A Aranha na Teia escrita por Elvish Song


Capítulo 8
Together


Notas iniciais do capítulo

Eeeeeeuuuuu volteeeeeiiiiii!!!!!!

Olá, meninas (e meninos, se houver)!!
Estou de volta com mais um capítulo! Espero que gostem!!!! Obrigada a todo mundo que está lendo, acompanhando, comentando, recomendando ou de alguma outra forma fazendo parte dessa fic!
Teremos aqui alguns flashbacks da Nat, e um dela e do Clint, marcados em negrito e itálico por serem parágrafos em que um ou outro se recordam de momentos específicos. Espero que gostem!

Boa leitura!!!



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Natasha petrificou por um segundo, felicidade e preocupação se misturando ao realizar que seu companheiro estava ali; passado o segundo de surpresa, porém, avançou até ficar a menos de um passo do Capitão, não muito surpresa com o hematoma em redor do corte suturado na testa do soldado. Com seu sorriso de lado típico, perguntou em tom casual:

— Apenas uma laje? Parece que te acertaram feio, Capitão.

— Ainda estou em uma parte só. – Ele sorriu e a abraçou; era raro Natasha permitir uma intimidade tão simples, e só o que quisera em todas aquelas semanas fora poder envolvê-la nos braços. – Como você está?

— Achei que o Clint teria colocado todas as fofocas em dia, ao te trazer para cá sem me avisar. – Respondeu a espiã, afastando-se um pouco para encarar o amigo com uma sobrancelha erguida.

— O Steve é de confiança, Nat. Vocês precisavam se encontrar, e de preferência fora da Torre. – o Gavião deu de ombros. – Achei que você preferiria contar tudo por si mesma.

A Viúva Negra assentiu, piscando longamente num agradecimento mudo, que Clint retribuiu com outro anuir breve, desencostando-se da parede:

— Bom, vou vigiar os Três Mosqueteiros, enquanto vocês conversam. Capitão, sinta-se em casa.

— Obrigado, Barton. – Os dois homens haviam conversado durante o percurso até ali, e o soldado entendia o nível de confiança que representava, para o mais jovem, levá-lo àquele lugar; fazia isso por Natasha, mas o fato não diminuía a boa-fé do ato, tampouco a gratidão de Rogers.

Sozinho na cozinha, o casal se sentou à mesa, Natasha apoiando a cabeça numa das mãos com um discreto sorriso feliz e cansado, Steve defronte a mulher a quem amava, tentando alcançá-la novamente através de um leve toque em seus cabelos, a outra mão sobre a que ela pousara na mesa. Os dedos da Viúva Negra se contraíram levemente, mas em seguida relaxaram, e ela não se afastou do toque, mas se endireitou na cadeira e fitou Steve, que foi o primeiro a falar:

— Senti sua falta, Nat. Quando enviou o sinal, tive medo do que aqueles lunáticos fariam até que chegássemos.

— Você me conhece, Steve. Eles não viram o que os acertou, antes de morrerem. – Romanoff sorriu levemente.

— Foi pensar nisso que me ajudou a ficar são, nessas semanas. – Ele se inclinou para beijar sua fronte, sentindo-a estremecer ao contato, ainda afetada pelo tempo em campo e por todo o estresse decorrente. – Como você está?

— Viva. Bem. – A ruiva deu de ombros, finalmente suspirando e segurando de volta a mão do Capitão. – Também senti sua falta; não percebi o quanto, até agora. – “Longe dos olhos, longe do coração” era um bom mecanismo de autopreservação, mas os sentimentos sempre voltavam, como agora vinham para fazê-la perceber que de fato estivera com saudades de Steve. Sua mente descartara essa percepção, mais ocupada em lidar com Lucy e as consequências de suas escolhas, encarando saudades como um sinônimo de dependência e fraqueza, portanto negando-as. mas Clint claramente, sem nenhuma surpresa, conseguia compreendê-la melhor do que ela mesma, às vezes. – Acho que preciso agradecer ao Papagaio, por te trazer. – Finalmente ela relaxou um pouco mais, e se inclinou para beijar brevemente os lábios do companheiro, feliz quando ele correspondeu suavemente.

— O que eu fiz para merecer você? – Perguntou o Capitão, sorrindo.

— Alguma coisa muito ruim. – Ela devolveu do mesmo jeito, antes de se afastar. – Nós... Precisamos conversar.

— Sobre a Lucy. – Ele se endireitou sem se afastar. – Vai ficar com ela, e acha que isso vai mudar algo entre nós. – Entrar nesse assunto seria um caminho perigoso. – Tasha... Isso não é sobre nós. Eu te amo, e quero estar com você independente da sua escolha, mas acho que está tentando analisar tudo e solucionar como se fosse uma investigação, e não é. Algumas coisas você precisa deixar fluírem, tomar seu tempo para se acostumar, conversar com alguém para se colocar em ordem. Tudo aquilo, as coisas que viu na sua missão... Só tome seu tempo. E não importa o que aconteça, estou ao seu lado.

Natasha se dividia entre ternura por Steve, gratidão, ao mesmo tempo em que se sentia irritada por sua calma, e por estar certo. Estava tentando controlar algo que não podia ser controlado, lutando para fazer algo em relação a uma situação sobre a qual sequer conseguia admitir os próprios sentimentos...

— Às vezes você é tão bom, que eu queria te estrangular, Steve Rogers. – Um breve sorriso se espalhou por seu rosto quando balançou a cabeça, relaxando os ombros que mantivera dolorosamente tensos até então. – Se disser para alguém que eu disse isso, mato você, mas acho que tem razão. – A russa se levantou e caminhou para a porta, de repente usando sua máscara de satisfação e o sorriso charmoso de sempre. – Vai ficar aí, ou vem conhecer a gangue?

*

Já conhecendo o Capitão América por nome e histórias do Gavião, os Barton o receberam muito bem, especialmente as crianças, empolgadas em conhecer um dos heróis que lutavam ao lado do pai e da madrinha. O mesmo não podia ser dito de Lucy: estavam nos fundos da casa, jogando milho para as galinhas e patos – a pequena simplesmente amara travar contato com os animais, e suas habilidades se manifestavam constantemente de forma involuntária, amansando até os mais ariscos – quando o soldado saíra com Natasha e, enquanto os primos exultavam, ela recuou e observou como um passarinho ressabiado. Os animais pareciam reagir a sua inquietação – provavelmente o faziam, mesmo – e se interpuseram à menina e o estranho, os gansos adquirindo postura agressiva.

