Mesmo que Arisu quisesse manter distância de Haruka, não foi bem assim que as coisas aconteceram.

Depois daquela conversa no terraço, o sempai o seguia pela escola durante os intervalos, depois das aulas, e no clube de jardinagem. Todo dia no horário do almoço aparecia na sala do mais novo e o arrastava para comer com ele. Isso deixava as garotas enlouquecidas.

Arisu aprendeu um pouco como lidar com aquele homem imprevisível. Primeiro, ele flertava com qualquer um que aos seus olhos parecesse comestível. Então não era muito seguro andar perto dele com um botão sequer do uniforme aberto.

Segundo, Haruka era um dos caras mais populares da escola. Não podia deixar as meninas vê-los juntos por muito tempo, senão ele corria o risco de encontrar cartas de ameaça no seu armário. Isso se provou ser um enorme problema, afinal o mais velho não desgrudava dele o dia inteiro, e tinha o hábito de passar sua mão pela sua cintura quando pensava que ninguém estava olhando.

Terceiro, ele nunca estava de mal humor. Ria o tempo todo, tirava sarro de toda e qualquer situação. Por um lado isso era bom, Arisu não se preocupava muito em conseguir se animar quando estava meio chateado. Mas às vezez se tornava irritante. A melhor opção era não dar oportunidades para ele encontrar algum assunto que rendesse uma tarde inteira de piadinhas de mau gosto.

― Clube de karatê?

Arisu estava cuidando da horta, cortando as ervas daninhas com muito cuidado e capricho, enquanto Haruka estava sentado no mesmo banco de madeira daquele fatídico dia.

― Isso. Eu sou o capitão. ― Respondeu Haruka com seu ânimo de sempre.

― Eeeh? Karatê, heim? ― Falou mudando de canteiro. ― Deve fazer o maior sucesso entre as garotas. Talvez eu devesse tentar.

― Eles vão te massacrar.

Porque ele tinha que ser sempre tão realista?!

― Não enche, sempai...

― Mas parece que você é muito bom no que faz. ― Ele apontava para a horta.

Arisu terminou o que estava fazendo e começou a recolher os materiais de jardinagem.

― Isso? Não é grande coisa. ― Falava enquanto colocava as coisas num saco. ― Cuidar de plantas não é difícil. Só precisa de esforço e paciência. Mas quer saber? Eu realmente gosto disso. ― Ele abriu um sorriso simpático.

Haruka riu levantando-se, e pôs a mão na cabeça do mais novo bagunçando seu cabelo.

― Ei...! Sempai!

― Você é mesmo uma gracinha sabia?

― Sai fora... ― Resmungou Arisu aborrecido.

― Arisu-kun!

Era uma das garotas do clube de jardinagem que o chamava. Ela estava do outro lado da horta, e fazia um sinal para ele trazer o saco com fertilizantes.

― Já vou!

O clube de jardinagem tinha quatro integrantes contando com Arisu. Duas garotas no segundo ano e um menino do terceiro. A menina que o chamava era Sato Junko. Bem humorada e inteligente, era a vice presidente do clube. Tinha o cabelo castanho escuro muito comprido, sempre preso num rabo de cavalo durante as atividades, e era bem mais alta que Arisu.

A outra menina se chamava Ikeda Kaede. Arisu achava que ela era a menina mais gentil do mundo. Tinha um corte de cabelo curtinho e com as pontas sempre perfeitamente retas, sem um fio sequer fora do lugar, o que lhe dava mais ainda aquele ar de graciosidade e delicadeza. Era a melhor amiga de Junko, que por sinal era tão super protetora com a menina que os outros poderiam até confundi-las com um casal.

― Traga também aquelas pás! ― Falou Junko apontando os objetos encostados numa árvore.

― Certo!

Arisu se afastou, enquanto o quarto integrante do clube se aproximava de Haruka.

― Haruka-san, aqui no clube de jardinagem novamente? ― Perguntou Kenji.

