O Passado do Lobisomem escrita por Heringer II


Capítulo 17
Capítulo 17


Notas iniciais do capítulo

Pensam que as surpresas acabaram? KKKKKKKK

Espero que gostem! ^^



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Quando Aldo parou de chorar, resolvemos ir ao quintal do asilo para conversamos mais um pouco.

— Então... Todas aquelas armas que você tem são do tempo do cangaço? – perguntei.

— Todas elas. São um reflexo do passado. Um passado horrível.

— Oh, Aldo, por que ficar se lamentando assim?

— Será que você não entende, garota? Eu matei um amigo.

— Lampião foi um homem horrível.

— Mas foi meu amigo. E eu matei. E pior, fugi daquele confronto! Quase todos os outros cangaceiros ficaram lá e lutaram bravamente, mesmo tendo sido decapitados. Eu fui um covarde, minha cabeça devia ter sido exposta junto com a dos outros.

— Eles expuseram as cabeças?

— Sim. Foram expostas como prêmio em diversas cidades. Dadá, a cangaceira mais brava do bando, e uma das únicas sobreviventes, foi quem pediu que elas fossem enterradas. Mas isso só aconteceu em 1969.

— Aí está! Você não foi o único sobrevivente. Então, por que se incomoda?

— Você não entende. Mesmo os que sobreviveram, lutaram. Eu, por outro lado, fugi como um covarde.

— E que importância isso tem agora, homem? Faz mais de 70 anos e você ainda remói isso na cabeça?

— E o que você tem a ver com isso?

— Nada! Só acho uma idiotice você se sentir mal por uma coisa tola assim! E daí se você fugiu, cara? Você está vivo agora! Isso é o que importa! Vai viver a sua vida!

— Viver a minha vida? Ah, Evelyn, quando você vai perceber que para mim esse negócio de viver a vida não vale mais nada?

— Aldo, não diga uma coisa dessas! Você é importante!

— Importante para quem? Meus pais estão em baixo da terra. Meus tios, eu os abandonei para fugir com o bando. E esse mesmo bando, eu abandonei para deixá-los morrer. Me diga, garota, para quem eu sou importante?

— Ah, Aldo! Por favor, deve ter alguém!

— Bom, na verdade... – Aldo tomou fôlego para falar alguma coisa, mas desistiu antes que falasse. – Deixa pra lá.

— O quê? O que foi?

— É só mais uma história boba de velho.

— A última história não foi nada boba.

— Esqueça, menina.

— Aldo, por favor. – segurei no braço dele e ele olhou para mim. – Me conte.

Aldo deu um longo suspiro e começou a falar.

— Quando eu escapei do ataque de Lampião, decidi vir até essa cidade para tentar começar uma vida nova. Imediatamente, arrumei um emprego num supermercado que havia aberto fazia pouco tempo. O dono do estabelecimento se chamava Aroldo Lima Barbosa e era um cara rico, vivia se exibindo, andando por aí no Chevrolet Corvette dele. Um dia, o motor do carro dele parou a poucos quilômetros de uma padaria que eu sempre ia para comprar o pão do café da manhã. Eu me ofereci para consertar o carro, meu tio tinha me ensinado tudo sobre o funcionamento de motores de carros, principalmente dos americanos. Quando eu consertei o carro, ele ficou tão grato que me ofereceu um emprego no supermercado dele. Eu não entendia nada de supermercados, mas precisava ganhar dinheiro para me manter na cidade. Com o tempo, fui ganhando e experiência, e me tornando um bom funcionário. Acho que eu era o funcionário favorito de Aroldo, levando em conta a forma como ele me tratava com relação aos outros.

— E o que aconteceu com ele?

— Morreu em março de 1999. Infarto fulminante. Mas não é dele que eu estou falando.

— Então, de quem?

— A confiança que Aroldo tinha em mim era tão grande que certo dia ele me convidou para um churrasco na casa dele. E eu fui. Quando cheguei lá, ele me apresentou a filha dele. E... Uau! Até hoje não sei como descrever a beleza que estava diante de meus olhos. Era uma mulher mais ou menos da minha idade. Era albina, então o pai não a deixava sair muito para que não se machucasse no sol. Os olhos e pele claros, e os cabelos loiros quase brancos me deixavam instigado. Eu me apaixonei por ela no instante que a vi. Mas, eu sabia que Aroldo não aprovaria nosso romance. Por mais que confiasse em mim, na família dele havia uma regra que gente rica só se casa com gente rica.

