Maresia escrita por Cinderela Modernizada


Capítulo 14
Capítulo 14


Notas iniciais do capítulo

A beleza só importa nos primeiros 15 minutos. Depois você tem que ter algo a mais pra oferecer. - Desconhecido.



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 Não vi os irmãos Cross pelo resto da semana. Não queria que ficassem saturados da minha presença tão rápido. Tudo tinha que acontecer de uma forma tão perfeita que não havia espaços para erros ou atitudes impensadas, por isso só voltei ao jogo no sábado de manhã. A mãe deles faria a apresentação de sua candidatura a prefeitura da cidade em um brunch apenas para convidados no clube.

Tive que ligar para a Anabela e pedir para que ela hackeasse a lista de convidados do clube e colocasse meu nome, o que não tinha sido tão complicado assim.

O clube "Água de coco" era um daqueles lugares super chiques que pessoas podres de ricas morriam e faziam de tudo para serem convidadas a se tornarem sócias e pagar uma quantia absurda como “contribuição”. Era o local perfeito para Daniela Cross, a mãe do Castiel e da Callie, comunicar sobre a sua candidatura que já era esperada.

Enquanto Carlos Cross se empenhava arduamente na empresa império da família, Daniela já tinha seguido para o ramo da política, angariando fundos, fazendo programas sociais, reunindo eleitores e coisas diplomáticas. Ela começou por baixo, foi eleita vereadora na última eleição, mas todos sabiam que seria candidata a prefeita logo menos.

Cheguei na recepção na hora do convite que eu não tinha, dei meu nome na entrada e a moça me deixou entrar, me oferecendo seu sorriso mais educado, que eu retribui tentando disfarçar o quanto estava nervosa e com medo de ser barrada, mas Anabela era incrível na área dela, eu sabia que podia contar.

O salão estava impecavelmente decorado de branco, dourado e azul claro, as cores da campanha da Daniela e, coincidentemente, da empresa Cross. 

Garçons vestindo roupas sociais e de gravatas azuis andavam de um lado para o outro servindo mimosas e champanhes para senhoras bem vestidas e elegantes. Quando fui me arrumar, tinha ficado um pouco insegura de como me vestir: pegaria mal vir com um vestido de verão? Ou eu tinha que usar uma coisa mais séria e adulta? O que seria exatamente uma coisa adulta Uma roupa muito formal seria o certo? Merda, cadê o Klaus quando se precisa dele?

Me senti bem confortável ao ver que não tinha errado ao vestir um conjunto de saia longa de tecido e de cintura alta solta em estampas azul e branco e um croped de mangas longas azul com listras brancas. (X). Sentei em uma das cadeiras brancas dispostas em filas e tentei ao máximo não chamar atenção naquele primeiro momento, mesmo não deixando de sentir olhares curiosos em cima de mim.

Daniela subiu no palanque minutos depois, acompanhada de seus dois filhos. Logo percebo a imagem que ela quer vender: mãe de família, progressista, voltada às mulheres. Ok, era uma boa jogada. 

Ela vestia um terninho bem cortado e claramente de grife em um azul tão clarinho que quase chegava a ser branco. A cor deixava seus olhos verdes-claros bem vívidos. O cabelo castanho claro quase em um tom de mel estava soltos e com uma fivela de pérolas prendendo uma pequena parte. Pele bem cuidada e nada bronzeada, como se nem morasse aqui. Lábios finos e pintados de rosa bem “mãe”, brincos de pérolas brancas que combinavam com o colar.

 Ela tinha realmente entrado na personagem.

 - Bom Dia, é uma honra ter vocês como meus convidados! – Daniela disse ao microfone, com Callie de um lado e Castiel do outro. Ela tinha uma voz calma e que marcava sua presença, aveludada e com uma dicção de dar inveja. – Como mulher, eu sei por quais lutas tivemos que passar para que hoje eu pudesse estar aqui em cima desse palanque e  para abertamente declarar minha candidatura como prefeita. – Uma salva de palmas ecoou e ela deu um sorriso cordial. – E é por isso que quero continuar no meu trajeto de igualar as condições ... – E pelos quarenta minutos seguintes ela fez um discurso inspirador sobre feminismo, lutas sociais, igualdade salarial e força feminina. 

Quando terminou, várias pessoas aplaudiram de pé, inclusive eu. 

            Depois de agradecer mais algumas centenas de vezes, ela e os seus filhos foram para uma sessão de fotos, apertos de mãos e essas coisas de política. Já eu fui direto ao bar fingir pegar uma bebida e ficar bem na zona visível de um certo loiro de olhos azuis.

 - Achei mesmo que tinha te visto. – Callie disse se aproximando com um sorriso gigantesco. 

