É engraçado que parece que quanto mais você está ansiosa pra uma data em específico, mais ela demora pra chegar. E quanto ela finalmente chega, vem e vai num piscar de olhos.

Depois de todo o “momento SPA” que tivemos no domingo, fui obrigada a tentar manter as minhas unhas intactas no meio da aflição, pra não estragar o trabalho da Júlia. Ficou tão lindo que era triste roer aquilo e descascar o esmalte. E, como eu não tinha nenhum trabalho mais naquele meio tempo, quase subi pelas paredes.

Saí, dei uma corrida pelo bairro, fui ao mercado, voltei, fui ao Fulano — e por algum motivo não encontrei Nathaniel lá —, fui ao brechó abaixo do nosso prédio, fiz amizade com a vendedora — uma suíça muito simpática, para minha alegria —, vi todos os vídeos possíveis no Youtube, desde reacts de pessoas, clipes musicais, DIY, blogueiras e terminei assistindo um daqueles filmes trash sobre tempestades de tubarão. É mole? E ainda fizeram pelo menos umas seis edições dessa tosquice. Brega. Quando finalmente, repito FINALMENTE, recebi uma ligação da agência avisando que eu havia passado no casting da GreenBeauty. 

Surtei feito uma louca pelo apartamento, mas ninguém precisa saber. Nem mesmo a Júlia, então isso fica como um segredo por aqui.

Depois disso, foi mais uma aflição esperar de segunda até quarta-feira. Cadê meu vira-tempo quando preciso dele?

...

Por um milagre dos céus eu não estava atrasada daquela vez. Vai chover! Com o calor que estava, não era má ideia uma chuva. Paris parecia mais quente do que o Brasil, o que era algo inacreditável pra mim.

Quando cheguei à agência naquela manhã — depois de quase morrer sufocada com o desodorante vencido de um sujeito ao meu lado no metrô —, me vesti com as roupas que me foram dadas e fui guiada para o jardim, onde faríamos o nosso shooting para a marca. Por que ali? Porque os organizadores fizeram tudo em cima da hora e não tínhamos um mato melhor para servir de cenário. Logo, teríamos que nos virar com o que tinha. E parecia que o estúdio estava sendo usado para outro shooting também.

Quando entrei no jardim com o meu figurino de calça e regata laranja — é, a GreenBeauty queria tudo bem colorido para representar o verão — e após enfrentar Lysandre mexendo no meu cabelo e Alexy fazendo minha maquiagem — que ia acabar não durando muito naquele calor —, fui para perto de onde acontecia a ação toda. Chani, nossa pobre produtora executiva, corria entre trabalhar no nosso shooting e o do estúdio dentro da agência. A coitada ia enlouquecer daquele jeito.

— Dake, vai, você é o próximo — ela orientou e o loiro bronzeado passou por mim num visual todo verde neon, com uma bermuda e regata. Quando me viu, ganhei uma piscada daqueles olhos cheios de fogo dele, mas simplesmente fingi que não era comigo e que nunca nem vi.

— Marimar, que surpresa te ver por aqui! — Ouvi uma voz chamar meu nome e, ao me virar, me deparei com Rosalya, trajando uma roupa parecida com a minha, só que rosa neon. Claro que, com madeixas lindas como as delas, ela não ia ficar de fora de uma campanha de produtos capilares. Aquela modelo era linda de morrer.

— Rosalya, que bom te ver de novo — cumprimentei-a e trocamos dois beijinhos no rosto. — Não conheço nenhum outro modelo aqui — comentei e era verdade. Normalmente eu não tinha muito problema com fazer amizades, mas os participantes daquela sessão pareciam mais ocupados com o seu trabalho e em não morrer de calor, afinal, o único ventilador disponível era usado para algumas fotos e ligado apenas de vez em quando. A cada vez que desligavam aquilo, uma gota de suor descia pelas minhas costas.

Ah, além disso, ainda tinha o Dake, que achava que brilhava mais que o sol ali, e parecia continuar a querer dar em cima de mim, e Castiel também não estava ali, para minha infelicidade. Era difícil de acreditar que alguém com os cabelos dele fosse passar para uma campanha publicitária da GreenBeauty, mas não custava ter esperanças.

— Não seja por isso! — Ela enganchou seu braço no meu. — Vem, deixa eu te apresentar pro resto do pessoal.

Eu não estava a fim de conversar com aquele povo com cara de azedo, mas todo mundo se animou quando Rosalya chegou perto. Talvez ela fosse outra das famosinhas da agência.

Fui apresentada a Jade Müller, Li Hashimoto e Dajan Romero. A platinada acabou monopolizando a maior parte da conversa, arranjando assunto desde o casamento de alguma blogueira, que eu não fazia ideia de quem era, até histórias de uma campanha que ela participou. Tédio.

