Uma Canção de Sakura e Tomoyo: Finalmente Juntas escrita por Braunjakga


Capítulo 84
Asas da liberdade




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Capítulo 84

Asas da liberdade

 

I

Aeroporto de Barajas, Madrid, Espanha

Manhã de 8 de agosto de 2017

 

O avião de carga de bandeira japonesa havia feito uma longa viagem sem escalas e finalmente havia chegado ao seu destino. Isso só foi possível porque ele era um avião mágico. Soldados de farda branca do ministério de assuntos especiais estavam a postos no pátio, prontos para qualquer ameaça. A imensa porta traseira da aeronave se abriu. Dona Beatriz estava lá também, observando todos aqueles detalhes e procedimentos.

Da enorme porta, os soldados da Autoridade mágica japonesa saiam de par em par, todos vestidos com vestes sacerdotais xintoístas. Uma mulher de armadura vermelha como sangue e cabelos castanhos longos era escoltada por eles, com uma algema mágica nas mãos. 

Um homem mais adiantado na fila dupla de soldados fez uma reverência para dona Beatriz.

— Excelência, Sou Shinya Tsunemori. Em nome da princesa Hinoto vos trago a prisioneira.

— Agradecida, senhor Tsunemori. O tridente dela veio junto? — perguntou Dona Bea. Uma caixa flutuante saiu do avião e flutuou ao lado deles. 

— Conforme solicitado…

— Excelente… — disse Beatriz. A mulher de cabelos castanhos levantou a cabeça para vê-la.     

— Dona Beatriz Fanjul… Eu não passei seis anos presa no Japão sem saber o que se passa por aqui — disse a mulher. Se você pensa que vai me usar como moeda de troca pra parar o processo que a Gotzone moveu contra você, eu… 

— Você não está em posição de negociar nada, Mercè. Lembre-se: você tentou roubar uma cidadã japonesa na própria casa dela — disse Dona Bea.

— Não me diga? E você é cúmplice da morte dos meus companheiros! Se alguma coisa acontecer com as minhas meninas, eu não falo por mim — disse Mercè, forçando as algemas.

— A sua cabeça pequena, Mercè, não faz você entender onde se meteu, nem te faz entender a situação em que está. Não ameacei ninguém, você quem está me ameaçando. Nem pretendo usar alguém tão insignificante como você pra paralisar o processo insignificante da Gotzone contra mim  — disse Bea. Mercè ainda olhava desconfiada para a mulher na sua frente — Vamos, mesmo com tudo contra, você ainda tem utilidade pra mim… — disse Dona Bea. A Interventora de Valência a olhou indignada.

 

II

Bruxelas, Bélgica

8 de agosto de 2017

 

A imensa sala do conselho europeu parecia um mini-coliseu de porta fechadas. Arquibancadas lotadas estavam dispostas de um lado e de outro da sala semicircular. Era lá onde reunia os 27 magos chefes ou representantes dos seus respectivos países da União Europeia se reuniam em caso de grave ameaça ao continente. 

Havia janelas imensas no lugar e o chão era todo feito de mármore. Na frente das bandeiras dos estados membros do continente, havia uma espécie de pequena mesa do júri, composta de cinco integrantes permanentes, os magos mais poderosos da europa. Eles também era líderes de seus respectivos países. Alfredo Bosch, antecessor de Bea, já foi membro do júri. 

O primeiro juiz era um negro de nome Alphonse Rimbaud. Ele era o mago supremo da França. O segundo era o mago supremo alemão de origem turca de nome Ahmet Erçelik. A terceira era uma mulher de nariz ressaltado e pele morena da Armênia de nome Nadja Davtyan. Ela era a maga suprema da Turquia e Grécia, os dois países ao mesmo tempo. O quarto era Antoni Agnesi, um senhor de idade, mago supremo da Itália. A quinta era Björk Agnusdóttir, uma islandesa, maga supremo da Lapônia e extremo norte da Europa.

Ao lado dele, estava um irlandês loiro parecido com um elfo de nome Aaron Smith. Ele era o lorde chanceler das Ilhas britânicas e mago supremo delas. As ilhas seguiam um rumo a parte da União Europeia, mas participavam de julgamentos mágicos como aqueles do conselho europeu quando convocados. Ele estava sentado em uma cadeira ao lado direito da mesa dos jurados.

Dona Beatriz estava lá também, no outra cadeira ao lado da mesa dos jurados. Dessa vez, como ré da ação movida por Gotzone. Os magos supremos e representantes que estava assistindo estavam em alvoroço, discutindo freneticamente. Alphonse, o negro, bateu seu imenso cajado no chão e cessou todas as discussões do lugar. 

— Ordem. Vamos começar mais uma reunião do conselho europeu e o nosso assunto de hoje é uma queixa apresentada por Gotzone Bengoetxea, Ágatha Santiago e Nerea Sagastizábal da Espanha. Queiram por gentileza se aproximar! — disse Alphonse. Todos pararam de falar. 

