Natassia era um pé no saco. No caminho todo enquanto subiam o primeiro lance de escadas até a Casa de Áries ela não parava de falar. Itsuki já sabia mais da vida da amazona de Cisne do que dela própria. Quando criança, seu vilarejo na Sibéria foi atacado por um monstro mítico que havia ressuscitado. Todos morreram, exceto ela, que foi salva pelo lendário Hyoga de Cisne, que surgiu no último instante destruindo o monstro. Percebendo que ela tinha potencial para se tornar amazona, Hyoga a treinou para suceder a armadura de Cisne. Porém, concluído seu treinamento, Natássia foi enviada ao Santuário sem saber que nunca mais poderia ver Hyoga. Mesmo voltando a procurar por ele em seus locais de treinamento, não conseguiu encontrá-lo. Desde então, Natássia vem tentando falar com o Grande Mestre ou com Atena, mas os cavaleiros de ouro não a deixam.

— Então deixa eu ver se eu entendi – começou Itsuki – basicamente, você é apaixonada pelo seu próprio mestre, mas os cavaleiros de ouro não sabem como encontrá-lo e nem deixam você falar com o Grande Mestre ou com Atena.

— Eu não estou apaixonada! – exclamou, corando. – Mas sim, só os cavaleiros de ouro podem falar diretamente com o Grande Mestre. E só o Grande Mestre pode ver Atena. Desde que começaram a se preparar para a próxima Guerra Santa, eles tem sido extremamente cautelosos com quem pode acessar o salão do Grande Mestre e o Templo de Atena. E tudo o que eu descobri sobre os lendários cavaleiros de bronze, é que eles estão em algum lugar pelo mundo tentando impedir essa guerra de acontecer.

— Impedir de acontecer? O que você quer dizer com isso? – questionou Itsuki.

— Bom, como você bem sabe, nos últimos nove anos, monstros mitológicos têm renascido ao redor da Terra e, dependendo da força deles, cavaleiros de bronze, de prata ou de ouro são enviados para destruí-los – começou a explicar Natassia.

— Sim, até aí, é o que todos nós sabemos – interrompeu Itsuki. – Mas até hoje ninguém sabe por que esses monstros surgem, e por quanto tempo isso vai continuar. Nem mesmo dá pra dizer se essa suposta Guerra Santa pela qual a gente vem se preparando vai realmente acontecer, ou contra quem vai ser.

— É aí que você se engana – disse Natassia, depois de soltar uma risadinha, como quem estava prestes a contar um segredo. – Em uma das vezes que eu saí sozinha procurando o Hyoga pelo mundo, eu descobri que tem um cara por trás da ressurreição desses monstros – pela primeira vez, Itsuki começou a prestar bastante atenção no que Natassia iria dizer. – Foi nas montanhas dos Bálcãs. Eu tive um pressentimento que um monstro estava prestes a renascer, então eu segui o cosmo dele, quando eu me deparei com um encapuzado dando vida à um dragão.

— Você está falando de um homem? Criando um dragão? – questionou incrédula.

— Sim! Ele estava dando forma ao dragão no ar, com as próprias mãos... É difícil de explicar.

— E aí? O que aconteceu? – perguntou, ansiosa.

— Ah... Depois disso eu não lembro! – confessou, embaraçada.

— Ah! Você tá me zoando – revoltou-se Itsuki, tentando não dar mais atenção para as bobagens de Natássia.

— Não! Eu to falando sério – insistiu, balançando Itsuki pelo braço. – Eu só lembro de acordar depois, com o Malik cuidando dos meus ferimentos. O dragão já estava destruído, e o encapuzado não estava mais lá.

— E mais alguém viu esse cara?

— Não. Quando o Malik chegou, ele já tinha ido embora. Mas o Malik me confessou que esse cara existe mesmo, embora não tenham contado para os cavaleiros de ouro quem ele é. Mas é ele que está por trás do surgimento dos monstros, e é ele que os lendários cavaleiros de bronze procuram para tentar impedir a guerra de acontecer. Eu só não descobri ainda o que exatamente estão tentando impedir...

— Como assim?

— O surgimento dos monstros em si não é um grande problema para o Santuário... Digo, é uma encheção de saco, mas não é uma ameaça, entende? É como se ele estivesse espalhando focos de incêndio que temos que correr atrás toda hora para apagar, mas o verdadeiro objetivo dele está escondido por trás dessa cortina de fumaça que o fogo está causando... Isso faz sentido pra você?

Itsuki assentiu. Mas na verdade não tinha certeza sobre o que pensar a respeito. Nunca tinha dado muita importância para a Guerra Santa que estava por vir. Apenas havia aceitado os seus desígnios como amazona: sair em missões para destruir os monstros quando fosse convocada, e procurar Ikki enquanto estivesse livre.

— Mas e aí – retomou Itsuki – quem você acha que é esse cara por trás dos monstros?

— Não é óbvio? – questionou quase rindo. – Só pode ser algum deus dos monstros!

— Você é tapada... – asseverou, indignada, ao que Natassia reagiu rindo.

— Aparentemente, só os cavaleiros lendários sabem quem ele é – disse Natassia, limpando as lágrimas de riso – nem os cavaleiros de ouro sabem. Então deve ser alguém muito forte, até mesmo para um cavaleiro de ouro, para esconderem isso deles. Por isso eu tenho certeza que é algum deus. Só os cavaleiros lendários podem derrotar um deus.

— Eu achei que todos os deuses do Olimpo tivessem entrado em paz com a Terra, após derrotarem Zeus¹ vinte anos atrás.

— Talvez não seja um deus do Olimpo – apostou, com uma piscada de olho. – Ou talvez ele tenha sido expulso. Isso explicaria o porquê dele estar se escondendo pelas sombras da Terra.

— Você não acha mais provável ser só um cara? – questionou, cética. – Sei lá, existem mais pessoas do que deuses por aí. Poderia ser um traidor do Santuário. Não seria a primeira vez que acontece.

— Você tem muita pouca imaginação – reclamou, apertando os olhos.

— Eu só acho que se você tivesse encontrado um deus, você não estaria viva para contar a história – debochou Itsuki.

Natassia não gostou de continuar sendo zoada e, parecendo uma criança contrariada, desistiu da conversa. Mas não deu tempo de se entediarem com a falta de assunto, pois logo chegaram à Casa de Áries. Quando chegaram, Itsuki ficou admirada com a arquitetura robusta.

— Vem logo, vamos atravessar até o outro lado – chamou Natassia.

— Espere, e o cavaleiro que a protege? – preocupou-se Itsuki.

— Ele não está aqui. Ele passa a maior parte do tempo fora, consertando armaduras em um lugar chamado Jamiel.

— Ah, eu não sabia... Natassia, falando nisso, qual foi o mais longe que você já chegou nas 12 casas? O Malik disse que você tenta atravessá-las há um ano.

— Eu? – perguntou retoricamente, como quem ganha tempo para responder – O mais longe que cheguei foi na casa de Gêmeos.

— Quê?! – exclamou sem esconder a decepção. – Então até agora você só conseguiu superar o cavaleiro de Touro?

— Hahahaha, também não – explicou, sem graça – A única vez que eu passei por Touro foi quando ela estava fora.

— Ela?... – questionou, ainda mais decepcionada em saber que Natassia nunca passou por cavaleiro de ouro algum, mas curiosa em saber sobre uma mulher ser a defensora da Casa de Touro.

— Sim, a amazona de touro. Você vai gostar dela.