This Christmas, go towards love! escrita por Regina Rhodes Merlyn


Capítulo 1
Capítulo Unico


Notas iniciais do capítulo

Olá flores!
Como já está se tornando tradição, estou postando uma One de Natal para vocês. Este ano, no entanto, foi diferente. Na verdade essa é minha segunda one natalina. A primeira fez parte do Semana Olicity de Natal a qual fui convidada a fazer parte pela querida Ciin Smoak. Aliás, quem ainda não leu recomendo. Já foram postadas cinco das sete que formam o projeto , inclusive a de moah, e todas, TODAS, estão maravilhosas! Deem um pulinho lá pra conferir e nos deixem suas impressões (Amaremos saber o que acharam!). Basta procurar aqui no meu perfil e terão acesso as fics.
Bem, mas vamos aqui. One de meu casal injustiçado, Rheese. Um pouco de romance e comédia espera por vocês flores. Espero que gostem de lê tanto quanto gostei de escrever. Me deixem rewiews, Pleeeeeaaassseeeeee! Alimentem uma escritora faminta, rsrsrsrsrs. Boa leitura. Bjinhos flores.
Em tempo: esta será a última postagem deste ano. Depois de hoje estarei entrando em recesso de final de ano. Não postarei mais nenhum capitulo das regulares ou outra one. Não vou parar de escrever. Aproveitarei este tempo para corrigir os capítulos que estão prontos, finalizar outros e dar sequência a meu mais novo projeto. Á partir da segunda semana de Janeiro retorno com bastante capítulos inéditos, algumas despedidas e novidades no Arrowerse pra começar!
No mais, desejo a todas vocês juntamente com suas famílias um Feliz e Sagrado Natal e um Ano Novo repleto de alegrias e realizações.
Nos vemos nas notas finais....kkkkk
Em tempo 2: Quero agradecer duas pessoas pela ajuda nesta fic. A primeira é a Marielle, que para variar me fez essa linda, linda, linda capa. Tu mora no meu core e não paga aluguel flor!! Mil bjs e xeros pra vc.
A segunda, e não menos importante, a Ciin Smoak que além de me convidar fazer parte do projeto Olicity, me ajudou na escolha do titulo e agora é minha beta oficial! Quando quiser ser vizinha da Mari pode vir viu?kkkkk bjs e xeros mil pra tu também flor



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"Santa tell me if you're really there;

Don't make me fall in love again;

If he won't be here next year;

Santa tell me if he really cares;

Cause I can give it all away;

If he won't be here next year..."

Santa Tell Me

Ariana Grande 

Dolan Rhodes (Segunda, 23/12/19 -20:15 p.m)

Sarah

Não acredito que estou prestes a entrar neste lugar uma segunda vez!!... suspiro desanimada, correndo os olhos pela fachada imponente da mais cara loja de departamentos de Chicago, a ornamentação natalina me trazendo de volta a mente coisas que gostaria de esquecer. Para sempre.

Mordo o lábio inferior com um pouco de força, tique que tenho desde criança quando estou insegura ou indecisa, o que, para minha infelicidade, acontece com certa frequência, logo, de vez em quando, acabo com a boca ferida, fato que muitas vezes me causa constrangimento.

—Reese, tá fazendo o que parada aí feito um dois de paus!?! – o questionamento me tira do limbo e pisco repetidamente, focando no rosto da loira sorridente a minha frente – Bora gastar nossos cartões presentes!! – convida, praticamente me arrastando em direção a entrada da loja e instintivamente, travo, obrigando-a parar – O que foi? Algo errado? – quer saber, enrugando o cenho.

SIM! NÃO QUERO ENTRAR AI DE NOVO!! ... a criança traumatizada em meu cérebro grita a plenos pulmões, mas ao invés disso me ouço dizendo...- Não seria o caso de esperarmos as garotas chegarem? Afinal, combinamos de fazer isto juntas – argumento, mordendo o lábio outra vez.

—E por que não lá dentro? Certamente está bem mais agradável do que aqui fora! – rebate, esfregando os braços – Está frio. Podemos esperar por elas no quentinho e de quebra ir dando uma olhada em tudo por lá – argumenta, me encarando.

—É que.... e se pensarem que não viemos ou que nos atrasamos ao chegarem e não nos verem? – insisto, me sentindo uma tola. Era inadmissível a uma futura Psiquiatra se deixar dominar por um medo infantil como este!

—Não seja por isto! – exclama, sacando seu celular e naquele momento perdi a batalha – Prontinho. Avisei no grupo que estamos esperando lá dentro – avisa, enlaçando seu braço ao meu – Vamos nessa que tô louca para gastar meu bônus natalino surpresa!! – vibra, me arrastando em direção as portas de vidro, que se abrem automaticamente quando nos aproximamos.

Sinto meu corpo retesar-se inteiro, mas desta vez não travo, para nossa sorte ou pagaríamos um tremendo mico caso as portas fechassem na nossa cara, o que só pioraria meu já deprimente estado de nervos.

Vamos lá Sarah, você consegue! Não é mais uma criança agora. É uma mulher adulta e forte! ... Incentivo a mim mesma, retendo o ar no exato instante em que cruzo as benditas portas, adentrando a Dolan Rhodes pela segunda vez em minha vida, imagens e sons do passado me tomando de assalto tão logo Sylvie me “liberta” em meio ao gigantesco hall de entrada do lugar... Não, não consigo não! Quero ir embora!... Sem que possa controlar, me vejo, aos seis anos, sendo arrastada por aquele mesmo hall, o segurança grosseiro usando uma mão para segurar e apertar meu braço com força, me obrigando segui-lo, enquanto na outra levava o fruto de meu suposto roubo: uma boneca de porcelana, importada sei lá de onde, caríssima, falando alto em seu comunicador ordenando uma busca por outras crianças e talvez adultos pela loja, alertando contra outros furtos, pouco se importando se as pessoas ouviam ou se estava me machucando, tampouco me dando ouvidos quando comecei a chorar baixinho, jurando não ter pego a maldita boneca.

A cena me vem tão nítida aos olhos que chego sentir sobre mim os mesmos olhares acusadores daquelas pessoas elegantemente vestidas. Alguns de pena também, mas a maioria de reprovação e critica. Sinto uma tontura repentina me atingir, fazendo com que tudo a minha volta girasse.

—Sylvie...eu...- balbucio, tateando em volta em busca de algo em que me apoiar quando minha visão começar ficar turva.

Não, desmaie! Respire! Respire... Pelo amor de Deus não desmaie em pleno hall de entrada!... admoesto-me mentalmente, encontrando, finalmente, algo firme em que me apoiar, a sensação de alívio evaporando-se ao escutar a voz grave e familiar a centímetros de meu ouvido ao mesmo tempo em que um braço forte e firme envolve minha cintura delicadamente

—Reese? Sente-se mal?? – pergunta, arrepios involuntários percorrendo meu corpo de alto a baixo, fazendo a umidade entre minhas pernas se elevar um pouco – Reese, está me ouvindo? O que está sentindo? – insiste, a preocupação ficando evidente em sua voz.

Ainda assim, sinto novos e fortes arrepios se espalhando num crescente por todo meu ser.

—Sarah!?!  Ah meu Deus, o que houve? – a pergunta (meio estridente e exageradamente alta) de Sylvie me faz cair em mim e reagir.

—Nada – digo, finalmente, tentando me afastar daquele corpo quente e tentador, do cheiro inebriante de seu perfume penetrando minhas narinas, da estranha sensação de pertença que sempre me vinha cada vez em que nos tocávamos mesmo que por acaso, como agora – Não foi nada. Estou bem – reafirmo, fazendo nova tentativa de me soltar.

—Não, não está. Está pálida e suando – ele rebate, levando uma mão a minha fronte (Esse homem é um polvo? De onde surgiu tanta mão??) – Venha. Vou te levar a um local mais calmo e te examinar – convida, e “desperto” de vez.

—Não!! – protesto, um pouco mais alto e rude do que pretendia, usando a mão que ainda apoiava em seu peito para empurrá-lo.Tudo que eu Não precisava naquele momento era “brincar” de médico com Connor Rhodes! .... Não seja ingrata. Ele está preocupado ... minha consciência acusa, fazendo-me moderar a reação – Estou bem. Sério – garanto, evitando olhar em seus olhos.

—Então se te soltar não vai cair? – Connor inquere e sinto meu rosto esquentar.

Evidente que cairia!  Além de a tontura não ter passado completamente, começava a sentir os efeitos de sua proximidade.

—Eu...- vacilo e por ter feito isto, dancei.

—Venha – repete, seu tom de voz deixando claro que não aceitaria uma recusa.

Vencida (e não querendo chamar mais atenção do que já tinha feito), me deixo conduzir por ele, Sylvie dois passos atrás de nós, até uma sala a alguns metros da entrada, um tipo de escritório ou sala de descanso. Uma mesa, duas cadeiras e um sofá de dois lugares além de alguns quadros e uns três vasos com arranjos florais compunham o ambiente bastante sóbrio, porém aconchegante. Na verdade, olhando melhor, parecia um tipo de refúgio.

—Sente-se aqui – manda e obedeço, resignada, apertando as mãos, ansiosa.

—Está mais corada – Sylvie comenta e sorrio sem vontade – O que aconteceu? – quer saber, preocupada – Desculpa ter te deixado sozinha...

—Sylvie, não foi culpa sua – apresso-me dizer, tendo um pequeno sobressalto ao sentir Connor segurar meu pulso esquerdo.... Sério que vai mesmo me examinar? Uau! ... me admiro, dando atenção a minha amiga outra vez (mesmo porque precisava fazer minha mente esquecer o formigamento de minha pele sob seu toque) – Eu só me senti um pouco zonza, nada mais. Deve ter sido algo que comi antes de sair. Foi uma tontura boba que já passou – justifico-me, retendo o ar ao ver Connor puxar uma cadeira e sentar-se, estetoscópio em mãos, inclinando-se até ficar bem perto. Perto demais para minha sanidade – Não precisa fazer isso Co... eh ... doutor Rhodes – corrijo-me não tão rápido quanto gostaria, o riso divertido dele me fazendo corar novamente.

—Disse que te examinaria e o farei – afirma, afastando delicadamente a gola de minha blusa a fim de posicionar o aparelho sobre minha pele e instintivamente levo a mão ao pingente em meu pescoço, encobrindo-o.

Durante o que me pareceu uma eternidade, Connor Rhodes me examina cuidadosamente (e realmente me pergunto qual a necessidade disto além de me torturar. E em plena antevéspera de Natal! Deveria ser crime!) até finalmente se dá por satisfeito.

—Ok. Aparentemente tudo bem – decreta, pondo o esteto em seu pescoço e me controlo para não rolar os olhos – Deve ter sido uma queda de pressão. Há quanto tempo se alimentou? – pergunta e decido dar um basta na situação.

—Pouco antes de sair, ou seja, cerca de meia hora – respondo, levantando-me com cuidado (não queria dar motivos a ele me examinar novamente porque aí sim passaria mal de verdade!) – Desculpa o susto e obrigada pela atenção doutor Rhodes – agradeço – Melhor irmos. O pessoal já deve ter chegado – proponho, olhando para Sylvie, que anui, pondo-se de pé rapidamente.

