Every single word

                                                                                                                                                                       builds up to this moment

—Filme favorito?—dirigi meu olhar a Percy enquanto catava outro marshmellow do saco de marshmellows

—Filme favorito...?—Percy ponderou por alguns segundos

Era noite de quarta-feira, dois dias depois do nosso primeiro beijo, estávamos sentados no meio-fio da calçada de minha casa, era dia de lua nova e eu havia prometido a Percy que lhe ensinaria sobre as constelações, e naquela noite as estrelas pintavam o céu com pontinhos brilhantes, perfeito para decorar algumas constelações. Ele estava usando um moletom cinza (e eu estava mais do que surpresa por ele não estar tarjado de preto da cabeça aos pés) com calça preta rasgada e all stars surrados, as bochechas pouco coradas por conta do frio e o cabelo se emaranhando com o vento gelado, estávamos sentados lado a lado e o olhar de Percy recaía sobre mim.

—Ah—Percy coçou a nuca parecendo constrangido—Deixa pra la

—Não—neguei com a cabeça—Me conta

Percy passou a mão esquerda pelo cabelo sorrindo levemente.

—O menino do pijama listrado...—Percy sorriu sem graça—...E ligados pelo amor

Sorri para ele.

—ligados pelo amor? Nunca assisti, parece bem cliche—Sorri ainda mais—Não sabia que gostava desse tipo de filme

Dei uma cotovelada de leve em seu braço.

—Você e o Groover são os únicos que sabem disso—Ele sorriu pouco constrangido

Eu não queria me precipitar e quebrar a cara novamente, mas sim, eu estava muito feliz por Percy compartilhar algo intimo comigo, e o fato de que eu era a única garota a quem Percy havia contado isso me fez sorrir.

—E o seu filme favorito?—Percy passou um dos braços pelo meu ombro

—Ah—coloquei uma das mechas de meu cabelo atrás da orelha—Eu amo o titanic, mas gosto muito de filmes de herói

Percy sorriu colando sua testa na minha, ele acariciou minha bochecha com o polegar.

—Eu já te disse o quanto você é linda?—Ele sorriu e me encarou com as pupilas dilatando

Baixei a cabeça. Não, Percy nunca havia dito que me achava linda, ele apenas me chamava de fofa as vezes mas eu sabia que era provocação, apesar de não me incomodar nem um pouco.

—Hey—Ele levantou meu rosto com o indicador e sorriu

Percy beijou minha testa e apertou os braços envolta do meu corpo.

—Como foi seu primeiro beijo?—Percy baixou o rosto para olhar nos meus olhos

Eu ri com a pergunta besta.

—Sétima série, atrás da quadra, Thalia já tinha beijado e queria que eu beijasse também, então ela chamou um garoto que eu nunca tinha visto na vida, foi horrível—meu rosto se contorceu em uma careta

Percy riu.

—E o seu?—Olhei nos seus olhos—Como foi seu primeiro beijo?

—Ah...—Ele franziu as sobrancelhas—Verdade ou desafio, sexta serie

Nos olhamos e sorrimos.

—E o seu ultimo beijo?—Percy me puxou para mais perto de seu corpo

Suspirei, apesar de eu Percy termos tido nosso momento, desde então nós não tínhamos nem sequer falado sobre isso, estávamos andando juntos no colégio, ele me mandava mensagens, mais nada além disso, eu sinceramente estava feliz de não termos tocado no assunto.

—Quer mesmo falar sobre isso?—Baixei meu olhar tentando não transparecer meu desconforto

Percy segurou meu queixo e ergueu meu rosto.

—Não—Ele balançou a cabeça negativamente

Percy então me deu um selinho pouco demorado, ele puxou meu corpo contra o seu e colou nossas testas novamente.

Eu estava um pouco tensa, não queria estragar o momento mas os pontos de interrogação martelavam na minha cabeça- Estavamos juntos? Aquilo significava que ele gostava de mim? E Rachel?- Tentei afastar os pensamentos da cabeça, não queria estragar aquele momento, enquanto eu pudesse aproveitar a companhia de Percy sem estarmos discutindo de alguma forma, eu faria.

