Os murmúrios curiosos logo assumiram a sala enquanto a dupla se dirigia na direção da saída, Hito pedindo por seu silêncio pouco depois para iniciar as aulas. A breve ida, pedindo informações da sala do diretor pelo caminho, parecia, ao menos para Oliver, a última caminhada de Jesus. A cruz seria a louca ao seu lado. Não sabia o que o Shinigami-sama faria, mas para ter este nome, a arma só conseguia pensar no pior.

De frente à porta que levaria a “Death Room”, o desespero de Oliver aumentara ao ver o corredor de guilhotinas em sua frente. Erin via bem o estado de seu parceiro quase beirando um ataque de pânico, estendendo-o a mão como se dissesse “vamos passar por isso juntos, relaxe um pouco”. Como resposta, ela tomou um tapa leve atrás da cabeça. Mas ainda assim, Oliver a segurou e adentraram juntos a sala, Oliver temendo o pior, Erin pronta para defender o parceiro (se possível).

Não dera nem dois minutos, e chegaram ao centro da Death Room. Em frente ao enorme espelho, estava uma figura estranhamente humana coberta por um manto preto e com uma máscara de caveira de três pontas adornando os cabelos igualmente negros, porém com três faixas brancas o circulando. Ao notar a presença dos alunos, o Shinigami-sama, conhecido como “Death The Kid” pela atual geração de professores, os encara com os olhos tão dourados quanto os da garota em sua frente. Oliver engole seco, aproximando-se junto a sua parceira.

—Creio que não precise explicar porque estão aqui, correto? – Oliver abaixa a cabeça, sentindo-se culpado por ter sido enganado tão facilmente por Erin. – Meu pai dividiu esta escola como “EAT” e “NOT” por um motivo, e vocês ainda não estavam prontos para isso.

—Mas...

—Basta ver seu estado para comprovar o que quero dizer, Erin. Um EAT experiente não se machucaria tanto em uma missão simples, vocês poderiam ter perdido a vida nesse combate. O mesmo vale para você, Oliver. Como que aceitou isso, visto que, pelo que recebi dos professores, você ainda não consegue se transformar completamente?

—Eu... – Oliver foi interrompido pelo braço de Erin em sua frente.

—Oliver não tem nada a ver com isso. Ele só soube que era uma missão roubada quando já estávamos longe. E se estou viva, é por causa dele! Tudo isso foi para que Oliver conseguisse se transformar, e ele conseguiu. Então eu vou assumir a punição dele também, deixe ele fora disso. – Mesmo admirado pela coragem da garota, a arma considerou quase suicídio falar desta forma com o provavelmente mais poderoso ser daquele país, se não do mundo.

—Você absorveu a alma? – Oliver nega, deixando Erin levemente emburrada, tirando-a da bolsa da garota e estendendo na direção do deus, Kid a segurando um pouco menos preocupado. – Como já conheço o histórico de sua parceira, graças a alguns poucos relatórios dos professores, apenas confiscarei essa alma como sua punição. Então pode ficar mais tranquilo e voltar para a sala. Ainda gostaria de falar mais um pouco com Erin.

—Por que, Shinigami-sama? Não posso ficar com minha parceira?

—Não, você pode, mas não seria bom perder mais de suas aulas durante os primeiros meses, com uma prova chegando. – Kid ri leve. – Mas gostaria de ouvir o relatório da missão, por mais que tenha sido roubada. E também decidir que tipo de punição ela vai receber a partir disso.

—Fica tranquilo Oliver. Não é porque ele tem morte no nome que vai me matar. – Erin ri acompanhada do deus ao seu lado. Oliver estava receoso, mas por insistência do Shinigami-sama, ele retorna, desejando mentalmente sorte para sua parceira.

******

Não muito tempo depois de Oliver a adentrar, Erin retorna para a sala, os cochichos voltando a preencher o silêncio criado por Hito, a maioria deles se perguntando como que ela ainda não fora suspensa ou expulsa, perguntando-se como realmente seria o Shinigami-sama. Os Star e Nathan claramente ignoravam aqueles burburinhos, o conheciam antes mesmo de pisarem naquela escola, em especial o rosado por motivos óbvios. Já imaginavam que Erin não seria tão severamente punida, mas a falta de expressão no rosto dela provou que havia sido um golpe muito forte para ela. Esperariam o intervalo para perguntar o que houve e, claro, tentar animá-la.