Vendo o que ocorria, Natasha se desviou dos animais e caminhou até a menina, pousando a mão em seu ombro; Lucy colocou a mão sobre a da mãe em resposta, captando explicações a partir de seus pensamentos. O coração infantil se acalmou, e as emanações de seus pensamentos abrandaram também os animais alvoroçados em redor, enquanto se voltava para o Vingador, o qual dobrou um joelho até tocar o chão, para ficar ao nível da criança enquanto esta vinha em sua direção, ainda segurando com força a mão de Natasha.

— Oi, Lucy. – Ele sorriu com gentileza e lhe estendeu uma das mãos, palma voltada para cima. – Não precisa ter medo de mim: sou amigo de sua mãe, e de seu padrinho. Pode ler os meus pensamentos, se quiser.

Por longos segundos a pequena permaneceu diante do homem, encarando-o nos olhos, até enfim estender a mão e pousá-la sobre a dele. Devagar, sua expressão se modificou de tensa para curiosa, e então algo como um esboço de sorriso enquanto captava as nuances da mente de Steve Rogers.

— Oi, Capitão Rogers. Eu me lembro do senhor: estava com o tio Clint e o homem de metal, quando nos tiraram da base. – Sua mãozinha se retirou da dele. – Obrigada.

— Não precisa agradecer, pequena. – Ele se ergueu, fascinado com a garota e as coisas que vira e sentira enquanto segurara sua mão: parecia uma linguagem própria dela, mostrando a própria curiosidade e receio, o vínculo com Natasha, Clint e a família... E apesar do medo ainda presente, da incerteza sobre como lidar com pessoas e da dificuldade em confiar, havia nela uma gentileza, compaixão, doçura... Não sabia explicar racionalmente, pois aquilo tudo ultrapassava sua compreensão, mas era impossível não se encantar com aquela garotinha. – E pode me chamar de Steve. Tio Steve, se preferir. – Agora entendia a confusão de Natasha: a criança era alguém totalmente diferente de tudo o que já vira... Doce e cheia de luz, mas também machucada, e inegavelmente alguém com enorme potencial, para o bem ou o mal.

— Tio Steve. – Ela abriu um sorriso delicado, aquele que parecia um raio de sol em meio a nuvens de inverno, e cruzou as mãos nas costas. – Gostei de conhecer o companheiro da mamãe. Você a faz feliz. – Seus olhos azuis buscaram Natasha de um modo sorridente. – Ela está feliz, agora, porque está aqui, então eu também estou.

— Também estou feliz de estar aqui, pequenina, e de ver você bem. – O soldado segurou o riso quando viu o olhar exasperado de Natasha, ante a denúncia clara de Lucy, e prosseguiu – Eu sei que ela me ama, mas não conte para todo mundo. Sua mãe tem uma reputação a manter.

— Hilário, Rogers. – Interveio Romanoff, pisando de leve no pé de Clint, que mal conseguia segurar o riso. – Lucy, dorogaya, vai continuar aqui atrás?

— Vou sim, mama! Cooper, Lila e eu vamos ajudar a tia Laura com as flores! – Ela foi até a mãe que, com um discreto sorriso e algo de sua costumeira postura distante, acariciou os cabelos da filha.

— Vou levar o Steve para se acomodar. Voltamos logo, ok? – E ante o anuir da criança, beijou sua fronte e se juntou a Steve com um olhar agradecido para Clint, que levantou uma sobrancelha de modo divertido, ganhando de volta um franzir de testa ameaçador pela piada não proferida.

— Algum dia eu vou me acostumar a essa linguagem de sinais bizarra de vocês dois. – Brincou Laura, divertida. Não se lembrava de um tempo em que não houvesse essa comunicação silenciosa e completa entre Natasha e Clint, embora nunca houvesse conseguido decifrar totalmente os códigos que usavam. Provavelmente nem eles mesmos conheciam conscientemente os próprios códigos, mas ler o outro lhes era algo natural e instantâneo. Mas conhecia o marido bem o suficiente pra entender suas expressões de travessura. – Gavião, pare de encher a Nat! Você é a criança mais difícil de cuidar, de todas aqui!

— Coloque-o de castigo por mim, Laura! – Pediu Natasha, levando Steve consigo para o quarto que ocupava.

Ao se verem a sós, tudo o que eventualmente pretendessem falar sumiu quando o Capitão empurrou Natasha contra a parede, seus lábios cobrindo os dela em beijos sôfregos e apaixonados aos quais a russa não conseguia não corresponder, passando os braços em redor do pescoço de Steve, uma das mãos se entrelaçando aos fios loiros enquanto se beijavam com toda a vontade acumulada ao longo das seis semanas de distância, famintos, quase desesperados, aqueles gestos aliviando a tensão desagradável da separação pelo reconhecimento do corpo do outro, de seus gestos, do toque, perfume, dos sons familiares, o calor que haviam sentido falta, capaz de espantar um frio que nada tinha de físico... Por longos minutos, existiram apenas eles e aquele momento.

— Senti sua falta, Romanoff – Sussurrou o Vingador, quando enfim se separaram, ofegante com as sensações que ter a amada de volta a seus braços provocava.

— E eu a sua, Rogers. – Pousou a fronte contra a dele por alguns segundos, ante de se afastar de vez. Não podia perder seu foco, mesmo que quisesse tanto. – Sei que estou mais distante, mas essa missão pareceu durar bem mais do que quatro semanas...

— Não vai querer conversar a respeito, imagino?

— Não mesmo. Quero esquecer. – Ela se sentou na cama, ao que o companheiro se sentou ao seu lado, abraçando-a enfim ao senti-la receptiva. Seu olhar captou tudo em redor, e foi fácil deduzir que Lucy estava dormindo ali, com a mãe. – Só o que importa é ter acabado. E dado tudo certo.

Steve ficou ao lado da espiã, deixando que a presença de um confortasse o outro, contando-lhe sobre como tudo correra na Torre dos Vingadores, e do sucesso no resgate dos jovens mutantes. A maioria retornara às próprias famílias, enquanto os órfãos haviam sido acolhidos pelo Instituto Xavier. Essa informação pareceu incomodar profundamente a espiã, que anuiu e desconversou:

— Tudo bem, por você, dormir no outro quarto? Lucy precisa de mais um ou dois dias até se ambientar...

