A Day of Exploration escrita por teffy-chan


Capítulo 1
Capítulo Único – This isn’t a Date (I guess)


Notas iniciais do capítulo

Como é bom poder escrever usando quantas palavras eu quiser!
Como eu disse lá nos avisos, essa história é um spin-off do drabble "The Secret of the Haunted House". Ela se passa antes do Ichigo e a Rukia começarem a namorar, quando eles ainda não tinham notado que gostavam um do outro e quando a Rukia tinha menos conhecimento sobre o mundo dos humanos.
Boa leitura^^



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Mais uma tarde normal em um dia pacato… na verdade isso é raro. Não recebi nenhum sinal de Hollow por perto hoje então aproveitei para ler a nova edição do meu mangá. Ichigo estava no andar de baixo então saí um pouco do meu esconderijo (se é que se pode chamar um armário de esconderijo) para esticar os músculos.

Estava quase no final do mangá quando Ichigo adentrou o quarto.

— O que está fazendo aqui fora? Já disse várias vezes para você ficar escondida — ele falou, fechando a porta atrás de si.

— Relaxa, só queria respirar um pouco de ar fresco — balancei a mão — Não tinha ninguém aqui, qual é o problema?

— O problema é que se alguém te ver eu vou ficar encrencado — ele lembrou pela milésima vez — Anda, agora sai da minha cama.

— Nossa, que medo… você não vai fazer nada comigo, não é? — até entendia a preocupação de Ichigo, mas não consegui evitar de rir da expressão irritadiça dele.

— Para de zoar comigo, Rukia. Sai logo.

— Isso é injusto, sabia? — deixei meu mangá de lado e cruzei os braços — Essa cama é tão macia. Por que eu tenho que dormir no armário enquanto você fica com uma cama confortável só para você?

— O que…? Você enlouqueceu de vez? — por algum motivo ele corou. Será que exagerei na brincadeira? — Não posso dividi-la com você! E sequer cabemos os dois…

— Como é? — interrompi o gaguejar dele. Podia sentir meu rosto esquentar. Droga, eu estava ficando vermelha também — Não quis dizer para nós dois dormirmos juntos, seu indecente! E sim para você passar uma noite no armário e me deixar ficar com a cama para ver como é!

— Ah… isso faz mais sentido — Ichigo desviou o rosto enquanto tentava se recompor. Céus, o que se passava pela cabeça dos humanos? Ou será que todos os homens, até Shinigamis, eram assim? — Espera, não faz sentido nenhum! Eu nem caibo naquele armário, do qual você se apossou por sinal.

— Aquele armário não te pertence mais, Ichigo — deixei bem claro, pois ele não parecia ter percebido isso — E é claro que você cabe. Veja só — levantei-me e peguei minha prancheta de desenhos. Comecei a fazer um rascunho rápido — Eu posso esticar as pernas porque sou mais baixa. Mas, se você dobrar os joelhos assim — expliquei enquanto desenhava ele — Cabe perfeitamente lá. Pode até virar de lado!

— Eu não vou dormir no armário — ele falou como se encerrasse o assunto — Você cabe lá porque é baixinha. E pare de tentar me explicar as coisas com esses seus desenhos estranhos, eu não entendo nada!

— Não fale mal dos meus desenhos… e não me chame de baixinha! — sem pensar duas vezes, o empurrei contra a cama e comecei a golpeá-lo com minha prancheta de desenhos na cabeça, tórax e qualquer outro lugar que conseguisse alcançar. Estava acostumada com Ichigo falando mal dos meus desenhos. Mas não admito ninguém falando da minha altura! Não tenho culpa se a natureza não foi favorável comigo, oras!

— Para com isso Rukia! Desculpa, tá legal? Sai de cima de mim! — ele tentava se proteger com os braços, sem sucesso. Eu já tinha descarregado minha raiva e estava prestes a me levantar quando ouvi batidas na porta.

— Irmão? Está tudo bem?

