Tudo era tão normal, tão monótono. A cidade era grande, mas todos de certa forma conseguiam se conhecer, se não pessoalmente, pelo peso de seus nomes. Vendo o grande condomínio pela janela do meu quarto eu olhava a cidade a alguns quilômetros dali meu coração parecia que saltaria a qualquer instante do peito, a sensação de recomeçar deveria ser normal para alguém como eu, mas eu já estava cansada disso, toda vez era uma tentativa falha de ser alguém ou esconder, e dessa vez não seria diferente. E novamente eu seria a garota estranha, que se mudou no meio do semestre, meu pensamento me levava para longe enquanto eu dirigia para Cambridge, sentia o vento da costa fazer meus cabelos voarem, tudo bem que é normal carros esportivos pelo campus, mas por algum motivo todos me olhavam, acho que porque era um carro desconhecido, um Aston Martin Vantage preto, meu último presente de aniversário, quando desci peguei minha bolsa e adrenalina de uma criança indo para o jardim de infância emundou meu peito, cada passo que eu dava parecia que olhos me perseguiam e nunca tinha visto uma porta tão longe de ser atravessada, meu braço abraçava meu corpo com os livros contra o mesmo, um grande livro da história americana. Quando achei que no corredor seria diferente, apenas olhares curiosos, será que alguém ali me conhecia? Fui até a sala que estava escrita no papel, onde seria minhas aulas. Um grande auditório, milhares de pessoas sentadas olhando a minúscula mesa no seu centro a frente, procurei um lugar vazio e me sentei ao lado de uma moça loira com cabelos presos em um coque mal feito, que escrevia sem parar em seu caderno de anotações enquanto me ajeitava ela brevemente soltou um “ Oi”, que respondi com um sorriso cordial e um “ Oi” quase que inaudível. Podia apenas escutar ponta de lápis ecoar pela grande sala, quando passos de salto ecoaram pela mesma, uma moça alta, loira cabelos em ondas perfeitas, a pele aveludada como de um pêssego com partes rosadas, olhos quase azul turquesa se ajeitou nos lugares da frente entre risos com mais duas garotas que a acompanhava. Quando ela se virou para trás e encarou a moça que estava ao meu lado com o riso mais diabólico que eu já tinha visto.

— Peyton, como está sua mãe? – A pergunta foi acarretada de risos da mesma acompanhada pelas outras garotas, enquanto a tal Peyton apenas a encarou e trincou os dentes.

— Annabelle, me diz você. Seu pai vem te visitar com frequência? – As duas se fuzilavam mortalmente o que logo foi quebrada com a chegada do professor da matéria que começou a falar fazendo a então Annabelle olhar para frente respirando fundo com o rosto vermelho com a raiva que sentia.

Quando a aula terminou peguei meu lanche e fui em direção ao refeitório, um pouco na frente estava Peyton, que onde passava os seguidores dessa tal Annabelle falava algo extremamente ofensivo para a mesma, peguei um chá e me sentei para tomar e ler sobre a próxima matéria quando uma sombra se fez no meu livro e olhei Peyton parada com um riso cordial para mim.

— Se ficar sozinha Annabelle logo pegará no seu pé, senta com a gente. – Peyton apontou para uma mesa que continha gêmeas e mais dois homens.

— Sentar com você não fará ela pegar no meu pé? – Falei mordendo a barra de cereal e ela fez uma careta concordando. – Garotas como Annabelle são vazias e acham que isso aqui. – Apontei para tudo ao redor. – É eterno, mas na verdade estão perdidas, não deveria ligar para ela e retrucar. – Falei sorrindo e Peyton sorriu de volta com um brilho a mais no olhar. – Tudo bem sento com vocês. – Falei me levantando e me dirigindo a mesa que comiam os amigos de Peyton.

— Pessoal essa é Zoey. – Ela apontou para mim. – Zoey, essas são as gêmeas Harper e Ellie e nossos amigos Hunter e Liam. – Ela disse e eu acenei para todos e sorri da forma mais cordial possível e logo me senti em casa. Mesmo as vezes minha mente voando longe e imaginando o que eu inventaria para eles, continuei ali. Ellie e Harper eram lindas, parecia que o padrão da faculdade exigia que fossem loiras, elas tinham olhos verdes e ambas ganharam a bolsa para a faculdade por conta de serem Cheerios no ginásio, ambas cursavam moda. Liam e Hunter eram vizinhos e faziam o curso voltado para cinema.

