Alisei meu vestido de noiva pela milésima vez. A cauda do meu vestido descia pelas minhas costas e pelo chão, dando uma brancura que nublava minha decisão. Estava lá, sozinha.

Quero dizer, claro que meus amigos estavam presentes – contrariados.

Olhei para o relógio e sabia que deveria estar andando pelo tapete que levaria ao meu futuro marido.

Eu sabia. Eu sei, claro.

Porém, fico parada olhando o ponteiro dos segundos andar tão rápido quanto às batidas do meu coração.

— Está atrasada, Mione! Vamos logo! – a voz aflita de Gina fez com que olhasse para ela sem me mover do lugar. Minha expressão ainda impassível. A atenção ao tiquetaquear do relógio.

— Eu já vou, Gina – ela balançou a cabeça negativamente e saiu do quarto que estava reservado para que eu me arrumasse. Fui até uma mesa e me servi de champagne, a taça enchendo lentamente e as bolhas estourando conforme meus pensamentos.

— Hermione?

Não olhei imediatamente para ele. Bebi um gole antes de fita-lo e senti um aperto no meu coração. Sempre sentiria esse aperto? Essa angústia? O peso da escolha que fiz ao dizer “não”?

— Posso levar você daqui. Podemos fugir – ele entrou, fechando a porta e se aproximou de mim.

— Fugir? – sorri antes de sorver outro gole. Aquela não era uma má escolha. Fugir com Rony e mandar todos os outros à merda.

— Podemos tentar novamente, corrigir onde erramos – sorri. Como não sorrir diante dele?

— Não posso, Ron. Não seria justo com nenhum de nós, não acha?

Terminei a taça e enchi novamente. Olhei para meu reflexo no espelho, sem realmente ver o que estava refletido. Eu via a Hermione de 20 anos, recém saída de uma guerra, equilibrando pesos inimagináveis.  

Ron abraçou-a e a pegou no colo, girando-a pelo quarto. Os dois estavam levemente embriagados. Caíram juntos na cama, riam.

— Mione, – Ron controlou a respiração, ficou sério – Eu te amo.

— Eu também. Estamos juntos, casados... Amanhã vamos partir em lua-de-mel e nossa vida será de completa felicidade.

Beijaram-se, entregues ao amor.

Encarei novamente o espelho, lembrando-me que não tinha mais 20 anos. Agora havia pequenas rugas ao redor de meus olhos. Não costumava ceder aos caprichos de Draco Malfoy, mas cedi àquele e por isso encontrava-me ali, vestida de noiva.

— Ron, preciso ficar sozinha alguns minutos.

— Você não teve dúvidas, teve? Ao se casar comigo? – ele aproximou-se ainda mais, eu sentia o perfume dele. Ronald tornara-se um homem bonito e confiante. Quem não amadurecera depois de tudo que passamos quando crianças?

— Não, não tive – eu quis emendar que aquilo não significava merda nenhuma, afinal estávamos divorciados. Só que eu não esperava que a dúvida em dizer “sim” para Draco fosse tão paralisante como naquele momento.

  - Acha mesmo que está dando certo?

— Somos nós, Hermione. Temos tropeços, falhas... Somos assim desde os 11 anos! Não vou assinar porra nenhuma de divórcio.

Hermione olhou na direção da escada, como se a discussão entre eles pudesse ser ouvida pelos filhos. Nada como bons feitiços silenciadores.

— Não ficarei longe deles. Eu amo vocês.

— Quem está se divorciando somos nós, você não precisa se afastar deles. Não quero isso.

— Você não me quer mais.

Era uma afirmação. As discussões entre os dois aconteciam com mais frequência, geralmente por detalhes que ganhavam escalas estratosféricas.

— O que tivemos é muito especial para ficar manchado. Vamos acabar agora enquanto ainda há respeito entre nós. Sabe tanto quanto eu que nosso relacionamento está se tornando tóxico.

Ron jogou-se no sofá, repousou os cotovelos sobre as coxas e deixou a cabeça pender nas mãos. Hermione sentiu os olhos lacrimejarem.

Ron levantou-se e andou até ela, também com os olhos cheios de lágrimas.

— Não há nada que eu possa fazer?

— Eu estou me sentindo presa, Ron. Sinto que tudo que faço é simplesmente para te agradar, para evitar uma briga. Isso tudo fica borbulhando dentro de mim e, quando percebo, estamos brigando por coisas tolas. Não precisamos disso. Nossos filhos não precisam disso.

