É só uma coisa implícita escrita por Dani Tsubasa


Capítulo 12
Capítulo 12 - Mistério




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Capítulo 12 - Mistério

                - É sério?

                - Não inventaríamos isso, senhora – Alia respondeu enquanto conversavam em uma das salas de reuniões do palácio.

Todos os móveis do lugar tinham um tom de branco perolado, se destacando nas paredes douradas e no carpete azul marinho do local, incluindo a madeira brilhante das cadeiras e da enorme mesa oval no centro da sala. O teto branco ajudava a refletir melhor a luz do lustre cilíndrico preso no centro do teto. Adornos de acrílico transparente adornavam as laterais da peça, produzindo um desenho semelhante a uma sequência de DNA.

— Com todo respeito – Adam começou, imediatamente atraindo o olhar de Ayesha – Se quer tanto acompanhar o processo, acho que poderia ter esperado um pouco pra dizer isso a ela. Ela podia ter perdido a criança. E podia ter morrido junto.

— E como você sabe disso?

— Ela desmaiou – Alia disse – Entrou em choque nervoso, e desmaiou. Adam disse que ela chorava e gritava de dor.

— Como algo como nervosismo pode causar dor física a tal ponto?

— Não sabemos sobre o caso dela – Adam tornou a falar – Mas o bebê estava se mexendo...

— É possível perceber isso?

— Sim – Alia lhe disse – Fazem isso depois dos primeiros meses.

— Mas era muito mais que o normal. Ela sentia dor a cada movimento e estava com medo de perdê-lo – Adam concluiu.

— Certamente deve doer ser chutado de dentro para fora. É mais uma prova de que nossos métodos de criação são muito mais sofisticados e práticos.

— Não, senhora – Alia disse – Se me permite explicar... Os bebês são muito pequenos, nenhum movimento deles nessas circunstâncias deve doer. É um dos poucos dados que consegui em missões aleatórias que me enviou. Portanto não era normal que ela gritasse de dor.

                - Isso é muito interessante – a sacerdotisa falou com o olhar curioso e perdido por alguns momentos – Poderiam me explicar como ela ainda está viva? – A mulher perguntou como se fosse a questão mais normal do mundo.

                - Ela desmaiou como já lhe dissemos – Adam disse.

                - Eu tomei a liberdade de levar uma das nossas enfermeiras pra vê-la. Não sabíamos o que podia acontecer. Ela disse que o desmaio a salvou do pior. Apesar de nenhum de nós ter qualquer ideia do que aconteceria se o colapso nervoso não tivesse sido interrompido, ela acredita que Gamora poderia ter perdido a criança. E até pior. Houve uma oscilação repentina na pressão sanguínea dela, e isso causou o desmaio, que felizmente interrompeu o descontrole dos nervos.

                - E o que está acontecendo agora?

                - Ela continua dormindo por enquanto. Eu levei um cobertor mais quente pra ela, foi uma sugestão da enfermaria.

— A temperatura dela também oscilou antes de desmaiar – Adam falou.

— Em quanto tempo acha que a criança estará aqui?

                - Três meses se o bebê fosse humano. Mas não sei sobre a espécie dela, pode ser mais, ou menos. Acho que é imprevisível uma vez que temos certeza que o bebê é mestiço.

                - Será interessante deduzir quem pode ser o outro criador – Ayesha falou se referindo ao pai da criança – Embora eu acredite que não há dúvidas sobre isso. Ele parecia um especialista nesse tipo de situação.

