Sugarcoat escrita por Camélia Bardon


Capítulo 6
All my Love


Notas iniciais do capítulo

Aproveitando a chuvinha gostosa, temos um capítulo com chuva saudável aqui também ♥ me atrapalhei toda nas postagens, mas já me atualizo, prometo xD



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A única coisa que me impede de prolongar a sensação de paraíso é a vibração do meu celular sobre a mesa. É como se estivesse em câmera lenta, sendo obrigado a interromper meu momento mágico para olhar para aquele bloco inconveniente de metal. Cassy ri da minha expressão de revolta, e eu também não resisto a sorrir. Começo a aprender que é contagiante – talvez eu devesse mantê-la por perto, para ver se consigo sorrir com mais frequência.

— Desculpa — peço, mesmo não sendo minha culpa. Olho para o visor e infelizmente me solto dela. Será que serei muito grudento se disser que quero passar todos os minutos do dia ao seu lado? — É o Sam. Você me dá licença para atender?

— É claro — novamente, ela sorri e se recosta na cadeira, tomando para si um dos últimos cookies. — Foi para isso que vim, afinal de contas.

Minha cabeça ainda está girando pelos acontecimentos dos últimos cinco minutos. Então, não é de surpreender que, ao pegar o celular, meus dedos estejam um tanto trêmulos. Se Cassy percebe, não comenta nada sobre. No entanto, assim como eu, ela parece um tanto aérea. Fico me perguntando se isso é uma coisa boa ou ruim. Para dizer a verdade, parando para perceber, pode não ter sido a melhor ideia de todas beijar a garota logo depois de ela ter me contado sobre o namorado que foi morto. Meu Deus. Será que ela me odeia? Será que fez isso só por dó?

Lá fora, a chuva começa a se fazer presente sorrateiramente. Pingo por pingo, crescendo a sinfonia nas telhas dos prédios e nas goteiras dos menos avantajados.

Por que a minha cabeça não me deixa em paz por um minuto?

— Ian? — Cassy me chama, pousando uma mão sobre a minha sobre a mesa. — Não vai atender?

— V-vou, vou sim — gaguejo, deslizando o ícone verde para o lado. É urgente: eu preciso parar de vegetar no meio do nada. — Sim?

Sam corresponde à falta de atenção com um riso zombeteiro. Como de praxe.

— Da terra para Ian Walsh, na escuta? Devo mandar reforços?

— Muito engraçado. Bom dia para o senhor também. O que você quer?

— Uau! — Sam gargalha, e pelo barulho abafado, suponho que tenha trocado o celular de uma orelha para a outra. — Liguei para dizer que estamos prontos. O wi-fi daqui caiu, senão eu mandaria uma mensagem mesmo. Onde podemos nos encontrar com a Cassy antes de ir?

— Por que eu saberia desse tipo de informação? — estou jogando verde para colher maduro? Sim. Mas é o modo como funcionamos, por aqui.

— Hum... Por que foi você quem levou ela para casa, ontem? Mas, já que está perguntando, deve estar com ela agora, para tentar esconder isso de mim. Você é um péssimo mentiroso. Oi, Cassy!

E, pelo visto, é uma péssima estratégia.

Resmungo de brincadeira, repassando o recado para Cassy. Por sua vez, ela abre um grande sorriso e chega mais perto para poder transmitir os cumprimentos pessoalmente. Busco meus fones de ouvido nos bolsos da bermuda, e os conecto para poder escutar junto a ela. Ofereço um lado, e ela se ajeita na cadeira.

— Sam! Já estão prontos?

— Com toda certeza! Quer fazer algo ao estilo “isca e troca” com uma maleta ou o tradicional envelope A4 cor creme da papelaria aqui do lado?

Cassy gargalha e, para mim, é como se ela complementasse os trovões. Eles, lá fora; ela, ao meu lado. Olho para ela de soslaio, suprimindo um sorriso.

— Olha... Eu adoraria a maleta, mas se faz questão da iniciativa diferenciada, você pode pegar um envelope pink. O que acha?

— Sim, señorita — dito isso, foi possível escutar o riso de Yelena, ao fundo. — Venice?

— Mas é claro — respondo por ela. — Mal saímos da frente do Tamara’s. Veja se tenha a decência de tomar café da manhã antes de vir, sim?

— E tomem cuidado com a chuva — Cassy acrescenta.

— Pode deixar. Estaremos aí às 11h. Não fujam, pombinhos.

Desligo o telefone rindo num tom bem-humorado, e Cassy me acompanha, dessa vez se recostando em meu ombro e erguendo os grandes olhos castanhos para mim. Retribuo o olhar – no caso, para baixo – e abro um sorriso breve.

— Então... — começa ela, sorrindo também. — Podemos continuar de onde paramos?

Como é possível que eu tenha me apegado tão rápido a alguém? Nós nos conhecemos há dois dias, no entanto ela sabe mais sobre mim do que eu mesmo. Pior: parece aceitar de bom grado. É como se fosse... Aquele negócio doido que as pessoas dizem. Destino.

