Mania escrita por Laurus Nobilis


Capítulo 1
Prólogo


Notas iniciais do capítulo

Olá!

Sou estudante de psicologia e tive essa ideia durante uma aula, começando a escrever incontrolavelmente. Não foi muito bom. Tudo que representarei aqui será baseado em meu conhecimento sobre transtornos mentais, visitas à clínicas psiquiátricas e experiências pessoais (tive muitos motivos para escolher esse curso...)

Eu via filmes e livros como "Veronika Decide Morrer" e "Se Enlouquecer, Não Se Apaixone", sabendo e ao mesmo tempo negando que um dia eu também escreveria uma história assim. Bem, aqui está. Como existe seriado médico, apelidei esse gênero de romance psiquiátrico.

Já mencionei isso nas notas da história, mas não custa reforçar: não pretendo economizar detalhes descrevendo os pensamentos e situações que os personagens vivem. Então haverá algumas ideias pesadas e menção à tentativas de suicídio.

Se você se considera uma pessoa sensível ou vulnerável a esse tipo de coisa no momento, talvez seja melhor interromper a leitura agora.

Ainda assim, vou evitar exageros, porque minha proposta é escrever uma história de amizade e esperança :)



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  Antes de ir para a clínica, Luiza passou um tempo em um hospital comum.

  Indiferente, ela encarava o vazio enquanto um médico remendava os muitos cortes profundos ao longo de seus braços.

  Mais uma vez tentara morrer.

  Mais uma vez falhou.

  “Essa vida de merda realmente me prende”, pensava, em meio aos pensamentos sobre torta de chocolate com morango. Em algum ponto de sua infância, alguém lhe disse que enquanto a enfermeira passava methiolate em seu joelho ralado, ela deveria pensar em coisas felizes, ou em doces.

 Quando muitos conceitos de sua vida se perderam, era engraçado que ela mantivesse justo isso.

 Ao dilacerar seu braço com um cutelo, ela sentira apenas dormência; formigamento. Agora, com o passar da anestesia local, começava a sentir fisgadas de dor. Seria uma merda esperar cicatrizar.

  Depois, sem que ninguém lhe perguntasse se queria, foi posta diante de um psicólogo. Era um homem de meia-idade, vestido em jaleco, que a encarou por cima de um par de óculos, parecendo muito calmo. Luiza percebeu a frieza naquele olhar, e quase decidiu não dizer nada. Quase.

  Ela não esperava que a primeira indagação fosse tão direta:

  – Por que você fez isso?

  Com um suspiro cansado, a jovem respondeu:

  – Eu mereço morrer.

***

  À medida em que tinham uma conversa vazia e infrutífera, ao ver de Luiza, e que pareceu gerar mais incômodo nela do que os cortes abertos que infligiu a si mesma, aquele homem, que se apresentou como Dr. Rodrigo, ia preenchendo uma ficha.

  Algo no fundo dela suspeitava do que aquilo se tratava. A confirmação só veio quando tentou sair dali e foi interceptada por uma equipe médica. Dr. Rodrigo veio por trás e entregou a ficha a um dos médicos. Com olhos atentos, Luiza leu: “[x] internação compulsória.”

  “Puta que pariu, que merda!”, pensou, antes de empurrar dois médicos, tentar fugir e ser agarrada e levada de volta com pouca delicadeza.

  Pela primeira vez em algum tempo, começou a chorar. Não queria conviver com malucos. Aquilo apenas deixaria mais claro o quanto ela era, de fato, maluca. Caso isso faça sentido.

  Mas talvez fosse melhor. Por alguma razão egoísta, ninguém queria que ela morresse.

***

  A clínica psiquiátrica era e ao mesmo tempo, não era como ela esperava. A área externa parecia até bonita, com muitas árvores, canteiros floridos, mesas com cadeiras, espreguiçadeiras e mesmo balanços e gangorras.

  “Tem crianças aqui?”, ela devaneou por um segundo, enquanto médicos a guiavam com mãos em seus ombros, sem tocar em seus braços.

  A única recomendação que recebera daquele hospital filha da puta: “Volte em duas semanas para tirar os pontos e não faça muito esforço com os braços, ou eles podem romper.”

  Talvez ela fizesse romper aqueles pontos. Talvez pegasse uma faca e cortasse tudo de novo.

  Não tanto por querer morrer, mas só para mostrar que não seria controlada.

  Pelo conhecimento que tirara de filmes, sabia que não existiriam objetos cortantes ao seu alcance. Talvez um clipe funcionasse.