—Vieram fazer compras? – Connor pergunta, não me dando tempo responder – Desculpem, não é de minha conta. Foi apenas curiosidade – pede, retirando o esteto, largando-o sobre o sofá.

—Sem problemas. Viemos fazer uso dos cartões presente que sua irmã nos deu – Sylvie se adianta, animando-se outra vez – Não sei se ela lhe contou, mas nos presenteou, a mim, Sarah e outras pessoas, com cartões pré-pagos, daqui da loja, como forma de agradecimento por tê-la ajudado, mesmo a gente tendo dito que não precisava – conta.

Cinco meses atrás Claire Rhodes passara mal em meio a uma praça da cidade. Era tarde e o local pouco movimentado. Por sorte tínhamos, Sylvie, Shay, Maggie, Casey, Severide, Otis e eu, ido a uma festa de um amigo da Leslie ali perto e a socorremos.

Semana passada ela apareceu de surpresa no Med trazendo um cartão presente para Maggie e outro para mim dizendo ser nosso presente de Natal. Bem que tentei recusar, mas todas foram taxativas em dizer que seria falta de educação e que poderia ferir os sentimentos dela. Naquela mesma noite, Sylvie e Shay foram em casa, animadas, querendo marcar de irmos as quatro juntas fazer uso dos cartões. Demorei responder e por isto dancei!

—Contou sim – diz ele, sorrindo daquele jeito simples e devastador, próprio dele, dando atenção seu celular que começara tocar, sua expressão mudando drasticamente – Bem, não vou reter vocês sem necessidade. Boa noite, boas compras e Reese, procure se hidratar. Desidratação pode ocasionar queda de pressão – aconselha, dirigindo-me um novo sorriso antes de sair.

—Como se eu não soubesse! – deixo escapar com certa ironia.

—Posso sugerir um check up cardíaco? Até já sei qual médico te indicar!! – ouço Sylvie dizer e tenho certeza ter atingido o mais alto grau de vermelhidão possível a um ser humano.

—Vai me dizer que não fica sem graça na frente dele? – rebato, respondendo a mim mesma – Óbvio que não! Tem a Shay – lembro, sua risada me perseguindo enquanto caminhamos de volta a entrada da loja aonde Maggie e Shay já nos esperavam.

—Onde vocês estavam? Pensamos que haviam desistido e ido embora – Shay inquere, olhando de Sylvie para mim – Tudo bem Sarah? Está um pouco pálida – questiona-me.

—Até que está se comparado a vinte minutos atrás. Ela quase desmaiou bem aqui! – Sylvie conta antes que pudesse impedir – Não fosse o doutor Rhodes certamente teria caído ao chão – completa.

—Connor te socorreu foi? Uhum!! – Maggie pergunta, ela e Shay rindo de maneira enigmática.

—Uhum o quê?? – devolvo questão e olhar.

—Porque sabemos muito bem que tem uma quedinha por ele e nem adianta fazer este bico, senhorita – Shay responde, apertando meu “bico”, rindo divertida – Apesar de disfarça relativamente bem...

—Isto quando passa menos de vinte minutos em um mesmo ambiente que ele, naturalmente. Porque amigas, vocês precisavam ver como ficou enquanto era examinada! – Sylvie entrega e sinto ânsias de esganá-la.

—Examinada? Então o caso foi sério? – Maggie preocupa-se, me olhando.

—Não foi, não – tranquilizo-a – Doutor Rhodes quis apenas se certificar que estava bem, só isso – garanto.

—Excesso de zelo, com certeza – Shay diz, o toque de malícia não me passando despercebido.

—Isso – anuo, tomando a iniciativa de mudar o rumo da conversa – Então, já pensaram no que comprar? Eu ainda não pensei em nada – admito – Lembrando que não temos muito tempo já que são quase nove horas e a loja fecha à meia noite, se não me engano – lembro-as, me sentindo um pouco mais confortável agora que o impacto inicial passara e por estar com elas.

—Notaram a discreta mudança de assunto né? – Shay brinca, fazendo aspas no ar, não me dando chance rebater – Façamos sua vontade, senhorita! – exclama, piscando – Respondendo: eu quero ir à seção de roupa íntima e depois maquiagem e roupas dia a dia, se é que tem isto aqui – avisa, esfregando as mãos.

—Eu quero ir à diária primeiro e depois cama, mesa e banho. Ouvi dizer que tem cada coisa linda!! – Sylvie exclama – Depois vou à de lingerie e maquiagem por último – conta.

—Como também quero ir à seção diária primeiro, basta que você decida com quem irá Sarah. Se com Shay ou conosco – Maggie sugere, Leslie não me dando chance escolher.

—Vamos de duas em duas, portanto, você vem comigo! – adianta-se, segurando meu braço, praticamente me arrastando com ela.

—Então tá – me limito dizer, acenando a Sylvie e Maggie, me deixando conduzir por ela.

—Liguem quando terminarem e marcamos um ponto de encontro – Mags sugere acenando de volta.

—Ok! – Shay responde, erguendo a mão sem olhar para trás ou parar – Vamos escolher umas peças bem lindas e sexys para nós! – declara ela, se apoiando a escada rolante de forma a ficar de frente para mim.

—Para quem, digo, quê? – solto antes que pudesse me controlar.

—Para você mesma, minha linda – responde, sorridente – Antes de querer ficar bonita para alguém, seja em público ou no privado, temos de querer ficar lindas para nós mesmas. Assim o brilho interno reflete e fica fácil conquistar quem desejamos – declara, me dando as costas ao alcançarmos o topo da escada.

—E quem disse que quero conquistar alguém? – retruco, sentindo meu rosto esquentar, pensando se algum dia receberia de Connor outro olhar daquele que recebi, quatro anos atrás, quando começou trabalhar no Med.

Naquele dia, tive a nítida sensação de que já o vira antes, em algum lugar.

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Aeroporto de Chicago (21:14 p.m)

Connor

Adentro o saguão do aeroporto dando uma rápida olhada no relógio. Ainda me restavam vinte minutos antes que o vôo saísse.

Caminho apressado por entre a multidão que ia e vinha com seus carrinhos repletos de bagagens. Todo tempo que economizei com a sorte de ter pego um trânsito fluído da Dolan até aqui, estava sendo desperdiçado ali, desviando de pessoas desatentas. Uma mulher quase me acerta o tornozelo com um deles.

Atenção senhores passageiros com destino a Londres, embarque imediato no portão 23, plataforma D” , o sistema do aeroporto anuncia, me fazendo praticamente correr em direção ao portão indicado, esbarrando em um ou outro de vez em quando devido a pressa.

Logo que me aproximo a vejo diante do balcão da companhia aérea, realizando o check in. Paro, aguardando-a finalizar o procedimento, acenando quando ao final se volta, a minha procura, certamente. Observo-a vir em minha direção, ajustando a bagagem de mão, seu riso morrendo gradativamente ao notar a ausência de malas a meu lado.

—Vejo que tomou sua decisão – comenta, parando a alguns passos de mim, claramente desapontada – Então isto é um adeus? – pergunta, olhando-me no fundo dos olhos.

—Estou reestruturando minha vida na cidade novamente. Refiz os laços com minha irmã, apesar de nosso pai ainda ser uma pedra em meu sapato - declaro, sincero – Também estou feliz com os resultados de meu trabalho no Med, das amizades que fiz por lá e através destas. Não posso simplesmente dar as costas a tudo isto porque você não se sente confortável aqui, Ava – argumento, sustentando seu olhar – Sinto muito termos chegado a este ponto – lamento.

—Quer dizer que prefere essa vidinha medíocre como segundo de Latham a ter uma posição de destaque e um departamento todo seu? Francamente Connor, esperava mais do homem com o qual pretendia me casar – desdenha, me irritando profundamente.

—O problema é justamente este: não considero mediocridade ser segundo de Latham muito menos continuar com meu trabalho aqui, seja na Cardiologia, seja no comando da sala híbrida...

—Que por sinal fui eu quem conseguiu grande parte do patrocínio junto a seu pai – faz questão de lembrar, aumentando e muito minha raiva.

—Bom ter lembrado este detalhe, assim torna mais fácil não me arrepender ter decidido ficar em Chicago posto que não levou em consideração meus sentimentos em relação a ele muito menos teve a decência de me contar como havia conseguido tal proeza - digo, não me importando se a magoaria.

Aquela ainda era uma ferida aberta entre nós. Não conseguia acreditar que ficara apenas no jantar mesmo meu pai confirmando sua versão. Tão situação fora a gota d’água que pôs fim a nossa relação antes mesmo que me comunicasse ter aceito uma proposta do Queen Anne Medical, em Londres, para chefiar o departamento de Cardiologia. Na verdade, acho que esperava me comover a ponto de pedir que ficasse e renovasse nosso compromisso. Quando não fiz nem uma coisa nem outra, zangou-se a ponto de me xingar a vista de todos em sua despedida oficial do Med.

Logo, foi com surpresa que a recebi em meu apartamento, quatro dias atrás, dizendo ter conseguido para mim um cargo de chefia no departamento de Trauma do mesmo hospital, acenando com a possibilidade de nos voltarmos a nos entender, o que aquela altura já não me passava mais pela cabeça. Ainda assim, insistiu em que deveria pensar a respeito até o dia do embarque, o que obviamente não fiz.

—Se pudesse voltar no tempo e mudar este fato, acredite, o faria – assegura, me encarando – Muito embora não mereça – diz, mudando o discurso radicalmente – Quer saber, não passa de um ingrato! – exclama – Fiz de um tudo para te ajudar. Até suportar aquele seu pai arrogante por horas, me comendo com o olhar, suportei para conseguir o dinheiro de sua maldita sala hibrida para no final me trocar por essa vidinha ... irritante – corrige-se rápido, o sistema fazendo a última chamada de seu vôo – Bom, fez sua escolha. Arque com as consequências então – dispara, retirando a aliança de noivado que sequer notara estar usando – Faça bom proveito. E caso se arrependa, não me procure – ironiza, estendendo-me o anel.

—Pode ficar. Mesmo que algum dia volte a tencionar me casar, não daria a ela o anel de outra – afirmo, honesto, surpreendendo-me ao ter o objeto lançado contra meu peito, o mesmo caindo ao chão, correndo no piso liso.

—Vá a merda Connor! – xinga, me dando as costas sem esperar resposta, seguindo a passos firmes para o portão de embarque sem olhar para trás.

—Adeus Ava. Espero que seja feliz – desejo para o nada, observando-a até que entrasse no corredor de acesso a aeronave. Somente então me volto, refazendo o caminho até a saída sem pressa.

Enquanto caminho, relembro os últimos cinco meses, tentando entender em que ponto aquela mulher encantadora, generosa e vibrante que conhecera em minha passagem pela África do Sul e pela qual me apaixonara a ponto de pedi-la em casamento meses após ter vindo para os Estados Unidos, deu lugar a mulher mesquinha, dominadora, egoísta, quase sem coração da qual acabo de me despedir. Ou teria sido mais uma ilusão de minha mente? Será que mais uma vez vi alguém que de fato não existia? Não seria surpresa já que cometi este mesmo erro algumas vezes, infelizmente.

