Natal Desfeito escrita por Beykatze


Capítulo 2
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura ♥



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POLO NORTE

00h 34m 12s 38mm

23/dezembro/2235

Estábulos

Ihcje se escondia ao lado dos estábulos, oculto pelas placas de madeira da construção e pelos galhos dos altos pinheiros ao redor, observando como os elfos construtores faziam as renas de neve.

Os homenzinhos moldavam a brancura com seus dedos cobertos por grossas luvas em circunferências e retângulos e iam encaixando as peças até formar algo que vagamente lembrava uma rena muito estranha. Em seguida, traçavam naquele molde os focinhos, articulações, orelhas, acrescentavam chifres e cascos e delineavam os animais.

Ihcje olhava admirado a precisão dos movimentos, a astucia com que montavam e encaixavam pedaços de neve fria de forma graciosa.

Quando a rena já estava montada, outros elfos vinham com as tintas marrons, pretas, brancas e vermelhas e faziam a festa com pinturas magníficas, pelagens impressionantes e os animais estavam prontos. Não havia ninguém no mundo, além dos elfos que as construíram, que poderia dizer que aquelas não eram renas de verdade, isso se esquecermos o fato de que elas não existiam mais, pois tinham sido extintas assim como a maior parte dos animais.

Ao final do trabalho, os construtores guardavam as renas de neve nos estábulos limpos e a mágica acontecia: com um pouco de pó de sonhos, feito a partir dos sonhos bons das crianças, derramado sobre os chifres majestosos, as renas ganhavam vida. Troteavam, relinchavam e cavavam o chão com seus cascos. De neve pura e fofa viravam animais reais.

Nunca tinha dado errado, nunca, nunquinha mesmo, uma rena tinha sido mal feita e não cumprira sua função. E era nisso mesmo que Ihcje apostava.

Assim que todos os elfos construtores se retiraram, Ihcje engoliu uma golfada de coragem e foi colocar seu plano em prática.

Amassando a neve branca com seus dedos desnudos, Ihcje pensou que mais tarde teria problemas com os dedos quase gangrenados, mas naquele momento tinha assuntos mais importantes para ocupar a mente, como, por exemplo, não deixar que ninguém o visse ali.

Moldou, como se lembrava de ter visto os outros elfos, círculos imperfeitos e cilindros esquisitos para as pernas. Tinham ficado tortas e estranhas, mas não podia melhorar. Mais uma vez apanhou a neve e fez uma barriga gorda, torcendo para que as perninhas tortas aguentassem, e foi por pouco, mas não cederam. Acima disso, uma cabeça chata com barba e braços compridos demais.

Se afastou para buscar as tintas e achou que talvez ninguém notasse mesmo. Principalmente se o pó de sonhos funcionasse adequadamente. Com os líquidos coloridos, pintou o Papai Noel de neve que acabara de fazer. As roupas vermelhas brilhantes, as botas pretas, a barba branca... Não esqueceu de nenhum detalhe.

Assim que sua aberração de neve estava montada e pintada, Ihcje correu até as renas, limpando o excesso de pó de sonhos das costas delas e juntando o máximo que conseguia dos restos para, finalmente, derramar o pó mágico sobre sua criação.

Papai Noel de neve começou a mover os membros e então o rosto. Tudo muito devagar e em rotações anormais. A coisa abriu seus olhos vermelhos que encararam Ihcje. Coçou a barba branca desgrenhada, bateu o pó das roupas e abriu a boca, deixando sair o som assustador e grotesco:

—Ho. Ho. Ho.

Ihcje sentiu, pela primeira vez, que aquela podia ter sido uma ideia ruim quando o boneco avançou sobre ele com as mãos esticadas e apertou os dedos deformados sobre seu pequeno pescoço élfico.

***

POLO NORTE

01h 01m 52s 41mm

23/dezembro/2235

Sala do Lifhe

Lifhe, o chefe dos elfos, já estava impaciente. Era uma hora da manhã e Ihcje devia ter voltado com Papai Noel para iniciar os serviços há, pelo menos, meia hora. Batendo o pé calçado em botas pretas bem polidas, o chefe levantou de sua cadeira acolchoada e foi procurar pelo subordinado.

Saiu de sua sala própria, dentro da residência do Papai Noel, deixando papéis inacabados e lápis espalhados pela mesa.

Os corredores da casa de Noel eram sempre mal iluminados, para garantir que o bom velhinho tivesse um bom ano de descanso, mas, mesmo com motivos nobres e para um bem maior, ainda aterrorizava o elfo um pouco.

Bateu suavemente na imponente porta de madeira e entrou no quarto sem nem esperar por uma resposta. Lá dentro, as cortinas já tinham sido puxadas, permitindo que a luz pálida do sol invadisse o quarto. Na cama, Papai Noel estava sentado encarando as mãos com tristeza.

—Senhor? - Lifhe chamou. O velho levantou o olhar cabisbaixo- Por que o senhor não está de pé? Um elfo não veio acordá-lo?

—Veio sim, amigo. Eu disse que não ia entregar presentes esse ano, mas estou tendo umas ideias.

—Pois diga- Instigou o homem com orelhas pontudas sentando-se na alta e macia cama onde o outro antes repousava.

—Eu não queria ir, pois, se analisarmos a miséria e pobreza dos humanos, de que servem presentes coloridos e com fitas bonitas?

—Tem certa razão, senhor- O elfo admitiu- Mas pode levar alegria a eles.

—Sim, nisso que eu estava pensando, Lifhe. E se eu não levar presentes cobertos com papel listrado e fitas brilhantes?

—Não sei se entendi, senhor- O elfo falou confuso.

—Lifhe, e se, ao invés de levar brinquedos, eu levar coisas que eles realmente precisam?

—Oh- O elfo estreitou os olhos para o chefe- Sagaz.

—Podemos levar roupas- Noel falou mostrando um início de ânimo- E produtos de higiene! E comida!

—E remédios- Lifhe ficou de pé na cama, ainda sendo mais baixo que o homenzarrão sentado.

—É ISSO!

Papai Noel deu um pulo da cama, derrubando os lençóis que o cobriam e dando um susto no ajudante, que quase caiu de costas no chão, sendo segurado pela mão do homem.

—VAMOS, LIFHE! Temos tanto trabalho...

Os dois deixaram a cama bagunçada e o quarto revirado para trás enquanto iam pelo corredor com tapete vermelho até a sala de reuniões, propor as mudanças que deveriam ser agilizadas para as próximas cinco horas.

Excitados com as novas ideias, Lifhe até mesmo se esqueceu de indagar sobre o paradeiro de Ihcje. Passando pelas janelas que davam para o lado de fora coberto de neve e para os estábulos, nenhum dos dois olhou para fora, pois se o tivessem feito, saberiam onde estava o elfo desaparecido: sendo soterrado solitário pela brancura gélida.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado :D
Digam ai embaixo o que acharam, gosto de saber suas opiniões :)
Até o próximo capítulo



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