— Droga, é a Yuzu — Ichigo resmungou baixinho — Está tudo bem, Yuzu! Não se preocupe, pode ir! — falou mais alto.

— Mas você estava gritando coisas como “sai da minha cama” e “saia de cima de mim” — Yuzu insistiu ainda do outro lado da porta — Tem alguém aí com você?

Agora que ela mencionou eu reparei melhor na posição em que me encontrava e notei que Yuzu tinha razão. Estava tão irritada que mal percebi que havia jogado Ichigo contra a cama e meio que encurralado ele. Estava em cima dele, nossas pernas emboladas. Estava com minha prancheta de desenhos em uma das mãos enquanto a outra estava apoiada no colchão perto de seu ombro.

Espera, no que raios eu estava pensando? Só estávamos assim porque ele implicou comigo. Não tinha nada de mais… apesar de ser uma posição um tanto sugestiva. Ichigo também pareceu notar isso. Estava com os olhos fixos em mim e se remexia inquieto, sem saber como agir.

— Irmão, eu estou preocupada… desculpe, mas vou entrar.

Foi tudo muito rápido. Em um instante eu estava em cima de Ichigo. E no outro ele havia me segurado pelos braços e me escondido dentro do armário no qual eu morava, bem a tempo da irmã dele adentrar o quarto.

— Irmão? Está tudo bem?

— É claro… por que não estaria?

— Mas você parecia estar conversando com alguém… o que é isso?

— Hã… isso é… é um trabalho para a minha aula de artes.

Pelo nervosismo crescente na voz de Ichigo, a irmã caçula dele devia ter encontrado minha prancheta de desenhos. Droga, foi tudo tão rápido que não tive tempo de escondê-la. Havia muitas informações sobre Hollows ali. Eu duvidava que uma humana comum entendesse do que se tratava, mas, se ela suspeitasse eu teria que modificar a memória da garota, mesmo sendo a irmã de Ichigo.

— Foi você quem desenhou isso, irmão?

— Hm… sim, fui eu — ele não parecia nem um pouco feliz por levar os créditos do meu desenho.

— Que incrível! Não sabia que você desenhava tão bem! E esses coelhos são tão fofos… você precisa me ensinar a desenhar um dia!

É por isso que eu gostava daquela menina, ela realmente tinha bom gosto.

Apesar de nunca ter falado com ela.

— Ah, é claro… um dia. Mas eu preciso terminar esse… desenho… então, se me der licença…

— Está bem. Me mostre quando estiver pronto!  — a menina deixou o quarto. Quando ouvi a porta se fechando saltei para fora do armário.

— Está vendo? Tem gente que sabe apreciar uma obra de arte — falei orgulhosa.

— Yuzu é uma criança, ela gosta de qualquer coisa remotamente fofa — Ichigo lembrou — Então isso é um coelho? — perguntou enquanto revirava a prancheta nas mãos.

— Lógico que é um coelho! — Ajeitei a prancheta nas mãos dele, pois estava de cabeça para baixo.

— Esqueci que você gosta de coelhos.

— Deve ser algo trivial para você — na verdade era mesmo. Não fazia diferença saber qual era a cor favorita ou a comida favorita um do outro, isso não era nenhuma prioridade. Mas por algum motivo isso me chateou. Subi na cama dele de novo e dali saltei para a janela.

— Ei, aonde você vai?

— Dar uma volta — o encarei de soslaio — Sabe, tem muitas coisas no mundo dos humanos que eu não sei o que significam porque apenas observo enquanto estou na forma de Shinigami enquanto espero que a presença de um Hollow apareça. E quase todos os dias descubro alguma coisa nova que parece ser normal para você. Está tudo calmo hoje então acho que vou explorar um pouco mais a cidade…

— Nesse caso eu…

—… sozinha — acrescentei e pulei pela janela.

 

 

Aquela foi uma péssima ideia.

