Bem Perto escrita por ro_dollores


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Vizinho interessante



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Bem perto 

 

‘O som do silêncio não fala aos ouvidos, grita na alma’

A casa de pedra nunca lhe pareceu tão imensa como naquela manhã, a porta imponente da garagem estava aberta e ela demorou alguns segundos para guardar seu Liberty e acionar o controle. 

Estava feito, ela estava fora de casa, se sentindo em casa!

O acordo era esse. 

Seus pais possuíam aquela ‘cabana de luxo’, que um dia tinha sido realmente uma cabana, muito antes da Villa de Los Altos Hills se tornar o que era. Os anos transformaram o lugar em um top ten para famosos, e a simples moradia que um dia pertenceu aos seus avós foi se modificando ao longo dos anos. Os quarenta metros quadrados do início, ganharam cinco vezes mais paredes e cômodos, toneladas de pedras e cerâmica, um generoso jardim e um quintal nos fundos com divisa para o lago.

Sara olhou através das cortinas e viu um pequeno barco fazendo desenhos psicodélicos na água. Um casal de namorados!

Ela precisava de espaço e coragem para deixar para trás, por um tempo, uma vida cheia de aventuras e possibilidades.

Só o que ela poderia pensar era que se não fugisse, implodiria!

Fugir! Talvez não fosse a melhor definição para sua saída estratégica da cidade, o afastamento de seu trabalho e de sua pequena família.

Ela suspirou quando pensou em seus pais, Gerard e Rosie. Eles eram sua vida, seu porto seguro e os amava infinitamente. 

Seu pai era oficial superior do regimento do Corpo de Bombeiros de São Francisco e sua mãe possuía uma livraria para crianças.

Sua infância havia sido cercada de cuidados e mimos. Sua mente privilegiada lhe permitiu bolsas nas melhores escolas e universidades e, alguns anos depois, um cargo de extremo respeito na Divisão de Investigação da Polícia da Califórnia, um braço adjunto do próprio FBI, mesmo com tão pouca idade. Muitas vezes, ela era designada para analisar locais usados por psicopatas, assassinos frios e todo tipo de mentes doentes. 

E foi em uma das saídas à campo que caiu em uma emboscada, quase perdendo sua vida. Tinha sido logo após a morte de Bruce.

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Ela tocou em suas costelas, ainda sentindo um certo desconforto que, segundo seu terapeuta, era puramente emocional. 

Assim que abriu a porta para o quintal, ela ouviu seu telefone na cozinha.

“Oi mãe …”

“Você chegou bem, querida?”

“Sim … acabei de desfazer as malas e estava indo até os fundos para verificar se está tudo bem.”

“Seu pai já falou com Peter, ele disse que tudo está na mais perfeita ordem, se precisar dele …”

“O telefone está na agenda!” - Ela já havia escutado aquela frase uma dezena de vezes. - “Não se preocupe, mãe. Ah … eu vou levar a máquina de café para o conserto, bati sem querer no canto do balcão e ela não está funcionando.”

“Não conte ao seu pai, vai querer ele mesmo consertar.” - Rosie levantou os olhos para o céu quando sentiu a presença de Gerard às suas costas.

“O que não é para me contar?”

Sara começou a rir, imaginando a carranca de seu pai, olhando com desconfiança.

“Vou comprar uma nova e levo essa para casa, quando voltar, ok?”

“Tudo bem, ele quer falar com você, beijos e se cuida, meu bem!”

“Oi filha … chegou bem?”

“Oi pai … cheguei sim.”

“O que aconteceu?”

Sara repetiu sobre a máquina e alguns minutos depois, sob os protestos da mãe de que não era para se preocupar com uma velharia, ela desligou. Tinha sido engraçado ouvir os dois discutirem sobre o conserto. Ele adorava mexer em coisas velhas e ela adorava discordar dele! 

Gerard tinha sido o primeiro namorado de Rosie, eles se separaram quando seus avós descobriram que ele havia entrado para a polícia. Poucos anos depois, ele deixou uma noiva praticamente no altar, ao descobrir que sua mãe estava doente por conta do casamento dele. Eles nunca deixaram de se amar e, Sara, era o fruto daquela união tão bonita. Filhos únicos, assim como Sara, a pequena família sempre esteve muito unida.

Quando ela conheceu Bruce, foi por influência direta de seu pai.

Os namoricos que eles sabiam que sua filha tinha, nunca os preocuparam, ela sempre foi uma garota responsável, muito quieta na verdade, mas transparente como água. 

Seu pai havia auxiliado em um incêndio no condomínio onde Bruce possuía um escritório de arquitetura, além de ser funcionário da prefeitura. 