Animei-me quando me chamaram pra fazer as fotos e mais ainda quando vi que Dake estava indo embora. Pra melhorar minha vida, Nina, a fotógrafa do nosso shooting, ligou o ventilador bem na minha cara para as fotos. Fiz todo o tipo de pose que ela me orientava e ainda fui parabenizada por ela quando terminei. 

Quando voltei para perto dos outros modelos, Rosalya estava conversando no telefone com alguém.

— A minha sessão tá acabando daqui a pouco mais, mas o Lys ainda vai ficar pra ajudar em outra, a da Charles Mlain — a modelo disse e esperou resposta. — Tudo bem — assentiu algumas vezes e disse algumas declarações melosas. Provavelmente conversando com o noivo, o estilista tão famoso que esqueci o nome. — Até mais tarde, amor. — Tirou o celular de perto da orelha e era toda sorrisos. Logo, olhou pra mim e seus olhos se iluminaram com uma ideia. — Mari, faz um favor pra mim? — Me chamou pelo apelido como se eu tivesse dado aquela intimidade toda. — Já vão me chamar pras fotos e eu preciso avisar pro Lys que vamos ir junto pra ver as roupas do casamento com o Leigh. Tem como você falar com ele pra mim? — Antes que eu dissesse um sim ou não, a modelo começou a se afastar, pois estavam chamando.

Disse alguma coisa e mandou um beijo no ar pra mim, enquanto eu assisti tudo igual uma pamonha. Era apenas dar um aviso ao cabeleireiro, apenas isso. Não importava se ele gostasse de mim ou não, eu só ia passar um recado e pronto, não tinha como ele me xingar por isso. A não ser que eu falasse o que precisava tudo errado, mas eu não era tão tapada assim, convenhamos.

Alexy apareceu ao meu lado para cuidar da maquiagem de Li e eu perguntei a ele onde o cabeleireiro estava. Ele não sabia. Aquele homem certamente era um aprendiz do Mister M, porque não era normal alguém desaparecer do nada assim.

Quando só faltava eu revirar as plantas em busca do cidadão, fiz a coisa mais sensata e perguntei para Chani. Fiquei sabendo que Lysandre já estava participando do outro shooting, pois não precisariam mais dele ali. 

Olhei para Rosalya e vi que estava ocupada com Nina a fotografando. Como ela era a mais famosa de nós, com certeza seria aquela com mais fotos na campanha. Como a pessoa muito legal que sou, fui cumprir o meu favor. Tive que dar a volta e entrar pela porta da frente e ainda atravessar todo o corredor até o estúdio no final dele.

Agora, imagine a cena: lembra que Rosalya disse que estava tendo um shooting da Charles Mlain ao mesmo tempo? É, pois é, acontece que essa é uma famosa marca de roupa íntima na Europa. Imaginou como os modelos estavam vestidos, não é? É normal para um modelo, super normal, ver pessoas em roupas de baixo. 

Agora, imagine quem era o modelo que estava fotografando justamente quando eu entrei no estúdio. Se alguém falou Castiel Perrot, acertou e ganhou um Trident. Só aconselho não fazer como eu e colocar na boca sem o papel.

Se normalmente eu ficava toda atrapalhada — mais do que o normal —, quando encontrava com o Castiel pela agência, não sei nem dizer como eu fiquei quando entrei na sala. Acho que só alguém que me viu pra descrever minha cara.

— Mude de posição, por favor — Viktor, o fotógrafo do shooting, pediu e abaixou-se um pouco para tirar a próxima foto. Kiara ajeitou a iluminação.

Castiel estendeu as pernas sobre o sofá vinho em que estava sentado no centro dos holofotes. O flash estourou e ele mudou a posição, dessa vez colocando uma das pernas sobre a outra. 

Será que esqueceram de ligar o ar condicionado? Porque ali dentro estava mais calor do que o jardim. Não era possível que estavam todos ali sem estar derretendo nem um pouquinho.

Mais uma gota de suor escorreu pelas minhas costas e meu cabelo começou a grudar na nuca quando Castiel voltou os olhos diretamente para a câmera. Mesmo que eu continuasse parada na porta, senti como se aquele olhar de garoto perigo fosse diretamente pra mim. Berrei. Por dentro, é claro.

Soltei uma respiração pela boca e tentei limpar o suor da nuca com as mãos. Sério que ninguém tava sentindo aquele calor todo por ali? 

O modelo sentou-se no sofá, espalmando as mãos sobre as coxas desnudas e dando um sorriso sensual para a lente da câmera. Eu pre-ci-sa-va daquelas fotos pra ontem. Talvez eu pedisse pra Júlia mais tarde, se ela não podia fazer um favor pra mim...

