A luz da fogueira, Qui- Gon tomava coragem para enfim tocar naquele assunto que tanto o incomodava. Dias haviam se passado desde que a missão em Mandalore chegara ao fim e a mais nova Duquesa agora se encontrava em segurança. Apesar de tudo ter corrido bem, sentia que seu Padawan não pensava da mesma forma.

— Obi Wan. — Ele disse casualmente. Não havia segredos entre os dois, nada que um não soubesse a respeito do outro e sentindo-se como um pai para o jovem Jedi, era como se fosse sua obrigação orienta-lo. — Seus pensamentos o traem, tenha cuidado. Amanhã retornaremos a Coruscant e você sabe como os membros do conselho costumam agir com relação a esses pensamentos indiscretos... — Ele olhou de soslaio para seu Padawan, deitado com os pés apoiados no tronco em que ele encontrava-se encostado.

— Não sei do que esta falando, Mestre. — Obi Wan murmurou. De olhos bem abertos, sabia que deveria tentar dormir, mas bastava fechar os olhos para que a imagem de Satine surgisse em seus pensamentos e ele não queria que seu mestre ficasse bisbilhotando sua mente. — Estou meditando.

— Estou vendo com clareza sua mente e posso afirmar com certeza de que nunca lhe ensinei esse tipo de meditação. — Qui-Gon suspirou.

  Obi Wan bufou e fechou os olhos. Por mais que tentasse esvaziar sua mente, o menor detalhe o fazia se lembrar da desastrosa despedida entre ele e a Duquesa, dias atrás. Sabendo que seria inevitável o adeus entre eles, ele ensaiou inúmeras vezes um discurso onde pretendia da melhor forma possível, revelar seus sentimentos por ela — geralmente aproveitava para fazer isso quando estava sozinho e perto de um riacho, onde poderia ver seu reflexo e se certificar de que não estava agindo feito um tolo enquanto discursava para si mesmo —  mas quando chegou a hora, simplesmente congelou e sua mente tornou-se um borrão.

— Deveria ter dito mesmo assim. — Qui-Gon captou os pensamentos de seu aprendiz e sorriu maliciosamente. — Bastava improvisar.

  Kenobi abriu os olhos e fuzilou seu mestre, que retribuiu o gesto balançando os ombros.

— Não me culpe, na sua idade já deveria ser capaz de bloquear sua mente. — Qui-Gon fitou a fogueira.

— Eu não consigo. — Obi Wan inspirou fundo e expirou devagar. — Não consigo evitar pensar nela mestre. Sinto como se a tivesse abandonado, deixado ela sozinha. Sei que ela esta bem agora, cuidando de seu povo, mas... — Ele suspirou novamente. — Será que ela também está pensando em mim, ou foi apenas uma ilusão minha? Talvez nunca tenha existido nada entre nos e eu tenha imaginado tudo isso.

— Padawan. — Qui-Gon jogou um graveto na fogueira, fazendo as chamas crepitarem. — A força age de maneiras misteriosas, mas jamais faria você enxergar algo que não existe. Você só precisa aprender a interpretar os sinais que ela transmite a você. Se não souber fazer isso, nunca conhecerá a força por inteiro. Agora — Ele jogou outro graveto. —Satine claramente sente algo por você também, só que você não percebeu.

— Você acha? — Kenobi perguntou, erguendo metade do corpo do chão e apoiando-se em seus cotovelos. — Acha que ela sente algo por mim? Mas então por que ela não me disse nada?

— Talvez tenha dito, mas não com palavras.

— Como assim?- Obi Wan ergueu uma sobrancelha.

— Como eu disse, você não deve ter interpretado os sinais direito e tirou conclusões precitadas, se não, não estaria aqui e não estaríamos tendo essa conversa. — O mestre disse, fazendo com que seu Padawan se encolhesse ao sentir o peso daquelas palavras.