Ele ajudou Gerard no que pode com as dependências do pequeno prédio, poupou todo o trabalho dos bombeiros de estudar o local, indicou cada ponto crítico e ainda conseguiu convencer algumas pessoas a saírem pela escada magirus.

Naquela noite, Gerard o convidou para sua casa, a empatia tinha sido imediata.

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“Você não seria capaz!”

Bruce começou a rir e a levantou do chão.

“Veremos …”

Eles estavam sobre a neve da estação de esqui de Aspen, o sol fraco fazia uma moldura em seu rosto bonito. Seus olhos muito azuis estavam radiantes, ele acabara de dizer a ela que tinha realizado seu grande sonho, traduzido em mil e quatrocentas cilindradas. O que o levara a irradiar felicidade, havia lhe tirado o bem mais precioso.  A vida.

“Vamos dividir um esqui, você vai adorar a sensação.!”

“Você gosta de perigo, não é?”

“Isso está mesmo vindo de uma agente ligada ao FBI?”

E ele conseguiu equilibrar os dois dentro de um mesmo equipamento, adrenalina a mil, e muitos gritos de pavor.

“Seu maluco!” - Ela mal podia acreditar que estavam inteiros. 

De repente, as luzes das viaturas cegaram seus olhos, muito ferro retorcido, passos nervosos e o desespero de saber que não ouviria mais sua voz, não teria seus braços, seu sorriso.

Sara acordou completamente molhada de suor.

Ainda tinha sonhos com ele, mesmo que cada vez mais espaçadamente!

Ela pegou uma garrafa de água mineral, e foi até a varanda, não se importando se alguém a visse com seu pijama masculino. Ela os achava muito mais confortáveis.

O olhar distante, perdido nas lembranças! 

Um motorista desavisado havia perdido o controle na radial, atingindo Bruce frontalmente. Foi um impacto injusto. Uma Ford Raptor em velocidade máxima contra uma raríssima Ecosse Titanium, espetacularmente linda. E ele se foi.

Eles se davam muito bem, estar com ele era sempre uma aventura, ele era um bom homem, tratava sua tia e o marido, professor da universidade local, com muito carinho e respeito. Sua mãe havia partido poucos meses após seu nascimento, de complicações neurológicas, causadas por um tumor agressivo e letal. Ele também não conhecera seu pai, segundo informações de sua tia, ele desaparecera antes dela descobrir a gravidez.

Ela não tinha muitos pesadelos com seu próprio acidente, talvez sua terapia tivesse realmente feito algum progresso.

O que lhe pesava demais era sentir que a perda de Bruce havia interferido consideravelmente em seu desempenho. Ela estava tão dispersa aqueles dias e não deveria ter feito buscas no local juntamente com sua equipe, deveria ter se poupado. Mas por outro lado, o trabalho lhe dava força e ânimo pra sair daquele luto.

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A manhã estava linda, ela abriu a janela e se alongou, como fazia antes de sua corrida matinal, o cheiro gostoso de natureza encheu seus pulmões.

Ela percorreu a extensão do lago duas vezes, depois fez alguns exercícios e se sentou na areia artificial olhando para o outro lado da margem.

Naquela hora da manhã, havia poucas pessoas acordadas em suas casas, muitas delas apenas para veraneio. Do lado sul, todas as casas tinham uma particularidade, o lago como complemento do quintal.

Se tivesse outro tipo de vida, talvez morasse definitivamente ali, ou quem sabe em sua velhice. Ela se imaginou onde estaria num futuro distante, depois riu e tratou de afastar aqueles pensamentos que lhe traziam o que poderia ter sido e não o que poderia ser.

Logo estava debaixo do chuveiro, tinha planejado ir até a cidade comprar uma nova máquina de café e uma bateria para seu notebook, precisava de um bom equipamento e nada de surpresas, estar on line era uma das exigências de seu novo trabalho, a consultoria. 

Ela recebia os casos em um link e analisava todas as etapas, sua evolução e as tomadas de decisão de cada agente. 

Seu horário era flexível e aquela nova etapa de sua vida conseguia agregar o descanso que necessitava sem se sentir inútil! 

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Grissom olhou para a entrada do condomínio e desceu de sua suv de luxo para falar com o porteiro e esticar as pernas.

Há muito tempo não tirava um descanso, e aquele lugar lhe pareceu perfeito para ter paz e terminar seu livro. Ele havia agregado suas férias com uma licença após sua bem sucedida cirurgia para correção da audição. 

Catherine havia falado daquele lugar, um velho amigo possuía uma casa ali e lhe deu a dica para um dos chalés, disponível por uma longa temporada. Os proprietários estavam em um cruzeiro ao redor do mundo.

