adorava aquele homem como se fosse seu avô. Apesar de ser grande e ter uma aparência rude, tinha o coração maior que o mundo. 

— É admirável o jeito que consigo me safar. — Ela jogaria o cabelo para trás, se os fios não tivessem presos em um rabo de cavalo firme. — Para que mesa devo levar isso aqui? 

Ivy se aproximou dos dois com um papel na mão. 

— Mesa 5, querida. 

Ela assentiu, pensando que aqueles dois eram os únicos motivos dela ainda continuar com aquele emprego. Eles, e o fato de precisar daquela grana para sobreviver.

— A Tasha está aí — cochichou a mulher perto do seu ouvido, tentando ocultar do seu marido que estava fazendo fofoca. 

Erin arregalou os olhos, impressionada. A esposa do seu chefe estava na lanchonete bem no dia em que a amante trabalhava! Finalmente algo acontecia para animar aquele lugar entediante. 

— Não acredito! 

Ela se apressou para sair pela porta, lembrando do pedido em mãos e ansiosa para ver o desenrolar da história cabeluda. Toda vez que Tasha aparecia na lanchonete, um clima hostil tomava conta do ambiente. 

A Landfish tinha quase certeza que ela sabia do caso de Andy com o chefe, e apenas ia para lá para atormentar um pouco a outra mulher. 

Ela atendeu a mesa designada, observando de canto de olho Tasha repreender Andy. 

— Bom dia, chefinho — cumprimentou a quileute assim que se aproximou do seu chefe. A ressaca parecia ter sido evaporada quando percebeu a cara de enterro que Carl fazia.

Ele a ignorou completamente, fechando ainda mais a cara. Não conseguia tirar os olhos da discussão armada pela sua mulher e sua amante.

— Deveria fazer alguma coisa. — Carl a fitou de canto de olho. — Estão espantando os clientes.

Com um sorriso escondido, Erin foi limpar as mesas, assistindo de camarote o momento em que Carl ameaçava Andy de demissão e puxava Tasha pelo braço. Ela não podia dizer que se sentia satisfeita com o que tinha acontecido, mas o tédio fazia coisas com as pessoas. 

— Aposto que está adorando isso, não é, sua vadia? — Andy bateu o ombro no dela, empurrando para trás.

Ao contrário da reação esperada, Erin gargalhou. 

— Você não imagina o quanto.

O resto da manhã seguiu sem mais alardes. Muitas pessoas entrando e saindo, fazendo seus pedidos sem se importar em sequer olhar para a cara dela. Erin preferia assim. Mesmo que tivesse que manter o sorriso falso no rosto, não precisava se concentrar completamente nas atividades que fazia.

Ela sentiu sua cabeça latejar, e as lembranças da festa da fogueira retornaram. A garota lembrava de beber bastante, conversar com Jared — alguém que não dirigia a palavra a ela há semanas, salvar Embry das garras de Jane…

Erin não sabia porque sempre que se tratava daquele garoto, ela perdia o controle. Brigar com a sua melhor amiga? Por causa de um cara? 

O pior era que ela não se arrependia disso. Não se arrependia de ter entrado no meio deles, de tê-lo defendido e ter brigado feio com Jane no caminho para casa. O que a amiga tinha feito não era correto, e a Landfish não passava pano para assédio seja qual fosse o sexo. Principalmente se a pessoa afetada fosse ele. 

Erin odiava mentir para si mesma, então precisou admitir ali, enquanto entregava um hambúrguer gorduroso a um homem que deveria estar com colesterol alto, e ela apostava que morreria nos próximos dez anos por apenas comer porcaria, que ela tinha se incomodado profundamente ao ver Embry e Jane quase se beijando. 

O sino da porta de entrada tocou, e a Landfish agradeceu aos ancestrais por tê-la livrado daqueles pensamentos constrangedores. Ela? Com ciúmes de um garoto que mal tinha saído das fraldas? Por favor

Erin não entendeu o motivo de Andy passar feito um furacão ao ir quase correndo até a porta. Parecia que um demônio tinha entrado ali e ela precisava dar um jeito de se livrar dele. 

Ela ergueu os olhos, e sua respiração ficou presa. Sendo interceptado pela sua colega de trabalho, estava Embry. 