—Você não aprende, não é mesmo Connor? – questiono-me baixinho, meu celular começando a tocar naquele momento. Atendo-o – Oi Claire. O que manda? – pergunto, rindo tranquilo.

< Primeiro, estou feliz que não tenha sucumbido a chantagem daquela víbora que chamava de noiva! > diz, direta < Segundo, poderia me fazer um pequeno favor? Minto, seria um enorme favor! > corrige-se ligeiro e me preparo para um de seus pedidos esdrúxulos.

—Se puder, faço sim – respondo, destravando meu carro quando me aproximo.

< Entãoooo... > cantarola e tenho certeza se tratar de alguma roubada < Sei que deve estar cansado por ter saído de um plantão longo e coisa e tal ...> enrola.

—Claire, não enrola. Fala de uma vez. O pior que pode acontecer é te dar um não como resposta – ordeno, entrando no carro.

< Certo. Então lá vai: poderia fechar a Dolan para mim? > dispara, me deixando em choque por um segundo < Normalmente é o Russell a fazê-lo, mas este ano ele pediu férias agora em Dezembro e não consegui negar, mesmo sendo o mês mais corrido na Dolan > conta < Normalmente o faço quando ele não está, mas acabei esquecendo este detalhe e marquei com um grupo de amigos da universidade que não vejo faz tempo. Não quero pedir ao papai ...>

—Já entendi – corto-a, não querendo ouvir mais lamentações. Ouvira bastante por um dia – Só me diz o que tenho de fazer e como – peço, dando a partida, conectando meu aparelho ao veículo, ficando com as mãos livres para dirigir.

< Basta aguardar por Célly, nossa subgerente, no escritório, conferir com ela os valores da férrea diária e entregar-lhe os envelopes com as bonificações natalinas que já deixei separada na última gaveta de minha mesa. Ela distribuirá entre os funcionários e passará o horário de funcionamento de amanhã > explica, soltando um impropério ao deixar (suponho) cair algo < Desculpa. Estou meio enrolada aqui > pede, me levando a pensar se teria alguma razão especial para parecer tão nervosa com o tal encontro. Ou alguém < De qualquer forma é bem simples. Só tem de conferir os valores com ela, assinar o relatório de fechamento de caixa e guardar no cofre. Não o que fica atrás do quadro. O outro sob o piso abaixo de minha cadeira > específica < E Connor, espere ela sair com os envelopes para fazê-lo. Russell e eu confiamos nela, mas papai não e não quero dar a ele motivos de reclamação, especialmente que será você que o fará e por falar nisso..>

—Não – corto-a outra vez, antevendo o que estava prestes a pedir, reduzindo a velocidade ao me deparar com uma fila de carros parados.

< Eu nem falei ainda! Como pode dizer não?? > inquere e rio ao imaginar sua cara de indignação.

—Porque já imagino o que seja – digo, atento a direção posto que começava a cair uma fina camada de neve – Não vou jantar em casa com você e papai – me adianto – Já tive minha cota de discursão com ele por um mínimo de dois anos – afirmo, ouvindo-a soprar.

< E tudo por culpa de sua querida noivinha! > bufa, seu tom de voz deixando transparecer a raiva que sentia.

—Ex noiva – a corrijo, acelerando novamente.

< Graças a Deus! > exclama e desta vez rio abertamente < Poderia ao menos pensar nisso? Gostaria tanto de ter os dois a meu lado na ceia > pede, completando antes que respondesse < Sem falar que faria Carlota muito feliz. Saiba que foi ela a me sugerir te pedir isto > acrescenta.

—Pegou pesado maninha! – exclamo, respirando fundo. Carlota trabalha para nossa família desde que erámos crianças. Igual Russell – Me deixe pensar a respeito, mas se por acaso aceitar, sairei logo depois da ceia. Quanto menos tempo juntos, papai e eu, melhor – declaro, reduzindo outra vez por conta do tráfego pesado.

< Ok e pode deixar que falo com papai. Teremos uma ceia tranquila, em família > promete e guardo para mim o comentário que me vem a mente < Obrigada pelo socorro maninho! Te ligo amanhã, não muito cedo, claro, para combinarmos melhor. Beijos. Te amo > despede-se.

—Beijos e divirta-se – recomendo, desligando ao mesmo tempo que ela, refletindo em seu pedido.

Desde que fizemos as pazes, cerca de um ano após eu haver regressado ao país, Claire e eu nos dividíamos no feriado de final de ano. Ela ceava com nosso pai e almoçava comigo, assim tínhamos nossa “reunião” familiar sem estresse. Encontros entre meu pai e eu tendem a ser, invariavelmente, extremamente estressantes não apenas para nós dois, mas para todos que estivessem por perto e por mais que deseje atender o pedido da querida Carlota, honestamente não sei se valeria pena arriscar mudar a esta altura, especialmente este ano.

—Preciso pensar bem sobre isto – murmuro, entrando na avenida que me leva a Dolan, manobrando de forma a fazer uso do estacionamento interno do prédio. Ficaria bem mais fácil e tranquilo sair depois de fechar a loja, o que aconteceria dentro de mais uma hora e meia.

Estaciono na vaga dela, desço, optando por deixar minha mochila e carteira dentro do veículo posto que não precisaria de nada delas, travo-o, caminhando distraído, a voz infantil chamando minha atenção.

Paro, olhando o jovem casal caminhar até seu carro com as duas garotinhas saltitantes, cada qual segurando uma caixa de boneca, um incidente antigo me vindo a mente repentinamente. Não sei bem por quê, a imagem de uma garotinha de cabelo castanho, trançado, chorando baixinho enquanto um dos seguranças que trabalhava na loja aquela época a arrastava acusando-a de roubo. A cena me chocara a tal ponto que não pude manter-me imune. Fui ao encontro deles, libertando-a, exigindo ao homem pedir-lhe desculpas, especialmente após as imagens, as quais deveria ter verificado antes de a acusar, mostraram que a menina não era culpada.

Uma outra garotinha, filha de socialite local, escondera uma boneca de porcelana, muito cara, na mochila da menina antes que a mãe percebesse que a havia pego. Como forma de me desculpar pelo comportamento daquele troglodita, dei-lhe uma correntinha que catei no balcão de jóias ali perto. Sequer prestei atenção ao valor muito menos qual era o pingente. Vi que havia um. O importante, na minha opinião, ali era reparar de alguma forma a humilhação que sofrera, não o valor. Agi por impulso e nunca me arrependi de o ter feio.

Neste momento, o riso da menina maior me tirando do limbo no qual entrara. Sacudo a cabeça, apertando o botão de chamada do elevador privativo que me levaria direto ao andar onde se localizam os escritórios. Por ser panorâmico, enquanto subo tenho uma visão do movimento em quase todos os departamentos, um sorriso surgindo em meu rosto ao reconhecer em meio a multidão Reese e Maggie com suas amigas caminhando por entre as secções lotadas.

Ela tinha este efeito sobre mim. Fazer-me sentir bem sempre que a via ou quando estávamos próximos. E sorrir. Não sorrir de coisas ruins ou atendimentos difíceis que algumas vezes fizemos juntos. Não. Apenas sorrir. Eu não sei explicar o como nem o porquê de me causar este efeito. Apenas acontecia e admito gostar cada vez mais.

Saio do elevador, me dirigindo direto ao escritório de Claire, me atirando no pequeno sofá de dois lugares, ficando no aguardo da subgerente.

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Dolan (00:15 a.m)

Narrador

—Cadê vocês?? – Sarah murmura, olhando em volta após verificar a hora em seu celular, deixando escapar um suspiro alto, sentando-se, desanimada, no pequeno e delicado puff ali perto.

Quase já não havia clientes circulando pela imensa loja de departamentos. O sistema de som avisava constantemente que os pouco precisavam se retirar o quanto antes pois as portas seriam fechadas muito em breve.

—Droga. Apareçam! – bufa a jovem médica, pondo-se de pé novamente, impaciente, segurando as poucas sacolas contendo suas compras.

Há muito escolhera o que desejava, pagara, ficando apenas para fazer companhia as amigas. Maggie fora embora pouco antes da meia noite, deixando-a com Sylvie e Leslie, a segunda ainda procurando alguma coisa que nem ela mesma sabia o que, tirando-a minimamente do sério.

Quando finalmente Shay parecia ter encontrado o que desejava e as três rumavam para os provadores, Sylvie esbarrara em ninguém menos do que Jesus Luz, modelo do qual era fã, e simplesmente largou a ambas, ela e Shay, saindo em uma perseguição maluca ao homem a fim de conseguir bater uma foto e pegar autógrafo.

“Deixa-a. Assim posso provar com calma. Daqui a pouco saímos” ... Shay a tranquilizará, indo aos provadores enquanto ela permanecia caminhando pela seção, sem afastar-se a fim de não perder a outra amiga de vista. Mas bastou um segundo para que justamente isto acontecesse!

Tivera sua atenção atraída pela passagem de uma jovem carregando várias bonecas de porcelana, a mesma que fora acusada roubar anos atrás, e quando deu por si estava seguindo a vendedora, se afastando mais do que gostaria de onde Shay estava. Quando retornou a loira já havia deixado os provadores e agora Sarah não conseguia contato com nenhumas delas.

Para piorar, seu celular estava prestes a descarregar e como não trouxera carregador, ficaria sem ter como falar com as amigas, o que a estava deixando a beira do desespero.

—Droga. Sabia que algo assim ia acontecer. Essa loja é meu carma! – sopra a médica, limpando o suor de sua fronte com o dorso da mão livre, perscrutando o ambiente em busca de seguranças, a simples idéia de sofrer nova humilhação fazendo seu coração disparar, destravando o aparelho, indo direto ao aplicativo de mensagens.

—Sylvie, meu celular está quase descarregando. Me desencontrei de vocês e agora não estou conseguindo contato. Onde estão? A loja vai fechar a qualquer momento. Temos de ir embora!! Estou no terceiro andar, perto de onde Shay estava provando aquele conjunto saia e blusa que escolheu. Vocês estão juntas? Me liguem, por favor. Rápido! – implora, enviando a mensagem.

—Senhorita, precisa sair – volta-se ligeiro ao escutar o pedido, deparando-se com um homem uniformizado, alto, a olhando, sério – A loja está fechando. Por favor, dirija-se a um dos elevadores que a levara ao hall de saída – recomenda polidamente.

—É que... – Sarah titubeia, visualizando uma cabeleira loira por sobre os ombros do rapaz a alguns metros deles – Claro. Estava procurando minha amiga – informa, apontando na direção que vira a garota, ele seguindo sua indicação com o olhar – Desculpa e bom Natal – deseja, ajeitando as sacolas em seu braço, dirigindo-lhe seu melhor sorriso.

—Sem problema. Um bom Natal para a senhorita também – retribui o homem, cumprimentando-a curto antes de seguir seu caminho por entre os corredores, deixando-a só.

Na esperança de ter localizado ao menos uma das amigas, Sarah corre na direção em que vira a loira, o vibrar de seu celular fazendo-a estancar um segundo, verificando tratar-se de uma mensagem da mãe e não de Sylvie, como esperava, o som característico de portas metálicas, como as do elevador, abrindo-se, a fazendo erguer o olhar a tempo de ver a luz que vindo do interior do cubículo, embrenhando nova corrida para não perdê-lo, adentrando no último segundo possível.