—Para com isso—Ele afastou seu rosto do meu um pouco

—Hm?—Levantei meu olhar para ele—Parar com o que?

—De pensar desse jeito—Percy deu um peteleco na ponta de meu nariz—Eu nunca sei o que você ta pensando

Percy sorriu e roçou seu nariz no meu.

—Eu só tava...—Parei, eu não ia estragar a noite com minhas inseguranças

—O que ta te afligindo, hein?—Percy pegou minhas pernas e colocou-as no seu colo

—Nada—Deitei meu rosto sobre seu ombro para ele não perceber que estava blefando

—Tem certeza?—Ele acariciou minha nuca com os dedos

—Uhum—Deslizei os dedos sobre seu pescoço

Percy suspirou.

—Minha mãe ta com câncer—Percy soltou o ar que estava em seus pulmões

Eu o olhei como se ele estivesse fazendo algum tipo de pegadinha, seu rosto estava serio como eu nunca havia visto antes, ele encarava o nada e suas íris escureceram em amargura.

—Percy...—Eu olhei em seus olhos—Eu sinto muito

Puxei Percy e o abracei com toda a força que eu tinha naquele momento, Percy suspirou e devolveu o abraço, com tanta força que minha respiração falhou, porém eu não liguei nem um pouquinho, eu não conseguia imaginar a dor de Percy, minha mãe não morava comigo mas pelo que eu sabia até o momento, sua saúde estava em perfeito estado e ela estava muito feliz, senti meus olhos marejarem e apertei Percy ainda mais, ele estava quase chorando, senti seu peito subir e descer com a respiração pesada.

—Desculpa—Ele soltou com a voz embargada—Desculpa ter te afastado tantas vezes

Percy apertou seus braços envolta de mim ainda mais, acariciei seu cabelo sentindo meu coração pesar.

—Sabe...—Percy continuou ainda com a voz pesando amargura—Eu nunca tive uma referencia de que tipo de homem ser dentro de casa...

Ele suspirou pesadamente, juntando forças para continuar.

—...Mas eu tive referencia de que tipo de homem eu não queria ser

Ele engoliu em seco suspirando pesadamente mais uma vez.

—Eu não tenho pai, eu tenho apenas um doador de esperma—Percy estreitou os olhos com raiva—Ele abandonou minha mãe assim que descobriu que ela estava gravida, ele abandonou ela Annabeth!

Percy fechou os olhos com raiva e pude ver lagrimas escorrendo pelo seu rosto.

—Percy—Olhei em seus olhos—Você não precisa...

—Quando eu tinha quatro anos—Percy continuou antes que eu pudesse terminar de falar—Minha mãe se casou com Gabe, eu nunca entendi o porque...

Percy apertou os olhos tentando fazer as lagrimas cessarem.

—Ele era um babaca, sempre foi, flertava com minhas tias na frente de minha mãe, bebia feito um porco e fumava aqueles malditos cigarros todos os dias, ele fedia e assediava minha mãe constantemente...

Percy suspirou finalmente conseguindo conter as lagrimas.

—Eu lembro...—Ele ameaçou voltar a chorar novamente—Lembro da primeira vez que ele bateu nela, lembro de ela me buscar voltando da escola, lembro de termos chegado em casa e ela tinha assados meus biscoitos favoritos, a massa com corante azul...

Percy sorriu sem vida com a lembrança de sua mãe assando seus biscoitos favoritos.

—Lembro de Gabe totalmente bêbado vindo em nossa direção, ele tinha sido despedido do trabalho, e chegou em casa acusando-a de ter culpa sobre aquilo...

O sorriso de Percy desapareceu e seus olhos marejaram.