                Alia usou todas as suas forças para se impedir de rir e continuar séria nesse momento, e se perguntou se deveriam contar a Ayesha sobre Gamora chamar por Peter Quill em seu delírio. Mas trocando um olhar discreto com Adam, decidiu que não. Por mais que Ayesha estivesse definitivamente interessada em analisar o processo de gestação e nascimento, ela também estava claramente satisfeita com a possibilidade de torturar psicologicamente um dos Guardiões da Galáxia, especialmente se tratando do membro mais brilhante do grupo, que certamente receberia qualquer impacto com mais profundidade. Ninguém sabia sobre isso afinal. Alia não contara nem mesmo para a enfermeira. Ayesha se aproveitaria disso se soubesse, e mesmo não sabendo, Alia sabia que ela provocaria Gamora sobre isso. E as instruções médicas haviam sido claras. Mais um choque e nada estava certo sobre a vida da prisioneira ou da criança, especialmente pela impossibilidade de socorro adequado uma vez que os soberanos não possuíam conhecimento sobre esse tipo de reprodução.

                - Ela falou alguma coisa enquanto estava acordada? – Ayesha quis saber, como se lesse os pensamentos dos dois.

                - Não – Adam respondeu no tom mais convincente de atuação que Alia já vira – Só disse que estava com medo de perder o bebê. Estava delirando quando cheguei lá. Ouvi os gritos antes mesmo de chegar ao corredor da cela dela. Isso foi tudo que ela disse além de gritar e chorar de dor.

                - Isso deve ser adicionado aos relatórios – Ayesha falou.

                - Senhora, se me permite... – Adam começou, temendo uma negação, mas ele precisava tentar – É muito claro que prisioneiros que ficam muito tempo isolados têm nível crescente de estresse. Isso já foi comprovado em experiências passadas em qualquer tipo de encarceramento, seja ou não o nosso. Peço que considere a possibilidade de deixá-la sair por alguns minutos em algum momento do dia, pelo menos até o jardim do centro da prisão. As instruções médicas foram claras. Mais um choque e não sabemos o que pode acontecer. Se Alia estiver certa, faltam apenas três meses para concluir a coleta de informações que deseja. E acho que é óbvio que será mais eficaz se ela estiver viva pra isso.

                - O que aconteceu na última noite pode afetar o nascimento?

                - Não sabemos – Alia respondeu – A enfermeira nos disse que se ela não se recuperar bem, é provável que sim. E que deve ficar em repouso o máximo possível nos próximos dias.

                - Isso não será um problema para ela, obviamente – A rainha falou, num raro momento de sarcasmo – Mas dar tamanha liberdade a prisioneiros pode deixá-los mais ousados do que devem.

                - Ela está grávida, e agora debilitada. Além de não conhecer os caminhos do palácio, e muito menos da prisão. Ela seria recapturada antes que chegasse à saída da ala prisional.

                - Ela teve muito tempo pra pensar numa fuga enquanto o bebê era menor e ela menos limitada. Não acho que o arriscaria agora. Parece ser o que ela tem de mais importante em todo o universo – Alia complementou.

                Ayesha ficou tantos minutos em silêncio que os dois quase chegaram a pensar que a sacerdotisa desenvolvera a capacidade de dormir de olhos abertos.

                - Isso pode ser usado a nosso favor – ela falou repentinamente, quase assustando os dois.

                - De que maneira isso funcionaria? – Alia questionou.

                - Muita conversa com prisioneiros está na nossa lista de riscos em potencial. Mas aparentemente ela confia em você – falou para Adam – Pode ser capaz de descobrir dados que ainda não temos. Ou como isso irá acontecer. E do que ela pode precisar quando a criança chegar.

                - Não sei se ela diria tanto. Parece algo extremamente pessoal – Adam respondeu.

                - É algo comum para as outras espécies inferiores a nossa. Não vejo como isso pode ser algo tão pessoal. Incontáveis seres no universo aparentemente nascem dessa forma. E ela não passa de uma prisioneira. Não há razões para lhe dar privilégios. Essa é sua nova missão. Trabalhe nisso, e o deixo livre para levá-la durante meia hora, dois dias por semana, ao jardim central da ala prisional, no horário em que você achar mais conveniente, ou quando ela não estiver em repouso como ordenam as instruções da enfermaria.

                Adam não soube o que responder de imediato, sentindo seus próprios princípios se chocarem com as ideias de Ayesha. Mas isso é o melhor que ele teria dela. Então sorriu o melhor que pode para sua líder.