O que logo veio, após um breve resumo de Hito sobre as próximas aulas de estudo de almas. A albina ia quase se arrastando, Oliver diminuindo o passo para ficar ao seu lado, o trio Star acompanhado mais a frente. Já no refeitório, encontraram novamente Masamune, Mason e Kise (agora acompanhado de Illyia), o albino animado acenando e chamando pelos demais para se sentarem com eles. Seu parceiro rosado quase estava saindo, mas foi segurado por sua arma. Ao sentar, a garota deixa a cabeça cair com tudo na mesa, aquilo com certeza resultaria em um galo após alguns minutos, mas ela não se importava no momento.

—Erin... o que houve na Death Room...? – Oliver a pergunta sem jeito, fazendo o trio da EAT arregalar os olhos enquanto Illyia soltava uma curta risada pelo estado da “baixote irritante”.

—Erin foi chamada pelo Shinigami-sama?! – O mesmo trio completa a fala de Oliver, ele explicando depois tudo o que aconteceu até onde sabia. Desde ele ser arrastado para um “trabalho” até sua saída da sala do diretor, onde apenas eles conversaram.

—Whoa, Rinrin corajosa. – Oliver sorri, Kise estava se confundindo bem menos entre o japonês e o inglês. Enfim poderia entender melhor o que ele fala. – Ainda bem que o Orii não foi punido sem ter culpa... se bem que uma tamashii a menos é um golpe duro também... ore to Ririi não chegamos nem na metade permitida...

—“Metade permitida”...?

—Ah é, vocês são novos na cidade. – Mason continua, tomando um pouco de suco enquanto os encaravam. – Já aprenderam que, antes da guerra, a missão da Shibusen era a proteção do mundo e a forja de deathscythes, ne? – Oliver acena em concordância. – Com a paz entre as bruxas, a criação de uma nova deathscythe foi proibida, então temos um limite de almas para absorver na classe EAT.

—Então vocês já comeram aquela coisa...?

—Sim. Eu e Masa já conseguimos trinta e nove, Kise e Illyia estão na vigésima. Tem gosto de nada e parece gelatina quando você engole, então não precisa ter medo. Mas voltando... a cada alma absorvida, você fica um pouco mais forte. E por isso, devemos parar na nonagésima nona alma. Ao absorver qualquer outra se não a correta, todas as outras se tornam inválidas e temos que recomeçar.

—A correta...? N-Não seria...

—Uma alma de bruxa. – Erin e Ártemis dizem juntas, Erin entediada e ainda chateada, Ártemis entristecida por suas antepassadas.

—Exato. E por isso são proibidas. Se continuassem sendo permitidas, mesmo que tenhamos inimigas bruxas, poderiam voltar a matar bruxas inocentes apenas para a forja de Deathscythes, e isso é algo que o Shinigami-sama não deseja. Toda alma de bruxa conseguida pela Shibusen é entregue ao Shinigami-sama, e ele repassa aos membros responsáveis pelas pesquisas para uma forma artificial de forja de deathscythe.

—Em resumo, vocês tem um limite. – Masamune continua. – Após isso, as almas são entregues ao Shinigami-sama, assim como fez com a que conseguiram. Mas, enfim, o que aconteceu com essa garota para ela parecer um zumbi?

—O Shinigami-sama me suspendeu das aulas práticas por duas semanas e terei que trabalhar no arquivo de missões da Shibusen no mesmo período.

Um breve período de silêncio se estabeleceu naquela mesa.

—SÓ ISSO?!

—Como assim, só isso?! Finalmente, depois de semanas, Oliver pode assumir a forma completa e eu estou de fora! Isso é quase tortura! E ele ainda disse que se eu arrumar brigas nos corredores nesse período, ele irá adicionar mais uma semana! Eu acabei de sair de duas semanas engessada e agora vou ter que passar mais duas sem fazer nada!

—Mais duas semanas de paz... – Oliver estava nas nuvens.

—Mais duas semanas de tédio... – Enquanto Erin desejava desesperadamente uma máquina do tempo. – Tenho que me apresentar depois das aulas, então não vou pra casa tão cedo nos próximos dias.

—Se quiser que eu te busque mais tarde, só me ligar, ok? – Oliver agrada um pouco os cabelos albinos da garota, animando-a minimamente.