—Ele puxou ela pelo cabelo e a jogou no chão...—as lagrimas de Percy voltaram a escorregar pelo seu rosto, e dessa vez eu tinha certeza que eram lagrimas de ódio— Ele deu tapas e socos no rosto dela, arrastando-a pelo cabelo no chão da casa, lembro do seu choro, dos seus gritos, dela pedindo para que eu fechasse meus olhos...

Percy enterrou seu rosto no meu ombro.

—Percy...—Senti as lagrimas escorregarem dos meus olhos—Você não precisa me contar

—...Eu não pude fazer nada Annabeth...—Ele ignorou minha fala—Eu só tinha oito anos e não pude fazer nada, eu fiquei parado observando aquele verme espancar minha mãe...

Senti as lagrimas de Percy molharem minha blusa.

—Eu não pude fazer nada...

Estremeci com a imagem de um garotinho de oito anos olhando a mãe ser espancada daquela forma, Percy apertou seus braços envolta de mim.

—Percy—Passei as mãos pelo seu cabelo tentando parecer forte—A culpa não foi sua...

Percy assentiu com o rosto ainda grudado no meu ombro, ele ficou em silêncio durante alguns segundos respirando fundo.

—Eu não quero te fazer sofrer...—Percy passou a mão pelo meu cabelo levantando o rosto levemente—Não quero te fazer passar nem metade do sofrimento que  aqueles vermes fizeram  minha mãe passar!

Apertei Percy com toda minha força sentindo meus olhos marejarem.

—Me perdoa...—Percy voltou a enterrar o rosto no meu ombro—Eu não quero te perder

—Você não vai—Ergui o rosto dele para olhar em seus olhos, que por conta do choro estavam pouco vermelhos—Eu to aqui pra você ok?

Percy sorriu ainda com o rosto carregado de tristeza e beijou minha testa.

(...)

Os fones no pescoço de Thalia pendiam soltos balançando, ela cantarolava junto com a musica, ignorando completamente a minha presença, caminhávamos juntas para o colégio, não era surpresa nenhuma que estivesse assim, ela estava saindo com Luke já fazia mais de um mês, e o relacionamento dos dois parecia cada dia melhor, eu estava feliz por ela, não o suficiente para dar pulinhos mas estava feliz, a preocupação ainda tomava conta de mim, Percy esteve mais próximo de mim depois de segunda, mas ele continuava grudado a Rachel, eu não estava achando totalmente ruim, ele não me ignorava nem nada do tipo, mas o medo de ele se afastar de novo permanecia junto de mim, enterrei as mãos no bolso da minha jaqueta para parecer mais confortável, o vento gelado fazia o cabelo de Thalia voar, deixando exposto seu rosto bonito, o que raramente acontecia já que sua franja cobria pelo menos 30% do mesmo, apesar do vento, o sol ardia sobre nossas cabeças, o clima estava maravilhoso, aquele clima de final de inverno e começo de primavera, nem muito quente, nem muito frio.

—Você tem que escutar essa musica!—Thalia falou de repente me fazendo virar o rosto na sua direção com o susto

Ela enfiou os fones no meu ouvido antes que eu pudesse protestar, a batida era tão agressiva que meus ouvidos poderiam sangrar, -heavy metal como Thalia gostava de dizer, satanás em forma de som como eu costumava chamar- seguimos andando enquanto eu tentava aproveitar a musica, que na verdade não estava tão ruim assim mas eu jamais admitiria para Thalia. Quando a musica acabou nós duas já estávamos em frente ao colégio, suspirei já esperando o pior do instituto entupido de criaturas entupidas de testosterona, passamos pelo portão central e adentramos ao corredor lotado, a maioria dos filhotes de satã estavam gritando com seus amigos e disseminando bullying, revirei os olhos e eu e Thalia seguimos em silêncio para nossos armários, ela parou no dela que era uns oito armários antes do meu e eu segui para pegar meus livros didáticos, Rachel estava em seu armário, ela parecia desesperada, fuçando por cada milímetro do local, eu sabia que ela detestava minha fuça, mas pelo que eu conhecia de Rachel, se ela estava desesperada, com certeza algo havia acontecido.

