Lembra daquele dia do ensaio com as crianças? Que eu disse que era um caos? Acho que aquilo já ficou pra trás perto de hoje.

Era modelo correndo de um lado para o outro, para fazer cabelo, maquiagem, pegar as roupas certas, e dentre elas estávamos nós, fotógrafos, tentando pegar alguns momentos antes do desfile real, que começaria em dentro de poucas horas.

Como eu tive que chegar antes da Marimar, não sabia se ela já estava por ali, mas esperava que sim, porque se ela se atrasasse, ia se xingar até a eternidade.

O evento ainda não tinha sido aberto, mas faltava minutos, e mesmo que eu não fosse alguém visualmente importante, estava tão nervosa quanto todos ali. O barulho das conversas e saltos pisando no chão de cerâmica enchia o salão, e eu tentava não ficar no caminho de ninguém.

Vi Lysandre trabalhando junto de outros cabelereiros contratados para o dia, igualmente Alexy e outros maquiadores, até porque os dois não dariam conta de todas as mudanças que as modelos precisariam fazer.

— Ju, Ju! — Ouvi alguém quase gritando meu nome e me virei, vendo Chani. — Vamos abrir daqui uns cinco minutos, vai lá pra frente com o Viktor, a Nina consegue cuidar daqui.

— E cadê ele?

— Deve estra lá fora. Vai, vai.

Corri para fora do camarim, passei pelo corredor e saí no salão principal, vendo os organizadores arrumando as mesas que estavam mais afastadas da pista de desfile. Era incrível como, mesmo fazendo grande parte das coisas com antecedência, ainda sobrava muito para fazer na última hora.

Vi de longe Bonnet “passeando” com alguns representantes da Gavieira, apontando, comentando e fazendo sei lá mais o quê. Passei por eles fazendo um joinha com o dedão e ele me devolveu um sorrisinho, cansado, mas orgulhoso. Fui para o salão de recepção e vi Viktor.

— Já tá à postos, cavaleiro? — perguntei ao ficar do seu lado, e ele sorriu nervosamente.

— Pois é. Tô com medo de fazer besteira. Nunca fiz um evento desse tamanho.

— É a mesma coisa de sempre, não tem motivo pra se preocupar. Tire fotos. É isso.

Ele afirmou e respirou fundo.

— Vou ficar do outro lado. Não fica muito perto da porta.

— Tá.

Alguns segundos depois, vi uma movimentação de outra entrada do salão. Percebi que a entrada para a imprensa tinha sido aberta, então eram fotógrafos de revistas de moda, repórteres, tanto de revista quanto de jornais, e outras pessoas com equipamentos. Todos eles foram para a frente da pista e começaram a ajeitar rapidamente seus instrumentos de trabalho.

Não demoraria para as portas se abrirem oficialmente. E, cinco minutos depois, se abriram.

Eram convidados, modelos famosos, artistas, influenciadores.

As câmeras, não só a minha e a do Viktor, começaram a disparar. Os repórteres correram para entrevistar algumas celebridades, e assim mais um pouco de caos começou ali.

Teria pelo menos meia hora de recepção antes do desfile começar, e quando o fluxo de pessoas diminuiu na entrada, comecei a circular pelo salão, fotografando tudo e qualquer interação entre as pessoas, principalmente as famosas.

— Trabalhando muito?

Tirei a foto que estava preparando e olhei para o lado, vendo Rayan ali com sua credencial especialmente arrumada por mim.

— Não parei desde que cheguei, acredita?

Ele riu. — Com certeza acredito. Ainda bem que você está de tênis.

— Sim, felizmente o uniforme é “esteja confortável para ficar o evento todo de pé”.

— Bom, vou te deixar trabalhar e vou socializar com alguns famosos por aí, mas depois que tudo acabar podemos ir pra minha casa e eu te faço uma massagem nos pés, se quiser.

Sorri, me derretendo um pouquinho. — Eu adoraria, mal posso esperar.

— Então depois nos trombamos de novo. — Rayan deu uma piscadela e saiu.

Me esforcei para parar de encarar suas costas e voltei ao trabalho.

Bons minutos se passaram, e eu estava concentrada em registrar encontros. Assim que terminei mais alguns flashes, senti alguém segurar meu braço e vi que era Viktor com um semblante estranho.

— A Debrah tá aqui.

— Quê?!

— Ela acabou de chegar com uns três fotógrafos. Ela foi convidada?

— Não que eu saiba. O Bonnet não convidaria ela.

— Será que a Ambre conseguiu fazer uma credencial pra ela antes de sair?

— Duvido muito, ela não tinha acesso aos arquivos.