                - Sinceramente eu agradeço, suma sacerdotisa. Farei o possível.

                - Alia... – ela falou com outro olhar distante, como se lembrasse de algo – Acredito que você relatou certa vez ter visto um recém nascido.

                - Sim, senhora. Mas não tive a chance de vê-lo de muito perto. E estava envolto num cobertor nos braços da mãe. Eu apenas o vi de longe. São completamente dependentes no início da vida.

                - A que ponto?

                - Aparentemente não sabem falar quando nascem. É tudo que sei.

                - Essa é uma informação importante. E mais uma boa razão para continuarmos nossas tradições.

                - Senhora... Os Guardiões... Estão mesmo... mortos?

                - Se não estiverem, ninguém aqui precisa saber.

                - Alguns dos nossos viram cartazes da Tropa Nova em alguns planetas. Estão até mesmo oferecendo uma recompensa.

                - Não podem saber que estamos com ela.  Nosso sistema anti-rastreamento tem qualidade suficiente para bloquear até mesmo os mais potentes rastreadores da galáxia. Nossas naves e planetas aliados também os têm.

                - Devo considerar a Tropa Nova como parte de minha missão original?

                - Eles não costumam interferir em assuntos pessoais. E seria prudente não nos envolvermos com qualquer autoridade de outros planetas. Mas considere estar pronto para tirá-los do seu caminho se for repentinamente necessário. E sem lhes causar danos se possível.

                Adam assentiu.

— Vocês estão dispensados.

Os dois fizeram uma breve reverência e saíram da sala, deixando Ayesha sozinha com seus pensamentos e questionamento pessoais sobre o que quer que fosse.

******

Gamora passou as semanas seguintes tentando não se desgastar, e descansar tanto quanto possível. Com o passar dos dias sua fraqueza rapidamente diminuiu, sinal de que a gravidez não estava afetando suas melhorias cibernéticas ou sua cura acelerada. Duas semanas depois ela voltou a fazer pequenos exercícios dentro da cela quando estava sozinha, isso ajudaria seu corpo a ter mais flexibilidade quando o momento chegasse. Treinar quase que diariamente sempre fora uma rotina para ela, antes e depois dos Guardiões, o que tornou mais fácil continuar mesmo com as limitações da gestação e de toda a situação que vivia.

O bebê parecia bem, e ela ficava mais aliviada a cada dia em que o sentia se mover ou percebia que ele tinha crescido um pouco mais sem que nada fora do comum acontecesse. E não conseguia deixar de pensar que ela já deveria saber muitas coisas sobre seu filho ou filha a essa altura, como o sexo, manias, posições favoritas de dormir, ou mesmo se estava tudo realmente bem com a saúde do pequeno e com a sua própria. Talvez ela e Peter estivessem no céu fazendo mudanças em seu quarto para acomodar o bebê, e se divertindo escolhendo nomes. E Gamora pensava nesse tópico praticamente todos os dias. Não ter crescido com seu povo a deixava sem ideia alguma do que escolher, portanto sua vida com Peter seria a base para escolha. Ela tinha certeza que chamaria uma menina de Meredith. Se Peter estivesse com ela, tinha certeza que esse seria o desejo dele, ela mesma daria a sugestão antes que ele se manifestasse. O nome não era apenas muito importante para ele, era bonito também.

Tinha dúvidas quanto a um menino. Ela poderia chamá-lo de David. Peter ainda admirava o ator, mas se tornara uma lembrança que ele preferia não visitar depois de Ego. Ela também poderia chamá-lo de Kevin, e tinha certeza que Peter gostaria desse. Era uma lembrança doce e importante para os dois, a primeira história de tantas que Peter lhe contara, do primeiro momento em que eles realmente se conectaram, e que, Gamora percebeu depois de negar por meses, a fez se apaixonar por ele, ainda que só tivesse admitido para si mesma quando dançaram em Ego. Lembrar disso trouxe novas lágrimas a seus olhos, e Gamora se permitiu chorar enquanto sentava na cama e acariciava a barriga, sentindo os suaves movimentos de sua conversa silenciosa com o filho. Ela precisava se recuperar bem, e ter outro colapso nervoso não estava em questão, por isso decidira não lutar contra suas emoções por enquanto.

