[Rozembout, Província de Matera, Itália, 1850]

Rozembout era um pequeno vilarejo que ficava na área limítrofe da Província de Matera, sua paisagem era composta principalmente por grandes cadeias de montanhas, porém existia uma grande floresta que vinha da Província de Taranto e cruzava a fronteira entre as duas províncias.

Duas senhoras estavam caminhando na principal rua do vilarejo, quando param em frente a uma casa e começam a conversar.

 - Nosso vilarejo está em perigo… e ele ainda não acredita no Deus Emiria… - Diz uma das senhoras falando alto e com tom de reprovação.

— Ele poderia ajudar o Reverendo Nolodie a salvar nosso vilarejo… mas prefere ser um incrédulo... – Completa a outra mulher também falando alto.

— Quantos mais terão que morrer para que ela se convença? - Perguntou a primeira senhora.

— Como pode continuar negando-se a ouvir os chamados do Reverendo Nolodie!? - Falou a segunda senhora.

Ao que parece as duas senhoras estavam tentando chamar a atenção das pessoas que circulavam na rua, o que facilmente conseguiram fazer. Muitos pararam para ouvir o que elas estavam falando.

— Se eu pudesse iria no lugar dessa gentinha ingrata. – Falou a primeira senhora, agora gesticulando e apontando ao perceber que tinha conseguido chamar a atenção das pessoas.

—  Eu também... seria uma honra pra mim! Mas uma hora ele vai ter que ceder... seja por bem ou por mal! – Finalizou a segunda senhora, que já estava praticamente gritando.

As pessoas que estavam na rua e que tinham ouvido a tudo começaram a cochichar, outros apenas balançavam com a cabeça demonstrando concordar com aquelas palavras, alguns poucos desviavam o olhar e iam embora.

Depois da pequena cena as duas senhoras seguem o caminho ainda resmungando em voz alta, até que param em frente a outra casa e fazem uma nova cena.

— E-eu estou com medo e já não sei mais o que fazer... - Sussurrou uma jovem garota ao ouvir toda aquela conversa que aconteceu em frente a sua casa.

A garota havia acabado de completar treze anos de idade, ela tinha cerca de um metro e trinta e cinco de altura, cabelos lisos e loiros que chegavam na altura dos ombros, usava um vestido simples de linho branco comprido e uma faixa vermelha na cintura e sapatos de couro bem simples.

— Pai, o que aconteceu com o senhor? Porque ainda não voltou? - Disse a jovem levando as mãos ao rosto e começando a chorar. Ele encostou as costas na porta e sentou-se no chão.

Depois de algum tempo chorando, ela acabou lembrando-se de uma história que o seu pai contava quando ela era mais nova.

“A Lenda do Balão dos Desejos”

A lenda dizia para escrever uma carta, contando os seus desejos mais profundos, depois devia-se prendê-la em um balão e depois soltá-lo ao vento.

Se os seus sentimentos fossem fortes o suficiente, o balão seria levado aos céus e um anjo viria para realizar os seus desejos.

Porém, a lenda também dizia que era preciso ter muito cuidado com o aquilo que se desejava, pois se a carta carregasse sentimentos ruins ela poderia atrair um demônio em vez de um anjo.

A garota enxuga as lágrimas, se levanta e vai para o seu quarto, pega uma folha de papel, um lápis e começa a escrever uma carta com o seu desejo mais profundo, depois prende-a em um balão vermelho usando um barbante.

Então abre a janela do seu quarto, se debruça sobre a mesma e aguarda pacientemente por uma rajada de vento forte o suficiente para levar o seu balão.

Depois de alguns minutos finalmente surge uma rajada de vento e ela solta o balão.

— Meu Deus, por favor, receba este balão com minha oração e nos salve.

{Dois Dias Depois}

— Aaaah, socorro! Alguém me ajude! Socorro! - Gritava uma jovem garota que estava fugindo de alguns lobos que a perseguiam. Ela já estava longe do vilarejo de Rozembout onde morava, tinha adentrado na floresta sem nem perceber.