—Ufa!! Deu tempo– sopra, aliviada, recostando-se a uma das paredes no interior do elevador, olhos fechados, puxando o ar com força, soltando-o devagar a fim de acalmar-se.

Abre os olhos, posicionando-se de costas para o fundo do elevador de forma a visualizar o painel central. Apoiando-se no ombro direito, decide ouvir a mensagem que a mãe enviara, a presença do moreno atrás dela passando completamente despercebida.

“Sarah, meu bem, sinto muito, mas não poderei ir pelo Natal. Surgiu algo aqui que requer minha atenção “...

—Me diz uma novidade! Sempre aparece algo mais importante do que vir me visitar! – exclama, desanimada, deixando a mensagem rodar outra vez.

“Quem sabe nos vemos no Ano Novo? Humm, pensando bem não vai ser possível. Já tenho compromisso agendado. Dou um jeito de te ligar no dia” ....

—Claro que vai, mãe! Vou esperar.... sentada! – ironiza a médica, mexendo-se, desconfortável, voltando escutar o áudio,  

“Minha secretária efetuou o depósito de seu presente como prometi. Já deve estar disponível. Até breve”

—Breve? Sei – bufa, mal tendo tempo lamentar posto que o aparelho começa tocar – Onde vocês estão? – inquere, aflita.

< Aqui ... >

—Alô? Sylvie? Alô??– chama, afastando o celular, o desagrado estampando-se em seu rosto ao ver a tela escura – Ah, não! não faz isso comigo! – choraminga, tentando, em vão, religá-lo – Merda! Ótima hora para ficar sem bateria! – esbraveja, sobressaltando-se ao escutar a voz grave soar a seu lado esquerdo.

—Use o meu – Connor oferece, estendo-lhe o aparelho.

—Jesus amado, que susto! -exclama a garota levando uma mão ao peito, olhando-o surpresa – De onde você surgiu? – questiona, o coração disparando ante o sorriso franco e belo que o cirurgião lhe dirige.

—Eu diria que foi você a se materializar aqui já que este elevador é privativo. Sequer deveria ter parado em algum andar – responde, enrugando levemente o cenho – Bom, como disse, pode usar meu celular para ligar ...

Antes que completasse seu pensamento, o elevador para bruscamente, jogando-o contra Sarah e a ambos contra a parede, fazendo-os perder o equilíbrio, indo ao chão. Mal têm tempo recuperar-se e novo solavanco sacode a pequena caixa metálica, fazendo-a descer rápido, estancando tão repentinamente quanto iniciara a queda. Ao parar, as luzes em seu interior apagam-se, deixando-os momentaneamente no escuro até que a luz de emergência acendesse.

—Porcaria de caixa metálica estúpida! – Sarah deixa escapar, agradecendo mentalmente por estarem quase às escuras e Connor não poder ver seu rosto corado por ter feito tal comentário.

—Você está bem? – pergunta o cirurgião, contendo a vontade de rir ante a evidente indignação da jovem.

—Acho que sim – responde ela, apoiando-se as paredes a fim de levantar-se, ele sendo mais rápido, ajudando-a tão logo põe-se de pé – Que aconteceu agora? – inquere, revoltada, de forma retórica.

—Nem imagino – Connor responde, erguendo a tampa transparente que protege o botão de emergência, apertando-o duas vezes seguidas – Pronto. Daqui a pouco alguém aparece para nos tirar daqui – tranquiliza-a, fazendo uma careta ao sentir o incomodo em seu braço direito.

Despe o blazer, dobrando o braço, o rasgão em sua camisa deixando à mostra o pequeno corte na região anterior ao cotovelo.

—Está machucado? – preocupa-se a jovem Psiquiatra, aproximando-se dele de forma a conseguir enxergar um pouco melhor, deslizando os dedos pelo local ferido, ambos se afastando ao sentirem a corrente elétrica percorrendo seus corpos.

—Não deve ser nada – minimiza Connor, intrigado com a sensação – E quanto a você? Algum machucado? – quer saber.

—Não, nenhum – assegura ela, enrugando o nariz em uma careta graciosa – Apenas meu lado mal-humorado e pessimista tendo um ataque inapropriado – diz, arrancando dele um sorriso divertido.

—Então não me enganei ao sentir o leve rancor no ar quando perguntou o que havia acontecido? – inquere, apoiando-se a parede, observando-a o mais atentamente que a pouca luz permitia.

—Nops! – confirma a garota, sentindo-se leve apesar da situação na qual se encontravam.

—Que mais aconteceu hoje que te fez ter este pequeno ataque? – instiga-a prosseguir ante o silêncio da garota.

—Quer dizer além de ter meu cabelo puxado até a raiz doer não duas, mas três vezes, por pacientes da Psiquiatria, uma garotinha ter vomitado em mim pouco depois do almoço, o que me fez vomitar também, não sobre ela, graças a Deus – tagarela a médica, fazendo o riso dele aumentar – De ter flagrado Noah e uma das novas estagiárias se pegando em um dos depósitos e como se isto não fosse suficiente ainda levei bronca de Miss Goodwin por algo que não fiz – prossegue – E para coroar este excelente dia, fui obrigada a vir a última loja na face da terra na qual gostaria de vir, quase desmaio já na entrada, me desencontro de minhas amigas, em parte por culpa do Jesus, bom dizer, e agora estou presa neste bendito cubículo defeituoso, sem celular nem a menor idéia de quando irá aparecer alguém para nos tirar daqui! – desabafa, soltando uma forte lufada de ar ao final, encarando a expressão confusa do moreno a sua frente – O quê?

—Duas coisas: Jesus é culpado pelo quê e porque exatamente odeia a Dolan Rhodes? – questiona-a – E, honestamente, espero que minha presença aqui não seja parte de seu incômodo – completa, sorrindo sedutor.

—Hã? Como assim Jesus.... – Sarah balbucia, momentaneamente perdida – Ah, sim! – bate na testa com a palma da mão, “a ficha” caindo-lhe – Não é a Este Jesus que me referi – aponta o alto – Jesus Luz, o modelo. Sylvie esbarrou nele e aí perdeu toda noção de tempo e o pouco juízo que ainda lhe restava! – esclarece, saboreando o som da risada dele, chegando a conclusão de este ter sido o som mais bonito que escutara aquele dia. Em muitos dias na verdade – E claro que não estou chateada por estar presa aqui com você. Estar presa, Aqui, é o que me chateia – declara ela, abrindo os braços de forma abranger o local aonde se encontravam.

—E quanto a odiar a loja de minha família? – insiste em saber, um longo silêncio abatendo-se sobre eles.

—Este... é um assunto... delicado e um pouco doloroso ainda para mim – Sarah confessa, levando a mão ao pescoço, envolvendo o delicado pingente mais uma vez, perdendo-se em suas lembranças.

—Deve ser especial – Connor diz, tirando-a do limbo.

—Quê? – interroga a jovem, franzindo o cenho, confusa.

—Este colar – aponta-o o cirurgião – É a segunda vez que o segura hoje. Deve ser um presente muito especial. Seus pais te deram? – pergunta, curioso.

—Não – responde, perdendo-se por um segundo em suas memórias outra vez – Na verdade, foi um estranho quem me deu – admite, olhando o painel escuro acima de suas cabeças, suspirando – Não sei você, mas eu vou me sentar um pouco – avisa, fazendo-o logo a seguir, Connor a imitando.

—Um estranho? – ele retoma tão logo se acomodam – Sinto que tem uma história por detrás deste fato, não tem? – persiste, olhando-a atentamente.

Ela havia atiçado sua curiosidade e agora precisava saciá-la. Além disto, pressentia que, de alguma forma, aquela história lhe dizia respeito também. Só não entendia como e por quê. Ainda.

—Vinte e um anos atrás... – Sarah começa narrar, fazendo com que Connor ficasse alerta – Acompanhei meus pais em uma viagem de negócios, por assim dizer. Papai tinha sido convidado a dar uma palestra na Universidade de Chicago e como não voltaria para casa antes do Natal, trouxe-nos com ele – conta, tomando fôlego antes de continuar – No dia seguinte, como estava livre, ele nos levou a passear pela cidade. A certa altura, perto daqui, encontrou alguns amigos e pararam para conversar, mas eu queria continuar a ver as vitrines e me afastei sem que notassem. Vim direto para a vitrine que mais chamará minha atenção: Dolan Rhodes – revela, fazendo outra pausa breve – Acabei entrando na loja e passeando pelos corredores. Estava fascinada. Não é que nunca tivesse visto ou entrado em uma loja luxuosa antes. Até havia, mas sabe como é? Criança adora novidade. Ainda por cima estava explorando tudo sozinha. Me sentia uma aventureira – relembra, rindo triste – A seção de brinquedos me atraiu e comecei andar por lá, me encantando com algumas bonecas de porcelana. Cheguei mesmo a pegar uma delas, mas a pus de volta no lugar assim que a vendedora se aproximou, desconfiada – continua, sem notar a mudança na expressão do homem a seu lado, o choque que cada palavra estava causando nele – Resolvi ir em busca de meus pais. Acabei me atrapalhando já que o número de pessoas na loja havia aumentado muito desde que entrara, e indo pelo corredor errado. Quando me localizei e já estava perto da saída, senti uma mão segurar meu braço com força, me puxando, praticamente arrancando a mochila que trazia em minhas costas, me acusando ter pego uma daquelas bonecas, me arrastando pela loja.... – se cala outra vez, as lembranças a entristecendo – Sabe, até aquela hora não pensei que estivesse tão mal vestida a ponto de ser confundida com uma ladra...

—Não estava – Connor declara, saindo da inércia, fazendo-a encará-lo, confusa – Agora entendo seu mal-estar ao entrar na loja. Não é para menos. Deve ter ficado traumatizada – presume o cirurgião, deixando Sarah ainda mais confusa – E também entendo agora por que sempre me pareceu familiar, desde o primeiro dia em que nos vimos – prossegue o cirurgião, balançando a cabeça – Quem poderia imaginar! Este mundo é mesmo muito pequeno! – exclama.

—Desculpa, mas não estou entendendo. Aonde estar querendo chegar? – questiona-o.

—Estou querendo chegar que eu estava aqui aquele dia, Sarah. Vi tudo o que acontecia da sala de segurança e fiquei tão fulo que nem parei para pensar. Desci até o hall de entrada e só não atirei aquele cretino porta afora porque imaginei que poderia piorar seu mal-estar – revela, deixando a médica boquiaberta.

—Então o garoto que me socorreu... era Você!! – exclama, levando as mãos a boca – Você! – repete, encarando-o.

—Culpado! – Connor brinca, sorridente, erguendo a mão – Tinha vindo a Dolan na intenção de me despedir de Claire já que partiria depois do Natal, o que acabei não fazendo – conta, “coçando” a barba – Fiquei jogando conversa fora na sala de segurança com o pessoal, esperando por ela. Daí um deles chamou atenção primeiro para uma garotinha que parecia estar pondo algo na bolsa de outra, mas devido ao ângulo não conseguia ver com precisão e alguns minutos depois atentou-se ao comportamento do segurança com outra menina – continua – Fiquei cego quando vi aquele idiota te arrastando! – bufa, cerrando o punho – Nem me liguei que um dos seguranças que estava comigo já havia conseguido esclarecer o caso e estava prestes a descer. Me adiantei a ele...