Merda, olhos azuis errados.

 - Oi! –  A cumprimentei com um abraço rápido. 

 - Não sabia que se interessava por política. – Ela me olhou com curiosidade.

 - Bom, mais ou menos. Minha empresa está procurando um candidato para financiar e achei melhor considerar as opções pessoalmente. – Expliquei, ditando o discurso que eu tinha gravado. 

Ela assentiu, caindo direitinho.

 - Parece meu irmão falando. – Ela revirou dramaticamente os olhos. 

 - Quer uma bebida? – Perguntei enquanto pegava a mimosa que o garçom me entregou.

 - Não. Minha mãe disse que se me ver bebendo me deserda. 

 - Manter as aparências? – Callie fez que sim com a cabeça.

 - É disso que vivemos! – Sua voz saiu amarga.

 - Calliope? Não vai me apresentar sua amiga? – Daniela perguntou se aproximando de nós com um sorriso pregado na cara e olhos curiosos em cima de mim. 

Castiel estava ao seu lado e trocamos um olhar rápido.

 - Deus me ajude. - Callie murmurou antes se virar com um sorriso para a mãe. - Merlia, essa é minha mãe. Sabe? A mulher que tá dando esse brunch? A candidata a prefeita? Com fotos nos banners? – Ela disse sarcasticamente e eu segurei um sorriso da cara feia que a mãe dela fez. – Mãe, essa é a Merlia, uma amiga.

 - Seu discurso foi incrível! – Disse ao nos cumprimentarmos com um aperto de mão. Pelo sorriso que Daniela deu, percebi que ela gostava de elogios.

 - Aquilo? Escrevi de última hora! – Respondeu modestamente, dando de ombros. – Bom saber que Callie tem amigas interessadas em política e nas questões sociais de nossa comunidade. – Callie revirou os olhos para mim e deu um sorriso quando a mãe a olhou, disfarçando bem na hora.

 - Na verdade, eu vim mais a negócios. – Impressão minha ou tinha cativado o interesse da mamãe Cross? – Minha empresa acha uma boa ideia patrocinar algum candidato. Questão de imagem, sabe como é.

 - Tudo não gira ao redor de como somos vistos? – Sra. Cross perguntou bem mais amigável depois de ouvir a palavra “patrocínio”.

 - Senhora Cross? – Uma garota de terninho preto segurando uma prancheta se aproximou de nós. – Precisamos tirar mais algumas fotos para as redes sociais, tudo bem? – A garota morena olhava para o Castiel de maneira furtiva e depois desviava o olhar quando achava que ele iria olhá-la. 

Espera aí, ela estava corando? Quem em sã consciência corava em pleno 2020?

— O dever me chama. – Daniela disse com um sorriso que não saía da sua boca. – Callie, vem comigo. – Ordenou.

 - Que manhã maravilhosa de sábado! – Callie diz antes de dar uma voltinha e seguir a mãe obedientemente. 

 - Agora você se tornou a amiga da Callie que minha mãe mais gosta. Parabéns. – Castiel diz quando ficamos sozinhos. Ele se apoia no balcão e pede um uísque ao garço apenas com um gesto. 

 - Você não tem aquela regra de não beber igual a Callie? – Pergunto, me virando para olhá-lo negar com a cabeça.

 - Minha mãe proíbe a Callie de beber porque ela não sabe parar. É mais por garantia. - Explicou.

 - E para manter a imagem de caçula intocável? - Deduzo logo. 

 - Você é esperta! – Ele diz dando um sorriso para minha descoberta.

 - E sua mãe sabe que você e a assistente dela dormem juntos? – Perguntei levantando a sobrancelha e bebendo um gole da minha mimosa enquanto ele me lança um olhar enigmático.

— Esperta até demais! – Rebate, pegando o copo que o garçom lhe entrega.

 - Pelo jeito que ela te olhou? Com toda certeza já te viu pelado! – Ele dá uma gargalhada alta, atraindo a atenção de uma senhoras do outro lado do bar.

 - Como que você viu isso tudo? Por acaso é espiã ou algo do tipo? – Perguntou fazendo graça, mal sabendo que tinha acertado em cheio.

 - Sim, fui contratada para vigiar a sua família. – Digo de forma séria e ele não acredita nadinha, rindo em seguida.

 - E é dormimos, no passado. – Franzo a testa, perdida. – A secretária e eu.

 - Não tem medo de ela colocar sua pior foto no Instagram da campanha ou algo assim? 

 - É bem possível. – Diz, parecendo ponderar sobre o assunto. – Eu não sabia que você tinha uma empresa. – Comenta casualmente.