Ouvir Hermione dize aquelas palavras feriu Ronald. Ela estava sendo sincera, porém sentiu-se ferido. Sua esposa, a mulher que amou desde que podia se lembrar, sentia-se presa ao seu lado.

— Vou dormir fora. Estarei aqui amanhã cedo para tomar o café com vocês.

— Siga sua vida, Ron – eu disse – Sei que está aqui por causa de Rose e Hugo. Por eles deve encontrar um jeito de ser feliz. Plenamente feliz. Preciso ficar sozinha, por favor.

Ele concordou, mas eu conhecia Rony muito bem para saber que ainda não tinha superado o nosso divórcio. Ainda apegado ao nosso passado, ao nosso amor. Senti quando ele depositou um beijo na minha têmpora.

Observei-o se afastar e sair. Fiquei novamente com o tique-taque do relógio.

— É um pedido inusitado, Malfoy.

— Pode me ajudar ou não?

Hermione ficou em silêncio, um sorriso no rosto analisando a expressão tensa do homem à sua frente. Lembrava-lhe muito o jovem que chegou desesperado por ajuda na época da guerra.

— Do que precisa exatamente?

— Ano que vem nossos filhos entram em Hogwarts. Você tem uma menina da idade de Scorpius, não é? – Hermione assentiu – Ele estará longe, morando no castelo e eu...

— Você chegou aqui e disse: preciso da sua ajuda com meu filho. Do que precisa exatamente? – repetiu-se.

— Porra, Granger. É difícil - ele coçou a nuca – Não tem nada alcóolico aqui?

— Estamos no ministério. Então, não, não tenho álcool na minha sala.

— Minha mulher morreu muito jovem – aquilo fez Hermione ficar séria – Meu foco desde então foi que nada faltasse para meu filho. Scorpius sempre foi minha prioridade – a auror ficou em silêncio – Não quero que ele parta achando que não pode contar comigo.

— Malfoy, tenho certeza que seu filho sabe que...

— Não sabe – Draco a interrompeu – Eu não tive um exemplo saudável de criação. Observei vocês com seus filhos em Hogsmeade e quero.... Quero algo assim com Scorpius.

— Algo como, Malfoy?

— Leve. Verdadeiro. Quero que ele saiba o quanto eu o amo.

Hermione sentiu o corpo todo reagir diante das palavras, do desabafo de Draco Malfoy.

— Não sei se posso ensinar isso.

— Não há nada que Hermione Granger não possa ensinar.

E agora estava ali.

A porta se abriu e ver Draco fez todos os pelos de seu corpo arrepiarem ao mesmo tempo. Sentiu como se estive no ponto mais alto da montanha-russa, os segundos de espera... e a descida.

— O que está acontecendo? Está pensando em desistir?

— Ver a noiva antes do casamento dá azar – eu disse, segurava a taça vazia. Draco não disse nada, foi até perto de mim, aqueles milímetros de distância. Pegou a taça da minha mão, encheu-a e me entregou.

— Azar? Já superamos muitas barreiras. Não é a merda de uma superstição que vai estragar nossa relação. Ainda não respondeu minhas perguntas.

— Já pensou se é uma escolha errada? O que estamos fazendo?

— Sim, claro que sim, Hermione. Sabe que não tive mais ninguém depois de Astória. Você entrou na minha vida e na vida do meu filho para ficar. Por isso estamos aqui. Por isso estou aqui.

— Eu te amo, Draco.

Ele sorriu. O sorriso dele era daqueles que tirava qualquer medo que eu sentia, que fazia eu me sentir completa, que fazia tudo, absolutamente tudo valer a pena.

— Eu também te amo. Acha que sou a escolha errada? – ele contornou meu rosto com delicadeza, fechei os olhos, a taça foi retirada da minha mão. Senti a respiração dele sobre meu rosto enquanto eu havia esquecido de puxar o ar.

— Draco...

— Cadê sua coragem, Hermione? Somos nós, juntando nossas vidas, nossos filhos. Dê o próximo passo comigo. Aceite ser minha esposa. Atravesse aquele tapete, mostre para todos sua escolha. Nossa escolha.

Não abri os olhos naquele momento. Nossos lábios se uniram.

Eu atravessei aquele tapete e toda a minha vida ao lado de Draco Malfoy.