Espera! O que eu ia fazer ali mesmo? Praticamente esqueci até o meu próprio nome com o sorriso do modelo junto do próximo flash.

— Mari, você conseg...

Gritei quando uma mão suada tocou no meu ombro do nada. Olhei pra trás e vi que era apenas Rosalya, me encarando com os olhos arregalados. Olhando pra dentro do estúdio pra ver o estrago, percebi que todo mundo tinha parado o que fazia e me encarava como se eu fosse uma louca. Com certeza as pessoas que não me conheciam se perguntavam o que aquela maluca estava fazendo no estúdio deles e berrando feito uma desvairada. Os que me conheciam, praticamente me ignoraram e voltaram para o que faziam. Vendo que eu era inofensiva, o restante do pessoal fez o mesmo.

— Credo, Mari, pra que tudo isso? — Rosalya soltou espantada, tirando a mão do meu ombro e cruzando os braços. Mudando de expressão de imediato, ela sorriu quando o cunhado caminhou até nós. — Lys-fofo! A Mari avisou você sobre o Leigh? — ela questionou e eu soltei um “ops” baixinho. 

Fui fazer o favor pra ela, não fiz e ainda causei um estardalhaço no estúdio. Apenas mais um dia na vida de Marimar Garcia.

— Não, ela não avisou... — o cabeleireiro respondeu, desviando o olhar para mim. — O que vocês duas estão fazendo aqui? — perguntou a questão óbvia. 

— Eu pedi pra Mari te passar um aviso, mas parece que ela esqueceu... — Rosalya soltou com censura. O que eu podia fazer? Não era minha culpa se o Castiel estava tirando fotos justo naquele momento. 

Voltando os olhos para dentro do estúdio, vi que o dito cujo havia terminado suas fotos e outro modelo tomava o lugar dele. Acompanhando-o com os olhos, vi que ele entrou para a área dos camarins e sumiu, provavelmente ia trocar de roupa.

— Mari! Mari, eu tô falando com você — a modelo chamou minha atenção e eu voltei o olhar para ela. Fechei a boca que eu sequer percebi que estava aberta durante aquele meio tempo. — Que foi? Nunca viu os meninos tirando foto de cueca? — questionou rindo, pelo visto deixando de lado o meu esquecimento com o favor dela.

Lysandre saiu de perto de nós com aquele jeito sorrateiro dele e foi arrumar os cabelos do próximo modelo. Senti meu rosto esquentar e devo ter corado um pouco.

— O que? Claro que não! — exclamei e Rosa continuou de braços cruzados ao meu lado no batente da porta, me encarando com cara de descrente. — Eu até já participei de uma campanha de moda praia no Brasil — me justifiquei e dessa vez eu cruzei os braços, voltando os olhos para o modelo loiro que tirava as fotos no sofá dessa vez. 

Kiara continuava ajustando as luzes, não encontrando a iluminação que queria. Viktor se levantou e começou a falar com ela um pouco irritado, querendo que ela se decidisse de uma vez.

— Tá bom... — a modelo ao meu lado deu um risinho, me encarando com aquela cara. — Mas não é o que parecia, não. Você ficava olhando sem parar pro... — Como se falar o nome dele fosse para fazê-lo aparecer feito mágica, Castiel saiu do camarim e foi falar com Lysandre. O cabeleireiro parou de aplicar spray no cabelo do modelo asiático e voltou-se para o amigo. — Olha só, de novo com essa cara — Rosalya continuou rindo de mim. — Você ainda vai ver muita coisa nessa vida de modelo, Mari. — Ela deu uma batidinha no meu braço e riu, balançando a cabeça. Percebi que até seus cabelos estavam começando a ficar grudentos. Talvez não fosse só comigo o calor ali dentro...

— Parece que alguém fez um escândalo e tanto. — Castiel se aproximou de nós duas, trazendo no rosto aquele sorriso que era marca registrada dele. Era algo entre bad boy e alguém que tira uma com a sua cara, como se soubesse mais do que você.

— A Rosalya quem me assustou — usei como desculpa e o modelo riu, uma risada grave. Por que continuava tão calor ali? — Você... — soltei de repente e vi a atenção de Castiel voltar-se para mim. Você o que, Marimar? — Sabe onde posso comprar sorvete?

Perguntei a primeira coisa que me veio na cabeça e, como estava com calor e com fome, falei de sorvete. Queria dar um tapa na minha própria cabeça ali mesmo.

— Na sorveteria? — respondeu o óbvio e me repreendi a mim mesmo. Ele podia ser bem seco quando queria, anotei mentalmente. — Mas tem uma aqui por perto... Posso te mostrar onde fica, se você quiser.

Se eu fosse gelo, teria virado água naquele exato momento.