Eu passei o dia inteiro fora. Descobri coisas novas como pretendia e até conheci pessoas novas. Mas a noite não terminou como eu esperava. Na verdade eu só sabia que era noite porque estava tudo escuro. Não fazia ideia de que horas eram.

De alguma forma que não me lembro, encontrei a casa de Ichigo e saltei até a janela aberta que eu torcia para ser a do quarto dele. A boa notícia é que era a do quarto dele. A má notícia é que caí em cima dele pela segunda vez naquele dia.

— Ai! O que está fazendo? — ele exclamou enquanto eu me sentava.

— Voltando para casa.

— Saltando pela janela e caindo em cima de mim? — ele ergueu uma sobrancelha enquanto se sentava de frente para mim.

— Preferia que eu entrasse pela porta da frente para que a sua família descobrisse que eu estou morando aqui? — não consegui evitar uma risada.

— Preferia que você fosse morar em outro lugar — ele resmungou — Você não parece muito bem… sua exploração pelo mundo dos humanos não saiu como esperava?

— Na verdade foi ótima! — exclamei — Eu caminhei por lugares que já tinha visto antes, mas dessa vez pude interagir com as pessoas. Passei por uma máquina que tinha vários bichos de pelúcia e um adorável coelho… mas não pude trazer nenhum porque aparentemente eu precisava pagar.

— Isso é óbvio.

— Então continuei andando até um rapaz que eu nunca vi antes me parar na rua — ignorei o comentário dele — Ele começou a dizer o quanto eu era bonita e adorável e me comprou uma coisa chamada sorvete. E isso é delicioso, Ichigo! Por que você nunca me deixou provar isso antes?

— Rukia… você saiu com um estranho para tomar sorvete? — mais uma vez ele não pareceu se importar com a minha indignação — Você entende que ele poderia ter colocado alguma coisa estranha no seu sorvete?

— Estranha?

— É. Tipo veneno ou remédio para de dopar e fazer sabe-se lá o que com você… céus, não acredito que você foi ingênua a esse ponto!

— Então humanos são mesmo cruéis assim? — balancei o corpo para frente e para trás, em parte por estar pensando sobre isso, em parte porque estava começando a perder o equilíbrio — Não sou burra, Ichigo. Vi que ele me olhava de um jeito esquisito quando terminei de comer. Eu disse que precisava ir embora e ele me seguiu, mas não me encontrou quando dobrei a esquina. Humanos comuns não podem saltar pelo teto dos prédios afinal — dei de ombros — E, mesmo se tivesse algo estranho no tal sorvete como você diz, eu teria simplesmente espancado o cara e me livrado desse gigai.

— É bem a sua cara — ele comentou — Sabe, existe uma linha tênue entre a ingenuidade e a burrice. E você parece estar bem no meio dela.

— Como é?

— Ah, nada não… bom, talvez tenha sido você quem se aproveitou dele para tomar sorvete de graça no fim das contas.

— Não acredito que está colocando a culpa em mim! — exclamei ofendida. E então estreitei os olhos — Ichigo!

— Ai! O que foi?

— Os homens humanos são muito cruéis. E aproveitadores. Vou embora daqui e você nunca mais vai me ver… — comecei a levantar mais ele segurou meu braço.

— Do que está falando? Você não pode ir embora, está em missão aqui, certo?

— Ah, é — sentei-me novamente. Minha cabeça estava uma bagunça, eu não conseguia raciocinar direito. Encarei Ichigo quando ele soltou meu braço e estreitei os olhos novamente — Você também é um homem humano.

— Que bom que notou.

— Você é como os outros humanos? Um aproveitador? Ah céus, você fez alguma coisa comigo enquanto eu dormia? — envolvi meu corpo com os braços, sem saber muito bem porque estava agindo assim. Eu conhecia Ichigo há tempo suficiente para saber que ele não era esse tipo de pessoa. Mas meus pensamentos estavam tão embaralhados que nada parecia fazer muito sentido.

