Ao Tempo escrita por Leticiaeverllark


Capítulo 27
Quase lá




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POV KATNISS

Agarro o ante braço de Peeta, descontando toda a surpresa e choque.
O convidado é a mulher que não vejo a bastante tempo, quem eu não tenho uma boa última lembrança.

—Sra. Everdeen.

—Olá, Peeta.

Fico impassível, tento mascarar minhas feições como antigamente, mas a volta de Peeta me desestabilizou. Falho ao tentar não dar na cara o tamanho de meu desgosto em vê-la.
Passaram anos, a diferença entre nós até pode ter sido resolvida, mas não dentro de mim.

—Olá, filha.

Filha? Essa é nova.
Não foi ela que me abandonou logo após a morte de Prim? Foi ao Distrito 4, fugiu das lembranças que eu e esse lugar trazia.

Peeta encosta seu nariz em minha bochecha, transfere de algum modo toda a coragem que preciso para enfrentá-la, jogar esse medo pro fundo do meu ser.

—Oi.

O momento não é dos melhores, odeio ser pega de surpresa. Não sei como reagir, o que dizer, o que esperar.

Não gosto de plateia, dos olhares que recebo. Odeio a sensação de ser a vítima, apesar de nessa situação ser.

—Eu vou achar Willow.- aperto meus lábios contra sua bochecha, admitindo que preciso de sua ajuda com a situação.

Chego a sala com pressa, faço a linha simpática com os convidados, menos Delly.
Sua chegada me causou mal humor, mas não permitirei que atrapalhe o aniversário da minha filha.

—Tome.- pego um sanduíche e protejo com guardanapo, entrego a Willow, com Rye insisto em ajudar ou logo sua roupa estará bem suja. -Você está feliz, florzinha?

Seu olhar reluz, antes de responder ela gira por toda a sala, analisa a mesa enfeitada e as bolas coloridas penduradas pelo teto e escada. Espero não tê-la desapontado, fiz o máximo que pude.

—Muito.- toco nos fios soltos, está todo arrepiado de tanto correr pela casa. -Vovó?

Paraliso ao senti-la chegar atrás de mim, o descontentamento com a presença de minha mãe só esta crescendo dentro de mim. Precisamos conversar, isso é fato.

Mas não estou preparada, não agora. E sinceramente, acho que nunca.

—Você está tão grande, Willow.

—Estou, vovó. Tenho 4 anos hoje!- seus dedos levantam, abaixo um fazendo só quatro ficarem de pé.

—Tome.

A expectativa brilha em seu olhar. Tenho receio do que possa ser, apenas de não achar que minha mãe fará algum mal a ela. A embalagem metalizada rosa é rasgada em minutos, dentro da caixa há uma linda tiara enfeitada com conchas pequenas e delicadas.

—Vovó!

—Gostou?- minha mãe ajoelha, coloca a tiara na cabeça da neta.

Recuo, reparando nas mudanças que os anos a proporcionaram. Estou mais velha, com a feição madura e corpo. Minha mãe já tem incontáveis cabelos brancos, rugas sob os olhos e testas, a expressão cansada e vazia.

Quase não reconheço a mulher que se tornou, antes já era difícil, agora é impossível. É como se eu tivesse dormido e quando acordo no outro dia ela está 20 anos mais velha.

—Sra.Everdeen!- Effie surge com Elisabeth em seu encalço, logo Wi e a pequena estão correndo para se encontrar com Anelise. Procuro por Delly na sala e dou graças ao achá-la conversando com Annie.

Finnick é um belo bebê, os traços são todos do pai, quem eu - pelo que diz o livro- matei.

Uma dor sobe pela garganta, impossibilitando minha tranquila respiração. Recuo até estar de volta a cozinha, que por sorte está vazia. Grudo no armário até chegar na porta adjacente onde fica a despensa.

É muito passado pro meu presente.

Escorrego até ficar no pequeno espaço entre um armário e a parede fria de azulejos, cruzo os dedos apertando até fazer a dor ficar forte o bastante para me trazer de volta.

"Preciso voltar. Willow precisa de mim. Rye precisa de mim... Eu preciso de Peeta"

Faço um breve intervalo entre minhas puxadas profundas de ar, a ardência suaviza.

—Katniss?— sorrio ao ouvi-lo me chamar, ele parece pressentir quando estou necessitada de sua presença. Nossa própria ligação.

—Peeta! Hey, padeiro!- mordo o lábio tamanha frustração em ouvir a voz de Delly. Pode ser uma intuição bem idiota, mas não gosto de deixá-los sozinhos.

—Você viu a Katniss?

Calma. Não está esquecendo de nada?

—Como?

—Você volta depois de dias e nem um abraço sua melhor amiga merece?— ele solta uma risada, não nervosa ou irônica, é mais do tipo que está sendo surpreendido e feliz por isso.

—Tem razão, tenho sido um péssimo amigo. Me desculpe por isso, Dell.

—Venha, preciso matar a saudade que estou de você!

A terrível sensação está de volta, piora ao fechar os olhos e imaginar o que acontece no silêncio. Abraço apertado daqueles que esmagam as costelas de tão forte e caloroso.