— O que a gente faz? — Viktor perguntou, perdido. — Não é justo ela aparecer assim como se nada tivesse acontecido...

— Com licença. — Uma moça alta, morena e de cabelos cacheados ficou ao nosso lado. — Eu fiquei sabendo das brigas que aconteceram umas semanas atrás, e vi agora pouco aquela mulher da Cèlèbritè passeando aqui. Ela realmente foi convidada?

— Eu não fiquei sabendo de nada, mas duvido muito que alguém da agência convidou — respondi, igualmente desacreditada naquele desaforo.

— Infelizmente eu ainda não me acostumei com a cara de pau de alguns paparazzis.

— Eu vou tentar achar o Bonnet. Obrigada por vir falar — agradeci à moça, e ela sorriu.

Andei rápido por entre as pessoas, com o salão cada vez mais cheio, e me esforcei em encontrar a cabeleira loura do chefe. Fui para o outro salão e o vi conversando com algumas pessoas em uma mesa. Cheguei perto e acenei, e ele se despediu e veio ao meu encontro.

— O que foi? — perguntou de prontidão, vendo minha cara.

— Debrah está aqui. Alguém convidou ela.

Bonnet piscou, sem acreditar naquilo, e negou com a cabeça. — Ela gosta de complicar as coisas pra ela mesma.

— Chamamos o segurança?

— Sim, mas vou tentar conversar com ela antes, para não ter alarde.

Segui Bonnet. Alcançamos um dos seguranças, ele explicou a situação e fomos atrás da intrusa. A encontramos entrevistando um modelo de outra agência, e Bonnet tocou seu ombro. Ela abriu um sorriso tão simpático quanto cínico para ele.

— Você não foi convidada — disse ele, erguendo a credencial dela, e vimos que ela tinha cadastrado seu nome do meio e vindo como imprensa.

— Imprensa não precisa de convite, querido. — Debrah me lançou um olhar rápido e voltou a encarar Bonnet, como se não tivesse me visto.

— Eu não quero ter que pedir para os seguranças te levarem pra fora.

— Eu me cadastrei legalmente, não é proibido uma repórter entrar aqui.

— Você não é bem-vinda aqui — falou uma modelo ao se aproximar, chamando atenção de quem estava por perto. — Sua vida é ganhar às custas dos outros, você deveria ser proibida de entrar em qualquer tipo de evento.

— Que eu sabia, ninguém é obrigado a consumir meu trabalho.

— Você é ridícula. Não tem um pingo de remorso por acabar com a vida dos outros.

Caramba, a Marimar ia adorar ver essa treta...

— Senhorita Chapelle, por favor, se retire — Bonnet pediu com firmeza na voz. Até ele estava nervoso pela insistência dela.

Percebi que estávamos praticamente no centro de uma rodinha, muitos dos que estavam a nossa volta pararam para assistir a discussão. Debrah também notou o fato e abriu um sorrisinho falso.

Sem falar mais nada, puxou o cordão da credencial e jogou para Bonnet, saindo andando em direção à entrada principal. O segurança a seguiu e, conforme passava, algumas pessoas assobiavam e batiam palmas.

— Obrigada pela... ajuda. — Sorri para a moça de cabelos vermelhos.

— Não foi nada. Essa mulher também quase arruinou a minha vida com fofocas. Eu sei o que aquela modelo Marimar sentiu, a diferença é que eu não fui tão atacada nas redes sociais.

— Sinto muito por isso — disse Bonnet.

— Tudo bem, já foi. Estou me sentindo até um pouquinho leve por ter falado aquilo diretamente na cara dela. — Ela riu, colocando as mãos na cintura.

— Eu também estou me sentindo mais leve — comentei e olhei para Bonnet.

Ele sorriu. — Vamos, o desfile vai começar daqui a pouco.

Nos despedimos da modelo e voltamos ao salão do desfile. As pessoas estavam começando a se acomodar nas mesas e a música ambiente estava diminuindo.

Chegou a hora.

— Tô aqui! TÔ aqui! — Ouvi uma voz conhecida e arregalei os olhos ao ver Marimar e Mica correndo, já sem fôlego.

Corri atrás dela.

— Eu não acredito que você tá chegando agora! — gritei em português para ela me escutar.

Marimar me viu e veio em minha direção, respirando rápido. — Foi a Mica que atrasou tudo.

— O quê? Tá me culpando é? — Micalina resmungou, tentando controlar a respiração.

— Vão tentar pegar uma mesa, tá quase tudo ocupado.

As duas saíram em busca de um lugar, e eu voltei ao meu ponto, dando risada. No fundo, sabia que ela ia acabar se atrasando, ou não seria a Marimar que eu conheço.