—Nee, ore mo, Orii! – O moreno encara Masamune, como se pedisse por uma tradução, o moreno mais velho rindo.

—Ele também quer. – E com isso, a foice passou os últimos minutos do intervalo agradando ambos os albinos, artesã e arma.

******

—Com licença...

Como prometido, a garota adentrara a sala de despacho de missões após as aulas, mesmo não obtendo resposta. Achou que seria melhor esperar dentro que encostada do lado de fora. A sala estava um pouco bagunçada, fazia sentido precisarem de ajuda nesta área. A classe EAT cresceu muito em poucos anos, mas ainda não houve um aumento de pessoal para supervisionar missões para tantos alunos. Encarou um relógio na parede, quinze minutos e nada de alguém aparecer. Então, ao menos enquanto não a informavam nada, resolveu começar juntando os papéis que estavam espalhados no chão.

Com a chegada da senhora responsável pelas missões, a albina se troca rapidamente para o uniforme necessário e senta-se em uma pequena mesa atolada de papéis, a senhora a dizendo para carimbar o máximo possível e organizar em uma caixa ao lado como uma, duas ou três estrelas. Era um trabalho simples, mas demorado. E a garota agradeceu por isso, não saberia o que fazer se fosse algo muito difícil, começando a carimbar e guardar na caixa, como a fora indicado. Como os papéis estavam se misturando na pilha, a garota arrancou as abas e fez divisórias improvisadas, facilitando  seu trabalho e deixando a “Tia das Missões” surpresa pela solução simples encontrada por ela. Alguns antigos ajudantes já chegaram até mesmo a pedir caixas extras.

O dia acabara rápido, e foram se passando lentamente até seu último naquele trabalho cansativo. Ainda faltavam algumas pilhas de papéis, mas Erin estava decidida a acabar com todos! Mesmo a Tia a dizendo que teriam que sair mais cedo naquele dia. A albina parecia estar a todo vapor, já era a segunda caixa que enchia naquele dia (embora a primeira já estivesse na metade) quando sua mão parou por um instante. Não haviam indicações de estrelas naquela missão. A Tia a pedira para não ler o conteúdo das missões, então foi diretamente até ela para perguntar onde colocaria esta, visto que não possuía indicação alguma.

—Ah, esta... deixe separada, naquela mesa. – A Tia aponta para uma terceira, próxima a uma janela e entre as estantes cheias com caixas semelhantes às que Erin enchia. – Irei falar com o Shinigami-sama depois sobre ela. Traz problemas desde antes dele assumir o lugar do pai. Já deveria ser descartada a muito tempo.

—Uh... certo... – E assim o fez, mas seus olhos insistiam em ler seu conteúdo, devido à resposta que recebera.

“Urgência na procura de civis, artesãos e armas desaparecidos na Romênia
Cidade de Cluj-Napoca relata inúmeros casos antigos de desaparecidos, outros artesãos e armas que investigam tendo o mesmo fim. Especula-se que seja trabalho de bruxas da ReBirth, porém ainda não foram encontradas provas o suficiente para tal acusação. O principal objetivo é...”

Recusou-se a continuar lendo, tremendo de nervosismo ainda parada próxima a mesa. Não deveria fazer isso, principalmente por estar sendo punida por ter feito exatamente o que se passou por sua cabeça, mas já era tarde demais para impedir suas mãos adentrando o colete do uniforme, o papel agora dentro. E então, voltou a carimbar as folhas, como se nada tivesse acontecido.

Com o final do dia, Erin havia completado seu objetivo e terminado todos os papéis que a Tia havia pedido para que ela carimbasse e classificasse, estufando o peito orgulhosa enquanto mostrava a mesa limpa para a senhora que havia passado as últimas duas semanas ao seu lado. Com um breve agrado, a Tia libera a artesã para voltar pra casa e se preparar para mais tarde, Erin acenando e dizendo que traria o uniforme lavado no dia seguinte. Com a partida da garota, a senhora vai para a mesa entre as estantes, não encontrando o papel que havia pedido para ela por lá, seu olhar indo dela para a janela aberta com uma leve brisa entrando.

—Deve ter voado para fora... bem... então falarei com o Shinigami-sama após a festa de fundação. Procurarei Erin na festa também para agradecer de novo por toda a ajuda.

Erin desabou em sua cama assim que chegou e só saiu de lá no dia seguinte.