 - Tem muita coisa que você não sabe sobre mim Castiel. – Digo o olhando e levantando a taça em sua direção antes de beber um gole do suco de laranja com champanhe. – Não nos conhecemos. 

 - Você é sem rodeios, não é? – Dou o meu melhor sorriso, dando de ombros. – Gosto disso.

 - Seu pai não devia estar aqui para completar a família perfeita? – Perguntei sabendo que era uma pergunta meio arriscada.

            Voltamos nossa atenção à Callie e sua mãe que estavam posando sorridentes para uma câmera. Fazendo aquelas poses de mãe e filha que vemos em books. Tá ridículo que nem acreditava que estava acontecendo. 

 - Ele não curte muito essa coisa. – Castiel disse antes de beber o resto do uísque em um único gole. – Bom, nem nós, mas ele não é obrigado a vir. – Completou com um sorriso ácido. 

— Elas estão olhando para cá. – Disse vendo que a fotógrafa estava pronta para vir até nós.

— Merda. Confia em mim? – Perguntou se virando para mim, me estendendo a mão. 

Olhei para a mão estendida na minha frente e depois para seus olhos para só depois responder.

 - Muito pouco? – Mas lhe dei a mão mesmo assim. Castiel deu um sorriso e me arrastou para fora do salão em passos rápidos. – Onde estamos indo? – Perguntei tentando segui-lo pelo clube com os saltos altos que não foram feitos para correr, me sentindo um adolescente fugindo dos pais com o namorado proibido. 

Mas tinha dois poréns: (1) - eu não era uma adolescente; (2) - Castiel não era meu namorado. 

 - Nos conhecer. – Respondeu enigmaticamente, só parando de andar rápido quando chegamos na praia.

            Já disse que tudo aqui fica de frente à praia? Qualquer lugar parece que tem o mar como fundo de quintal.

 - Acho melhor tirar os sapatos. – Comentou enquanto tirava os mocassins que calçava.

 - Por que não me sinto muito confiante com esse plano seu? – E mesmo assim me apoiei em uma das cadeiras de praia do clube e tirei minhas sandálias.

 - Só vamos andar pela praia. – Ele diz inocentemente e entendo o porquê das meninas se jogarem em cima dele.

 Aqueles malditos olhos azuis.

            E é isso que fazemos pelos dez minuto seguintes. Andamos pela praia descalços, um do lado do outro, conversando sobre algumas coisas e também sobrenada. Contei sobre a história falsa da morte dos meus pais, de como o barco estava sumido e que eu nunca enterrei os corpos. Não parecia alguma coisa tirada de filme? Dessa vez eu tinha até conseguido fazer algumas lágrimas saírem. 

 - E faz quanto tempo? – Castiel perguntou enquanto se sentava na areia da praia.

            Por um minuto, fico apavorada e não consigo lembrar da data da morte dos meus pais. Meu Deus, que tipo de filha esquece essa informação?

 - Tempo o bastante para me sentir sozinha. – Isso! Boa Merlia!

            Me sento ao seu lado, não me importando em estragar a roupa de grife com a areia úmida da praia. 

 - Sabe o que é o mais difícil? – Pergunto olhando para o mar e suas ondas indo e vindo. – Que todas as coisas te fazem lembrar deles. De algum cheiro, de algum momento que você vive e queria contar, de uma experiência que viveu e queria detalhar. – E aquela sensação era verdadeira. 

Eu sempre tinha sido muito próxima dos meus pais e depois de mergulhar com a Callie, a coisa que eu mais queria era contar para eles em como eu tinha me sentido. Eu sabia que minha mãe iria surtar quando soubesse que eu tinha feito aquilo, mas mesmo assim, até do surto dela eu sentia falta.

 - Vocês se davam bem, né? – Ele perguntou e eu assenti, ainda olhando para o mar. 

 - Não tinha segredos entre nós. – Dei um sorriso. – Quando dei meu primeiro beijo, a primeira pessoa a saber foi meu pai. – Castiel me olhou com a sobrancelha levantada. – Ele não gostou muito da ideia de me ver beijando alguém e disse que eu estava muito nova. – O sorriso se desfez do meu rosto quando me dei conta que já estava a uma semana longe de casa e que morria de saudades. – Eu sinto saudades. – Comentei baixinho. – Mas e você e seus pais? Dão certo? – Perguntei tentando mudar o foco daquela conversa e foi a vez do Castiel olhar sem rumo para o mar.

 - O básico. – Respondeu depois de alguns segundos de silêncio, dando um longo e cansado suspiro. – Meu pai não é muito de conversa e está sempre trabalhando. Acho que foi até por isso que minha mãe entrou para a política, para ter alguma coisa para fazer ao invés de ficar em casa esperando ele chegar. – Comentou amargamente.