— Não precisa ficar desconfortável assim por causa disso, Tasha: em casa moramos em apartamentos separados: não tenho problemas em dormir no outro quarto, pelos dias que a pequena precisar para melhorar. – Ele depositou um beijo suave no ombro da espiã, sabendo que ela não lhe falava tudo o que estava sentindo, ou tentando lidar. – Quando vai começar a se abrir comigo, Tash?

— Um dia. – ela o abraçou. – Só fique assim, comigo.

— Sempre, Nat. – Com a russa, os passos tinham de ser devagar. Ela já se abrira demais, em comparação a quem costumava ser quando ainda eram apenas “amigos com benefícios”, mas ainda havia um bom caminho a percorrer. E por ele, tudo bem. Confiava em Natasha, e sabia que ela confiava em si, mesmo que não se abrisse. Se não falava, era apenas porque falar não fora algo que aprendera a fazer, algo que lhe fosse fácil. Viria com o tempo. Por ora, bastava saber que continuavam ali um pelo outro.

*

O jantar fora tranquilo e até divertido, com as crianças dos Barton pedindo a Steve que contasse algumas de suas aventuras com os outros Vingadores, e este exasperadamente tentando encontrar alguma história que pudesse realmente contar. O Gavião explicara que Fury o ajudara a manter sua esposa e as crianças fora dos radares da SHIELD – sendo inclusive padrinho das crianças – e Laura contara sobre seu trabalho como paisagista e designer de ambientes, numa conversa inesperadamente comum e fluida. A própria Lucy aos poucos se soltara e participara da conversa, e vê-la tão integrada à família dava um nó na garganta de Natasha, tanto quanto a aliviava. A criança percebeu o desconforto da mãe, olhando-a com confusão, mas nada disse, nem mesmo quando Romanoff desapareceu sem dar explicações após terminarem de lidar com a louça.

Agora, a espiã se encontrava sozinha no telhado do sobrado, joelhos dobrados junto ao peito, cotovelos apoiados nos joelhos e cabeça entre as mãos. Havia um bom motivo pelo qual não tomava decisões por impulso, e eram as consequências de fazê-lo... Como agora. Diante de si, tinha duas escolhas: manter sua promessa, e falhar de modo retumbante com Lucy, ou quebrar sua promessa e, com ela, o coração machucado da criança, mas lembrando-a bem da lição que ninguém como elas devia esquecer: jamais confiar em alguém. Não seria a primeira vez: ela já fizera coisa similar com outras garotas, promessas vazias de mantê-las a salvo e vir em seu auxílio, se necessitassem, apenas para desapontá-las duramente a fim de marcar muito bem aquela preciosa lição. Mas isso fora em outro tempo. Uma outra Romanoff. Uma Natasha que mantinha em si coisas demais do mundo em que fora criada, e perpetuava o que fora feito a si mesma por considerar apenas o modo mais prático e direto de agir. Em sua mente, sabia que devia fazer isso agora, mandar Lucy para longe antes que algo muito pior do que um coração partido acontecesse com a criança... Mas parte de si sabia que não haveria nada pior, pelo menos no entender da criança. Tortura, morte, perigo... Ela já não passara por tudo isso?

— Lembro de já termos estado nessa situação. – A voz de Clint soou serena atrás de si. – Mas era eu quem estava assim, quando Laura me contou estar grávida de Cooper. – Ele se sentou ao lado da amiga, pernas cruzadas, encarando o horizonte. – Não é exatamente o mesmo, mas ambos agimos de modo impensado, cada um ao seu modo, e o resultado acabou sendo uma coisinha dependente de nós. Lembra do que me falou, naquela época?

— Não é a mesma coisa, Clint. – Os olhos de Romanoff também estavam fixos na paisagem bucólica da fazenda, levemente úmidos. – Hoje, na mesa, e nesses dias todos... Estou deixando que ela viva um sonho, uma ilusão. Mesmo se ficasse com ela, a vida não vai continuar esse paraíso. Tenho um trabalho longe daqui, um do qual não posso sair, mesmo se quisesse. Um trabalho que me trouxe inimigos e colocou um alvo nas costas de todos que sejam importantes para mim. Mas todos os meus amigos são guerreiros, enquanto ela... – A russa encolheu os ombros – A vida comigo não vai ser uma coleção de dias felizes numa fazenda, dormindo na mesma cama toda noite e ouvindo histórias para dormir. – Havia raiva na voz de Romanoff. – Dei a ela o gosto de algo que nunca vai ter, e para quê? Por quê? Por um momento de fraqueza, quando ela estava na minha cabeça! – Ela agarrou uma pedrinha solta e arremessou com toda a sua força. - Deixei uma criança de dois anos e meio me contagiar com seus anseios, expectativas e desesperos, arrisquei um disfarce e tomei uma péssima decisão, manipulada pelos sentimentos de um bebê!

— É. Você caiu feio nos encantos da coisinha. Por outro lado, foi manipulada por uma versão menor de si mesma... – Ele repuxou o canto da boca num esboço de sorriso. – Nat, você estava muito envolvida nisso, desde o começo. Não na missão: com Lucy. Ficou muito pessoal desde que descobriu que ela é sua filha.

— E como não ia ficar?! – A espiã se levantou, andando para um lado e para outro nas telhas, punhos cerrados com força. – Tudo o que ela passou, todas as coisas que fizeram com ela... As mesmas coisas que fizeram comigo... Tudo isso foi porque eu FALHEI em Nuremberg! Ela não teria sofrido, não teria nem existido, se eu não tivesse sido capturada, ou se houvesse contaminado direito as amostras que colheram de mim. Não entende? Eu fiz tudo isso com ela, indiretamente! – Merda, Lucy era sua filha, seu erro, sua responsabilidade, sua culpa e, pior do que tudo, o reviver de coisas que ela queria muito esquecer!

Natasha estava presa com correntes ao radiador, as grades pressionando suas costas com força enquanto as algemas se enterravam na carne. Os eletrodos em suas têmporas, a água jogada em seu corpo, e então as descargas elétricas fazendo-a convulsionar e morder o tortugo de couro em sua boca quase até partir a peça dura e seca. As memórias se embaralhavam enquanto o vídeo era exibido na tela diante de si, sua mente confusa absorvendo as imagens e sons como memórias próprias... Memórias de balé, em vez do treinamento de assassina. De danças suaves em vez dos movimentos marciais precisos. De longas horas ao som de Tchaikovsky, Stravinsky e Prokofiev, em vez do canto do gatilho sendo puxado repetidas vezes e o canto de morte dos disparos... Ambas as memórias se mesclando em seus pensamentos, incapacitando-a a dizer qual era real... Apagando as lembranças dos detalhes das missões...