— Falando no diabo — sussurrou sob a sua respiração. 

O rosto do garoto Call corou com qualquer coisa que Andy tenha dito, e Erin sorriu ao pensar nas palavras atrapalhadas que saiam de sua boca. Tinha comprovado o que Jared tinha dito na outra noite. Embry era tímido.

O amigo dele parecia impaciente — reparou a Landfish. E foi somente quando ele olhou para ela e a chamou com a cabeça, foi que se deu conta que eles precisavam de ajuda. 

— Sinto muito, rapazes, mas não podem entrar na lanchonete com este tipo de vestimenta. 

“Hein?”, pensou Erin aproximando-se do trio. A situação já tinha chamado a atenção de todos os presentes, que encaravam a cena com os olhos esbugalhados. Que droga era aquilo que a outra estava fazendo? Desde quando pocilgas feito aquela, tinham código de vestimenta? 

De canto de olho, ela percebeu que Ivy, que não perdia uma fofoca, tinha saído da cozinha para espiar o que estava acontecendo. 

— O que tá pegando? — Se antes Embry estava vermelho, quando viu Erin tão próxima a ele, quase virou um tomate. 

— Essa mocreia aí não quer nos deixar entrar porque não estamos vestidos adequadamente. — Ele, a quem ela tinha reconhecido como o neto do velho Quil Ateara, afinou a voz no final da frase para imitar Andy. 

Erin segurou a risada e fuzilou sua “amiga” com os olhos. 

— Que história é essa, Andy? — perguntou ela com uma inocência fingida. — Essa porcaria de vestimenta não existe aqui. Não estamos num restaurante chique em Port Angeles, sabe?  

A quileute quase conseguiu ouvir o ranger dos dentes da outra.

— Carl disse…

— Se o nosso chefe, — cortou Erin. — não avisou nada ao resto da equipe, essa regra não vale, Andy. O que ele te fala em privado não serve. 

A outra abriu a boca para interromper, mas ela não deixou. 

— Os garotos vão entrar, comer o lanche deles e acabou. Não vai querer que o Carl saiba que está procurando problemas com o Uley, não é? 

Sam Uley era o chefe daquele bando de garotos gostosos e pelados que corriam por La Push. Erin conviveu o bastante com Jared e Paul; mesmo antes daquela mudança abrupta, para saber que o que eles faziam nada tinha a ver com drogas. 

Eles eram um grupo fechado, e ela confessava que já tinha invejado algumas vezes a união e companheirismo deles. Pareciam uma família. 

Por Carl ser um cara-pálida — mesmo que seus funcionários fossem em maioria quileutes, era constantemente vigiado para não se aproveitar ou tratar mal qualquer um da reserva. Então, por mais que ele odiasse, tinha que aceitar com um sorriso escancarado garotos musculosos com poucas peças de roupa se não desejasse ser expulso daquelas terras a pontapés. 

Andy soltou um guincho e saiu pisando duro, arrancando risadas do amigo de Embry e dela mesma. 

— Vagabunda — xingou baixinho, pensando que os garotos não ouviriam. 

— Embry, cara, sua garota é incrível. 

Erin franziu o cenho com o “sua garota”.

— Cala a boca, idiota. — A ordem fez apenas o amigo rir mais ainda, e a garota adorou a dinâmica dos dois. — O-oi, Erin.

A única palavra que veio à sua cabeça foi fofo. Embry Call, com todos aqueles músculos, era muito fofo. E ela adorava coisas fofas.

— Olá, Embry! — Ela sorriu amplamente, sem tirar os olhos das bochechas coradas. — E Quil, não é? 

O garoto assentiu e apertou a mão dela rapidamente. 

— Em que mesa os senhores desejam sentar? — perguntou formalmente, curvando-se como se estivesse diante de reis. 

Eles trocaram olhares divertidos e apontaram para uma mesa de canto, perto da janela. 

— Tudo bem! Então vamos lá. 

Erin passou na frente deles, dirigindo-os até a mesa como se fosse algum tipo de maître. 

— Ela é muito legal — cochichou Quil.

Ela não conseguiu ver a resposta de Embry, mas sentiu seu coração se aquecer naquele péssimo dia de trabalho.


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