De repente a garota esbarra com alguém. - O que houve garota? - Perguntou um homem uniformizado.

— U-um o-oficial? Por favor me ajude! Eles estão me perseguindo! - Ela aponta para os lobos que estavam se aproximando.

O oficial avança alguns passos à frente, já empunhando a sua carabina.

— Por favor, tenha cuidado. - Falou a garota assustada.

— Não se preocupe senhorita. - Falou o oficial enquanto brandia a sua carabina para tentar afugentar os lobos, conseguindo afugentá-los rapidamente.

— Pronto, você está a salvo agora. Mas não é bom ficar zanzando por aí na floresta sozinha. - Advertiu o oficial guardando a carabina e indo ao encontro da garota.

— E-eu sei… - Disse ela enxugando as lágrimas. - é que de repente os lobos apareceram e… eu sai correndo e… entrei na floresta… e… e...

— Tudo bem, se acalme. Você deve morar no vilarejo de Rosembout, não é mesmo? – Perguntou o oficial.

— Si-im, isso mesmo...

— Imaginei... Eu trabalho na fronteira e estava fazendo uma ronda quando pensei de ter ouvido alguns gritos e uivos. Felizmente eu cheguei a tempo.

— Sim, foi bem na hora.

— Você quer que eu te acompanhe até o seu vilarejo, para te proteger caso os lobos voltem?

O semblante da garota muda. - Obrigado... mas… mas eu preciso encontrar... meu pai…

— Por acaso seu pai está aqui na floresta? É perigoso você procurar sozinha por ele, principalmente com esses lobos nas redondezas, vamos, eu vou te ajudar a procura...

— Nesse instante a cabeça do oficial explode e o seu corpo cai no chão.

— Aaaaah! Me-eeeu de-eeus… o-o que foi que aconteceu… - Gritava a jovem em pânico.

— Não se preocupe... Ele não era um oficial, sequer um ser humano de verdade…

Das sombras da floresta surge um jovem com longos cabelos vermelhos, ele tinha um metro e setenta e quatro de altura e usava o que parecia ser um sobretudo preto com uma calça também preta e botas de couro pretas de cano alto. Ele tinha uma fisionomia séria e um semblante pesado, mesmo parecendo ser bem jovem, talvez uns vinte e poucos anos.

— Você deve ser a Nana, não é?

— Si-im... E quem é você? - Perguntou Nana enquanto se afastava.

— Espere, não tenha medo. Se quiser saber a verdade, basta olhar para baixo e descobrirá a verdadeira identidade desse oficial. – Disse o jovem.

Nana estava com medo, ela só queria ir embora dali. Ao tentar se afastar, ela sem querer acabou olhando para baixo e assustou-se quando percebeu que o corpo daquele oficial tinha derretido e virado uma gosma estranha, sobrando apenas o uniforme, sapatos, a carabina e etc…

— Esta criatura chama-se Evil e este é da família Smile que é o nível mais baixo de todos. - Disse o estranho rubro.

— Evil!? Do que você está falando? Isso tudo é muito estranho! E como você sabe o meu nome?

— Você reconhece esse balão vermelho, Nana? Ele me trouxe a sua carta e eu vim realizar o seu desejo. - O estranho se aproxima e tenta entregar a carta para Nana.

A garota estava tão assustada que nem tinha reparado que ele carregava consigo um balão vermelho. Nana estende a mão para pegar a carta, mas ela fica relutante e acaba desistindo e sai correndo floresta adentro.

— Espere Nana, você não quer salvar o seu pai? - Perguntou o estranho.

Escutando aquilo, Nana começou a diminuir a velocidade até que parou de correr e se virou para o estranho. - Meu Pai? Como você sabe sobre ele?

O estranho vai até ela e tenta novamente entregar a carta. - Vamos, pegue a carta, não tenha medo.