—E foi em meu socorro – sopra a médica, tocando o pingente – Eu estava tão assustada, com tanto medo, e fiquei tão aliviada quando apareceu que por muito tempo te fantasiei como um grande cavaleiro de armadura brilhante, bem maior do que deveria ser, com certeza – revela, saudosa, o brilho no olhar e o sorriso luminoso de Connor passando despercebido a ela.

—Para uma garotinha de seis anos certamente eu era bem alto! – Connor brinca, fazendo-a rir junto, ficando sério logo em seguida.

—Disse que viu o que tinha acontecido. Como a boneca foi parar em minha mochila? – quer saber.

—Uma outra menina, cerca de um ano mais velha do que você, tinha pego escondido da mãe e com medo de ficar de castigo, aproveitou um momento em que você se distraiu amarrando o cadarço de seu tênis, para pô-la em sua bolsa – revela.

—A menina ruiva! – Sarah lembra estalando a língua, fazendo outra careta engraçada – Eu realmente me distraía quando precisava amarrar o cadarço àquela época. O lance do coelho entrando na toca nunca funcionou muito bem! – comenta, fazendo Connor rir abertamente.

—Comigo também não – assume, retomando a explicação – O fato é que ela pôs a boneca em sua mochila, fechou e saiu com cara de paisagem! – compara – Por sorte, muita sorte mesmo, havia outro ângulo que permitiu-nos ver tudo isto porque o principal não deixava claro o que tinha acontecido – relembra, suspirando – O chefe de segurança as trouxe tão logo seus pais chegaram, esclarecendo as coisas.

—Lembro um pouco disto – Sarah comenta, piscando – Por que me deu o cordão? – pergunta, de repente.

—Não para compensar financeiramente – garante ele, sentando-se mais confortavelmente – Acho que fiquei chateado com a maneira pela qual a mãe da outra menina agiu. A forma como pediu desculpas foi tão falsa e superficial que me senti impelido a fazer algo – confessa – Pensei em te presentear a boneca, mas desisti. Dai vi o colar. Minha irmã tem um parecido dado por nosso avô. Claire faz o mesmo que você quando está insegura ou pensativa. É como se o pingente lhe desse força. Sei que não é amuleto e tal, mas naquele momento a lembranças me veio e agi por impulso. Peguei e te dei mesmo temendo ser mal interpretado por seus pais– relata, abrindo um largo sorriso – O sorriso que me deu apagou qualquer dúvida e como nenhum adulto por perto notou nada...- dá de ombros.

—Eu amei – admite ela, girando o pingente delicado entre os dedos – Não por ser valioso, como mamãe soube avaliar algum tempo depois, mas pelo gesto. E a mim pareceu que tinha me dado algo seu, não da loja – revela.

—Olha, nada do que tinha comigo àquele dia serviria – conta, rindo mais- Não sem me arriscar estragar a imagem de cavaleiro em armadura brilhante que fizera de mim! – brinca, a olhando intensamente – Quer dizer que foi assim que me viu durante um tempo? – inquere.

—Então ...- balbucia a jovem, corando violentamente – Vi sim – confirma, ainda mais sem graça – Você foi tão incisivo em me defender, tão forte e valente enfrentando alguém com o dobro de seu tamanho, que não tinha como não te vê desta maneira – compara – Abalou-se desde a sala de segurança, que suponho ser nos últimos andares, até o hall somente para me ajudar enquanto outros apenas observavam tudo, de braços cruzados – lembra, erguendo o olhar – Ajuda, aliás, que está nos faltando – comenta – Por que ainda não vieram nos tirar daqui? – questiona, apoiando-se a parede, levantando-se, Connor fazendo o mesmo.

—Boa pergunta – diz ele, indo ao painel, apertando o botão de emergência algumas vezes – Pior que não dá para saber se está funcionando – lamenta-se, olhando em volta, aproximando-se das portas.

—O que está fazendo? – Sarah pergunta ao vê-lo começar forçá-las em sentindo contrário – Não pretende abri-las, pretende? – inquere, tensa.

—Pretendo – confirma o cirurgião, enfiando os dedos por entre tira de borracha escura de modo a ter apoio para tentar separar ambos os lados.

—Mas.... Não é perigoso? – Sarah questiona-o, mordendo o indicador – Além do mais, já devem estar vindo nos pegar – pondera.

—Acho que paramos entre andares, o que diminui o risco de queda, caso eu consiga abrir as portas – Connor explica, forçando novamente ao sentir as portas cederem – Estamos presos a mais de meia hora. Já deveriam ter vindo nos tirar daqui, o que me leva a crer que ou o botão de emergência não está funcionando como deveria, ou estamos sem energia e o por alguma razão o gerador não entrou em funcionamento – diz, parando para respirar, voltando-se para a Sarah – Não estou querendo te assustar, mas notei a luz de emergência oscilar a pouco e também a claridade ter diminuído bastante, além de estar começando a ficar mais frio, o que não aconteceria caso o gerador tivesse entrado em funcionamento – constata, fazendo-a olhar a volta - Isto, claro, partindo do pressuposto que estou correto em pensar haver faltado energia – conclui, voltando-se para as portas outra vez, forçando-as, sorrindo quando a médica junta-se a ele.

Juntos conseguem abrir as portas internas, partindo de imediato para as externas. Imprimindo um pouco mais de esforço e força, conseguem abri-las com certa rapidez, descobrindo estarem, de fato, presos entre andares como suspeitara o cirurgião.

—Acha que dá para sairmos? – Sarah pergunta, ficando na ponta dos pés na tentativa de visualizar o local através do vão livre acima de suas cabeças – Onde estamos? Em qual parte da loja, quero dizer – inquere, enrugando o cenho.

—Parece o depósito, um andar acima do estacionamento do subsolo – Connor diz, acionando a lanterna de seu celular – E ao que tudo indica, estamos mesmo sem energia – relata, franzindo o cenho – Só não entendo por que o gerador não entrou em funcionamento – pensa em voz alta.

—Nós vamos ... – Sarah começa dizer, mas antes que pudesse formular qualquer observação, algo pesado cai sobre o teto do elevador, fazendo ambos olharem naquela direção.

Rapidamente, algo começa se espalhar sobre a placa de acrílico reforçado, escurecendo o ambiente no interior do elevador.

—O-o que é isso? – Sarah balbucia, atônita.

—Não sei e não pretendo esperar para saber! – Connor anuncia, recolhendo as sacolas dela e seu blazer rapidamente, atirando-os para fora pela fresta – Venha, vamos sair daqui – convida, entregando seu celular a médica – Vou te levantar e ajudar passar. Quando estiver fora, jogue luz em volta para saber onde estamos – orienta, ela anuindo com um aceno de cabeça, visivelmente tensa – Tudo vai dar certo, ok? – tranquiliza-a, sorrindo gentil.

—Uhum – Sarah limita-se dizer, deixando-se ser erguida pela cintura até altura da fresta.

Apoiando os braços, força o próprio corpo de forma ajudar Connor na tarefa de fazê-la passar pela abertura, deslizando graciosamente no chão sem importar-se se sujaria a roupa. Tão logo se vê fora do cubículo, põe-se de pé, fazendo o que ele recomendara, acionando a lanterna do celular em suas mãos, iluminando, ainda que fracamente, o ambiente a sua volta, descobrindo que Connor acertara: estavam no depósito da loja.

Dando dois passos a frente, Sarah procura enxergar para qual lado ficava a saída do lugar, franzindo o cenho ante a escuridão e o silêncio reinantes.

—Estranho! Não deveria ter soado algum alarme? Vai me dizer que uma loja deste porte não tem sensor de presença? – inquere, a ausência de resposta fazendo-a notar que o cirurgião não a seguira – Connor? – volta-se, jogando o facho curto de luz em direção ao elevador, retornando no exato momento em que ele se lança para fora, rolando no solo – Desculpa, deveria ter te ajudado – pede, em graça, inclinando-se com a mão estendida.

—Sem problema. Considerando minha altura e peso, corríamos o risco de eu te derrubar – diz, aceitando a ajuda dela, sentindo outra vez a corrente elétrica percorrendo seu corpo, o mesmo acontecendo a ela, porém, desta vez nenhum dos dois apressa-se em romper o contato – É o depósito, não é? – inquere, quebrando o silêncio.

—Uhum. É sim – confirma ela, devolvendo-lhe o celular – Estava procurando a saída, a propósito, não deveria ter algum alarme soando aqui? – lembra de perguntar.

—Deveria, se o gerador tivesse sido acionado – responde, soltando a mão dela devagar – E ao que parece não se trata de uma queda de energia localizada – diz, apontando o janelão alguns metros de onde estão, fazendo-a dirigir o olhar na direção indicada – Posso estar engando, óbvio, mas daqui parece que a cidade está às escuras.

—Pode ser uma queda de energia no quarteirão – supõe a médica, inclinando-se, pegando suas sacolas e o blazer dele, pendurando a peça em seu braço.

—Pode ser – Connor anui, pensativo – Lembro de ter escutado sobre uma nevasca se aproximando enquanto voltava do aeroporto – revela.

—Aeroporto? Pretendia viajar? – a pergunta sai antes que ela pudesse impedir- Desculpa, não quis ser invasiva – pede.

—Não, tudo bem, você não foi – afirma o cirurgião, erguendo as mangas de sua camisa – Fui me despedir de Ava – revela, caminhando em direção ao janelão.

—A doutora Bekker viajou? E você não foi com ela? Quer dizer, vocês reataram, não foi? Ela disse que tinham...quer dizer... – enrola-se toda, “coçando” a lateral da cabeça, completamente sem graça – Desculpa – pede novamente.

—Não precisa se desculpar de nada Sarah e não reatamos, ao contrário do que possa ter ouvido – assegura, tranquilo, avaliando se conseguiria subir em algumas caixas a fim de ver a rua lá fora – Não deve acreditar em tudo que escuta pelos corredores do Med. Algumas vezes as pessoas aumentam o que escutam e outras simplesmente inventam a seu bel prazer – recomenda, deixando transparecer o amargor na voz, empilhando duas três caixas junto a parede.

—Eu não acredito, mas como foi a própria doutora Bekker quem falou não vi por que duvidar – justifica-se a médica, enrugando o cenho – Tá fazendo o quê? – pergunta, pondo as sacolas e o blazer sobre uma caixa menor.

—Quero ver lá fora – explica o cirurgião, firmando o pé direito sobre uma caixa pequena, testando antes de dar impulso, escalando a pilha, alcançando o janelão – Ok... a coisa é pior do que pensei – diz, olhando para baixo – A cidade inteira está às escuras e para completar está caindo uma tremenda nevasca – relata, limpando o vidro com a mão, olhando mais atentamente.