Romanoff respirou fundo para segurar a náusea que sentia até hoje, quando tentava discernir as memórias falsas das reais – uma cruel piada da SV, para incapacitá-la de buscar a verdade em seu passado. Um condicionamento duro, que no começo a fazia ter dores de cabeça lancinantes e até desmaiar. Sentiu as mãos de Clint em seus ombros, fazendo-a sentar, e percebeu que seu equilíbrio oscilara, abaixando-se com ele, suas mãos segurando as do amigo, o único toque naquele mundo que não a fazia se encolher ou tentar fugir, não importava o quão estressada, assustada ou mal se sentisse; os braços dele passaram ao seu redor e a puxaram para si, abraçando-a e fazendo-a sentar entre suas pernas abertas, aconchegando-a contra o peito. Ela tremia levemente de tensão, raiva, emoções em ebulição... O arqueiro ficou algum tempo em silêncio, queixo apoiado no ombro direito da mulher, esfregando devagar seus braços gelados.

— Eu não queria isso, Clint. Não queria uma criança para cuidar. – Declarou a russa, deitando a cabeça no ombro do amigo. – Não sei nem por onde começar... Por enquanto estamos aqui, mas e depois? Quando eu voltar para a Torre, para minha vida... Mesmo que eu consiga dar o mínimo necessário para ela, e não estou falando de bens materiais, como vai ser quando estiver trabalhando? E quando acabarem sabendo sobre ela? Pelo amor de... Ela me chama de mamãe, e eu ainda olho para Laura, achando que é com ela. – Ela deu um breve riso amargo. – Eu nem sei o que sinto por ela. É uma necessidade de cuidar, de mantê-la a salvo... Mas isso está misturado com culpa, e sei que estou projetando a mim mesma na Lucy, tentando apagar o meu passado através dela.

— Nat... É exatamente o que crianças são: nossa chance de sermos melhores do que fomos. Eles são parte de nós, e a nossa chance de dar o que gostaríamos de ter tido. De consertar onde nossos pais, mentores ou instrutores erraram conosco, dar ao mundo alguém melhor do que somos.

Natasha respirou muito fundo, fechando os olhos, dividida como há muito tempo não se sentia. Lembrava-se de outras meninas que salvara, especialmente de Ava Orlova, um caso que a marcara bastante, por ter trabalhado com a menina, anos depois...

Após salvar a criança do armazém em chamas no qual matara Ivan Somodorov, Natasha deixara a menina com os agentes da SHIELD, e com ela uma nota de cinco dólares na qual desenhara seu símbolo, dizendo à garota de dez anos que, se algum dia precisasse dela, bastaria ir à embaixada ucraniana nos EUA e apresentar aquele símbolo. Ao mesmo tempo, instruíra aos embaixadores que, se a garota um dia o fizesse, deveriam informa-la, mas debochar da criança e mandá-la embora. Fora cruel, mas a pequena Ava fora uma das últimas Devushki Yvanna, as “meninas do Ivan”, seus projetos experimentais e, como Natasha, estava sozinha no mundo, não podia confiar em quem fosse. Aquela pequena armação surtira efeito, marcando profundamente a alma da criança e endurecendo-a do modo como os órfãos precisavam se enrijecer.

— Lembra-se de Ava Orlova?

— Um pouco. Faz bastante tempo, Nat... Você não é a mesma pessoa.

— Uma parte de mim é. Uma parte ainda acha que entregar Lucy para os X-Men sem dar explicações seria a coisa certa. Endureceria a coisinha, e a colocaria com outras pessoas como ela... – Um suspiro raso, acompanhado de testa franzida e lábios apertados. – Não que ela precise se endurecer mais... Só... Seria mais fácil. Decepcioná-la só uma vez, me livrar dessa responsabilidade, desse vínculo, e da cascata de erros que vou cometer com essa menina, se ficar com ela. – Ela se endireitou, virando-se para encarar o amigo. – Como eu poderia fazer isso, Clint? Ficar com ela. Ser uma mãe? Lucy precisa de tão mais do que posso dar...

— Nat... E se você entregar Lucy? – Ele não a estava tentando persuadir, apenas apontando os fatos. – Ela vai se machucar, e muito: formou vínculos emocionais conosco, com você acima de todos, e o que ela precisa... O que você puder dar a ela será muito mais do que Lucy jamais teve, e mais do que o Instituto Xavier poderia fornecer. Lá ela talvez esteja segura. Ou não. Com você, sabemos os riscos que corre; com os X-Men, não se tratará só de quem quer a sua cabeça, mas as pessoas que a desejam recuperar, ou eliminar. E claro, os inimigos daqueles mutantes. – Um longo minuto de silêncio. – Disse que ela cresceu com outros mutantes, e todos a temiam. Não será diferente. Ela vai crescer sozinha, endurecer, talvez faça algo de bom, talvez não... Claro, não seria mais sua responsabilidade. Mas seja honesta consigo mesma: vai conseguir esquecer, abrir mão e tirar a menina de sua mente? – Ele já sabia a resposta. Natasha queria ficar com a menina, mas estava assustada, julgando-se a pior pessoa do mundo para fazer isso.

Quando Clint descobriu sobre a gravidez de Laura, o pânico o tomara: era um assassino, alguém com muitos erros no passado, e tanto sangue nas mãos... Não se sentia capaz de ser o pai que uma criança precisaria! Isolara-se no telhado do triskelion, até Natasha vir atrás de si.

— Você está com medo? — Ela perguntara em tom neutro. – É claro que está. Acha que não vai ser um bom pai.

— Não precisa ser um gênio para deduzir isso. Olha para mim, Nat! Como eu vou... Um filho é uma coisa que depende totalmente de você! É mais do que fraldas, mamadeiras e carrinhos, é... É proteger, ensinar, ser um exemplo. Que tipo de exemplo eu seria?

— Um homem bom. Alguém que tenta fazer a coisa certa. E alguém que já ama essa criança o bastante para se preocupar com as necessidades dela. Se isso não te torna um bom pai, o que seria?