Ela inspirou fundo quando reconheceu os passos de Adam no corredor. Ela o vinha evitando desde aquele dia. Ele e qualquer pessoa que passasse do lado de fora, mesmo sem entrar em sua cela. Sempre tentava dormir, ou fingia fazê-lo quando ele vinha vê-la ou lhe trazer suprimentos. Tentou seu melhor para parar de chorar quando ele anunciou na mesma voz gentil de sempre que estava entrando e deixou comida e água na mesa como tantas vezes antes. Mas seu corpo não obedeceu, e suas lágrimas não pararam de fluir. Gamora desejou que ele fosse embora, ainda que agora soubesse que não parecia da personalidade dele ignorar pessoas tristes.

Ouviu o homem se agachar a sua frente, e soube que ele a olhou com paciência pelos quase dois minutos que ela continuou chorando.

— Você está bem? – Ele perguntou mais uma de tantas vezes quando ela tirou as mãos dos olhos para vê-lo.

Outra vez seu cérebro quase entrou em curto circuito. Adam quase não parecia um soberano em momentos como esse. Apenas sua cor denunciava isso. Ele tinha um olhar muito mais humano do que qualquer um dos outros que Gamora conhecera, mais até do que Alia, que Gamora julgava como sendo a única soberana com algum senso de humanidade que ela conhecia, e que também tinha um olhar muito mais pacífico e gentil do que os outros.

— Sente algum dor? – Adam insistiu em perguntar.

Gamora apenas negou com a cabeça, e ele continuou olhando-a com preocupação por alguns instantes antes de levantar. Ela achou que finalmente ele iria embora, e não estava preparada para o que ele disse a seguir.

— Depois que você se alimentar, se você quiser... Há um lugar que eu gostaria de lhe mostrar.

Ela inclinou ligeiramente a cabeça, literalmente não entendendo a sugestão dele.

— A enfermeira que ajudou você quando desmaiou disse que se aquilo acontecer de novo, pode realmente fazer mal a você e à criança, e que seria aconselhável tentar manter você mais tranquila. A suma sacerdotisa Ayesha me autorizou a deixá-la ficar alguns minutos no jardim central da ala prisional, dois dias por semana, a qualquer horário que for possível.

— Eu não preciso da piedade de sua sacerdotisa – falou baixo enquanto secava os olhos.

— Gamora... Você não tem ideia do quanto e de por quanto tempo eu precisei insistir e argumentar pra conseguir permissão. Alia também ajudou. Vai fazer bem a vocês dois.

Gamora refletiu. Adam parecia bom demais para compactuar com as intenções duvidosas de Ayesha, ela poderia o estar usando para coletar dados sobre sua gravidez. Ou talvez Adam fosse um ator estupidamente bom, o que Gamora duvidava. Os anos com Thanos a ensinaram bem a reconhecer cada micro expressão das pessoas que denunciasse maldade ou mentira. Nem sempre ela conseguia ter certeza de imediato, Ego era a prova disso, mas ela percebeu que havia algo errado com Mantis, e agora tinha certeza que perceberia se houvesse com Adam.

Caminhar pela ala prisional também poderia lhe fornecer dados. Como a prisão funcionava, se as celas podiam ser movidas de lugar sem que os prisioneiros percebessem, se havia níveis, qual era a dinâmica dos guardas, e talvez até mapear o lugar. Ainda era um tiro no escuro se tratando de Ayesha, mas era melhor do que nada.

— Eu vou esperar na porta, lá fora. Não se apresse pra se alimentar ou qualquer outra coisa que precise fazer primeiro. Eu estou livre pelo resto da noite. Você virá? Não encontraremos guardas no percurso se isso a preocupa.