— Como é? Se eu quisesse me aproveitar de você já teria feito isso há muito tempo, você está morando aqui há meses, sua idiota! — ele exclamou. Parecia envergonhado e ofendido ao mesmo tempo. A parte da minha cabeça que ainda funcionava estava certa, ele não era esse tipo de pessoa — Qual é o seu problema? Bateu a cabeça durante a sua exploração por acaso?

— Não. Mas eu encontrei um Hollow. Ele me deu bastante trabalho então acabou me deixando de mau-humor. Eu pretendia voltar para casa depois disso, mas passei por um lugar que lembrava muito um restaurante da Soul Society, então decidi parar lá… mas não tinha comida. Só bebida.

— Só bebida…? Rukia, você foi a um bar?

— Eu disse que parecia um restaurante.

— Restaurantes não servem só bebida — Ichigo informou. Como eu poderia saber disso? — É por isso que está agindo desse jeito estranho? Você está bêbada?

— Claro que não! — falei mais alto do que pretendia — Digo, talvez. Eu não sei.

— Você está bêbada — Ichigo concluiu.

— Mas o dono do lugar me garantiu que aquilo não era sakê — recordei — Embora o cheiro fosse parecido.

— O que você bebeu?

— Cerveja.

— Isso também é álcool, Rukia! — Ichigo passou a mão pelos cabelos.

— Como eu poderia saber? Existem vários tipos de sakê na Soul Society, mas cerveja não… você nunca me disse que isso era álcool. Além do mais… — solucei — Não estou me sentindo bem.

— Estou vendo. Quanto você bebeu?

— Um copo.

— Um copo e ficou assim? — ele exclamou pasmo.

— Na verdade eu já tinha provado sakê antes, mas parece que sou fraca para álcool — recordei da ocasião enquanto sentia meus olhos começarem a se fechar. Aquilo devia mesmo me deixar com sono? — Mas como o dono do lugar disse que não era sakê eu achei que não teria problema… então…

— Então é melhor você ir dormir — Ichigo completou a frase. Não era isso que eu ia dizer, mas acenei a cabeça, concordando. Consegui me levantar e caminhar até o armário. Depois tudo ficou escuro.

 

 

Acordei em um lugar mais amplo. Familiar, e ao mesmo tempo estranho para mim. Me sentei e vi Ichigo de pé ao lado da cama que pertencia a ele.

— Finalmente acordou. Se sente melhor?

— Sim — passei a mão pelos cabelos bagunçados — Por que estou na sua cama?

— Você apagou ontem. Achei que seria bom te deixar usar a cama, para variar.

— Então você realmente dormiu no armário? — perguntei pasma.

— Claro que não! Já disse que não caibo lá — ele exclamou — Anda, aproveite que não tem ninguém em casa, tome um banho e vá se trocar.

— Me trocar para que?

— Você queria saber mais sobre os costumes humanos, não é? Bom, vou te levar para dar uma volta pela cidade — ele sorriu antes de deixar o quarto.

 

 

Cerca de uma hora depois tínhamos trocado de roupa e tomado café da manhã. Agora caminhávamos pela cidade, por ruas que eu só tinha visto do alto dos prédios.

— Aqui é o Aquário — Ichigo apontou para um prédio enorme — Como diz o nome, tem uma grande variedade de peixes. Quer ir?

— Não sei… a gente comeu peixe no café da manhã.

— Não é para comer, é para observar! — ele exclamou, para minha surpresa — Têm vários tipos de peixes, mas é pra gente admirar.

— Vocês observam peixes? — franzi a testa — Que estranho.

— Não é estranho… ah, deixa pra lá. Vamos andando — Ichigo continuou caminhando e eu o segui — Está quase na hora do almoço. Quer comer alguma coisa?

— Algo que eu ainda não tenha provado — deixei bem claro. Já que ele tinha acordado de bom-humor hoje eu precisava aproveitar.

— Nesse caso é melhor irmos até uma lanchonete. Acho que tinha uma por aqui.