  Qui-Gon virou-se na direção de Obi Wan e o encarou. O único som além da respiração deles era o da chama consumindo as madeiras. Era uma noite agradável e o céu estava limpo. Seria uma ótima oportunidade para terem um bom descanso, visto que nos últimos meses passaram por situações complicadas e cansativas, mas se os pensamentos inquietantes e incontroláveis do ruivo não cessassem, o mestre não teria sossego  e teria tomaria medidas extremas.

— Entendeu o que quero dizer?

 Obi Wan assentiu, embora no fundo não tendo compreendido totalmente. Voltou para sua posição inicial, de barriga para cima e apoiando a cabeça sobre os braços. Dirigiu seu olhar para o céu estrelado e mais lembranças do ultimo encontro com a Duquesa voltaram com força a sua mente.

— Obi Wan! — Satine exclamou sorrindo ao ver o Jedi indo ai seu encontro. — Eu achei que já tinha partido. — Seu sorriso tornou-se vacilante ao perceber o nervosismo no Padawan. — Algum problema?

 

 Kenobi Estava forçando tanto para se lembrar das palavras que pretendia dizer a Duquesa que não percebeu que mordia os lábios com força. Só se deu conta quando sentiu o gosto amargo do sangue e desviou o olhar, envergonhado. Estavam no meio do corredor que levava ao salão principal do enorme palácio. De frente para Satine, Obi Wan sentiu uma súbita vontade de correr até a janela mais próxima e se jogar da sacada, tudo para evitar ter aquela conversa pela qual tanto esperara, mas estando cara a cara com  a loira naquele momento, não se sentia tão entusiasmado assim.

 

— Sim, está tudo ótimo. — Ele passou a mão pela nuca. — Eu só queria ter certeza de que você está bem antes de voltar para o templo.

 

— Estou ótima. — Satine o analisava dos pés a cabeça. — Mas não me parece tudo bem com você. Algo o esta incomodando. Vamos, diga o que é! Esta me deixando preocupada. — Ela fez uma careta.

 

— Eu... Eu só queria dizer... — De repente, era como se Obi Wan tivesse se esquecido de que possuía a habilidade de falar. Não conseguia formular frases coerentes em sua cabeça, tudo o que conseguia pensar era em coisas que não tinham nada a ver com o que queria falar para Satine. — Só queria dizer que fico feliz que tudo tenha corrido bem. — Ele cuspiu as palavras e respirou aliviado. A vontade de pular ia suavizando-se aos poucos.

 

  A loira cruzou os braços e o fuzilou. Obi Wan não soube dizer se era um olhar amigável ou de alerta para o perigo iminente que sentia ao fitar o rosto da loira. Uma chama ardente pareceu-se acender por trás dos olhos dela.

 

— Só isso? — Ela perguntou, dando um passo na direção do Padawan. — Tem certeza de que é só isso? Achei que fosse dizer outra coisa, algo como... — Quando percebeu que iria falar mais do pretendia realmente, cobriu a boca com as mãos.

 

— O que achou que eu fosse dizer? — Obi Wan também deu um passo em sua direção e agora se encontravam bem perto um do outro, tão perto que bastava um deles se inclinar para que seus lábios pudessem finalmente se tocar. Os olhares de ambos indicavam que era exatamente isso que queriam, mas estavam tão nervosos e preocupados em esconder seus sentimentos, que não perceberam. Até que Satine sentiu seu rosto corar e percebeu que estava dando bandeira demais.

 

— Nada. — Ela virou-se, ficando de costas para ele. — Bobagem minha. — Ela fez menção de se virar novamente, mas se conteve. — Também fico feliz de que tudo tenha terminado. Eu não aguentava mais viver naquela situação terrível. Vivendo um dia após o outro, sem saber se iriamos acordar na manha seguinte. — Sentiu que novamente falara mais do que devia e se virou, a tempo de ver uma expressão de tristeza passar pelo Rosto do Jedi. — Ben, não foi o que eu quis dizer. Passar esse tempo ao seu lado foi... — Ela levantou a mão na intenção de poder tocar no rosto de Obi Wan, mas desistiu ao pensar que ele não parecia querer corresponder ao toque, devido à postura rígida que ele adotara. — Foi uma ótima experiência. — Disse por fim, jogando os ombros para trás e erguendo o rosto.