—Nossa. O hospital deve estar uma loucura – Sarah comenta, lembrando o caos que ocorrerá no ano anterior – Não vamos ser prioridade – diz, tensa, fazendo-o olhá-la – Nos tirar daqui não será exatamente uma prioridade ante os chamados que os bombeiros devem estar recebendo. O que faremos Connor? – questiona, apertando as mãos nervosamente, a idéia de passar a madrugada ali dentro não lhe agradando nada.

—Isto se souberem que estamos presos – pondera o cirurgião, descendo rapidamente, limpando as mãos uma na outra.

—Como assim? Acha que podem não saber da gente? – inquere, mais tensa.

—Há uma grande chance de isto ter acontecido já que nenhum alarme disparou, estamos sem energia e o gerador não foi acionado – enumera, enrugando o cenho – O que é bastante estranho. Meu pai tem neura por segurança. Não iria descuidar justamente disto e ainda mais nesta época do ano. E Claire é muito zelosa e responsável. Mesmo que ele descuidasse, ela estaria atenta – constata, passando a mão sobre a boca, pensativo.

—No que está pensando, melhor dizendo, o quê te preocupa? – pergunta a garota, encarando-o.

—Nada. Só constatando alguns fatos por hora – minimiza, olhando em volta – Neste momento, o melhor que fazemos é sair daqui. Sem o gerador o sistema de aquecimento não entra em funcionamento e logo isto aqui estará um gelo – afirma – Lá em cima teremos uma idéia de como as coisas realmente estão e como pedir ajudar – completa, levando, instintivamente, a mão às costas de Sarah – Por aqui – orienta, iluminando o caminho com a lanterna do celular.

—Como sabe para qual lado ir? – questiona-o a Psiquiatra, deixando-se conduzir.

—Quando era pequeno costumava me esconder por aqui sempre que meu pai cismava de me trazer. Apesar das reformas lá em cima, por aqui quase nada mudou. Conheço bem esse local – revela.

—Entendo – diz ela, simplesmente, guardando para si como ele sabia de tal fato.

Caminham cuidadosamente por entre as caixas e prateleiras durante alguns minutos, Sarah notando que, de fato, começava esfriar bastante ali, o que a fez questionar-se acerca das mercadorias. Novamente guarda para si o questionamento, acompanhando o cirurgião.

—Aqui – Connor avisa, parando defronte uma imensa porta – Só espero conseguir abri-la – sopra, entregando o celular a Sarah, forçando a maçaneta durante alguns minutos.

—Não precisa de uma chave? – interroga a médica, atenta.

—Não. É um tipo fechadura de pressão. Basta saber onde e como apertar e ....- conta, o estalido seco avisando que fora bem sucedido – Voilá!! – comemora, satisfeito – Normalmente diria para que saísse primeiro, mas neste caso irei – avisa, deixando agora claro para Sarah que ele estava desconfiado de alguma coisa.

—Connor, se desconfia que algo não está certo, me fale por favor. Não quero ser pega de surpresa – pede, ficando mais atenta a tudo em volta deles.

—Certo – ele responde, suspirando – Certo – repete, um tom mais baixo, parando, obrigando-a fazer o mesmo – A única possibilidade de o gerador não entrar em ação automaticamente diante de que de energia, é se estiver com problemas.... ou caso seja desligado – diz, encarando-a sob a tênue luz do celular – Nenhum funcionário da Dolan faria tal coisa, logo, caso isto tenha ocorrido, só posso pensar que alguém de fora, mal-intencionado, o tenha feito. Como conseguiu, já que o controle principal se localiza na sala de segurança, e o porquê, honestamente não quero descobrir – declara.

—Acha que a loja possa estar sendo ... assaltada? – inquere, nervosa.

—É uma hipótese, mas como disse, não pretendo descobrir – reafirma Connor, respirando fundo – Nós vamos fazer o seguinte: iremos até o escritório de Claire e de lá tentamos pedir ajudar. De qualquer forma, dentro em pouco, a julgar pela força da neve lá fora, será o local mais aquecido de todo prédio e onde estaremos seguros. Estou com as chaves aqui – toca o bolso – Só precisamos ficar atentos caso minha suspeita se confirme. Tudo que não precisamos é encontrar bandidos armados aqui dentro – recomenda – Venha – convida, estendendo-lhe a mão.

Recomeçam caminhar, alcançando o lance de escadas que os levaria ao hall de entrada e de lá para os demais andares. Connor optara por seguirem pelas laterais, fazendo uso da escuridão e para tal, desliga o celular.

—Vamos ficar perto um do outro, assim não precisaremos usar a lanterna – diz, trazendo-a mais para si – E de quebra nos aquecemos – acresce.

—Uhum – Sarah concorda, sentindo o coração disparar tanto pelas suspeitas dele quanto pela proximidade, deixando-se guiar degraus acima até chegarem no hall.

Lá dentro, fazem como combinado, se esgueirando pelas sombras, evitando os poucos fachos de luz provenientes dos reflexos de alguns objetos. Ao escutarem um som metálico, param, atentos, visualizando uma sombra passar ao longe, indo em direção aos banheiros.

—Segurança? – sussurra a jovem.

—Pouco provável. Meu pai paga o sistema para não precisar deixar guarda presencial – responde o cirurgião, retomando a caminhada tão logo sente-se seguro.

Mais adiante, sobem as escadas, sempre atentos a qualquer movimento, subindo ao primeiro andar da loja. Com surpreendente agilidade, Connor os conduz por entre os corredores, jamais perdendo o foco de onde pretendia chegar, cada vez mais certo de que algo não estava certo naquilo tudo e depois de terem visto aquela sombra, firmara ainda mais sua decisão em leva a garota a seu lado a um local seguro. Somente então relaxaria e tomaria as providências necessárias a tirar ambos dali em segurança.

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"...Let it snow, is blassing out;

But I won't get it in the mood;

I'm avoiding every mistletoe;

Until I know It's true love;

So next Christmas I'm not all alone boy..."

Sarah (02:00 a.m)

—Poderíamos parar um segundo, por favor? – peço me apoiando à parede assim que chegamos ao quinto andar – Preciso descansar – justifico-me, puxando o ar com força.

Mesmo ele não dizendo nada, ficou evidente que Connor tinha pressa em nos levar até o escritório, especialmente depois que virámos aquela sombra. Não vimos ou ouvimos mais nada depois daquilo, mas ele havia apressado o passo consideravelmente. Aliás, de onde vinha tanto fôlego? Havíamos subido uma centena de lances de escadas e ele sequer parecia estar suado ao passo que eu estava quase descabelada, soprando tanto quanto uma mangueira de ar furada e pingando de suor. Chagava sentir as gotas escorrendo por minhas costas. Definitivamente precisava deixar o sedentarismo de lado!

—Claro – concorda a agradeço mentalmente – Desculpe, não tinha notado que estava rápido demais. De agora em diante vamos mais devagar – promete, dando atenção seu celular.

—Vai tentar ligar para alguém? – interrogo, engolindo a saliva e ao fazê-lo sinto o quanto minha garganta estava seca.

—Bem que gostaria, mas não tem sinal – responde, mostrando-me a tela – Está com sede? – pergunta, respondendo antes que eu o fizesse – Porque eu estou – diz, olhando a volta – Estamos no quinto andar, não é? – pergunta.

—Uhum, estamos – confirmo.

—Tem uma mini praça de alimentação aqui...ou seria no sexto andar? – inquere mais para si do que propriamente a mim.

—Não sei responder. O mais alto que cheguei foi o andar abaixo deste – digo, sentindo mais dois incômodos: fome e necessidade de usar o banheiro – Hã...será que eu poderia ir ao sanitário? – pergunto, sem graça, a resposta demorando um pouco a vir.

—Claro – repete, dando alguns passos a minha esquerda – Acho que encontraremos sanitários e água deste lado – diz, indeciso – Vamos. Se for o caso damos a volta até encontrar água – convida, segurando minha mão automaticamente.

Vinha fazendo isto desde que saímos do elevador. Confesso estar gostando do gesto mesmo sabendo que o faz apenas para me proteger e guiar pelos corredores, como agora.

Caminhamos uns quinze metros para a esquerda da porta pela saíramos, no deparando com uma pequena e requintada praça de alimentação, se é que podia chamar assim. Espaço gourmet talvez fosse um nome mais apropriado já que o ambiente, além de muito elegante, contava com apenas cinco lojas de refeições. Nenhuma delas barata, pelo que me lembre das marcas ali exibidas. Dois dos melhores restaurantes e duas casas de doces finos ocupavam uma área requintada onde as cadeiras eram forradas e acolchoadas, em nada lembrando a praça de alimentação de um shopping comum. Uma destas sorveterias da última moda completava o lugar, que contava ainda com um espaço dedicado a crianças menores. Me pego imaginando os filhos de Connor brincando ali enquanto ele e a esposa comiam algum petisco, descansando das compras.

—Sarah? – ouço chamar, me sobressaltando de leve – Tudo bem aí? – quer saber, o rosto muito próximo ao meu. Próximo demais.

—Uhum. Tudo – respondo, afastando os pensamentos de a pouco – Banheiro??? – inquiro, mais por querer um segundo longe daquele mar azul tentador, do que por estar necessitada.

—Ali – aponta as portas ao lado da sorveteria – Vou aproveitar e ir também – avisa, me acompanhando – Quero jogar uma água no rosto e pescoço para aliviar o calor. Estou suado e fedendo.

Pode até estar suado, mas fedendo de jeito nenhum! Não mesmo. Se este é seu modo fedorento, não quero nem imaginar como seja o cheiroso, pós banho, com aquela sua loção pós barba maravilhosa, aquele seu perfume delicioso! Ah, se todo homem fedesse igual a você!!! Eu sim devo estar horrorosa e fedendo!

—Hã... não sei se fico lisonjeado ou sem graça – escuto-o dizer e sacudo a cabeça, olhando-o confusa – De qualquer forma, agradeço o elogio e não acho que esteja fedendo muito menos horrosa – declara, sorrindo daquele jeito que faz qualquer mulher perder a sanidade, entre otras cositas más!

—Verbalizei meu pensamento não foi!? – pergunto, mordendo a língua quando confirma com um aceno – Definitivamente preciso mandar implantar um filtro entre meu cérebro e minha boca! – exclamo, deliciando-me com seu riso.

—Prefiro que não faça. Está perfeita assim, do jeitinho que é – elogia e me sinto corar como nunca. Graças a Deus não podia ver meu rosto com clareza – Caso saia antes de mim, me espera perto da sorveteria – pede – Deve ter água por lá.

—Ok – respondo curto, entrando no banheiro antes que minha boca grande me fizesse passar outra vergonha.

Lá dentro ponho bolsa e sacolas sobre o balcão e após fazer minhas necessidades, aproveito para aliviar parte do calor pela subida rápida. Dispo a blusa ficando apenas de sutiã. Lavo meu rosto, pescoço e colo, sentindo um imenso alívio. Não que estivesse quente aqui dentro. Pelo contrário. Estava cada vez mais frio. Se não estivéssemos em movimento constante, certamente já estaria tremendo. Como não era o caso, meu corpo havia esquentado bastante pelo esforço físico e como resultado sentia-me pegajosa e suja.