Caminhamos mais dois quarteirões e chegamos à tal lanchonete. Era um lugar pequeno, porém bem organizado, com um cardápio simples.

— Vou comer hambúrguer e refrigerante  — Ichigo escolheu rápido — E você?

— Deixe-me ver — passei os olhos pelo cardápio. Precisava aproveitar a eutimia de Ichigo em me deixar escolher o que fazer — Eu já provei vários tipos de chás e aquele suco em caixinha que você me deu uma vez…

— Que você não conseguiu abrir sozinha, por sinal.

— Acho que nunca provei esse refrigerante — ignorei o comentário dele — Quero um também. E… eu já provei hambúrguer, sorvete, e… cachorro-quente?

— Vai querer isso?

— Vocês comem cachorros? — perguntei abismada. Eu sabia que os alimentos dos humanos eram bastante diferentes dos nossos, mas não pensei que chegassem ao ponto de comer cachorros! — Não acredito nisso! Como se atrevem a devorar criaturas tão adoráveis?

— Acalme-se Rukia! As pessoas estão olhando — Ichigo sussurrou nervoso. De fato, as pessoas das outras mesas começavam a olhar para nós e cochichar alguma coisa — Não é um cachorro de verdade, é só o nome do lanche. Porque o formato parece o de um cachorro.

— Você jura? — perguntei ainda desconfiada.

— Juro. Pode provar um para ter certeza.

Instantes depois uma jovem mulher usando avental aproximou-se da nossa mesa.

— Vocês são um casal bastante animado, hein — ela sorriu — Já decidiram o que vão pedir?

— Não somos um casal! — exclamei. Ichigo acabou falando a mesma coisa junto comigo.

— É claro — por alguma razão ela alargou o sorriso — Enfim, já se decidiram?

— Dois refrigerantes, um hambúrguer e um cachorro-quente — Ichigo falou enquanto ela anotava tudo em um bloco de papel.

A mulher afastou-se, nos deixando em um silêncio constrangedor. Céus, por que ela tinha que dizer aquilo? Nós sequer parecíamos um casal! Éramos muito diferentes um do outro.

Mas ainda assim nos dávamos muito bem. Uma pequena parte de mim parecia desejar que aquela garçonete estivesse certa. Droga, o que está acontecendo comigo?

Antes que meus pensamentos continuassem tomando um rumo que não devia a garçonete retornou com nossos lanches.

— Por que ela achou que éramos um casal? — acabei perguntando depois que a mulher afastou-se.

— Atendentes são assim mesmo, não podem ver um garoto e uma garota a sós que já pensam que são um casal. Não se importe com isso — Ichigo deu de ombros, embora ele mesmo parecesse se importar. Apenas assenti e decidi me concentrar no lanche.

— Como se abre isso? — revirei a lata inutilmente entre as mãos.

— Para com isso, desse jeito vai espirrar tudo em você — Ichigo tomou a lata das minhas mãos, abriu e me devolveu. Parecia ser um mecanismo bastante difícil.

Não gostei muito do sabor do refrigerante. Suco em caixa era melhor. E tinha que admitir que o formato daquele lanche lembrava vagamente um cachorro, mas eu estava feliz por não se tratar de um.

Estava tudo muito bem até a hora em que a garçonete retornou para recolher os pratos antes de irmos embora.

— Por favor, voltem sempre! E aproveitem seu encontro.

— Já disse que isso não é um encontro! — Ichigo exclamou, e eu não sabia se ele estava irritado ou envergonhado. Ele me arrastou para fora do estabelecimento e só soltou meu braço quando chegamos ao fim da rua.

Não era um encontro, eu sabia disso. Mas ainda assim eu começava a desejar que fosse. Eu sabia muito bem o que era aquilo e não podia acreditar que estava acontecendo. Não com ele.

— Francamente, por que todo mundo fica dizendo isso? — ele ainda resmungava durante o caminho.