Adam esperou pacientemente enquanto ela pensava por mais alguns segundos.

— Me dê alguns minutos – respondeu finalmente.

Gamora o viu soltar um pequeno suspiro de alívio, ainda não conseguindo processar como alguém que era praticamente um de seus inimigos estava se preocupando com ela. Observou Adam sair como havia prometido e o ouviu se recostar à parede do lado de fora da cela.

Levantou-se e observou o vestido cinza escuro que estava usando. Ia apenas até os joelhos, e as mangas não passavam dos cotovelos. Pegou um agasalho da mesma cor e o vestiu, também colocando uma legging preta, adaptada para sua condição, e suas botas. O lado de fora era frio à noite. Ela conseguiu perceber em algumas vezes que a porta da cela fora aberta e um vento frio soprou. Não tinha conhecimento sobre as estações do planeta dos soberanos, talvez estivessem se aproximando do inverno.

Sentou à mesa e se alimentou enquanto refletia, tentando entender como Ayesha esperava que alguém tão doce como Adam fosse um destruidor. Várias vezes Gamora se perguntou se ele já pensara em trair sua mestra, fosse se recusando a ferir os Guardiões ou a seguir qualquer outra ordem absurda. Mas parecia improvável. Os meses se arrastavam, e ela não via evidências disso, o que a convenceu de que tais pensamentos eram apenas sua cabeça brincando com ela, seu desespero e angústia, ou sua esperança lhe pregando peças.

Após terminar o jantar e tomar algum tempo para usar o banheiro, e depois refletir mais um pouco sobre realmente aceitar ou não a oferta de Adam, Gamora decidiu seguir em frente, e seu orgulho a deixou em dúvida de como deixá-lo ciente de que ela estava pronta para ir. Mas parecendo ler seus pensamentos, ele mesmo abriu levemente a porta para verificá-la quando Gamora já estava de pé diante dela.

— Então você virá? – Ele tornou a perguntar.

Ela assentiu e o seguiu para fora, encarando a porta quando a ouviu ser trancada, e sentindo uma pontada de decepção e tristeza por saber que essa não era uma despedida definitiva daquele lugar. Ela também tinha se perguntado se realmente não havia guardas do lado de fora, para algemá-la ou escoltá-la ao longo do caminho. E tinha certeza que resistiria e recusaria a oferta se essas fossem as condições. Mas outra vez Adam falara a verdade. E se viu o seguindo por entre os corredores cinzentos e metálicos da prisão.

A primeira coisa que Gamora observou é que o lugar realmente tinha níveis, de diferentes tratamentos para os prisioneiros. No corredor à direita do seu ficava o caminho das celas onde ela passara seus primeiros dias ali, que ainda eram capazes de oferecer alguma dignidade aos prisioneiros, apesar de serem mais frias, desconfortáveis, e muito menos privadas. Em outro corredor, mesmo à distância, sua visão aprimorada lhe permitiu identificar celas ainda menores, com uma divisória num canto que deveria ser um banheiro minúsculo. Um bando de pedra também servia como cama. A seguir ela e Adam passaram por celas, à esquerda, que pareciam ser muito mais sofisticadas. Aparentemente não tinham nada de diferente da que ela ocupava agora. Mas sabia que o sistema de segurança nelas era muito mais rígido e até mesmo havia câmeras lá dentro, exceto nos banheiros. Ela sabia porque fora em uma dessas celas que Nebulosa fora mantida anos atrás, uma das coisas que a irmã lhe contou quando seus encontros e conversas se tornaram mais pacíficos e gentis. Gamora também percebeu números em alguns locais da parede, de 1 a 4 de acordo com o tipo de celas. Ela estava agora no setor 3, o que confirmava que o número subia conforme o nível de segurança e a comodidade da célula prisional.