Alguns minutos depois, estava descarregando sua bagagem.

O lugar era bem espaçoso e estava cheirando à limpeza. 

Muito criterioso, ele vistoriou todos os cômodos, aprovando imediatamente, logo depois resolveu tomar um banho para tirar a canseira da estrada.

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Sara estava sem sono, ela havia recebido uma série de etapas de um caso e estava tão envolvida que não viu o tempo passar, estava calor e ela resolveu se sentar na varanda. Foi quando notou o movimento no chalé em frente ao seu.

Ela viu a porta de uma suv prata ser aberta, alguém desceu e ficou parado olhando para a garagem fechada. 

Se passaram alguns segundos quando ela percebeu que havia algum problema com o controle remoto, a garagem não estava abrindo.

“Droga!”

Com coragem, ou como se algo a empurrasse, ela atravessou a rua se sentindo familiarizada com o estranho, sem saber exatamente se corria perigo ou não. Embora fosse um condomínio fechado, havia riscos como em qualquer outro lugar que se dizia seguro.

Ele ralhou novamente, e ela teve vontade de rir com o jeito quase infantil.

“Algum problema? Eu … posso ajudar?”

Ele se assustou e se virou rapidamente. Ela achou que ele tinha algo familiar, os olhos azuis, talvez. Eram lindos!

“Oi ... acho que meu controle … pifou!”

A voz dele tinha um sotaque gostoso, e o meio sorriso tímido, era encantador. Duas covinhas surgiram sob a barba espessa mas bem aparada e, olhando mais de perto, ela viu  a mesma fissura em seu queixo. 

“Sou sua vizinha de frente …” - ela apontou para trás e girou o corpo em uma meia volta apenas. - Ela viu que ele inclinou a cabeça de leve, e arqueou uma de suas sobrancelhas, se estivesse sozinha com certeza assoviaria com prazer. Ele era muito bonito! - “Talvez eu tenha pilhas extras, se precisar … se conheço bem meus pais, pode ser que encontre dúzias delas!”

Ele sorriu mais abertamente, a sensação estranha foi mais intensa.

“Obrigado …” - ele apontou para ela como a perguntar silenciosamente seu nome.

“Oh … desculpe, sou Sara … e você é?”

“Grissom … Gilbert Grissom!” - Aquele nome não era de todo estranho.

“Então, Grissom, vai aceitar minha ajuda?”

“Oh … me desculpe, eu aceito, com certeza.”

Ele não sabia porque estava tão nervoso, ela era uma linda morena, cabelos brilhantes, um sorriso encantador, os olhos chocolate mais incríveis que ele já vira e um cheiro delicioso. 

“Me dê seu controle por alguns instantes, eu já volto.”

Seus pensamentos pareciam flutuar quando ele viu o corpo magro e bem feito, atravessar a rua com graça, o ar parado deixando o perfume dela com ele!

Há um bom tempo uma mulher não lhe chamava tanto a atenção. Em sua profissão, ele tinha contato com dezenas delas, mas aquela empatia que estava experimentando era diferente.

Ele se sentou na cadeira de balanço da varanda, olhando para o outro lado da rua, de repente a porta da garagem deslizou suavemente e ela surgiu com seu sorriso gostoso.

“Prontinho … você me deve uma!”

Ele retribuiu o sorriso.

“Obrigado, Sara, agradeça seus pais por mim, eu … não havia usado a garagem ainda, então não sabia que estava com problemas.”

“Acontece e … quando falar com meus pais, o que deve acontecer por telefone, eu o farei.”

“Oh … desculpe …” - ele ficou olhando para a sua casa como se perguntasse se havia mais alguém ali. Sua expressão ansiosa foi facilmente lida por ela, afinal era treinada para tanto.

“Bem … se precisar de algo, é só dar um grito … ou melhor interfone, as casas se comunicam entre si com um número específico, o meu é o vinte e um.”

“Obrigado mais uma vez.”

“Feliz estadia, Grissom, espero que sua família aproveite este lugar, é maravilhoso!” - Ela sabia quem eram os proprietários do chalé, os Hudson  raramente ficavam ali, então alugavam com frequência.

“Eu … não estou … com minha família … aliás, eu não tenho uma família.”

Seu pensamento deu alguns rodopios, então ele era sozinho?

“Eu não sei se devo dizer que sinto muito …”

“Não deve …” - ele sorriu, de novo, ela também!

“Até mais!”

“Até breve!” 


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado. Obrigada a quem se interessou. ETERNA GRATIDÃO PELO TEMPO QUE DISPENSARAM.



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