— De onde você veio Zoey? – Hunter perguntou me encarando.

— Vermont. – Falei um pouco receiosa e engoli seco o olhar de Harper em mim me assustava. Hunter era um tanto magricela e ruivo, mas com músculos bem definido, pela forma que Ellie o olhava jurava que poderiam ser um casal, mas Peyton afirmou que não. Liam parecia um modelo, com cabelos castanhos como o meu, olhos cor de mel e alto. Eu ainda não sabia, mas sim aquelas amizades feitas na mesa durariam anos, depois de algumas aprovações.

Quanto mais tempo ia passando, mas difícil era esconder certas coisas, mas eu respirava fundo e encontrava saídas que achava impossível. Annabelle resolveu que deveria pegar no meu pé e no final de cada aula ela conversava com um moço de maneira intima e de certa forma agressiva, um moço de cabelos escuros e olhos acinzentados, me peguei presa olhando para ele por alguns instantes quando Ellie me chamou para ir ao campo para o ensaio delas das Cheerios. Fui olhando para trás e vi Annabelle o abraçar e beijar seu rosto animada e logo correr em nossa direção porque sim, aquele filhote de satã também era das Cheerios. Sentei na arquibancada vendo as meninas e o time da faculdade treinar, abri meu caderno de anotações das aulas e comecei a escrever. Quando a treinadora chegou me encolhi, ela me dava medo. Quando morei em Washington no ginásio eu competia para a equipe de ginastica, mas não sinto um pingo de saudade disso, era mais uma obrigação para o currículo da faculdade do que qualquer coisa, mas ver minhas amigas ali fazendo o que gostavam não me importava em esperar.

— Quem é aquela na arquibancada nos olhando? – Escutei a treinadora perguntar as meninas e olhei de rabo de olhos e fingi que não era de mim que ela perguntava. – Ela tem um bom físico para ser uma flyer.

— Aquela é a Zoey Johnson treinadora. – Annabelle fala em tom de deboche o que me fez bufar e olhar assim que meu nome foi pronunciado.

— Johnson. – A treinadora gritou meu nome com sua voz grossa e eu a olhei e ela espreitou o olhar. – Se troque e venha aqui, preciso de uma flyer.

— Treinadora eu não posso. – Falei sem jeito e ela apenas bufou e negou com a cabeça.

— Eu não perguntei se podia, eu mandei vir até aqui. – Ela disse ainda mais grosseiramente e eu engoli seco vendo Ellie vindo ao meu encontro e me levando ao vestiário das Cheerios me dando um short de coton vermelho curto o suficiente para mostrar a poupa da bunda eu revirei os olhos me vendo no espelho, coloquei a camiseta baby look por cima que também era justa demais, amarrei meu cabelo em um rabo de cavalo mal feito.

— Você é linda Zoey não deveria estar com vergonha. – Ellie falava tentando me animar e eu apenas respirava fundo revirando os olhos. – Sério, seu cabelo castanho com mechas mel, esses olhos azuis piscina que meu Deus mulher, e esse corpo que esconde? – Ela falava me ajudando com o rabo de cavalo que tinha ficado torto. Ficamos em silencio enquanto ela amarrava meu cabelo tão forte que sentia meu rosto sendo puxado para trás junto com o cabelo. – Zoey. – Eu a olhei quando terminou e ela bufou. – Te vi olhando Caleb, acho melhor parar ele é tudo que queremos, e tudo que não queremos quando conhecemos ele. – Ela falou mordendo os lábios e eu pisquei algumas vezes forjando um sorriso torto e concordando com a cabeça. – Agora vamos. 

Eu não sabia exatamente como me esconder da treinadora, Ellie foi andando mais a frente quando chegamos parei de frente com o sol que me cegava e engoli seco sentindo meu corpo tremer e um suor escorrer pela lateral do rosto de nervoso e pelo calor que fazia. Abracei meu corpo tentando esconder o mesmo, mas logo a treinadora estava com uma prancheta na mão e ela lia fazendo várias caretas de surpresa.