 

— Experiência. — Ele repetiu a palavra com um sorriso fraco. — Na verdade, concordo com você. — seu olhar estava distante. — Passar esse tempo ao seu lado serviu muito bem ao meu treinamento. Estou a cada dia mais perto de me tornar um cavaleiro Jedi e se não fosse por essa experiência, talvez demorasse ainda mais. — Ele encarou Satine. — Obrigado, Duquesa. — Fez uma reverencia e deu dois passos para trás.

 

  Ao perceber que ele encerrara a conversa vergonhosa, Satine adiantou-se em sua direção e impulsivamente agarrou a manga de sua vestimenta Jedi, fazendo-o se virar e olhar para ela espantado.

 

— Ahn... — O olhar de Satine variava entre sua mão, cujos dedos apertavam com força o tecido, e o intenso e curioso olhar de Obi Wan. — Posso lhe dar um abraço de despedida? — Ela corou novamente. — Como amigos, quero dizer... Somos amigos agora, não somos?

 

  Dessa vez, foi Kenobi quem corou. Olhou para os lados, torcendo para que ninguém estivesse por perto, pois por uma fração de segundos, cogitou por para fora tudo o que estava sentindo, mas a vontade passou ainda mais rápido do que chegara. O medo de que seu amor pela Duquesa não fosse correspondido associado ao medo de que talvez pudesse ser, ganhara. Havia muito em jogo e algumas poucas palavras poderiam por a perder tudo pelo que ele e ela vinham lutando para conquistar. Ele, seu futuro como cavaleiro Jedi e ela, seu legado como uma Líder de um povo em busca de mudanças. Será que valia a penas arriscar tudo? Ele achava que sim, mas será Satine estaria disposta a fazer o mesmo?

 

— Claro. — Essas e outras perguntas fervilhavam em sua mente. Ele se endireitou e recebeu de bom grado o abraço de Satine. Sentiu instantaneamente sua temperatura aumentar quando seus corpos se tocaram. — Vou sentir sua falta. — Sussurrou no ouvido da jovem Duquesa. Era tudo o que conseguia dizer.

 

  Satine sorriu e apoiou a cabeça no ombro de Kenobi. Não era exatamente aquelas palavras que queria ouvir, mas eram o bastante para que seu coração se aquietasse.

 

— Eu também.

 

 Afastaram-se e impulsivamente, Satine se inclinou em sua direção e depositou um beijo tímido em sua bochecha. Obi Wan só teve tempo de ver que ela estava totalmente vermelha, antes que ela se virasse e corresse na direção oposta. Aquele havia sido o ultimo encontro dos dois.

 

  Obi Wan foi tirado de seus devaneios com uma pedrada em sua testa. Sentou-se subitamente e massageou o galo dolorido que surgiu acima do olho esquerdo.

— Ai. — Exclamou, encarando seu mestre. — Por que fez isso?

— Sinais meu caro Padawan, sinais... — Foi tudo que Qui-Gon disse antes de se deitar e virar, ficando de costas para seu Padawan — Ainda tem muito que aprender Obi Wan. Eu teria apoiado, se quer saber. — Disse por cima do ombro antes de se calar totalmente, deixando o jovem perdido em seus pensamentos.

  Sem entender muito bem o que seu mestre quisera dizer com aquilo, Obi Wan deitou-se novamente e fechou os olhos. Por mais que doesse, não queria deixar de pensar em Satine. Queria poder memorizar para sempre em sua mente a imagem daquele beijo tímido em seu rosto, pois era tudo o que ele poderia ter dela e nunca seria o suficiente.