Do outro lado da sala, Gotzone e Nerea atravessaram um imenso portal. Além da armadura vermelha como sangue, as duas vestiam um robe cerimonial vermelho cheio de gilfos e desenhos mágicos. Todos daquela sala olharam admirados para os robes delas e o burburinho voltou. Aphonse bateu seu cajado mais uma vez e todos pararam novamente. 

Todos daquela sala usavam robe com gilfos e desenhos mágicos. O robe era uma roupa de gala no mundo mágico, e os símbolos escritos neles representavam o poder do mago, o máximo que ele conseguiu progredir no caminho da magia. Os membros do júri tinham tantos gilfos que não cabiam em um robe só. Todos eles estavam com capas para complementar os desenhos faltantes. Na parte da coluna vertebral, havia um imenso desenho representando o poder principal do mago, o que ele ou ela estava mais familiarizado. O robe de Dona Beatriz era cinza azulado com o desenho de um imenso floco de neve nele, simbolizando que ela só sabia moldar qualquer coisa com estrutura de cristal. Era o único desenho que tinha lá.  

Os robes de Gotzone e Nerea não continham apenas desenhos que representavam o poder mágico, mas sim, inscrições que representavam a Ordem do Dragão como todo. Na coluna, havia um imenso dragão saindo de um corpo morto, símbolo da volta de Pi Sunyer do mundo dos mortos, nos primórdios da organização. No peito, um desenho representando a ressurreição de Zigor da casa da morte, feito por Carlos Garaikoetxea, antecessor de Zigor. Eram justos essas figuras que causavam tanto alvoroço na plateia. Era um tabu no mundo mágico ressuscitar os mortos. 

— Silêncio, silêncio. Aproximem-se… — ordenou Nadja Davtyan, uma das juradas. 

 As duas se aproximaram.

— Excelências aqui presentes de todos os países da Europa. Acredito que sou conhecida de todos vocês por ser uma jogadora de futebol famosa e isso dispensa apresentações. O motivo de eu estar aqui é pra denunciar os rumos nada ortodoxos que a Dona Beatriz está conduzindo a autoridade mágica espanhola! Conforme a gravação que eu enviei à vocês, dona Bea fez sérias ameaças aos comuns, fez apologia ao domínio dos magos sobre eles! Suspeito até que estamos lidando com uma infiltrada da Torre Negra no nosso ministério de assuntos especiais! — disse Gotzone. Bea escutava tudo segurando o queixo, resignada, olhando para um ponto vazio da janela. 

— Excelências, ela me acusa de eu pensar como todo mundo pensa nessa sala. Ou, por acaso, todo mundo aqui não acha que os comuns são um bando de agressores que só vivem destruindo o planeta terra, nossa casa comum? — indagou-se dona Bea. Um tumulto surgiu na plateia e Alphonse teve que parar todos de novo — A Ordem do Dragão quer falar de mim quando carregam pecados enormes nas costas e andam com eles com orgulho! Que maravilha! O que nós devemos como Europeus é acabar com esse tipo de gente que se acha que tá acima das leis, do conselho europeu, do senso comum! Fizeram isso no Mali, na África, com muitos resultados positivos. Eles acabaram com todas as ordens mágicas ilegais. Por que não podemos fazer isso aqui? — disse Bea. Um quarto dos assistentes concordou com ela.  

— Dona Beatriz, sabemos que as origens da magia não estão de todo esclarecidas. Quero aproveitar também para avisar que eu sou filho de dois comuns e fiz mais progressos na magia do que você. Eu sei o que magos preconceituosos, muitos entre nós aqui, pensam de gente como eu. Quero que saibam que não adiantam se orgulhar que só se casaram com gente com magia, quando o tataravô ou a tataravó de vocês, lá na décima geração passada, também nasceu de uma família comum com a minha! — disse o jurado Ahmet. Mais da metade da plateia ovacionou o discurso dele. Gotzone e Nerea olharam para Bea com um sorriso grande nos lábios.  

— Não comemore, Ordem do Dragão! — advertiu Björk — Vocês fizeram coisas intoleráveis e eu não concordo de todo com a existência de gente como vocês, que ficam intervindo no mundo dos comuns. Em Tromsø, eu enfrentei um esquadrão que pensava que os comuns deveriam ser domados, mesmo estilo de dona Beatriz, e eu concordo com ela que ordens mágicas como vocês não deveria existir. 

— O principal motivo da gente existir é que vocês, como autoridade mágica, muitas vezes falham! — disse Nerea, interrompendo a mulher — Muitos monstros, como a Torre Negra, crescem debaixo da sombra desses prédios imponentes que vocês chamam de Autoridade mágica sem se dar conta! 

— Você não deixou eu terminar, Nerea! tenha mais respeito! — advertiu Björk. Todos do conselho se calaram. — Eu posso não gostar de gente sem controle como vocês, mas tem casos e tem casos. Vocês não fazem parte do pior caso, mas, pelo que vejo, vocês cometeram crimes graves no Japão… 

Gotzone se ajoelhou diante deles. 

— Meus senhores, estamos enfrentando uma divisão na Ordem. A Torre se infiltrou entre nós e arrancou-nos muitos interventores nossos. Até mesmo a princesa Maitê foi corrompida por eles. Eu estou tentando corrigir isso, liderando a Ordem leal ao povo e a sua majestade. 