— Ichigo… isso é um encontro? — acabei perguntando. Eu tinha uma vaga noção sobre como funcionava os encontros para os humanos. Não era muito diferente para nós, exceto que muitas daquelas coisas não existiam na Soul Society. E tudo o que fizemos até agora se encaixava no que eu sabia sobre o assunto.

— O que? — ele arregalou os olhos — Por que está perguntando isso? Não é a primeira vez que saímos só nós dois…

— Nós geralmente saímos para caçar Hollows ou ir para a escola juntos — eu lembrei — Nunca saímos assim, apenas para passear pela cidade.

— Você quer que isso seja um encontro? — ele perguntou. Não parecia desconfortável nem constrangido, apenas curioso.

— Eu… bem… — desviei os olhos, sem saber o que responder. Não podia simplesmente dizer a ele uma coisa que acabei de perceber, eu sequer tinha processado aquela informação! Precisava mudar de assunto. Girei os olhos para o outro lado e me deparei com algo que me chamou atenção no dia anterior — Ichigo, olha! Foi disso que eu te falei ontem! — corri até o outro lado da rua — A máquina com o coelho de pelúcia.

— Ah… essa é a máquina da garra — ele se juntou a mim. Parecia ter se esquecido completamente do assunto anterior — Desista, é impossível ganhar esse jogo.

— Por quê?

— Bem, você precisa usar a garra para pegar um bicho de pelúcia movendo a alavanca. E usando os botões para abrir e fechar — ele explicou — Mas existe um tempo limite. Mesmo se você conseguir pegar algum bichinho, o tempo sempre acaba antes de você conseguir colocar o prêmio no tubo. Esse jogo é a maior trapaça.

— Bem, eu vou tentar assim mesmo — comecei a apertar os botões — Não está funcionando.

— Você precisa colocar uma moeda.

— Você tem uma moeda?

— Só uma tentativa, ouviu? — Ichigo suspirou e inseriu a moeda na máquina, que acendeu algumas luzes.

Eu não sabia quanto tempo tinha então parti para meu objetivo principal, o coelho. Apertava os botões aleatoriamente, mas, uma vez que consegui segurá-lo, ficou fácil. Ele caiu pelo tal tubo, mas como as luzes da máquina ainda estavam acesas eu concluí que meu tempo ainda não tinha acabado. Consegui pegar um cachorro e um urso antes que a garra parasse de se mover.

— Como você fez isso? — Ichigo perguntou abismado — Eu nem vi as suas mãos se mexendo.

— É fácil para alguém com a minha velocidade — não consegui conter um sorriso convencido — Você também deve conseguir, agora que possui a velocidade de um Shinigami.

— Ei, vocês dois! — o dono do estabelecimento apareceu enraivecido — O que pensam que estão fazendo? Pegando todos os prêmios da minha máquina?!

— Pare com essa azoada. Minha amiga conseguiu os prêmios de forma honesta. Pode conferir as câmeras de segurança se quiser — Ichigo rebateu — Agora, se puder nos arranjar uma sacola, eu ficaria grato. Temos muitos prêmios para carregar, sabe.

“Amiga”. Era assim que Ichigo olhava para mim. Bom, eu nunca pensei em uma definição exata para a nossa relação, na verdade. Eu era a responsável por transformá-lo em Shinigami, mas… era só isso? Bem, considerando que éramos amigos agora, acho que isso podia ser considerado uma evolução no nosso relacionamento.

Mas eu não queria ser amiga dele. Não mais. O que eu realmente queria…

Céus, por que tinha que ser com ele?

Continuamos caminhando depois que o dono do estabelecimento colocou os bonecos de pelúcia em uma sacola, bastante zangado. Peguei o coelho que tanto queria e o abracei.

— Aqui. Leve para suas irmãs — entreguei a sacola com os outros bonecos para Ichigo — Yuzu gosta de cachorros, certo? Eu não sei do que a Karin gosta…

— Tem certeza? Você ganhou os três.

