A cabeça de Piper doía de tanto pensar. Sabia que não cabia à ela resolver os problemas do time de basquete, mas a vitória deles iria interferir não só na sua vida, mas também na de todos na escola Half-Blood. Enquanto os alunos da Jupiter School  apenas queriam ganhar o campeonato, os alunos da Half-Blood precisavam ganhar aquele campeonato para receberem o prêmio, que era uma grande quantia monetária. Era isso ou a escola seria fechada por dívidas bancárias e falta de infraestrutura. 

Tudo ia bem até o começo daquela semana. O time de basquete da escola tinha chegado na final e essa notícia tinha alegrado todos da escola, mas aquele entusiasmo durou pouco. 

Na segunda-feira, um dos jogadores do time – Will – quebrou o tornozelo durante o treino. Nico, outro jogador do time, tentou ajudá-lo a ir para a enfermaria, mas acabou caindo e quebrando o pulso. Na terça e na quarta-feira choveu a tarde inteira, e como a quadra da escola não era coberta, os garotos não conseguiram treinar. Na quinta-feira, um dos jogadores se envolveu numa briga de rua e teve o braço quebrado. E para fechar com chave de ouro, o capitão do time chegou em casa apressado, fugindo de uma chuva de final de tarde, e tropeçou no tapete do corredor, caindo sobre a mesa de centro, feita de vidro. Quinze pontos na coxa e restrição de qualquer esforço físico até a cicatrização. O único garoto da equipe principal que não tinha se machucado naquela semana era Luke. Os sete da equipe reserva tinham sido escolhidos apenas por obrigação para preencher todos os requisitos do campeonato, porque: Paulo era brasileiro e ninguém do time entendia o que ele dizia sem que houvesse muitas gesticulações; Clovis perderia uma corrida para uma tartaruga aleijada; Travis e Connor não levavam nada a sério; Chris Rodrigues era um jogador bom, mas às vezes, do nada, parecia estar dormindo em pé; Charles Beckendorf era um jogador extremamente bom, mas tinha uma tendência a ser fominha; e por último, Pólux, nem um pouco confiável por causa do seu problema com alcoolismo. Resumindo, a vitória da Half-Blood estava de atestado.

Piper já tinha lido e relido o edital do concurso diversas vezes, mas não tinha nenhuma brecha que desse algum benefício ao time da Half-Blood por causa de todos aqueles ferimentos. A mãe de Annabeth, a namorada de Percy, era advogada e estava tentando negociar uma nova data para a final do campeonato, deixando bem claro todos os problemas da equipe e da escola, mas nada era certo. 

Leo teve que chamá-la duas vezes para que ela escutasse. O garoto estava sentado no sofá, segurando o celular na mão.

— Não consigo entender como você  conseguiu me convencer a assistir essa porcaria – falou ele olhando inconsolável para o celular – A sua persuasão deveria ser estudada.

Piper o encarou por um tempo, com uma expressão cada vez mais entusiasmada no rosto. Mesmo sem saber, Leo tinha lhe dado uma ideia de como vencer no campeonato.

— Por que está me olhando assim? Sei que sou lindo de morrer, mas não é para tanto – falou ele. Depois de alguns segundos disse: — Sério, Piper, para com isso, está me assustando.

A garota se levantou e pegou o rosto do amigo com as mãos.

— Você é um gênio, Leo, um gênio! Já sei como podemos ganhar o campeonato!

Ele abriu um sorriso largo.

— Como? – perguntou entusiasmado.

Ela abriu a boca para falar, mas quando sua mente formulou a frase, pareceu algo vergonhosamente egoísta. Isso fez o sorriso abandonar seu rosto rapidamente. 

— Não foi nada, só uma ideia boba. 

— Mentira. Vai, desembucha, Piper.

Não tinha como contrariar Leo. O garoto era teimoso como uma pedra.

— Eu pensei em usar a minha persuasão para descobrir a estratégia do jogo final da Jupiter School. Eu poderia me envolver com o capitão do time e fazer ele me contar, mas isso parece tão errado...

— Não é errado, Piper, é perfeito! Você se matricularia lá na Jupiter School e começaria uma amizade com o... – Leo pensou por um tempo — Jason Grace! Ele é o capitão do time. Isso tem tudo para dar certo, Piper. Vamos vencer e conseguir salvar a escola!

A garota deu um sorriso torto e disse que não era tão simples assim.