—Você faz falta.

Eu deveria dizer isso!
Afinal, é impossível dormir sem ele na mesma cama.

—Senti saudades, loira.— certo, isso está ridículo.

Aperto o saco de algo que não importo em saber o que é, quero sair dessa situação horrível e constrangedora. Ouvir a conversa alheia não é algo que costumo fazer.

—Você viu a Katniss?

—Não, por isso vim falar com você.— consigo imaginá-la tocando a suave bochecha dele, acariciando sua barba rala. —As vezes acho que você fica sufocado nesse casamento.

Agora ela está passando dos limites, se intrometer em nossa vida pessoal já é demais.

—Por que acha isso?

—Katniss te priva de falar comigo.

—Ela não faz isso, Delly.

—Não? Aposto que se ela chegasse aqui e me visse tão perto de você, iria ficar com aquela cara azeda dela e você logo se afastaria. É sempre assim, Peeta. Estou preocupada, nunca achei que você seria submisso a uma mulher, ainda que ela seja o seu chato amor de infância.

—Katniss não manda em mim, vamos deixar isso bem claro.

—Não? Então me prove.

—Certo, loira.

Toco minha boca só para me certificar de estou fazendo o famoso bico de ódio, e como sempre Peeta está com a razão quando diz que forço a boca e acabo ficando com um "irresistível" bico nos lábios.

—Olá, onde tem mais sanduíches? Effie não para de me perturbar para achar Katniss e pegar mais!

—Eu não sei, Johanna. Estou procurando-a também.

—Se aquela mulher der trabalho logo hoje, vou atirar algo nela! Estou logo avisando.

—Não jogue nada nela.

"Obrigada, querido marido. Você pode impedi-la, se não estiver perto o suficiente da sua melhor amiga!"

—Então ache-a, antes que Effie me encontre e encha o saco!

Afundo mais meus dedos no tecido do saco, torço para não ser de farinha e estourar. Estarei encrencada se isso acontecer.

—Vou procurar minha esposa.

Espero um longo tempo até poder espiar e sair do meu esconderijo, aliso o vestido e passo a ponta dos dedos pelo cabelo. Grudo na pancada, abro a cesta e encontro mais sanduíches. Estou arrumando-os num prato quando dedos agarram meu ombro, o calor denuncia quem é.

—Oi.

—Sabe, devia verificar se o chão da despensa não tem farinha antes de sentar lá!- gelo, não por Peeta saber que eu estava lá o tempo todo, mas por suas mãos descerem pela linha da minha coluna.

Desce até o quadril, onde com algumas batidas no tecido, Peeta consegue limpar qualquer vestígio branco.

—Farei isso da próxima vez.

Ainda permaneço de costas, arrumando distraidamente o lanche antes de levá-los para a sala.

—Quer conversar?- nego, sabendo que se começarmos, iremos unir um assunto a outro e perderemos mais minutos do que temos. -Quer um abraço?- afirmo sem pensar, é tão automático quanto seus braços ao redor de minha barriga.

Tão firme que sou obrigada a soltar todo o ar que tinha preso em meus pulmões.

Encontro o lugar que sempre apoio a lateral de meu rosto, é perfeito pois seu cheiro entra forte pelos meus poros.

—Ela só quer fazer parte da família novamente.

—O que eu fiz com ela durante esses anos?- pergunto com receio de ter sido um monstro, ainda estar sendo.

—Nada.- sua mão sobe para o topo da minha cabeça e desce lentamente até a ponta das minhas costas, daí recomeça lá de cima. -Mas vocês se afastaram depois da rebelião, lembra da página dela do livro?

—Não muito.- aperto suas costas, dando-me permissão de abusar de seu corpo.
O contato ás vezes é melhor que palavras.

—Acha que só você está nervosa? É como se fosse a primeira vez que ela é oficialmente minha sogra, quero causar boa impressão, apesar do meu histórico ser bem ruim.

—Você é o sonho de toda mãe, Mellark.- ele sorri contra meu pescoço, me obrigando a travar o maxilar e a vontade de morder sua cheirosa pele. -Por que acha que a minha mãe não iria gostar de você?

— Tirando o fato que posso te matar a qualquer momento?- paro de acariciar sua pele, não gostando de suas palavras.
—Ta, isso não foi nem um pouco legal.

—Não, então fecha essa boca antes que eu belisque você.

"Nada de agressão física, Katniss. Isso pode acarretar uma crise."

Sua risada mostra o quão assustadora fui. Um belo fracasso.

—Posso fazer mais algo pro você?

—Quer mesmo saber?- a única coisa que preciso é de sua boca, quente, molhada e forte contra a minha.

—Farei qualquer coisa.

Tomo distância suficiente para encarar seus olhos, o jeito doce que eles me admiram.

—Me beije.- sussurro de modo baixo e nada sensual, até porque sou terrível nisso.

Fecho os olhos esperando o incrível momento, mas só o que consigo é ser sacudida junto a ele quando uma forte gargalhada chega.