Haviam conversado por um longo tempo, ao fim do qual Clint não estava cem por cento seguro, mas ao menos sentia que havia uma chance. Que poderia fazer isso.

— Lembra de quando eu descobri que ia ser pai? – O arqueiro sorriu para a parceira. – Também estava com medo, achando que tinha sido impulsivo, irresponsável, que cometera um erro.

— Clint, isso é tão diferente... Você tinha a Laura, e... É uma pessoa muito melhor do que eu.

— Nat... Não faça isso consigo mesma. Nós dois temos sangue nas mãos, erros no passado e vermelho na nossa conta. Somos pessoas tentando ser melhores do que já fomos. E se alguém pode ser um exemplo para Lucy, ensiná-la a pegar os horrores que viveu para torná-la alguém forte, altruísta e corajosa, essa pessoa é você. – Ele segurou a mão da amiga. – Você quer ficar com ela, não é?

Natasha revirou os olhos e desviou o rosto, tentando não se perder nas memórias, mas essas eram mais vivas do que gostaria...

Ela sonhara com amor. Com família. Com coisas que havia sido ensinada a nunca desejar. Apaixonara-se por outro jovem treinado pela KGB, um promissor jovem piloto, Sergey Shostakov. Ela tinha dezesseis anos, ele, dezessete, e se haviam casado às escondidas, uma fina fita de cetim servindo-lhe de aliança, pois nada mais possuíam de seu, mas para o jovem casal bastava terem um ao outro. Apaixonados. Sonhando com sua própria família, algo que jamais haviam tido, antes. Fora um doce sonho, que durara exatos três meses, até serem descobertos. Sergey fora assassinado, ou assim Natasha pensara por décadas, e ela fora “reprogramada”: tortura pura e simples – duchas geladas sobre seu corpo nu e amarrado, espancamentos, suspensões pelos punhos, imobilizações nas posições mais dolorosas concebíveis, afogamento, ter cigarros apagados nos seios, interior das coxas, violações brutais... - intercalada aos choques que nublavam e deturpavam suas memórias enquanto lhe eram repetidas instruções em uma intensa lavagem cerebral que a tornara, por anos, uma máquina assassina vazia, culminando com a transformação em Black Widow, e a esterilidade consequente dos efeitos do soro. O dia em que todos os sonhos de ter algo mais, de ser algo mais, haviam sido definitivamente assassinados.

O maxilar de Natasha estava trincado quando meneou a cabeça para se livrar desses pensamentos, e percebeu que estivera apertando com força o pulso de Clint. Ficariam hematomas ali e, ainda assim, ele não se queixara, por simplesmente saber o que acontecia na mente da amiga.

— Você sabe que eu quero. E tudo em mim sente raiva disso, porque é ilógico, perigoso para ela e para mim... – Ela meneou a cabeça. – Mas desde que eu a senti na minha cabeça, pela primeira vez, quando vi suas emoções... Virou mais do que culpa, pontas soltas a consertar ou passado a reparar. Eu não pedi por isso, e parte de mim ainda se pergunta se o que estou sentindo não é só efeito dessa manipulação que ela faz com as emoções, se não estou reagindo às expectativas e necessidades emocionais dela, sem considerar o que é realmente certo. – A russa esfregou o rosto com as mãos. – Eu não sei se consigo fazer isso. Não sozinha.

— Não está sozinha. – Ele segurou suas mãos, sorrindo de modo compassivo. – Estou com você, Tasha. E se não reparou, caso você não adote Lucy, tenho certeza de que o Capitão adota. Ele está de quatro pela baixinha. – Havia diversão na voz dele, e Natasha não conseguiu não rir junto. – Olha... Não posso te dizer o que fazer, porque é uma responsabilidade enorme. Mas entendo o medo que você está sentindo, e o que posso falar pela minha experiência é: nunca é fácil. Desapontar seus filhos faz parte de criá-los, porque somos humanos e erramos. Frustração faz parte de crescer. Existem dias ruins, difíceis, e vai perder muitas noites de sono. Mas se eu pudesse voltar no tempo, sabendo o que sei hoje, faria tudo exatamente do mesmo jeito, porque nada se compara a isso.

Ficaram mais algum tempo em silêncio, antes que o arqueiro sugerisse:

— Por que não conversa com Lucy? Ela não é uma criança normal, pode entender as consequências. Leve-a para conhecer o Instituto, veja por si mesma como ela se adapta, daqui a alguns dias. E se decidir ficar com ela, bem... Ela ainda precisa estudar, e o Instituto é uma excelente escola. – Em seu interior, tanto ele quanto a espiã sabiam qual seria a escolha, mas Natasha precisava ter certeza de que explorara todas as opções, para decidir pelo que era melhor. Natalia sorriu com gratidão e, num gesto raro, abraçou Clint com força.

— Obrigada, Gavião.

— Quid pro quo, Nat. – Respondeu Barton, que jamais esqueceria como a ajuda de Natasha o ajudara a superar o medo, quando estivera na mesma situação. No final, eram sempre eles dois, um pelo outro. Sempre.

*

Natasha se sentou aos pés da cama, observando a menina adormecida, abraçada ao dragão de pelúcia que se tornara seu companheiro constante, quando dentro de casa, vestindo seu pijama azul-marinho de estrelas brancas, cabelos espalhados pelo travesseiro e caindo sobre a fronte serena em cachos, cobertas jogadas para longe das pernas, mas presas entre os braços junto à pelúcia. O joelho ralado ontem na brincadeira com Cooper, Lila e Clint já estava praticamente curado – o soro da Black Widow, na criança, era cem por cento eficaz no aprimoramento de força, velocidade, agilidade e regeneração. Tão eficaz quanto na própria espiã. – e as bochechas haviam adquirido um tom corado saudável, ao longo dos últimos sete dias. Mais um sinal de melhora: naquela noite não houvera pesadelos de qualquer tipo, pela primeira vez. Ante aquela cena tão tranquila, seria fácil esquecer que Lucy não era apenas uma criança inocente e serena; a sensação estranha que recrudescia em si tornava mais difícil ficar ali e pensar na alternativa a discutir com a garota, para o próprio bem de ambas. Enquanto sua mente esperava convencer a criança, seu lado menos lógico e pateticamente carente queria que falhasse nisso.