— E aí?

— Eu não liguei. Naquele momento eu não me importei com o churrasco, muito menos se iria perder o emprego, eu não iria descansar enquanto não conseguisse conquistá-la. Num primeiro instante, ela até me evitou. Mas, aos poucos, conforme Aroldo ia fazendo mais churrascos e me convidando, fui conversando mais com ela e ela foi confiando mais em mim, e no final de um dos churrascos, já éramos muito amigos. Escondido do pai dela, a convidei para que fosse me encontrar naquela noite. Eu achava que ela não iria aceitar, mas para minha surpresa, ela disse sim, e nos encontramos naquela mesma praça onde eu e você comemos os sanduíches.

— Que romântico!

— Pois é, mas quem não gostou disso foi o pai dela, que a tinha visto sair de casa escondida e a seguiu. Quando ele me viu beijando a filha dele, ordenou imediatamente que nos separássemos daquele beijo. Uma semana depois, ele pagou para ela uma viagem para a Argentina, onde ela iria cursar uma faculdade. Horas antes do voo, eu fui escondido até a janela do quarto dela, onde nós conversamos por alguns minutos. Eu disse a ela que a esperaria o tempo que fosse, e que um dia nos reencontraríamos para viver nosso amor sem a interferência de ninguém.

— E onde ela está agora?

— Eu não sei. Ouvi boatos de que após a morte do pai dela, ela voltou para a cidade. Porém, eu nunca mais a vi.

Após ele acabar a história, ficamos calados por um bom tempo, até que ele decidiu voltar ao quarto. Antes que ele entrasse no asilo, eu o chamei...

— Aldo!

— O que você quer agora, Evelyn?

— Vamos sair por aí. Sei lá, comprar uns sanduíches...

Aldo parou um tempo e olhou para o chão.

— Vá embora, Evelyn.

— O quê?

— Vá embora. Você já fez muito por hoje.

— Mas eu ainda tenho umas duas horas para ficar por aqui.

— Considere-se dispensada por hoje.

— Qual é, Aldo? Por que isso agora?

— Garota, você mesmo disse que só fica comigo por obrigação da lei. Mas se você for embora, ninguém vai saber. Só se eu delatar. E eu não vou fazer isso.

— Aldo...

— Boa noite, Evelyn. E tome cuidado com o lobisomem.

Ele deu um sorrisinho de canto de boca e entrou no asilo. Lá dentro, a supervisora deu um “boa noite” sorridente para ele, mas Aldo não respondeu. Aquilo chamou a atenção da supervisora. Aldo nunca respondia as boas noites que ela dava. Mas agora, havia algo de diferente no seu semblante. Não era raiva, era tristeza.

Eu acabei o obedecendo, e peguei o caminho de volta para casa. Mas, tinha algo que me incomodava. Era como se uma força estivesse me fazendo querer voltar para onde Aldo estava. Quando eu estava a poucos quarteirões da minha casa, decidi voltar correndo para o asilo.

Entrei apressada pela sala principal, assustando os velhinhos, as enfermeiras e a supervisora. Corri o mais rápido que pude em direção ao quarto de Aldo, e quando eu abri, senti um choque ao ver aquela cena.

Aldo estava com um de seus rifles apontados para sua cabeça, e com o dedo já no gatilho.

— NÃO! – gritei e corri em direção a ele, usando a minha mão para empurrar o braço dele, o fazendo derrubar o rifle. - VOCÊ FICOU MALUCO? – eu gritava e chorava. – O QUE DEU EM VOCÊ AGORA? QUAL O SEU PROBLEMA?

Aos poucos, os gritos que dividiam o espaço com meu choro foram desaparecendo, e aos poucos, comecei apenas a chorar. Abracei Aldo com força, enquanto minhas lágrimas escorriam incessantemente do meu rosto. Senti ele me abraçar de volta.

— Por favor. – eu disse. – Não faça isso.


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Notas finais do capítulo

Ainda tem alguns segredinhos para o Aldo revelar... KKKKKKKK

Espero que tenham gostado! ^^