O que diabos você esta fazendo?— tento me soltar de seus braços, mas o aperto amolece minhas tentativas.

—Desculpa, mas você tentou ser... sexy?

—Não, eu tentei fazer você me.. Ah, esquece!- lhe dou um empurrão, voltando a pegar o prato abarrotado de sanduíches e levar para a sala.

—Ou, acho que alguém não recebeu o que queria!

—Cala a boca, Johanna.

Reabasteço a mesa e dou bastante suco as minhas crianças, consigo sentir a euforia nos movimentos e palavras de Wi. Minha filha está tendo um aniversário que tanto quis, com pessoas que a amam, comida boa, alegria, presentes.

Bob engata uma ótima conversa com Haymitch sobre a ampliação do mercado, Effie elogia o vestido da noiva dele. Annie tagarela com Greasy, minha mãe e Delly sobre bebês, Johanna fica jogada no sofá zapeando os canais, as crianças espalham cada vez mais brinquedos no tapete.

Cruzo os braços puxando a boca, todos seguiram em frente com suas vidas, construiram mais sonhos e estão os realizando.

E eu?
Consegui ter algum sonho e realizá-lo?

Peeta e meus filhos. Isso com certeza deve ter sido algum sonho improvável.
Que no final aconteceu, da mais bela forma.

—Você está brava.

—Não quero falar com você!- sussurro de volta, acalmando um borbulhar no estômago só por tê-lo colado a mim. Seu ombro toca no meu, sua mão audaciosa busca pela minha.
Grudo ainda mais na parede, deixando a lateral de seu corpo grudado em mim.

—Eu não estava rindo de você!

—Quer tentar de novo para sair mais convincente? - fecho a mão me fazendo de difícil, ainda estou brava por sua conversa com Delly. - mesmo que isso seja bem idiota, no final das contas- e por sua risada.

—Eu quero é beijar você!

Arrepio completamente, ignorando o fato de impedir seus dedos de se infiltrarem entre os meus. Peeta está chegando aos poucos, tentando se aproximar de nós. É o que queria, então por que não deixo?

—Precisamos conversar primeiro.

—Então... não posso beijar minha mulher?

—Você precisa parar de ser tão bom com as palavras, de usá-las na hora certa e nesse tom que me faz ficar maluca por você!

Seu sorriso denuncia que entreguei o jogo, e não me importo de expor para ele o que sinto.

É Peeta, meu marido, o melhor padeiro que deve existir, o melhor pai, homem e ser humano que tive a sorte de conhecer.

Vou lutar por ele, trazê-lo de volta a realidade boa que vivemos quando precisar, destruir seus demônios e lutar contra seus pesadelos.

Isso é o que pessoas fazem por aquelas que amam, o impossível.

Seus dedos acariciam os meus suavemente, sinto o clima ficar diferente. Ele quer, o mesmo que eu. Urgentemente.

—Isso é bom, caçadora.- reviro os olhos antes de apertar sua mão, mudo o olhar de lugar e vejo uma Willow quase adormecida sobre as bonecas.

—É sim, padeiro.- encosto minha têmpora em seu bíceps, admirando nossa sala. Apesar de não gostar de festas, me sinto confortável. A presença dele tem grande fator nisso, sem dúvida.

—Vamos cantar parabéns?

—Vamos. Queria ter feito o bolo dela.

—Você terá muitos anos para isso.

—Não sabe o quão fico feliz em ouvir isso.- de mãos dadas nos juntamos a eles, anunciamos o parabéns.

Preparo a mesa, os doces e o bolo redondo decorado com borboletas coloridas de glacê.  Encontro a vela rosa de número "4", risco o fósforo na hora que Haymitch apaga as luzes. Rye sobe nos braços do pai enquanto coloco Willow em pé na cadeira em nosso meio.

A canção começa, as palmas dão o ritmo. Minha garotinha não tira os olhos da vela, assim como Rye que se debate querendo apagá-la. Rio enquanto passo o braço ao redor da cintura dela, evitando possíveis acidentes.

—Pode assoprar a vela.

—Oh, não esquece do desejo, mini lindinha!- Haymitch diz antes dela assoprar, sorrio acendendo novamente para Rye.

—Fiz um desejo, mamãe!

—E o que pediu?

—Ela não pode falar, Katniss! -Effie me interrompe, pega os pratos para começar a cortar o bolo. -O desejo não se realiza assim.

—Não pode, tia.- Elisabeth se manifesta quando a pego nos braços, beijo sua bochecha ajeitando o brilhante laço em sua cabeça.

—Certo, não conte pra mim, filha.

Deixo-as comer os brigadeiros, Peeta ajuda nosso garoto mas não me perde de vista. Todos se fartam de comer, rir e se divertir. Levo os copos descartáveis sujos até o lixo, assim não terei muito trabalho amanhã.

—Podemos conversar?- fecho os olhos querendo-a mandar embora, mas até posso ouvir a voz de Peeta em minha mente.

"Fale com ela e resolva isso, você só ficará mal enquanto estiver evitando-a."

—Sim. Vamos esclarecer algumas coisas agora!


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