  Com esses pensamentos ligeiramente autodestrutivos (Luiza gostava dessa palavra), ela adentrou o prédio principal e foi direto para a área dos dormitórios. Tentou ouvir gritos. Não detectou um ruído sequer, o que era ainda mais suspeito.

  A porta do quarto reservado a ela foi aberta. Por fora, parecia uma porta normal e pesada, com uma janelinha transparente no meio. Por dentro, como depois perceberia, não havia tranca.

  – Não pense demais no que aconteceu, Luiza. Tudo o que queremos é ajudar. Aí dentro tem uma televisão para você. Internet é proibido. – disse uma psiquiatra de voz forçosamente suave.

  Luiza lançou a ela um olhar pouco amigável e entrou, pois não valeria mais a pena resistir.

  Novos ares talvez fariam bem.

  “Não pense demais nisso.”

  Ela deitou na cama e tentou dormir. Sonhou com pessoas que não gostaria de rever, e ao despertar com vontade de chorar, considerou aquilo um pesadelo.

  Aí sim, ainda deitada, começou a pensar.

  Ela conhecia bem demais seu diagnóstico. Transtorno de personalidade borderline.

  Reações exageradas a incômodos emocionais, impulsividade, medo inconsciente de abandono, vazio interno insaciável, ideação suicida.

  Uma delícia, não?

  “Transtorno de personalidade”, como sugere o nome, significa que aquela merda de problema mental consumia tanto de seu modo de ser que ela esquecera, há muito tempo, quem realmente era.

  O pior, na verdade... Era a maneira como aquilo afastava todo mundo.

  Ela se afastaria de si mesma, se pudesse. Inclusive, “não pense nisso”, seu intuito na noite anterior havia sido mais ou menos esse.

  Alguém bateu na porta, assustando-a. Pela janelinha, ela reconheceu a mesma médica que lhe explicara por alto as regras. Com um “joinha”, permitiu que ela entrasse.

  Era engraçada aquela formalidade, dada a porta sem tranca interna.

  – Hora da recreação, Luiza. Você quer ir?

  Luiza deu de ombros. Soava melhor do que continuar ali dentro.

  Foi levada, então, a um salão com mesas, estantes, uma televisão e um rádio tocando aquelas músicas enjoativas de João Gilberto, Vinícius de Moraes e cia.

  Assim ela já teria um vislumbre do que precisaria suportar. Foi deixada ali e olhou em torno.

  Pessoas malucas têm cara de pessoas malucas. Olhares perdidos, posturas estranhas, movimentos repetitivos.

  E alguns pareciam quase normais.

  Luiza sabia parecer “quase normal” em boa parte do tempo, especialmente em público.

  Dentre as muitas mesas, ela escolheu uma em que estavam sentados dois jovens de sua idade.

  Queria mesmo socializar? O que mais lhe restava?

  Era um rapaz e uma garota, que estava deitada de cabeça apoiada na mesa, revelando a dimensão de seu cabelo oleoso.

 O rapaz olhou para Luiza sem uma palavra, esboçando um sorriso.

  “Ele é gato até”, pensou ela, e isso quase a fez rir.

  A menina deitada mal se movia. Apenas respirava. Aquilo a deixou um pouco agoniada.

  – Tudo bem com ela? – perguntou ao garoto.

  Ele a olhou e não respondeu. Então ela percebeu que havia algo de disperso em seus olhos azuis com remelas.

  “Ótimo, um esquizofrênico”, concluiu suspirando.

  Ninguém ali estava bem. Seus próprios braços estavam inteiramente cobertos de bandagens, parecendo mangas.

  Ela olhou para a mesa. Havia um maço de cartas (nenhum deles parecia disposto a jogar, no máximo seria um jogo de paciência) e livros. O primeiro livro da pilha chamou sua atenção, pelo fato de reluzirem na capa de couro, em dourado, as palavras: “Mitologia grega.”

  – Olha só... – murmurou, puxando-o para perto de si.

  O doidinho ao seu lado sorriu.


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Notas finais do capítulo

Por incrível que pareça, minha vibe ultimamente tem sido escrever contos de fadas e terror leve, então desacostumei a escrever drama e fiquei meio assustada com minha própria história. Mas tudo bem, life that follows.

Rolou muita licença poética aqui, como a Luiza pensando um monte de palavrão e chamando as pessoas de malucas (é desrespeitoso.)

E eu pessoalmente gosto de bossa nova, não acho enjoativo.



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