— Bom dia, Mama. – A voz da menina soou sonolenta enquanto esfregava os olhos ao se sentar no leito. Seus últimos minutos de sono se haviam permeado dos pensamentos da mãe, deixando-a incomodada e nervosa, incapaz de reconhecer o limite entre o sonho e a realidade. – Você está bem? – Seu rosto pueril se franziu em preocupação, o sono subitamente espantado.

— Sim, pequena, estou. – Romanoff segurou o rosto da garota num gesto firme e delicado. – Mas preciso saber como você está, realmente. – Ela pegou a xícara de café com leite que trouxera para Lucy e a entregou à garota enquanto bebericava o próprio café. - Como se sente?

Lucy a fitou com sua habitual seriedade e lucidez, mas havia uma mudança surpreendente no olhar da menina... As sombras, a dor e o trauma não poderiam ser rapidamente apagados, e talvez nunca fossem, mas passara a haver tão mais, ali! Enquanto outros jovens em mesma situação levariam meses para sequer iniciar uma recuperação, as percepções extraordinárias da menina lhe haviam apresentado naqueles poucos dias um universo inteiro de oportunidades e novas emoções, os pensamentos e sensações daqueles que a cercavam servindo como meio de aprendizado tão real e eficaz quanto o mundo sensorial... Provavelmente ainda mais. A fazenda se tornara seu pequeno reino seguro e pleno de maravilhas, e as pessoas ali presentes – os Barton, Natasha e, desde ontem, Steve – com suas personalidades rapidamente compreendidas (senão em detalhes, ao menos em suas demandas principais), haviam passado a ser seu grupo, clã... Família. Confiava em cada um em graus diferentes, mas podia dirigir essa confiança a cada um deles, não de modo cego, mas por saber como se sentiam e de que modo agiriam em relação a si. Bem, talvez isso não fosse confiança, afinal... Apenas compreensão e segurança. Independente do nome, eram vínculos fortes, e começavam a dar sinais de reciprocidade enquanto a garota demonstrava em gestos e pensamentos importar-se com cada um deles. Tanta mudança, em tão pouco tempo...

— Lucy, eu sei que prefere se comunicar por telepatia, mas preciso que converse comigo com palavras, para não nos desviarmos da linha de raciocínio. Pode fazer isso? – A ruivinha anuiu, então Natasha insistiu. – Como se sente?

— Você me mostrou um mundo que era só um sonho, antes. Uma ideia que eu via na cabeça das pessoas, pedaços de memórias que nunca iam ser minhas. E por sua causa, agora é real. – Um leve sorriso brotou em seus lábios. – Agora sei o que é sentir felicidade. As coisas que me ensinaram e fizeram, na HIDRA, ainda estão comigo, mas pelo menos sei que não sou só aquilo. – A íris índigo brilharam através da preocupação no rosto infantil. – Mas eu sei que, mesmo me tratando bem, você não sabe se quer ficar comigo.

Natasha não esperara ouvir aquilo, muito menos que a tristeza na voz da menina fosse tão contida e racional; fazia sentido, apesar de tudo: controlar e reprimir as próprias emoções fora tudo quanto Lucy aprendera em sua vida. Não era uma criança mimada ou levada por arroubos, mas acostumada com a frustração, com ter os eventos fora de seu controle e seguindo rumos indesejados, dolorosos e desagradáveis. Talvez fosse mais fácil se ela protestasse ou argumentasse, manifestasse raiva ou qualquer outra emoção além daquela mágoa resignada, embora facilitasse a continuidade do diálogo.

— O que eu quero raramente é relevante, Lucy. Não é sobre o que eu desejo, mas sobre o que é melhor para nós duas, especialmente você. – Uma breve pausa se seguiu. – Eu prometi que cuidaria de você, e é o que vou fazer. Isso significa pensar na sua segurança e bem-estar. – A russa se sentou defronte à criança, pernas cruzadas sobre o colchão. – Se você fosse só uma criança normal, eu tomaria as decisões por conta própria, mas acho que merece ter voz na decisão pelo seu futuro, então preste atenção: há duas opções. A primeira é levar você para o Instituto Xavier, onde será cuidada e ensinada, junto com outras crianças como você. Quem ficaria responsável por te orientar seria Jean Grey, também uma telepata, então capaz de entender muito bem as suas necessidades. – Romanoff tentou ignorar a voz de Lucy em sua cabeça, quase um sussurro acidental: “você entenderia minhas necessidades”. – Se ficar lá, eu a visitarei toda semana, e garantirei que esteja bem.

A pequena não havia modificado sua expressão, um pouco magoada, mas no geral poderia ser tomada por neutra, quase sem emoções para quem não a conhecesse.

— E a outra alternativa? – Perguntou, abraçada ao dragãozinho de pelúcia.

— Você fica comigo, se não se adaptar ao Instituto. – A fisionomia da russa se suavizou. – Mas precisa entender que não vamos morar aqui, Lucy, nem levar essa vida. Viremos visitar Clint, claro, e você o verá com frequência; moraremos no mesmo prédio que Steve e os outros Vingadores, farei tudo o que puder para lhe dar a melhor vida possível, mas eu tenho de trabalhar. Não estarei sempre em casa.

— Você ainda vai ser a minha mãe, quando voltar de cada missão? – Havia uma pontada de esperança na voz da garota, mesmo através da tentativa de ocultar esse tom, e Natasha segurou seu rosto com mão firme e delicada.

— Eu sempre serei sua mãe, more você comigo, ou não, em missão ou em casa. – A russa acariciou os cabelos ruivos da pequena. – Quero o melhor para você: que esteja segura e possa crescer a salvo, ter uma vida longe de quem lhe faria mal, ou tentaria usá-la. – Seus pensamentos acabaram sendo mais veementes do que desejara, tornando muito fácil para Lucy os ler:

“Sei o que é ser criada como arma e usada como uma até não saber ser outra coisa, além disso. Não quero que este seja também o seu futuro, malishka, e não posso te oferecer garantias, nem prometer algo melhor, se estiver comigo.”

Ao ouvir claramente os pensamentos da mãe, Lucy deu um sorriso triste e acariciou os cabelos vermelhos da espiã. Do próprio modo, Natasha sentia tanto medo quanto ela, e isso fazia a garotinha querer esquecer as suas dores para confortar as dela.

— Está tudo bem, mama. Eu vou com você, conhecer o Instituto, ficar alguns dias lá... – Ela mordeu o lábio inferior. – Só... Não se esqueça de mim, ok?