— Já sabemos disso, Gotzone, foi a própria Dona Beatriz quem nos alertou — disse Antoni Sassoli, o italiano. A loira olhou surpresa para a compatriota. 

— Dona Bea alertou? — indagou Nerea. 

— Sim, ela mesma — continuou Antoni. Por causa disso, nós estamos preparando uma força-tarefa europeia para responder à ameaça da Torre Negra. Podemos compartilhar informações e experiências, Gotzone. O que acha? — propôs o italiano. A jogadora se voltou para Nerea e as duas cochicharam por uns minutos. 

— Desde que não se metam na nossa liberdade… 

— Está feito. Com isso, encerramos a sua queixa contra Dona Beatriz. — disse Alphonse.

— Mas como assim? — indagou Gotzone, indignada. 

— Não temos provas materiais que as suas denúncias são procedentes, nem temos meios de mostrar que há um plano em andamento, comandado por ela, para regular os comuns da Espanha. Inclusive, ela nos permitiu examinar todos os prédios da Autoridade mágica espanhola em Toledo e não vimos nada de mais… 

— Mas isso é um absurdo! — gritou Nerea. 

— Absurdo seria deixar vocês saírem daqui impunes depois de brincar com a vida dos mortos e violar diretrizes mágicas milenares. Mas não vamos culpar vocês pelos crimes dos seus antepassados, não é mesmo? — disse Alphonse. As duas pareciam estar diante da maior injustiça da vida delas. — A nossa colaboração continua de pé. Podem ir. Nos chamem quando precisarem de nós e lamento pela morte da Ágatha e demais interventores que morreram lutando contra esse pessoal. Essa sessão está encerrada — disse Alphonse. Ele bateu o cajado e todos se levantaram. Gotzone olhou Bea com um ódio no olhar antes de sair. 

Antes de atravessar a imensa porta por onde tinham entrado, a mão da maga suprema da Espanha tocou no ombro delas. 

— Gotzone, Nerea, preciso falar com vocês. A gente pode se encontrar em Barcelona? — perguntou Dona Bea. As duas estavam surpresas com aquela atitude.    

 

III

Figueres, Catalunya, Espanha

Tarde de 8 de agosto de 2017

 

Já sem os robes mágicos, usando a calça jeans e as blusas de verão de sempre, Gotzone e Nerea esperavam na frente da penitenciária, encostadas numa SUV. De repente, Dona Beatriz aparece com duas mulheres atrás delas. Uma era loira de cabelos curtos e a outra tinha cabelos castanhos longos. A loira correu até as duas interventoras de Euskal Herria.

— Gotzone! Nerea! — disseram elas. 

— Marta Carbonell, Mercè Mas! Minhas interventoras das Baleares e de Valência! — disse Gotzone, abraçando-a de volta. Nerea também as abraçou. Mercè caminhou aos poucos até elas, com um sorriso melancólico — Cortou o cabelo, hein? 

— Quis começar a minha nova vida de um jeito novo — disse Marta. Eu perdi tudo! Perdi meus sucessores! 

— Não perdeu nada não, Marta! Vamos reconstruir a Ordem com o apoio deles, seja lá onde estejam! — disse Nerea, enxugando as lágrimas da bochecha da colega de farda.  

— Mercè… Tá tudo bem com você? — perguntou Gotzone. 

— ‘Tô… As prisões japonesas são horríveis, sabe? Nunca mais quero voltar pra lá.

— Tenho uma surpresa… — disse a jogadora. De repente, uma menina negra pulou nas costas dela. 

— Mercè! 

— Samantha! Você vai me matar! — disse Mercè, quase sufocada. A jovem desceu e abraçou-a pelas costas. Mais duas meninas correram e abraçaram a mulher de cabelos castanhos. A morbidez inicial dela deu lugar a um choro e a um abraço caloroso entre as quatro. 

— Elena! Cristina! Eu senti muita falta de vocês! Tá tudo bem? — perguntou Mercè. 

— A gente quase morreu, mestra! — disse Elena.

— Nunca mais deixa a gente! — disse Cristina. 

Dona Beatriz deu um pigarro e chamou a atenção delas. 

— Sei que é um reencontro bonito, mas não pisem fora da linha mais uma vez! — disse a mulher. Todas a olharam com melancolia nos olhos, exceto por Gotzone e Nerea.

— O que você quer com isso, Bea? — perguntou Gotzone. 

— Nada. Esse é só um presente meu pra vocês, pra mostrar que eu não sou uma pessoa tão má quanto vocês pensam… E também, um recado pra vocês se prepararem para as guerras que virão… Eu vou indo… Aproveitem suas asas da liberdade enquanto podem — disse Dona Bea, sumindo num redemoinho invisível. Seu corpo dissolveu-se no ar, como cristais de açúcar. Todas olharam desconfiadas para ela. 

— Aí tem coisa… — disse Nerea. 

— Se tiver, a gente vai descobrir logo, logo… — disse Gotzone. Todas fizeram sim com a cabeça.

 

Continua…


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