 - Eles formam um casal bem bonito. – Podiam não se gostar ou amarem um ao outro, mas pelas fotos, pareciam um daqueles casais de revistas.

 - Eu não acredito que se amem. – Ele deixa escapar e levemente se assusta com a confissão. – Acho que em algum momento da vida se amaram, mas não mais agora. – Acrescenta. – Acho que agora é só para manter as aparências e por comodidade. 

 - Eu sinto muito de ouvir isso. – Digo de forma genuína. Não há coisa pior do que crescer em uma casa sem amor. 

 - Já estou acostumado. – Ele diz dando de ombros, tentando mostrar que não se importa, mas não me convence.

            Castiel se levanta e para na minha frente, me estende a mão e me ajuda a levantar.

 - Você me surpreendeu, sabe. – Comentei batendo as mãos na saia para tentar tirar um pouco da areia.

 - Por quê? – Perguntou prestando atenção no que eu estava fazendo.

— Achei que você era um daqueles riquinhos mimados que não sabem ouvir um não. – Nossos olhos se encontraram e ele abriu um sorriso de diversão.

 - E eu achei que você era fútil. – Levantei a sobrancelha.

 - E quem disse que não sou? – Rebati.

 - Uma garota que sentou na areia com uma roupa de grife sem reclamar? – Perguntou com a sobrancelha levantada. – Normal você não é. – Dei uma risada.

 - Vou considerar isso como um elogio. 

 - E é. – Confirmou assentindo. 

— Sua mãe não vai surtar quando ver que você fugiu do brunch? – Perguntei ao voltarmos a andar em rumo ao clube.

— Completamente! – Castiel enfiou as mãos nos bolsos da calça de brim de forma despreocupada, quase como se estivesse gostando de quebrar as regras. – Mas valeu a pena. –E ele me olhou furtivamente com um sorriso matreiro nos lábios.

 - Já sei quem você parece! – Disse como se tivesse tido um colapso, o assustando. – Desde que eu te vi achei que você era parecido com alguém! – Disse animada ao finalmente descobrir.

Sabe quando você assiste um filme de animação e tenta descobrir de quem é a voz que está dublando? Você sabe que já a ouviu, mas não consegue lembrar de onde, até que... Bum! Lembra. 

 - Como é? – Castiel perguntou, parando de andar e me olhando como se eu tivesse problema mental.

 - O José Bezerra, de Enrolados? Só que loiro! – Ele franziu a testa e deitou a cabeça. – Você não tem a mínima ideia de quem eu tô falando, não é? – Perguntei já sabendo a resposta. – Depois assiste e me fala. – Disse andando e passando na sua frente.

 - Eu pareço um personagem de filme? – Perguntou me seguindo. – Ele é bonitão? 

 - Assiste o filme. – Respondi dando uma risada.

 - E forte? Ele é forte? – Continuou a perguntar de forma brincalhona. – Ele salva alguém? 

 - Agora tá parecendo o burro do Shrek perguntando toda hora se já chegou.

 - Você só tem referência de filme de criança?! – Ele protestou e eu dei gargalhada.

 - Agora só precisamos achar o seu dragão! – Continuei a implicar e não vi a hora que ele me pegou pelas pernas e me colocou nos ombros, de cabeça para baixo. – Castiel!

— Vamos ver quem se acha engraçada agora! – Ele disse deixando seus sapatos caírem na areia e andando em direção ao mar.

 - Você não vai fazer o que eu acho que vai fazer! – Disse não me segurando de rir enquanto via, ainda de cabeça para baixo, seus pés começarem a ser molhados pela água salgada.

 - Bem que você queria que eu fosse o Burro do Shrek agora. – Segurei meu cabelo para que não molhasse enquanto ele ia entrando cada vez mais na água, pouco se importando que estava ficando totalmente molhado.

 - Me desculpa, você não é o burro! – Falei com a voz entrecortada, ficar de cabeça para baixo nos deixa sem ar. Ele parou de andar. – É o Shrek! – Disse entre gargalhas e ele me jogou com tudo na água, me fazendo afundar no mar gelado e salgado. Quando voltei a superfície, ele estava dando gargalhadas. – Você assinou sua sentença de morte rapaz! – Avisei ameaçadoramente enquanto usava minhas mãos como concha para jogar água nele. 

 - Isso é guerra? – Perguntou enquanto eu tentava não fazer minha saia flutuar ou subir com a água.

 - Você que começou! – Disse dando de ombros.

 - Isso é guerra! – E foi o que bastou para que nós jogássemos água um no outro, tentando defender dos ataques e correndo pela orla totalmente ensopados como duas crianças.


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