Sua análise foi interrompida quando ela tentava deduzir quais caminhos conduziriam a possíveis saídas do local, e Adam anunciou que estavam no jardim. Gamora levou alguns segundos para voltar à realidade, e olhou o local com atenção. Era uma grande clareira circular no centro da prisão. Seria uma das coisas mais lindas que ela já viu se não fosse pelo local onde se encontrava. Havia grama verde cobrindo boa parte do chão de terra, flores coloridas brotavam em alguns lugares, e algumas pequenas árvores estavam distribuídas perto de bancos dourados espalhados pela clareira. Ela já vira locais assim em vários planetas, incluindo Xandar, e descobrira que os adorava, o que fez Peter começar a procurar locais assim para ir com ela, e tinham criado muitos momentos inesquecíveis assim. Notou que a falta de animais tornava o lugar um pouco estranho, borboletas e pequenos insetos, o que inevitavelmente a fez lembrar de Mantis. Mas a beleza do local ainda era inegável. E era impressionante que um povo tão frio quanto os soberanos fosse capaz de criar algo assim dentro de uma prisão.

— Você quer se sentar? – Adam a tirou de seus pensamentos.

Gamora assentiu e sentou-se no banco mais próximo. Adam sentou no que estava à frente dela.

— Eu tenho ordens pra não deixá-la sozinha. Mas posso me afastar se deixar você mais confortável.

— Não. Está tudo bem.

— Você também pode andar pelo jardim se quiser. Nós temos meia hora.

— Eu farei isso daqui a pouco.

Os dois ficaram em silêncio por vários minutos então. Gamora se sentiu grata por ele deixá-la respirar fora da cela, tanto literal quanto figurativamente. Seus pensamentos se concentraram inicialmente na beleza no lugar, depois nas celas que podia ver em volta e em salas que não sabia do que se tratavam, possivelmente usadas pelos funcionários responsáveis pelo local, e depois para nada em especial, sua mente cansada queria apenas existir por alguns instantes. Acariciou a barriga inconscientemente, já não se importando que Adam observasse os movimentos do bebê com curiosidade, agora que ele já sabia que isso era normal.

— Você tem um nome pra ele?

— Eu ainda não sei se é um menino.

— Nós sempre sabemos. Achei que seria possível assim também.

— É possível. Mas eu mesma não tenho como descobrir até que o momento chegue.

Adam se sentiu incomodado ao lembrar das ordens de Ayesha para investigar. Perguntara isso a Gamora por simples e pura curiosidade, não se sentindo a vontade com a possibilidade de colocar ela ou o bebê em perigo. Esse pensamento o fez se abster de novas perguntas pelo restante do tempo. Eles apenas conversaram ocasionalmente sobre o jardim, e Adam lhe contou como havia alguns soberanos que gostavam de lugares assim, ainda que Ayesha fosse neutra sobre o assunto.

Durante o caminho de volta para a cela, Gamora mapeou mentalmente o lugar pela segunda vez, agora tendo certeza que seria capaz de ir e voltar sozinha a qualquer momento se quisesse e pudesse, e até mesmo por caminhos diferentes. A tristeza nos olhos de Adam ao trancá-la novamente deixou novas interrogações em sua cabeça. E Gamora conseguiu fazer o que vinha se impedindo há meses, mesmo que uma parte dela ainda sentisse raiva por isso.

                - Obrigada – ela lhe disse antes dele partir.

                Adam pareceu visivelmente surpreso ao ouvir, quando já abria a porta para sair, e ficou ali parado a encarando por um momento antes de abrir um sorriso, lhe dar boa noite e ir embora. Gamora não se deixou ficar feliz com essa última gentileza, confiar demais nas pessoas podia ser sua ruína. Ela sabia que isso era parte da lavagem cerebral de Thanos, mas tinha discernimento suficiente para saber que podia estar certa em determinadas situações. Se livrou de suas botas, do casaco e da calça antes de deslizar debaixo das cobertas e apertá-las em torno de si, tentando sentir um pouco do que seria a segurança e o conforto dos braços de Peter em volta dela se ele estivesse ali.


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