— Eu só queria o coelho.

— Valeu — ele aceitou a sacola — Elas vão adorar. Bom, pelo menos a Yuzu eu sei que vai.

O sorriso dele pareceu aquecer meu coração. Será que eu devia contar isso a ele? Talvez eu devesse contar… não fazia sentido ficar sentindo essa angústia e sofrer calada.

— Ichigo — chamei, tomada por uma súbita coragem — Preciso te dizer uma coisa.

— O que foi?

— Tem um Hollow perto daqui — falei quando meu denreishinki começou a apitar.

Tudo bem, eu não preciso dizer isso agora.

— Droga, justo hoje que eu não trouxe o Kon — Ichigo praguejou.

— Sem problemas. Eu dou um jeito nisso.

A alma de Ichigo literalmente voou para fora de seu corpo quando o soquei usando minha luva.

— Eu odeio quando você faz isso — ele esfregou a bochecha.

— Não podemos perder tempo.

Deixei Chappy assumir o controle do meu gigai e pedi para que ela tomasse conta do corpo de Ichigo. Corremos apenas por um quarteirão e avistamos o Hollow. Esguio, com uma cauda longa e uma cabeça grande demais para o corpo.

Ichigo foi na frente. Parecia querer acabar logo com isso, mas esse Hollow era particularmente rápido. Ichigo acertou os braços e a ponta da cauda, mas não conseguia destruí-lo por completo. Enfurecido, o Hollow contra-atacou. Ichigo sequer tinha aterrissado no chão depois de seu último ataque, não conseguiria desviar.

Não pensei no que estava fazendo. Em um instante estava assistindo Ichigo desmembrar o Hollow aos poucos e no instante seguinte eu sentia os dentes afiados dele enterrados em meu ombro, o sangue quente escorrendo pelo meu braço.

— Rukia! — ele gritou meu nome — Essa não… Rukia, saia daí!

— Seu idiota… já lhe disse que para matar um Hollow você precisa acertar a cabeça, não disse? — eu lembrei. Recuei alguns passos e, ignorando a dor pungente em meu ombro, apunhalei a cabeça dele usando o outro braço.

Destruímos o Hollow, mas eu não estava muito contente. A dor no meu ombro tinha aumentado e ele não parava de sangrar.

— Rukia, o seu ombro… — Ichigo se aproximou de mim — Sinto muito. Você fez isso para que eu não me machucasse…

— Ei, não se preocupe. Isso acontece em batalhas — forcei um sorriso — Não posso te transformar em Shinigami Substituto de novo para resolver essa situação, então preciso que vá buscar a Chappy. Tem um kit de primeiros-socorros na bolsa que deixei com ela.

— Muito engraçado — ele riu — Eu já volto.

Ichigo correu na direção de onde viemos. Voltou minutos depois, ainda na forma de Shinigami, com Chappy carregando o corpo dele, o que era uma visão muito estranha.

— Deixa que eu cuido disso — Ichigo ofereceu.

— Não precisa. A Chappy pode…

— Rukia — ele chamou mais sério — Você entrou na frente daquele Hollow para me proteger. O mínimo que posso fazer é cuidar do seu ferimento.

— Está bem — suspirei derrotada. Abaixei parte do kimono, expondo o ferimento no ombro e parte do braço. Ainda o segurava com o braço bom para que ele não visse mais do que o necessário.

Ichigo limpou o ferimento, um pouco desajeitado, pois havia muito sangue. Passou o remédio que eu indiquei e enfaixou meu ombro.

— Acha que deve demorar muito para você melhorar?

— Não se preocupe. O ferimento não foi tão profundo quanto parece. Eu devo estar melhor amanhã — respondi. Era mentira, mas não queria preocupá-lo — E você? Se machucou?

— Ah, eu estou bem.

— Mesmo? E esse corte no seu rosto? — reparei na bochecha dele, que sangrava.