Primeiro, ela teria que ver se tinha vaga para ela na outra escola, que ficava a dois dias de viagem dali. Também teria que ver se os jogadores da Half-Blood estavam de acordo com aquilo. Leo ignorou o horário – onze da noite – e ligou para todos os membros do time e para Annabeth, que acabara se tornando a conselheira deles. Todos atendiam ou mal-humorados ou preocupados, mas logo seus tons mudavam para entusiasmo. Em uma ligação coletiva, Piper explicou os detalhes do plano. Era uma sexta-feira, então partiria sábado de manhã para já se matricular na Jupiter School na segunda-feira. Chegando lá, bastaria se envolver com Jason e descobrir a estratégia do jogo em duas semanas. Era arriscado e incerto, mas a única alternativa que tinham. Apesar do desejo que eles tinham de ganhar, foi difícil até mesmo para Piper convencê-los a topar. 

— Ah, gente, pensem só em como ajudaria a escola. Pagaria as dívidas, daria para reformar as salas... Seria perfeito! Não é só por nós que eu vou fazer isso, é por toda a escola, e cá entre nós, a Jupiter não precisa desse prêmio. – falou ela.

Houve alguns protestos, mas todos acabaram aceitando. Travis disse:

— Beverly Hills é longe. Apesar de você ser chata pra caramba, duas semanas vão deixar saudades, então hoje nós vamos fazer uma despedida para você, e isso não é um pedido. Venham todos aqui para casa. Cada um traz o que vai beber e uns dólares para rachar a pizza. Até.

Travis desligou antes que alguém pudesse protestar.

— Nos vemos na festa, então. – riu Percy antes se desligar a ligação.

A festa de despedida foi breve, mas quase fez Piper desistir do plano. Eram só duas semanas, mas era tempo suficiente para fazê-la sentir saudades dos amigos. Mas era por uma causa boa, e valeria a pena. 

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Piper se sentiu extremamente deslocada ao entrar na Jupiter School. Enquanto estava  acostumada com as salas simples, com manchas de água no teto e rachaduras nas paredes, carteiras bambas, corredores mal iluminados e tudo mais, a Jupiter School era o total oposto. Piso brilhante, paredes e tetos uniformes, carteiras impecáveis, quadros de vidro, luz em todos os lugares. Realmente, eles não precisavam ganhar o prêmio. 
Outra diferença entre as escolas era a hierarquia. Os presidentes do grêmio estudantil na Half-Blood eram Annabeth e Clarisse La Rue, e elas eram respeitadas por todos, mas não veneradas. Eram vistas como super amigas com quem você podia falar com simplicidade. Já na Jupiter, não. Antes de ir para a aula, Piper pesquisou no site da escola e descobriu que os presidentes do grêmio estudantil eram Jason Grace e Reyna Ávila-Ramírez Arellano. Achou as redes sociais dos dois, para já saber como eles eram, mas mesmo se não tivesse feito isso, saberia reconhecê-los. O corredor estava cheio de alunos, mas quando um garoto loiro de olhos azuis e uma garota morena com olhos castanhos extremamente sérios entraram no corredor, o caminho se abriu e a conversa cessou. Agora Piper entendia porquê o nome da escola era de um deus romano. 

Quando passaram por Piper, os dois pararam.

— Suponho que você seja a aluna nova. – falou Reyna. Seu tom tinha a mistura perfeita entre autoridade e confiança, aquela mistura que assusta os outros — Alguém já te apresentou as dependências da escola? 

— Ainda não. A secretária disse que uma garota chamada Hazel...

— Hazel faltou. – interrompeu ela — Se não se sentir incomodada, Jason poderá te apresentar a escola.

— Por mim, tudo bem. Obrigada. 

Reyna encerrou a conversa com um curto aceno de cabeça e saiu. A conversa no corredor voltou rapidamente. Jason acompanhou-a com os olhos até que ela sumisse do corredor. 

— Ela não é braba de verdade. – falou ele como um pedido de desculpas — Só é seria, então, caso ela diga algo que te magoe, não é nada pessoal, apenas sério. 

— Não acho que ela magoe as pessoas, só... Assusta. Vocês são os presidentes do grêmio estudantil, não são? 

O garoto assentiu, com uma pontada de orgulho num sorriso contido.

— É feita uma nova eleição a cada semestre, ou caso algum problema aconteça ou uma regra seja quebrada. Você pode se inscrever no ano que vem.

— Ah, não, não. Não tenho o menor jeito para isso. 

— Eu acho que você tem. Por onde quer começar a nossa tour? 

— Hoje você é meu guia turístico.

O garoto pensou por um tempo.