Passo a mão úmida por meu ventre e parte das costas, aumentando o alívio. Em seguida, pego o frasco de perfume que sempre trazia comigo, borrifando um pouco sobre a pele. Seco o excesso com papel toalha, umedeço meu cabelo, escovo-o e o prendo em uma trança lateral que deixa meu pescoço livre. Visto a blusa, deixando os primeiros botões fora da casa. Arrumo as sobrancelhas usando os dedos, passo um pouco de brilho labial, ponho tudo de volta a bolsa, pego as sacolas e respiro fundo dando uma última olhada no espelho antes de sair.

Assim que deixo o lugar, visualizo Connor inclinado sobre o balcão, me dando uma visão privilegiada de sua bunda .... costas! Suas costas. Me pego pesando mil bobagens.

—Para com isso agora mesmo, Sarah! – ralho, estapeando-me de leve enquanto caminho até ele – Não é perigoso se debruçar sobre um balcão de vidro desta maneira? – inquiro, retendo o ar quando se volta.

Puta merda!!!.... Ele havia, conforme dissera que o faria, jogado água no rosto e, assim como eu, molhara pescoço e colo. Até aí nada demais afinal admitira estar com calor. O problema é que não tinha fechado nenhum botão, NENHUM, de sua camisa. ZERO. Logo aquele peito/tórax/abdômen lindo e tentador estava ali, completamente a mostra, bem diante de meus olhos, a centímetros de minhas mãos e honestamente, aquilo era um pouquinho mais do que podia suportar sem perder o restinho de sanidade que me sobrara!

—Não tem perigo. O vidro é reforçado, vê? – ouço-o dizer, o som de seus dedos batendo no balcão me fazendo sobressaltar – Tudo bem? – pergunta, se aproximando.

—Tudo – respondo, recuando um passo – Tudo ótimo! – exclamo de maneira um pouco exagerada, deixando as sacolas sobre uma mesa próxima – Conseguiu água? – quero saber, aquela altura a secura em minha garganta sendo provocada por outro motivo que não cansaço e calor.

—Água e um pouco de comida. Doces, infelizmente – revela, indicando o banquinho atrás dele – Mas já é algo para nos manter vivos até a ajuda chegar. Faltam poucas horas agora – diz e instintivamente busco o relógio em seu pulso – Quase três da madrugada – elucida e sorrio sem vontade.

—Bom saber – digo, alguns pensamentos pouco amistosos me vindo a mente – Já parou para pensar que ninguém, nem minhas amigas nem sua irmã, parece ter dado por nossa falta? Devemos ficar felizes por termos pessoas que não se preocupam em xeretar nossa vida pessoal ou preocupados pelo mesmo motivo? – pondero, fazendo-o rir outra vez. Confesso ter amado cada uma das risadas que provoquei essa noite.

—Ambos, acho – concorda, me estendendo um copo com água mineral, que prontamente aceito – Mas estou certo de que quando amanhecer a história será diferente – tranquiliza-me.

—Mesmo porque os funcionários começarão a chegar e notarão ter algo errado. Daí alguém vai avisar sua irmã ou seu pai e logo uma dezena de carros de polícia estará parando aí defronte e acharão nossos esqueletos congelados! – dramatizo, não resistindo e rindo junto com ele desta vez.

—Olha, que saberão de nossa presença não há a menor dúvida. Mas não através de algum funcionário – diz e enrugo o cenho – Claire os liberou. A Dolan só reabrirá depois do Natal – revela, me deixando boquiaberta.

—E como raios vamos sair daqui? – pergunto – Espera, é normal não abrirem justamente na véspera do Natal? – inquiro, desconfiada.

—Não, não é – responde, sentando-se – Parece que foi algum tipo de acordo entre meu pai, ela e os funcionários. Só não me pergunte qual pois não saberei responder – avisa, erguendo as mãos – O fato é que não haverá expediente amanhã nem depois. Quanto a como sairemos, pretendo usar o telefone no escritório para pedir ajuda. Isto, claro, no caso de as linhas não terem sido atingidas como as de celular foram – lembra – Além disto, estou certo de que a energia será restabelecida pela manhã e assim poderemos pedir socorro. Em último caso podemos atear fogo em alguma coisa e fazer os bombeiros virem - brinca, apoiando as mãos em suas coxas, o gesto atraindo meu olhar para aquela região de seu corpo e por consequência, para um pouco mais acima também. Pisco repetidamente ao notar o volume sob a jeans. Estou delirando ou ele está ficando excitado!? -Hei, estava brincando. Não pretendo pôr fogo em nada – tranquiliza-me e ergo o olhar – Ao menos não em nada que queime visivelmente – completa e sinto meu rosto esquentar com a insinuação velada.

Ok, quando exatamente deixamos a friendezone e passamos para as provocações sexuais?? Porque isto me pareceu ser claramente uma!!! , penso, levando o copo a meus lábios.

—Não sei. Talvez depois que elogiou minha forma física e minha bunda pela quarta vez enquanto subíamos as escadas – engasgo ante a observação, perdendo o fôlego.... E não é que havia verbalizado meu pensamento novamente? Meu pai, aonde isto iria parar? - Tudo bem aí? Precisa de ajuda? – se oferece, fazendo menção levantar-se.

—Não, não! – exclamo, rápido, acenando freneticamente – Eu... Eu estou bem – minto, pigarreando, corando forte ante o sorriso malicioso que me dá – Eu... hã... Por que não me falou nada? Quero dizer, por que não avisou o que estava acontecendo, quero dizer, que estava pensando alto demais!? De novo. Pra variar! – interrogo, torcendo o nariz, forçando a memória a fim de saber se havia “pensado” algo mais comprometedor.

—Não quis te deixar sem graça e além do mais, estava divertido escutar suas... observações, por assim dizer – declara, convencido.

—Não tem vergonha de ficar escutando o monólogo alheio não? Cadê a educação refinada que deve ter recebido? – alfineto-o, fingindo uma zanga que no fundo não sentia. Quer dizer, sentia sim, mas de mim mesma.

—Desculpe, mas seria praticamente impossível não escutar. E pensei que estivesse se ouvindo – justifica-se, me deixando ainda mais sem graça.

—Claro que não estava ou teria posto freio em minha língua e não estaria pagando este mico gigante agora!! – minto porque pensando bem, me ouvia sim. Só não notei que ele também estava ouvindo! – Que mico!! – exclamo, sobressaltando-me ao sentir o toque em meu braço.

—Por que o susto se estamos apenas nós dois aqui? – questiona, não me dando chance responder – Vai querer algum doce? – pergunta, erguendo a embalagem retangular contendo variadas guloseimas em tamanho pequeno ante meus olhos.

—Vou e segundo sua teoria podemos não estar sós, logo posso sim me assustar caso não perceba ser você me cutucando – rebato, servindo-me de três mini donuts – O quê? – inquiro ao ver sua sobrancelha erguida, minha voz abafada por estar mordendo o doce. Nem a pau colocaria todo de uma só vez na boca em frente a ele, como fazia quando comprava. Vai que dá margem algum pensamento malicioso! Além de ser má educação.

—Nada – responde, sacudindo a cabeça, voltando a sentar-se, desta vez em uma cadeira próxima, servindo-se.

Faço o mesmo, aproveitando enquanto comia para dar vazão a meus pensamentos sem o perigo de expô-los, me constrangendo ainda mais.

Não chegava a ser nenhum segredo no Med que me sentia atraída por ele. Isto desde meu estágio. Mas sempre neguei por diversos motivos: não seria bom para nenhum de nós dois um envolvimento já que ele seria um de meus orientadores. Também julguei ser uma via de mão única durante muito tempo, embora tenha flagrado alguns olhares seus que em nada remetiam de orientador para estagiária. Mas foram tão poucos e raros que pensei ter imaginado e como logo Sam Zanetti tratou de laçá-lo, não tive chance saber se de fato me olhara de maneira diferente. Isto partindo do pressuposto que investigaria tal coisa. Aliás, este fora outro entrave descobrir se havia alguma intenção por detrás daqueles poucos olhares: insegurança. Não me passava, sendo franca, que alguém como Connor Rhodes tivesse qualquer interesse em alguém como eu que não profissional.

O namoro/caso durou pouco mais de um ano, até Downey anunciá-lo como seu substituto, posto que ela almejava, fato com o qual não soube lidar. Romperam, ela optou por ir embora e durante uns meses ele ficou livre. Chegamos mesmo a nos encontrar no Molly’s uma ou duas vezes, em comemorações de amigos e até dançamos, mas logo outra pessoa surgiu: Robin Charles.

O caso deles foi bem mais rápido e tumultuado posto que ela se aproximara de Connor claramente para provocar o pai, meu mentor. Viviam as turras, indo e voltando e em uma dessas idas Ava Bekker veio para o Med.

Eles já tinham vivido uma história no passado a qual ela apressou-se em reatar. Passaram a dividir o mesmo teto e não tardou anunciarem o noivado. Mas assim como era com a Robin, a relação deles também não foi fácil. Ava era muito competitiva e o fato de estarem dividindo a cama não a fez recuar um centímetro sequer na competição estipulada por doutor Latham, o que acabou destruindo a relação. Mas dizem ter sido a gota d’água, ela ter recorrido ao pai dele para obter o financiamento da sala hibrida.

Nada disto era segredo. Muito pelo contrário. Era público e notório as brigas dentro e fora do hospital. Por ter ainda aquele sentimento em relação a ele, me mantive o mais distante possível, afinal, mesmo sem eu querer, cada relação que terminava, uma pequena esperança acendia em meu peito, alimentada pela convivência diária e por novos olhares furtivos que flagrara, especialmente após o incidente com a colônia de formigas Saúvas que um garotinho levará para o amiguinho internado.

Se por um lado ainda me causava pânico a lembrança dos bichos infiltrados em minha roupa, por outro seu olhar de franca admiração masculina ao me ver praticamente nua, igualmente me provocava um reboliço no baixo ventre e fazia minha intimidade pulsar!

Sem mencionar que eu também o vira, acidentalmente, usando tão somente uma box branca em uma saleta no que, a julgar pelo volume imenso sob a referida, acabara de ser uma rapidinha entre ele e Bekker.

—Belos pensamentos para uma véspera de Natal! – resmungo, não tão baixo quanto deveria, atraindo sua atenção.

—A quais pensamento se refere? Os durante a subida ou estes que guardou para si e te fizeram ficar tão vermelha quanto um pimentão maduro? – inquere, o riso safado me deixando deslocada.

—Justamente! – exclamo, dando uma generosa mordida no donut em minha mão, protelando ao máximo a resposta. Pigarreio, limpando o açúcar em minhas mãos com calma, rezando para que algo acontecesse, me salvando ter de falar. Por sorte, desta vez o destino joga a meu favor. Quer dizer, nem tanto – Eu...

—Shiii! – ordena, inclinando-se sobre a mesa, a ponta de seus dedos tocando meus lábios em uma ratificação ao pedido de silêncio, o toque me arrepiando inteira mesmo não sendo uma situação romântica – Shiii! – reforça quando tenciono falar e me encolho ao notar que olhava por sobre minha cabeça.