— Ah, isso? — ele limpou o sangue com as costas da mão — Foi só um arranhão. Perto do seu machucado…

— Não seja imprudente, você precisa cuidar disso — interrompi — Você não quer ficar com uma cicatriz no rosto, ou quer?

— Claro que não!

— Então me deixe cuidar disso — peguei uma pomada e comecei a passar pelo machucado. Droga, ele bem que podia ter se sentado. Por que Ichigo tinha que ser tão alto? Ou eu que era muito baixa?

Já tinha passado o remédio, mas meus dedos continuavam deslizando pelo rosto dele. Eu não podia dizer isso para Ichigo… aos olhos dele eu provavelmente parecia uma criança, mesmo sendo mais velha do que ele. Minha aparência não ajuda em nada e eu nem sei como relacionamentos amorosos entre os humanos funcionam. E o mais importante, ele mesmo disse que sou uma “amiga”. É melhor desistir dessa ideia idiota.

 — Rukia? Está tudo bem? — ele me despertou para a realidade.

— Tudo ótimo. Agora coloque um curativo para manter o remédio aí — coloquei um band-aind no rosto dele, talvez um pouco forte demais.

— Ai! Isso dói!

— Pare de reclamar e vamos logo. Depois disso tudo eu quero ir para casa — falei enquanto reassumia o controle do meu gigai.

— Espera Rukia. — Ichigo pediu após retornar para o próprio corpo — Tem uma coisa que eu quero fazer antes.

 Caminhamos por dois quarteirões até pararmos em uma pequena sorveteria. Ichigo comprou um sorvete de morango. Eu não conhecia nenhum sabor então escolhi um cuja aparência me agradou mais.

— Esse sorvete é de quê? — perguntei após provar.

— Tangerina — Ichigo informou — Achei estranho você escolher esse. Quase ninguém gosta desse sabor.

— Ele é bom — comentei, provando o sorvete de novo. Tinha quase a mesma cor que os cabelos de Ichigo, era apenas um pouco mais claro — Onde vamos agora?

— Para casa. Estou cansado e minhas irmãs devem estar preocupadas. Além do mais você precisa repousar para que esse machucado melhore logo.

— Já disse que estou bem — repeti — Então o passeio já acabou?

— Tem muita coisa na cidade, não dá para ver tudo em um só dia — Ichigo comentou — Tem o zoológico, o parque de diversões… e em breve teremos o Festival Cultural na escola.

— O que é isso?

— Você vai ver quando chegar. Não quero estragar a surpresa — Ichigo sorriu misterioso.

— Não gosto quando você sorri assim. Parece que está aprontando alguma coisa — reclamei — Então, de todas essas coisas que você falou, decidiu escolher me levar para tomar sorvete?

— Qual é o problema? Você pode tomar sorvete com caras estranhos, mas não quer ir comigo?

— Ichigo… você está com ciúmes? — perguntei, em parte por implicância, em parte por não conseguir acreditar naquela possibilidade.

— Claro que não! Por que eu teria ciúmes de você? — ele negou, mas seu rosto começou a corar.

— Sei… se não está com ciúmes então por que seu rosto está vermelho?

— Não está nada! — ele replicou, entre irritado e constrangido — Sua idiota, se já consegue fazer piadinhas então seu ferimento já deve ter melhorado — ele tentou mudar de assunto.

— Eu disse que não tinha sido nada grave.

Continuamos nosso caminho até em casa enquanto ele me contava mais coisas sobre o mundo dos humanos das quais eu nunca tinha ouvido falar. Mas na verdade não estava prestando muita atenção.

Ele se preocupava comigo e, por mais que tentasse negar, sentia ciúmes de mim. Talvez eu não precisasse desistir tão facilmente do meu sentimento recém-descoberto afinal. Mas ainda era cedo para pensar nisso. Precisava colocar meus pensamentos, e principalmente o meu coração em ordem.

Talvez um dia eu contasse isso a ele.

 


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