— Se é assim, então vamos começar por aqui mesmo. Já achou o seu armário? – perguntou ele. Piper assentiu — Sabe onde fica a secretaria e a direção? – ela assentiu de novo — É bem fácil de se guiar aqui. A primeira porta do corredor é a secretaria. A segunda é a direção e a terceira é a enfermaria. As duas últimas são os banheiros feminino e masculino, e o resto é armário. 

Jason foi conduzindo Piper pelo primeiro andar da escola. Do corredor, seguiram para um amplo refeitório – ela mal pode acreditar que eles tinham cantina que vendesse algo além de bala, água e chips. Do refeitório, seguiram para o exterior da escola. Piper achou engraçado que, enquanto a Half-Blood se concentrava com uma única quadra de cimento descoberta, a Jupiter School tinha pista de corrida, quadra de basquete, campo de vôlei e um grande ginásio coberto. 

— Nós usamos as quadras nas aulas de educação física, mas também temos cursos extras no contraturno. Se você quiser participar de algum, pode falar comigo e com a Reyna que a gente faz a sua matrícula. Você fazia algum curso na outra escola?

— Só de handebol. – mentiu Piper. A escola não tinha verbas nem para ter aulas de educação física, quem dirá para cursos no contraturno. Apesar disso, Piper era boa no handebol, e Jason estranharia se ela dissesse que não fazia nada — Você faz algum?

— De basquete. – os olhos dele brilharam – A nossa equipe está num campeonato interescolar. Você deve ter ouvido falar. 

— Ouvi sim, mas não acompanhei. O campeonato já chegou na final? – Quando falou, a voz dele estava carregada de orgulho e felicidade. Isso lançou uma pontada de culpa em Piper. 

— Já sim, a nossa escola está na final. A outra escola que está contra nós também tem um time bom. É a primeira vez que eles estão participando, e por já terem chegado na final, bastante gente importante está começando a se interessar por eles.

Os alunos da Half-Blood não sabiam disso. Se tinha gente importante interessada nele, por que não tinham sido avisados disso?

— Como assim gente importante? Olheiros de universidades, profissionais de basquete?

— Isso. Mesmo eles sendo bons, acho que eles não vão ganhar de nós. É uma escola lá de Nova Jersey, e pelo que dizem, eles não têm muito dinheiro, nem infraestrutura para treinar. É uma pena, porque eles realmente tem muito potencial. – ele deu de ombros — Mas é só o primeiro campeonato deles, ainda tem muito pela frente. 

— Mesmo se eles não foram os melhores, por que tem tanta certeza de que vão ganhar? – Piper tentou soar o mais despreocupada possível. 

— Porque nós temos infraestrutura, material para treino, um dos melhores treinadores da Califórnia, e também a melhor estrategista de todas.

Melhor estrategista de todas.

— Quem é?

— A Reyna. Ah, droga, eu não podia contar isso! Sério, você não pode dizer isso para ninguém, está bem?

Aquilo era uma boa oportunidade.

— Por que eu não posso? 

— Isso não importa, você apenas não pode citar para ninguém.

Piper o olhou desafiadoramente.

— Mas por que eu não contaria isso a ninguém se eu não sei o que isso tem de mal?

O garoto mordeu os lábios, vencido.

— Está bem, eu conto, mas isso morre aqui. Só nós dois e a Reyna sabemos disso. – ele passou a mão pelo cabelo loiro — Se ela souber que eu te contei ela vai me matar. É ela quem faz todas as estratégias de jogo, mas o time e todo o resto dos membros do campeonato pensam que sou eu, porque o campeonato é masculino, então o que eu e a Reyna estamos fazendo e contra as regras, e se descobrirem, o time será desclassificado e nós dois vamos perder as nossas posições. 

Piper assentiu. Tirar informações de Jason estava sendo mais fácil do que ela imaginava, mas o brilho no olhar e alegria na voz que surgiam quando ele falava do campeonato a faziam hesitar.

Jason limpou a garganta e falou:

— Quer conhecer o segundo andar? – A garota assentiu e eles continuaram a tour.

No segundo andar ficavam as salas de aula, tão organizadas e iluminadas quanto o resto da escola, e no terceiro andar ficavam a biblioteca e os laboratórios. Piper imaginou como Leo surtaria ao ver o laboratório de mecânica, em como Annabeth se perderia na seção de livros, em Clarisse passando toda a tarde na área de educação física, em Connor e Travis organizando as festas no auditório da escola, e foi desses pensamentos que ela passou a tirar forças para prosseguir com o plano.