Nana pega a carta e começa a lê-la. - O-oh! E-essa é mesmo a minha letra, sem dúvidas essa foi a carta que eu escrevi... En-então quer dizer que meu desejo será realizado?

Nesse momento, uivos estridentes são ouvidos e o balão que o estranho carregava acaba estourando. 

— Tsc… Parece que ainda não acabou... 

— O quê? O que isso quer dizer? - Perguntou a garota confusa.

De repente, os lobos que anteriormente estavam perseguindo Nana reaparecem, porém algo estava estranho, eles não pareciam lobos normais como antes, eles estavam maiores e com seus corpos deformados.

— Quem é você? - Perguntou um dos lobos. Ele era o maior dos três e provavelmente devia ser o Alfa do grupo.

— Nã-ão acredito! Esse lobo está falando!? - Perguntou Nana assustada.

— Se afaste Nana, eles não são lobos de verdade... - O estranho toma a frente da garota para protegê-la. - Eles também são Evils, porém estes devem ser da família dos Bestiais.

— Uhhu… Então você sabe o que nós somos… interessante… - Disse um dos lobos menores que estavam atrás do Alfa.

— Isso é estranho... ele tem um cheiro anormal... você também é um Evil? – Perguntou o terceiro lobo.

— Evil ou humano, isso não importa! Ele não vai ficar em nosso caminho, nós temos uma missão para cumprir e além do quê, ele não terá chance contra nós três! - Rosnou o Alfa que começou a se transformar em uma nova criatura.

Ele ficou em pé sobre as suas patas traseiras, manteve a cabeça de lobo que ficou ainda mais deformada e várias partes dos seus ossos e músculos ficaram visíveis. Seu peitoral foi coberto por uma grande placa feita de osso e suas costelas foram reforçadas ficando mais grossas. Algumas partes do seu corpo mantiveram-se com pêlos e outras ficaram sem, suas garras e dentes também ficaram maiores.

Os outros dois lobos menores também se transformaram, contudo os três eram completamente diferentes, cada um parecia ser mais deformado e asqueroso que o outro.

O lobo alfa avança correndo sobre as quatro patas, enquanto urrava: Irei te matar e te devorar até não sobrar nenhum vestígio!

O estranho não responde as provocações e também avança contra o monstro, o lobo então salta estendendo as suas patas dianteiras, mirando as suas enormes garras na garganta da sua presa, porém o estranho desliza para o lado bem a tempo de esquivar-se da investida, fazendo o monstro passar rente ao seu corpo.

Agindo rapidamente, ele agarra a cauda da criatura e começa a girá-la, os outros dois lobos avançam para ajudar o seu líder e quando eles estavam próximos o estranho lança o alfa contra os outros dois, derrubando-os. Os três monstros caem no chão e vão rolando para longe deixando um rastro no chão.

— Como isso é possível!? - Esbravejou o Alfa, enquanto tentava se levantar, pois ele estava em cima dos outros dois lobos e não conseguia se equilibrar.

— Vamos atacar os três juntos e acabar logo com isso! - Falou um dos lobos menores, enquanto ele tentava empurrar o alfa para tirá-lo de cima das suas pernas. 

Agora os três monstros estavam recompostos e avançaram juntos contra o estranho, que também avança contra os lobos e ao mover as suas mãos algumas Flechas Amarelas são materializadas entre os seus dedos e ele as lança acertando todos os três monstros, que são derrubados pelo impacto das flechas.

— Haha, mais que merda foi essa? Se esse é o melhor que pode fazer, você está acabado! – Falou o Alfa se levantando, mas a sua voz trêmula não inspirava confiança.

— É  o que veremos... – O estranho então salta para trás ficando próximo de Nana e na sequência os três monstros explodem. Eles foram completamente despedaçados pela força da explosão e aos poucos cada pedaço começa a se desintegrar virando pó.

Nana se desespera e sai correndo floresta adentro. - Espere Nana! Para onde você está indo? É perigoso! - Falou o jovem rubro, que rapidamente se move e aparece em frente a garota que acaba esbarrando nele.