— Onde estava escondida Johnson, peguei sua ficha. Aqui diz que era capitã das Cheerios em Washington, ser Cheerios é como andar de bicicleta então não terá problema, se alonge. – Ela falava e todos me olhavam surpresos até mesmo Ellie e Harper, quando olhei para a arquibancada Peyton, Liam e Hunter estavam olhando, me alonguei o máximo que consegui, era como se eu fosse mandada para forca e nesse momento era. A treinadora tinha minha ficha e se alguém visse algo? Estou a meses enganando as pessoas que são gentis comigo, quando escutei meu nome sento chamado, cada passo que eu dava fazia meu corpo tremer, parei um pouco distante da treinadora, os outros do grupo já estavam sentados distantes me observando ali, em pé sozinha. Annabelle não conseguia tirar o riso diabólico do rosto, ao longe embaixo de uma grande arvore o então Caleb observava o treino, porque ele me encarava daquele jeito? Meu Deus, não estou sentindo meus pés. – Quero que faça os seguintes movimentos Johnson, Abertura, duplo twist carpado e termine com um avião. – Todos abriram a boca com as exigências da treinadora até mesmo Annabelle perdeu o sorriso com o pedido, eu engoli seco, tomei uma certa distância tentando fazer meu corpo me obedecer e quando fiz tudo que me foi pedido, suor escorria pelo meu rosto, meu corpo não estava mais acostumado com isso. Terminando coloquei a mão no joelho e vi cabelos soltos grudando no meu rosto vermelho pelo esforço, todos aplaudiram até Annabelle mesmo sem vontade.

— Na verdade treinadora. – Eu falava em pausas com a respiração descontrolada. – Eu era capitã da equipe de ginastica. – Eu falei e logo ergui a cabeça a olhando. A treinadora desamarrou o rosto, exibindo um sorriso e aplaudindo como se tivessem ganhado um campeonato. Após minha breve aprovação para a equipe, todos se levantaram indo ao vestiário para se trocar com o final do treino. Peyton, Harper, Ellie vieram ao meu encontro me abraçando.

— Incrível Zoey, não sabia que tinha sido ginasta. Você desiquilibrou na abertura, mas conseguiu um lindo duplo twist. – Ellie falava empolgada e me acompanhando para o vestiário. Saindo do banho e penteando o cabelo Ellie e as meninas já tinham ido na frente, abri o armário que disponibilizaram para mim e peguei meus livros e a chave do carro, quando sem perceber e quase prendendo minha mão Annabelle fechou a porta do armário e eu a encarei trincando os dentes.

— Para uma caipira que veio de Vermont você tem muito ensino. Como um carro esporte caro, roupas de marca. – Ela falava em tom de curiosidade e eu engoli seco, ajeitei meus livros no braço e forjei um sorriso irônico. – Como era Vermont Zoey?

— Tinha muito pasto e vacas Annabelle. – Falei sorrindo debochadamente. – Como você. – Fui saindo do vestiário e a mesma me acompanhando falando atrás de mim.

— E por quanto tempo morou lá? – Ela perguntava e eu sentia a ironia em sua voz.

— Por dois belos anos, mas minha família é de Washington. – Falei sem paciência se virando para olhar para ela.

— Quanta mentira para uma pessoa só menina prodígio Zoey. – Ela me olhava como se soubesse de algo. – Seus amigos ficariam tão decepcionados se soubessem como você mente na cara deles todos os dias. – Eu ignorei Annabelle e sai em direção a próxima aula que tinha, eu não estava mentindo para ninguém, não literalmente eu sou assim, apenas não contei toda a história ninguém se interessou em saber. Com a mente distante durante toda a aula, tudo que Peyton falava ecoava e eu não entendia, até que ela me cutucou e eu a olhei e pisquei algumas vezes.

— Está distante, aconteceu algo no vestiário? – Ela cochichou em meu ouvido e eu forjei um sorriso e neguei com a cabeça. – Zoey somos amigas, me permita te ajudar, mas temos que ter uma comunicação para isso.

— Um dia te conto, prometo Peyton. – Falei com um olhar triste. – Mas hoje, preciso ir para casa, estou com dor de cabeça. – Falei pegando minhas coisas e levantei e Annabelle se levantou com o riso diabólico de sempre.