— Nunca. – Nat beijou a testa da filha. – E, se você não se adaptar ao Instituto, se realmente não quiser ficar lá, depois de conhecer... Então vamos para casa. – Ela tentava se convencer de que, quando conhecesse o lugar e travasse contato com Jean Grey, a menina desejaria por si mesma ficar na escola. Seria tão fácil se isso acontecesse...

                Lucy se aprontou depressa, ajudando Natasha a guardar suas coisas na mala. Sairiam depois do almoço, portanto era melhor já resolver a questão da bagagem. Desde ontem havia sido dito que Romanoff voltaria ao Complexo, e Clint acompanharia a espiã e o Capitão, a fim de limpar qualquer traço que houvesse ficado para trás, na última missão, cortar pontas soltas e se inteirar pessoalmente do status das buscas que vinham fazendo. Em meio a isso, havia a questão da pequena telepata, e tanto Barton quanto Steve iriam com as russas até a escola Xavier, tanto para apoiar a amiga – ela poderia negar o quanto quisesse, mas sabiam que a ideia de deixar Lucy aos cuidados de outros, ainda que fosse a mais lógica, machucava a espiã tanto ou mais do que a menina – quanto para ajudar Lucy a se sentir mais segura enquanto era apresentada a um novo espaço e pessoas.

                Durante a manhã, as crianças brincaram e passearam como se nada estivesse errado, Lucy fazendo questão de desfrutar de cada momento ali, por não saber se teria outros. Saboreou o almoço feito por Steve e Clint já saudosa das refeições em família, a melancolia tomando seu ser enquanto a hora de ir embora se aproximava. Finalmente, quando já havia se levantado para ir buscar suas coisas com a mãe, sentiu a mão do Capitão em seu ombro e o fitou com olhos marejados, antes de ser por ele abraçada.

                - Hey, isso não é adeus. – Disse o americano, confortando a coisinha pequena em seus braços. – Não importa como as coisas se desenrolarem, não vai deixar de nos ver. Clint e eu vamos te sequestrar sempre que pudermos. – Ela apertou os lábios e assentiu, vendo o Capitão erguer a mão para um high-five, ao qual respondeu com um sorrisinho leve.

                Steve entendera o ponto de Natasha, e sua mente lógica podia até mesmo concordar quanto a ser mais seguro para Lucy viver com os X-Men, mas uma criança precisava de mais do que apenas segurança, e falara isso para a companheira. Não a pressionara demais, primeiro por ser inútil, segundo por ver nos olhos dela como a situação a estava machucando. Falar poderia até mesmo tocar os sentimentos da espiã, mas Rogers já descobrira em várias ocasiões que as emoções podiam massacrar Romanoff, e ainda assim ela faria o que achava certo. Não seria ele a tornar tudo ainda mais difícil para ela, mas tampouco se afastaria da garotinha. Apoiaria Natalia em qualquer que fosse o desfecho, porém, se a criança fosse deixada aos cuidados dos X-Men, ele mesmo a visitaria tão frequentemente quanto pudesse, e já havia concordado com Clint em até mesmo pegar a ruivinha para passar os feriados com ambos. Fora uma ideia que fizera a própria Natasha erguer o canto dos lábios num arremedo de sorriso aliviado. Mesmo sem nada falar, Lucy percebeu aqueles pensamentos e lhes lançou um olhar grato.

                Finalmente, após se despedir de Laura e das crianças com abraços apertados e olhos úmidos de choro contido, Lucy entrou no carro com Natasha e Clint, enquanto Steve os seguia de moto; não era uma viagem muito longa até seu próximo objetivo, mas, agarrada a seu dragãozinho no banco de trás, a pequena se pegou desejando que durasse muito tempo.

*

                - Olá, pequena. – Jean Grey estendeu a mão e se abaixou um pouco para falar com a criança, lançando-lhe um breve sorriso antes de, aparentemente com a permissão de Lucy, usar de telecinese para erguer a criança um tanto no ar, de modo a deixar ambas no mesmo nível. Isso arrancou uma risadinha breve da ruivinha, que apertou a mão de Jean Grey.

                - Sou Lucy. Mas você já sabe, não é? Sabe tudo sobre mim. – Sua voz era séria, e o olhar triste, apesar da tentativa de sorriso.

                - Nem tudo. – A telepata colocou Lucy de volta no chão, soltando então sua mãozinha. – Mas você pode me dizer tudo que achar necessário, pequenina.

                Lucy inclinou a cabeça, um pouco incomodada em não conseguir ler tão bem a outra telepata, entendendo que havia ali um bloqueio voluntário por cima de outro, mais intenso e não-intencional. Mas os fragmentos de pensamentos e emoções que captavam de Jean Grey lhe diziam que a mulher a via exatamente como às demais crianças do Instituto: sem medo, apenas uma vontade legítima de ajudar e proporcionar à garota uma vida tão boa quanto possível, com perspectivas de futuro e um lugar seguro onde ficar e aprender a usar seus poderes.

                - Não sei o que dizer. – Lucy se retraiu, sabendo que a doutora Grey a estava lendo, também, e sem querer que a outra visse seu medo, sua mágoa e fraquezas. Nunca demonstrar fraquezas fora a primeira lição que aprendera, nem se lembrava de quando, mas enraizara bem. Afinal, quando desrespeitara essa regra, afeiçoara-se a Natasha. Talvez seus treinadores estivessem certos ao dizer que vínculos eram buracos na sua armadura, e tiros que daria em si mesma.

                “Sei que está com medo, Lucy, e tem todos os motivos para isso, mas, se me der uma chance, posso lhe mostrar a vida que pode ter, aqui. Sei que, agora, lhe parece um pouco com sua antiga vida, mas não poderia ser mais diferente.”

                Lucy olhou por cima do ombro para Natasha, Clint e Steve, segurando-se para não chorar e pedir para sair dali. Era isso o que era melhor para ela. Natasha nunca quisera uma filha, não podia cuidar dela, apenas quisera acalmá-la quando estavam na base... E mesmo que não quisesse ficar ali, esse era o melhor, a coisa certa. Afinal, quantas coisas já não fora forçada a fazer? Essa, ao menos, tinha a intenção de protegê-la, não de machucá-la. Sim, podia fazer isso. Deixaria para chorar depois, quando estivesse sozinha. Com o tempo essa dor também ia se anestesiar, como todas as outras...