Murakami Kenji, terceiro ano, estudava desde pequeno na mesma sala que Haruka. Os dois nunca foram realmente amigos, mas se davam bem. Normalmente nos festivais escolares eram os dois que organizavam a turma, portanto já estava habituados um com o outro.

― Só estou dando uma passadinha. ― Falou Haruka abrindo mais o sorriso.

― Você tem vindo muito aqui ultimamente. Não quer se juntar ao nosso clube? ― Kenji perguntou, mas na verdade já sabia realmente a resposta.

― Não, eu passo. Acabaria destruindo tudo que vocês fizeram.

― É, tem razão.

― Ei... Não era pra concordar... ― Reclamou Haruka o olhando de lado.

Kenji era o único que conseguia falar de igual para igual com Haruka. Os dois tinham a mesma altura, e o mesmo porte físico, mas enquanto Haruka tinha aquele cabelo loiro macio e fino, o colega possuia fios pretos cortados bem curtinhos, e com pouco brilho. Difícil decidir qual dos dois parecia mais deslumbrante.

― Mas e o pessoal do seu clube? ― Continuou Kenji ― Você é o capitão, não? Não tem problema ficar vadiando por ai?

 ― Hã? Eu vou lá no clube todos os dias. Só não passo a tarde inteira com eles. Não que faça diferença, eu sempre fui assim. Além disso, eles me idolatram.

― Sua modéstia é tocante.

― Hehe.

Kenji suspirou, virando o rosto para observar Arisu.

― Isso tudo é por causa do Arisu-kun...?

― Ele é um garoto interessante. ― Respondeu Haruka dando um tom ambíguo em sua frase.

― Sempai! ― Gritou Junko.

― Já estou indo. ― Ele andou até Arisu, e colocou a mão em seu ombro ― Arisu-kun, você não tem exames semana que vem? Pode ir pra casa estudar, nós cuidamos de tudo por aqui.

― Mas Murakami-sempai...

― Não se preocupe, você já fez mais que o suficiente.

― Sério...? Então, acho que vou indo mesmo. Ah, prometo que depois dos exames vou trabalhar em dobro!

― Vou esperar por isso ― Kenji abriu um sorriso.

Arisu se despediu, tirou o avental, e correu para a saída da escola. Haruka, contra a vontade do menor , o acompanhou.

― Que provas você vai ter? ― Perguntou o mais velho.

― Matemática, física... ― Arisu enumerava as provas contando nos dedos. ― Ah, e história.

― Hum... Quer ajuda pra estudar?

― Ah? Mas o sempai também deve ter exames...

Os dois pararam ao encontrar Rika na saída da escola. A menina olhou para Haruka com uma expressão curiosa, depois virou-se para uma colega, e as duas começaram a voltar para casa.

― Essa garota me olha de um jeito estranho... Isso me irrita. ― Resmungou Haruka com um tom azedo na sua voz.

― Haruka-sempai! Rika-san é uma menina muito educada! Você não devia falar dela pelas costas.

― Ainda a defende depois do que ela fez?

Arisu corou.

― Mas é claro! É assim quando gostamos de uma pessoa... Você deveria saber, sempai!

― Não sei.

― Hã?

Arisu parou de andar para olhar Haruka, que se desfizera do sorriso de sempre e o olhava sério.

― Como assim...? ― Questionou.

― Eu nunca me apaixonei. ― Explicou ao ver a expressão confusa de Arisu. ― Saio com um monte de gente por ai, mas é só por prazer e diversão. Nunca gostei realmente de alguém. Por isso não tem como eu entender.

― Sempai...

Haruka riu, e bagunçou o cabelo de Arisu colocando sua enorme mão sobre a cabeça dele.

― Por que essa cara de velório? ― Ele começou a rir.

― Mas... Isso é triste, não acha...? ― Arisu estava preocupado.

― Sério? Eu acho normal. ― O pequeno não mudou sua expressão. ― Não é todo dia que se encontra alguém para amar. Vamos, pare com isso. Eu não quero tenha pena de mim. Eu mesmo não me incomodo com isso. ― Ele sorriu ― Então, em que matérias precisa de ajuda?