— E-eu não entendo o que está acontecendo… Quem é você? Como você conseguiu vencer aqueles monstros? Você é um anjo ou é um demônio? - Falou Nana aos prantos.

— Meu nome é Maya. E eu não sou um demônio, muito menos um anjo. Eu sou um Evil Crusher e vim para realizar o seu desejo.

A cabeça do Alfa que ainda não tinha desaparecido completamente, sussurra: Evil Crusher? Isso é impossível… Preciso avisar ao meu senhor…

Uma pequena esfera negra emerge da sua testa e sai voando pelo céu e assim finalmente a cabeça do monstro desaparece.

— Mas antes disso Nana – continuou Maya - eu preciso que você se acalme e me escute, eu vou tentar explicar o que está acontecendo da melhor forma possível.

Maya começa a explicar que aqueles monstros que a atacaram se chamam Evils e são na sua grande maioria seres malignos que se alimentam dos seres humanos, seja da carne, da alma ou da energia vital.

Ele explica que os Evils sempre tentaram tomar o controle deste mundo para si, porém deuses e humanos se uniram para impedir que isso acontecesse. Diversas batalhas contra os Evils foram travadas ao longo da história e ao fim da última grande guerra contra os Evils, eles acabaram sendo selados pelos deuses num lugar chamado Terra da Noite Escura, mas eventualmente eles acabam escapando para o mundo dos homens.

Com o passar das eras, cada civilização tentou explicar a existência dos Evils à sua maneira, criando as suas próprias suas lendas e mitos. Sejam os Gregos com os seus Daemons, os Japoneses com os seus Onis e Youkais, os Árabes com os seus Jinns ou os Judeus e os Cristãos com os seus Demônios. No fim, Evil é só mais uma das diversas formas de interpretar esses seres.

Os humanos que lutaram ao lado dos deuses contra os Evils receberam o nome de Evil Crushers.

— É muita informação de uma vez, estou muito confusa. - Diz Nana enxugando as lágrimas e tentando se acalmar. – Mas pelo que entendi, são esses tais de Evils que estão causando a morte do povo do meu vilarejo?

— Sim, eu não tenho dúvidas. Consigo sentir uma grande aglomeração de Evils por perto. - Respondeu Maya.

— E você, o que é? Como consegue lutar contra esses monstros?

— Como eu disse, os Evils foram selados em um lugar chamado País da Noite Escura e foi nesse lugar infernal que eu cresci e foi lá também que eu herdei as minhas habilidades especiais.

Movendo as mãos e as juntando Maya cria três flechas, uma amarela, uma azul e uma vermelha - Cada uma dessas flechas possui uma função diferente.

— O-oh… isso é incrível… ma-as isso quer dizer que você não é humano? - Perguntou Nana.

— Eu sou... humano... - A expressão de Maya muda por um instante e uma aura sombria toma conta do seu semblante. – Mas não sou um humano comum, por isso que consigo lutar de igual para igual contra os Evils. - Maya move novamente as mãos e as três flechas desaparecem...

Nana percebe que aquilo mexeu com Maya - De-esculpe… eu não falei por mal… deve ter sido horrível ter crescido num lugar assim, repleto de monstros...

— Apenas esqueça... - Maya vira as costas para Nana. - Agora eu gostaria que você me levasse até a igreja que você mencionou na carta.

— Ce-erto… A Igreja do Deus Emiria fica perto daqui, podemos sair da floresta e dar a volta por fora para chegarmos na estrada, porém seria mais rápido se seguíssemos pela da floresta.

— Entendo, então devemos seguir pela floresta.

— E se mais monstros aparecerem? - Perguntou Nana preocupada.

— Não precisa se preocupar, eu vou proteger você, apenas não sai do meu lado. - Respondeu Maya virando para a garota.

Nana assente com a cabeça e os dois seguem em direção a Igreja do Deus Emiria.