— Zoey querida aonde vai? – O tom de ironia em sua voz me fazia querer empurrar ela pela escada do auditório. Apenas a ignorei e fui para casa, vi o tal do Caleb saindo do campus junto comigo, ele parecia furioso, entrou em um Audi S6 sedan todo preto com vidros tão pretos que não era capaz de se ver dentro, só sabia que era ele por ver ele entrando no mesmo. Minha cabeça estava a mil, queria contar a alguém sobre tudo, e o porquê disso tudo, mas ao mesmo tempo ficava com medo da reação de como seria ao saber da minha pequena omissão de fatos, entrei no condomínio que morava, um condomínio a beira mar, com casas campestres de alto nível, entrei na garagem no subsolo e parei ao lado de um Audi TT RS Coupé cinza, significava que após meses, meu pai estava em casa, respirei fundo e engoli seco apenas negando com a cabeça o dia de cão que estava tendo. Subi a escada que dava para a cozinha e vi meu irmão sentado e logo meu pai na ponta da mesa, Isaac estava de cabeça baixa e meu pai mastigava algo e lia papeis e mais papeis a sua volta esquecendo de tudo a sua volta, principalmente os filhos. Logo que Isaac me viu, veio ao meu encontro e pulou em mim e eu o abracei indo com ele para mesa.

— Papai, podemos ir no parque brincar? Agora que a Zoey chegou podíamos ir os três. – Isaac falava animado, mas o meu pai revirou os olhos o ouvindo, ele tinha 5 anos, e nunca conseguia ter a atenção do meu pai, desde que minha mãe morreu no parto do Isaac de AVC tinha sido apenas nós três ou mais nós dois. Pois desde que ela morreu qualquer pessoa tinha a atenção do meu pai menos nós, e internamente ele deveria culpar meu irmãozinho por isso.

— Não Isaac. – Ele falava penoso. – Viajo daqui duas horas, se quer ir, que sua irmã te leve eu não posso e sabemos que ela que manda por aqui. – Meu pai disse esboçando um riso sádico e eu revirei os olhos. Ele mal olhava para Isaac para responder, apenas para os papeis e Isaac veio em meu colo com os olhos lacrimejados sentindo a rejeição e eu respirei fundo abraçando o mesmo fortemente.

— Eu te levo, se fizer seu dever do colégio e se almoçar tudo. – Falava em bom humor, mas querendo afundar meu pai no chão. – Combinado? – Sorri e beijei o rosto de Isaac que melhorou seu rostinho, abrindo um sorriso e saltitando assim que o coloquei no chão e eu subi para o quarto deixando meu pai sozinho.

A tarde estava agradável, sentia o sol penetrar na minha pele e aquecer a mesma ao mesmo tempo que a brisa suave a refrescava, eu tomava um sorvete, sentada na grama e com Isaac deitado no meu colo, observava tudo ao redor, quando do outro lado vi Caleb conversando de forma rude com uma moça, eu espreitei meu olhar como se aquilo fosse inconveniente todo lugar se encontrar com ele dessa forma, mesmo que involuntariamente. Eles pareciam discutir e a moça desolada, acho que Annabelle fez ele escolher entre as duas, só pode. Meu pensamento me fez rir e voltar em si de como eu estava com a mente vazia e isso atraia pensamentos fúteis, acariciava o cabelo de Isaac quando percebi que ele dormia, terminei o sorvete e com delicadeza levantei e o peguei no colo, recolhendo as coisas e indo em direção ao carro, agora eu estava com a Land Rover Evoque branca e vidros sufilmados coloquei Isaac no banco de trás na cadeirinha de forma confortável e joguei a bolsa com as coisas do lado, me ajeitei pois estava suada de tanto esforço e vi Caleb vindo em minha direção pisando fundo, abri a porta do carro e então percebi o carro dele parado na frente do meu, ele foi abrir a porta e me encarou e percebeu que eu o olhava.

— Sabe o que é ruim de relacionamentos?  Eles uma hora chega ao fim e essa é a pior das partes, você passa por cada parte ruim, pelas crises, supera, tenta continuar, mas não conseguem mais se aguentar. – Eu o olhava sem entender nada e ele respirou fundo abrindo a porta e sorriu de uma forma que quebraria as pernas de qualquer pessoa. – Seu filho é uma graça. 

Antes mesmo de explicar ele entrou no carro e saiu, o vi saindo na frente e eu entrei saindo dali também e me peguei gargalhando e logo parando e rindo mais silenciosamente para não acordar Isaac, não entendia o que tinha acabado de presenciar e sobre ele achar que Isaac fosse meu filho, de certo modo cuido dele desde que nasceu e o amo como se fosse meu mesmo, apertei o volante forte pensando em como Caleb estava triste e ainda assim sorriu e me cortou o coração quando me toquei em como deve ser duro romper um relacionamento assim, mas tem males que vem para bem e se soubesse disso neste momento, eu não teria me sentindo tão mal.