—Tudo bem?—Minha voz saiu tão baixa que eu acreditava que ela não tinha escutado

Rachel virou o rosto na minha direção, achei por um momento que ela fosse me bater, mas seus olhos não tinham uma expressão raivosa, ela parecia mais...confusa.

—Uhum—Ela desviou os olhos de mim mas a ansiedade transparecia no seu rosto

—Certeza?—Minha voz continuava baixa temendo que a qualquer momento ela pudesse voar em meu pescoço

Rachel suspirou, ela parecia tão tensa que por um momento pensei em abraça-la, não que eu tivesse coragem para faze-lo, ela ponderou por alguns segundos.

—Você...—Sua voz estava baixa suficiente para que eu quase não pudesse ouvi-la mesmo estando do meu lado, ela parecia indecisa entre me falar ou não—Tem absorvente?

Ela terminou a frase com a voz quase sumindo, soltei um sorriso com o canto dos lábios ao entender o que estava acontecendo, abri meu armário e tirei de la um pacotinho de absorvente com abas do meu estoque de pacotinhos de absorvente com abas (Que foi? Você nunca sabe quando vai precisar) e entreguei para ela discretamente.

—Não, eu só preciso de um e...—Rachel estendeu o pacote de volta para mim

—Pode ficar—Empurrei o pacotinho na sua direção novamente antes que ela pudesse terminar sua frase—Eu tenho vários

Dei de ombros.

E então, Rachel sorriu, e pela primeira vez não era um de seus sorrisos doces, era tímido e quase não mostrava os dentes, o primeiro sorriso sincero que ela já tinha dirigido a mim em todos os anos de colégio—Valeu—Ela disse e em seguida saiu.

—

Sentei na mesa no canto ao lado de Nico, ele estava conversando com Léo, Thalia e Luke estavam agarrados como sempre, Nico passou um dos braços envolta de meus ombros assim que notou minha presença.

—Ola, loirinha—Ele me lançou um olhar exibindo o sorriso perfeito

—Ola, Nico—Sorri para ele e esquivei meu rosto pra frente para poder ver Léo—Olá Léo

—Bom dia Annie—Léo deu um peteleco no meu nariz e sorriu

Os dois voltaram a conversar animados e eu os observei, eles se davam muito bem, o jeito quase insensível de Nico combinava perfeitamente com o jeito sarcástico de Léo, eles conversam algo sobre como a indústria do cinema havia mudado de uns tempos pra cá, um assunto que parecia interessante para ambos, já eu estava boiando completamente, mas não ligava nem um pouco que seja, ouvir dois dos homens mais importantes da minha vida conversarem era maravilhosamente reconfortante, enterrei minhas mãos nos bolsos da jaqueta  e me afundei no abraço de Nico, observei Thalia e Luke e só a forma como olhavam um para o outro (como se estivessem imaginando um ao outro pelados) me fez corar, encarei alguns alunos, todos pareciam entretidos, alguns conversando com seus amigos, outros com a cara enfiada nos livros, outros no celular e alguns apenas comendo. Observei Percy entrar na cafeteria de mãos dadas com Rachel, prendi a respiração, ele caminhou até nossa mesa enquanto os dois riam de algo que ela tinha falado, senti um nó na garganta e o medo de Percy ignorar minha existência fez minhas mãos tremerem levemente, Percy me olhou, baixei a cabeça esperando que ele ficasse com Rachel e me ignorasse completamente, mas então, vi Percy soltar a mão de Rachel e fazer algo que me surpreendeu completamente, ele sentou do meu lado.

—Bom dia—Percy escorou o cotovelo na mesa e apoiou o queixo na mão, olhando diretamente para mim

—Bom dia—Olhei em seus olhos e sorri

Virei meu rosto e com pouco esforço vi a coisa mais triste do meu dia, Rachel saindo da cafeteria enquanto usava as mãos para limpar as lagrimas que escorriam pelo seu rosto.