Eca.

Mas, de verdade. Começo a pensar que posso ficar aqui, em LA, a cidade que odeio, apenas para estar ao seu lado. Todas as horas em que estou inquieto, em que tenho sonhos imprudentes, que fico para ver o sol nascer e a lua se por... Quero que todas as horas que estou aqui sejam nossas. Se ela quiser também, é claro.

Penso que talvez, se eu der uma chance, eu possa me apaixonar por ela. Amar, talvez.

Ou talvez eu esteja me precipitando e ela vai quebrar o meu coração em mil pedacinhos.

— Eu estava esperando você dizer algo do tipo — ri com maldade.

— Muito obrigada! Vamos lá, então — ela deixa o dinheiro sobre a mesa e guarda os pertences de qualquer maneira na bolsa. Pega meu celular para fazer o mesmo, colocando-o junto ao fone cuidadosamente lá, diferente dos outros itens. Sorrio com a consideração.

Cassy permanece me puxando em direção à saída. No último minuto, interrompo a jornada.

— Vamos sair na chuva, mocinha?

— É claro. É como a minha avó disse: ninguém aqui é de açúcar. Não está dando raios... É só chuva, Ian. Por favor...?

Seus olhos brilham com a perspectiva de um banho de chuva. Meus instintos primordiais gritam: “você acabou de tomar banho, Walsh. Não faça isso, pelo amor da sua sanidade higiênica”. No entanto, aqueles olhos brilhantes e pidões me conquistam de cara.

Que se dane se ela quebrar meu coração em mil pedacinhos. Estou feliz agora. É o que importa.

— Está bem. Mas só um pouquinho.

— Só um pouquinho é tudo que preciso — dito isso, ela me puxa gentilmente para baixo na intenção de me roubar um beijo. Quer dizer, seria roubado, se eu não correspondesse. Cassy sorri e acaricia a minha mão, que ainda segura como se o mundo fosse acabar. — Obrigada.

Assinto com a cabeça e a sigo chuva adentro. Os transeuntes, que procuram fugir dela, nos encaram com uma expressão de julgamento. Há uns três dias atrás provavelmente teria me encolhido e voltado para dentro, pensando “está bem, vocês estão certos, me desculpe”; contudo, estou com Cassy.

Já entendi que é ela quem manda.

— Ian?

Pisco para acostumar o olhar diante de toda a cortina de água que cai diante dos meus olhos.

— Sim?

— Quer dançar?

Gargalho com o pedido. Estendo as mãos indicando o ambiente e pontuo o óbvio:

— Com que música? O som da chuva?

— Eu canto muito bem — ela faz uma cara convencida e dá um passo em frente. Dou de ombros e arrumo a postura. — Lenta ou agitada?

— Eu gosto de músicas lentas — sorrio, estendendo uma mão para me segurar em seu ombro. A outra vai para a cintura, como manda o decoro. Seguindo meus passos, ela me acompanha, aprovando a escolha.

— Saindo uma música lenta do forno!

Cassy limpa a garganta e, depois de se ajeitar, embalamos o famoso ritmo de dança se mexer para lá e para cá e fingir que é dançar. A chuva acumula poças bem onde estou pisando, e posso sentir minhas meias se ensopando mais rápido do que consigo pensar.

Está tudo bem. É só respirar.

E então, a calmaria vem quando Cassy começa a música. É Love me Tender, do Elvis.

Eu posso jurar que o céu se abriu e emprestou um anjo para mim, o reles mortal. Fico tão dividido entre escutá-la, me remexer no ritmo e segurar a vontade de beijá-la até que todo o ar saia do meu corpo que acabo me travando todo. Cassy ri por um momento, soprando o and I always will num tom mais baixo. Permaneço escutando-a até a música terminar. Ela sorri e desvia o olhar para o chão. As poças d’água merecem atenção, também.

— Essa é a música preferida da minha avó — ela comenta, erguendo o olhar para mim. Quase sussurra. — Ela colocava para tocar na cozinha quando fazia o almoço de domingo, e eu ficava lá... Escutando... Cortando alface e tomate ao som do Elvis. É uma boa memória... Obrigada por ter me lembrado dela, Ian.

Eu não tenho o que dizer. Se, por um lado, pensei que ela poderia ter odiado minha atitude e me quisesse o mais longe possível, agora Cassy volta a falar com a doçura rara que só conheci quando começamos a permanecer perto um do outro com mais frequência.

Lembrei-a de uma memória ruim e uma boa no mesmo dia? Por esse motivo, giro-a na chuva, o que a faz gargalhar e se segurar em mim para não cair. Quero que ela preserve essa memória, e não a anterior.

É como eu disse: dane-se se ela quebrar meu coração. Todo meu amor será dela e de mais ninguém.


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Notas finais do capítulo

Música do capítulo: https://www.youtube.com/watch?v=gfPqofidv98
A música que eles dançam: https://www.youtube.com/watch?v=YC0BPcLea0Y

Esse Ian é mesmo um amor. Cê vê, dois dias e já tá caidinho pela crush.



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