Estremeço ante a possibilidade de sua teoria estar correta. Num impulso, uno as mãos, fechando os olhos, rezando silenciosamente, pedindo ajuda. Durante alguns minutos tudo que ouço são as batidas de meu coração, aceleradas não apenas pelo contato quente em meus lábios, mas pela tensão.

—Melhor seguirmos – anuncia, a voz soando mais grave que o normal, e abro os olhos tentando enxergar os seus - Quero alcançar os escritórios o quanto antes – completa, desfazendo o contato, deixando para trás a sensação de ardor – Vamos – chama, segurando minha mão, obrigando-me sair da inércia, levantando-me juntamente com ele.

Rapidamente, juntamos o restante das coisas que pegara na sorveteria e seguimos, quase correndo, em direção as escadas. Subimos os últimos lances até o sexto andar numa velocidade absurda, o que me deixa completamente exaurida. Preciso me esforça para conseguir acompanhar seu ritmo e não ser arrastada corredor afora até uma porta marrom, clássica, a qual abre após soltar minha mão e pegar as chaves, trancando-a tão logo entramos.

Estancamos lado a lado, aguardando nossos olhos se habituarem falta de luminosidade do ambiente. Estava mais escuro aqui do que em toda a loja.

—Me segue – ordena, fazendo com que pusesse minhas mãos em seus ombros, tomando a dianteira.

Não consigo evitar o riso ante seus xingamentos a cada vez que chuta ou tropeça em algo, reconhecendo a gentileza de seu gesto. Quando estamos perto das janelas, para, fazendo-me apoiar as mãos em uma mesa, indo até elas, abrindo as persianas. O que vejo me faz reter o ar, maravilhada. Poucas vezes vira a cidade deste ângulo, especialmente durante uma nevasca.

—Que lindo! – exclamo, soltando as sacolas, caminhando até onde ele estava - Lindo! – sopro, admirando a paisagem lá fora.

Dava para ver metade da cidade dali. Tudo era uma imensa manta branca pontilhada por luzinhas fracas aqui e ali, fruto de geradores, com certeza. Ao longe, a silhueta do encontro entre céu e mar anunciando que em breve a aurora chegaria.

—Sem telefone ainda – ouço, virando levemente o rosto a fim de vê-lo – Nem sinal de celular – acresce, se juntando a mim – Teremos de esperar e torcer para tudo se normalizar – avisa, enfiando as mãos em seus bolsos – A cidade parece tão calma daqui – comenta.

—Sim – anuo, seguindo seu olhar – E bela assim, toda coberta de neve. Parece um bolo gigante recoberto de açúcar – comparo, escutando seu riso.

—Ainda com fome? – pergunta, ambos nos voltando ao mesmo tempo.

—Um tantinho assim – assumo enrugando meu nariz – Não jantei – lembro.

—Também não – diz – Vamos devorar o que restante de meu espólio! – brinca, tomando minha mão.

Sorrio, o seguindo, com cuidado. Nos sentamos sobre o tapete macio, apoiando as costas ao sofá de dois lugares. Comemos em um silêncio agradável, permanecendo assim um bom tempo.

—Estou para perguntar desde que saímos do depósito – quebro-o, olhando-o – O que acontece com as mercadorias caso estraguem?

—Temo seguro – responde e sopro um “Ah”, me sentindo uma tola – Mas pouca coisa estraga com o frio. Alguns casacos talvez. Mesmo assim, não creio que dará tempo isto acontecer – diz, me surpreendendo ao ficar de lado, me olhando intensamente, em silêncio.

—Ok, se o objetivo era me deixar sem graça, conseguiu! – exclamo, sentindo o rosto quente – Pare com isto! – peço, fazendo menção me afastar, ele retendo-me – Connor...

—Deveria estar me sentindo culpado por estar desejando transar com uma linda e adorável mulher em plena véspera de Natal!?! – meio que pergunta, a mão em meu braço acariciando minha pele, provocando ondas de arrepios crescentes.

—C-como? – gaguejo, respirando com dificuldade.

—Segundo sua teoria – diz, me deixando confusa – A pouco me deu a entender que estava pensando em algo não muito... puro ou adequado a época do ano – lembra e coro mais – Logo, transar deve ser bem pior, não é? – questiona, aproximando-se, os lábios roçando a pele sensível junto a minha orelha.

—Eu... não sei! – sopro, começando ofegar – P-pessoas se casam no N-natal, então a-acho.... Céus! – gemo ao senti-lo morder o lóbulo com delicadeza, a língua brincando ali um segundo antes de deslizar por meu queixo, suave como uma pluma – Connor... eu não .... – balbucio, frustrando-me quando interrompe a carícia.

—Você não quer? – pergunta, frustração e confusão transparecendo em seu belo rosto – Entendi errado os sinais, foi isso? – questiona.

—Não – admito, respirando profundamente – Não entendeu. Quero você sim. Nossa, como eu quero! – exclamo, o riso de menino travesso me deixando sem ar – E não me importa se é véspera ou noite de Natal – digo, tocando-o suavemente – O que não quero é ver o arrependimento em seu rosto quando sairmos daqui. Estamos passando por uma situação diferenciada. Nada foi normal desde que pus os pés na Dolan ontem, muitas lembranças vieram à tona, sem falar na possibilidade de não estarmos sós aqui dentro – relembro, uma dúvida surgindo em minha mente, mas a sufoco. Ele não faria isto, faria?

—Jamais levantaria a hipótese de um assalto se não sentisse que isto poderia estar acontecendo – diz, e sacudo a cabeça em negação.

—Sei que não – garanto, segurando seu rosto entre as mãos, tomando coragem para falar – O que eu quero dizer é que tenho guardado este sentimento por muito tempo, esperando que talvez, algum dia, tivesse a chance de vivência-lo...

—E por que não agora, hoje? – me corta, segurando e beijando minhas mãos – Por que não aproveitar a oportunidade que o destino ofereceu? – questiona, me olhando fixamente – Se o que precisa é me ouvir dizer que também não era imune a você, saiba que não era. Me senti atraído desde o dia em que a vi de pé, na área de triagem, segurando um cachorro enorme, completamente sem graça! – me surpreende – Algo na maneira como riu para mim e Will mexeu fundo comigo. Dali por diante cada pequeno contratempo, cada momento singular que tivemos somente fez aumentar a sensação– garante, beijando e mordendo meu queixo – Não me pergunte como ou porque, mas a verdade é que sentia algo como pertença sempre que estávamos juntos...

—O que não te impediu se envolver com outras – bufo.

—Não – anui, rindo suave, me roubando um selinho – E você também se envolveu com outros – relembra.

—Só com Joey, porque ao contrário do que andaram espalhando, nunca houve nada entre mim Kelly ou Otis. Menos ainda com aquele garoto vítima de tráfico humano – relembro.

—Eu nunca acreditei nas fofocas Sarah. Ainda assim, senti ciúmes – confessa, me deixando boquiaberta – Por que acha que implico tanto com Noah e aquele novato, Mac-alguma-coisa? – interroga – Até Ava já tinha percebido. Discutimos por isto mais de uma vez – revela.

—Eu não.... nunca pensei que.... Sentiu mesmo ciúmes? – pergunto, incrédula.

—Sinto – afirma, me pegando de surpresa com um beijo doce – Mas não sabia se ainda sentia algo por mim. Nos afastamos muito ultimamente e acabei me deixando dominar pela dúvida e como ainda tinha que resolver minha situação com Ava, resolvi esperar este ano terminar para tentar uma aproximação – conta, me puxando para junto de seu corpo – Mas parece que papai Noel tinha outros planos! – brinca, distribuindo beijos por meu pescoço e colo – Quanto a me arrepender, não vai acontecer – garante, olhando fundo em meus olhos – Tudo que mais desejo é que está tenha sido a primeira de muitas noites que passaremos juntos, independente de ser Natal, Réveillon, ou que estejamos presos na loja da minha família – declara e rimos – Agora, senhorita que quer justificativa para tudo, será que podemos aproveitar as últimas horas da madrugada fazendo amor enquanto o resgate não chega? – sugere, mergulhando o rosto na curva de meu pescoço, sugando a pele num chupão delicioso que derruba as últimas barreiras dentro de mim.

—Podemos! – sopro, enroscando os dedos em seu cabelo, obrigando-o erguer o rosto para mim, tomando a iniciativa do beijo, que começa doce e sereno, mas logo evolui para algo mais forte e primitivo.

Nos amamos sobre o tapete felpudo e macio, a tempestade lá fora diminuindo gradativamente. Ao final, descansamos abraçados, olhando a neve cair, agora mansamente, lá fora.

Conforme Connor previra, a energia retorna pela manhã, por volta das sete, e com ela os sinais de telefonia.

Meia hora depois de ele ter ligado para a irmã, para os bombeiros e a polícia, ouvimos as sirenes. Deixamos o refúgio do escritório pertencente a Claire Rhodes, descendo no elevador panorâmico de onde a vemos entrando, aflita, junto com Matt Casey e Kelly Severide.

Enquanto explicamos o que acontecerá, os policiais descobrem que o que caíra sobre o elevador fora mesmo um corpo. Parece que os bandidos haviam se desentendido e um deles fora morto. Os bandidos haviam se concentrado em roubar apenas o depósito, o que levanta a suspeita de haver algum funcionário envolvido. Isto, segundo o oficial presente, fora nossa salvação ou poderíamos ter corrido risco de morte.

Após prestarmos depoimento, Connor se oferece para me levar em casa. Estamos entrando em seu carro quando Claire nos intercepta.

—Connor, sei que não é exatamente a hora apropriada depois de tudo que passaram, mas pensou sobre a ceia!? – pergunta, mordendo o lábio.

—Pensei – ele responde, me olhando intensamente antes de dar atenção a irmã – Desculpa Claire, mas tenho outros planos para hoje a noite. No entanto, ano que vem cearemos todos juntos – promete, me olhando outra vez – Todos nós. Te dou minha palavra – acresce, lançando um beijo a uma confusa, mas aparentemente satisfeita com a resposta, Claire, que acena enquanto nos afastamos.

—Posso saber quais planos seriam estes? – questiono-o, olhando-o desconfiada.

—Primeiro, tomar um delicioso banho em minha hidro, devidamente acompanhado, caso certa garota aceite, óbvio – manda e retenho o ar – Depois, preparar uma ceia fantástica para a mesma e prendê-la de uma vez por todas pelo estômago, como anda o figurino – prossegue – Por fim, quero fazer amor até amanhecer entre lençóis quentinhos para compensar o chão duro de mais cedo, desejando não um feliz Natal, mas que este seja o primeiro de muitos a seu lado – conclui, soltando uma mão do volante, segurando a minha – Que me diz? – pergunta, desviando rapidamente o olhar para mim.

—Digo que me parece o plano perfeito para uma véspera/manhã de Natal – respondo, sorrindo-lhe, ganhando um beijo na mão e uma piscadela antes que se concentrasse no trânsito novamente, meu peito inflando-se de alegria enquanto o carro veloz avança rumo aquele que passaria a ser meu lar.

"...Santa tell me if you're really there;

Don't make fall in love again;

If he won't be here next year..."


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado. Deixem suas impressões please.
Mais uma vez, Bom Natal e um Prospéro Ano Novo a todos!
Nos vemos ano que vem. Bjinhos flores



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