                Vendo a hesitação da menina, Clint colocou a mão no ombro dela para tranquilizá-la:

                - Está tudo bem, Lucy. Quer que um de nós vá com você?

                - Eu estou bem, padrinho. – Ela respondeu num murmúrio quase inaudível. – Consigo fazer isso sozinha. Se eu ficar aqui, vocês não vão estar junto. – Assim dizendo, segurou a mão de Grey e deu um breve sorriso para os adultos. Natasha assentiu de modo encorajador:

                - Estaremos aqui, quando voltar.

                Apertando os lábios e fechando os dedos em volta dos de Jean com um pouco mais de força do que pretendia, a garota acompanhou sua potencial nova tutora a fim de conhecer o lugar que, ao que tudo indicava, seria sua casa. Não pensava naquilo como um lar. Experimentara o que era um lar quando estivera com a mãe, o padrinho e os primos, mas tudo bem... Ela crescera sem ter um lar. Podia lidar com isso.

*

Natasha estava inquieta na sala da diretora, imóvel em seu lugar junto à janela - de onde podia ver o enorme pátio, o bosque e o lago - porém traída por seus olhos, estes denunciando toda a agitação interior ao não se ficarem por muito tempo em lugar ou pessoa alguma. Haviam visitado as salas de aula, alojamentos e dado uma pequena volta pelo pátio imediatamente em redor da mansão, e tudo parecia perfeito para uma menina de cinco anos que passara toda a breve vida confinada. Várias crianças mutantes, algumas alunas, outras também residentes do Instituto, tinham suas aulas de diversas matérias - as quais incluíam filosofia, níveis dos mais básicos aos mais avançados de física, química e biologia, técnicas de combate, idiomas, arquearia… - caminhavam juntas pelos corredores ou áreas abertas, demonstravam em público suas habilidades peculiares sem medo algum.

— Eles levam a sério a questão de criar um ambiente saudável para as crianças. - Comentou Clint, para tirar Natasha do laconismo em que se colocara desde o retorno do reconhecimento guiado pelo Dr. Hank, conhecido como O Fera.

— Parece que sim. O lugar é ótimo.

— Mas? - Steve não comprava aquela fachada, tanto quanto Clint.

— Nada.

A pequena Natalia se agarrava ao homem que salvara sua vida, os rugidos do fogo ainda apavorando-a enquanto as lágrimas vinham em torrente, desesperada para ver sua mãe em algum lugar, chamando-a até Ivan - o homem que a resgatou - tapar sua boca com um mínimo de gentileza e dizer-lhe que se acalmasse. Nessa hora, ela compreendeu que nunca mais veria a mãe.

O lugar para o qual foi levada era, oficialmente, um orfanato do governo para meninas. Grandes alojamentos, pátios de exercícios, salas de aula e de balé, professoras capacitadas… Nos primeiros dias, achara o lugar até bonito - ainda achava, dentro do que a URSS podia fornecer, na época - mas logo aquela fachada bonita cairia para revelar um lugar cruel, e o bondoso Ivan se mostraria o mais implacável dos supervisores, entragando-a aos cuidados de Alian, um dos mais exigentes treinadores. Lição número um aprendida e gravada em sua alma a fogo, literalmente: ninguém é o que parece, e por isso confiança é a maior tolice que se pode cometer.

— Terra para Natasha! - Clint estalou os dedos na frente do rosto da amiga, que piscou depressa duas vezes, recompondo-se.

— Estava distraída.

— Percebi.

Mordiscando o lábio, Nat olhou mais uma vez pela janela, e então para Steve. Sem uma palavra, ele conseguiu entender, e sua mão encontrou a da espiã, apertando-a levemente em sinal de apoio. Sorrindo levemente para ele, a russa conteve o fugaz desejo de beijá-lo até ambos perderem o fôlego, prometendo a si mesma fazer isso mais tarde, e dirigiu-se ao Dr. Hank:

— O Instituto também dá aulas, apenas, sem que o aluno matriculado tenha de ficar em regime de internato, não é?

— Sim, senhorita Romanoff. Parte dos nossos alunos de fato apenas tem aulas aqui, não sendo residentes.

— E se o aluno em questão ocasionalmente precisasse passar alguns dias nesta escola? - ao ouvir aquela pergunta, Steve reprimiu um sorriso, sabendo que Natasha acabara de tomar uma decisão.

— Não seria inédito. Devo entender que pretende tomar a guarda da menina, e matriculá-la na escola como estudante?

— Gosto de saber minhas opções. - a russa se sentou na cadeira defronte à mesa da direção, sua postura profundamente profissional. - Importa-se de me dar mais informações?

— É claro que não. – O mutante abriu a gaveta sob a mesa e tirou vários papéis relacionados às grades curriculares, professores, sistema de funcionamento do colégio e tudo quanto fosse relevante, colocou-os sobre a mesa e dedicou a próxima hora a explicar para a Viúva Negra, Hawkeye e Capitão América os detalhes que pedissem.

*

Sempre ao lado de Jean Grey, Lucy conheceu a mansão e os arredores, foi apresentada a professores e a colegas. Retraída e pouco falante, contudo, foi difícil conseguir reações diferentes de desconforto, especialmente quando encarava fixamente os olhos dos demais, procurando compreender o ser humano por sob palavras e fachadas. Depois da quinta vez, tão logo se viram sozinhas, a professora se voltou para a garota com seriedade, mas gentileza:

— Lucy, eu sei como se sente, e que ler os outros é seu mecanismo para se adaptar a uma nova vida, mas isso assusta e incomoda as pessoas.

— Se forem boas pessoas, não têm porquê se sentir mal. Não têm nada a esconder. – A simplicidade daquelas palavras era algo difícil de rebater, por serem tão lógicas em um modo inocente e direto, o que fez Grey sorrir levemente:

— Eu entendo. Sou como você, pequena, e pensava do mesmo jeito... Mas o mundo não está dividido entre pessoas boas ou más, e todos têm coisas que preferem guardar para si. Ter os próprios pensamentos lidos os faz sentir... Incomodados. É como se você os visse completamente nus, entende?

A garota anuiu, desviando os olhos para o lado:

— Eles sempre vão ter medo de mim, não vão? – Foi a vez de Jean se sentir extremamente mal pela criança, por conhecer tão bem a sensação. Porém, mais ainda, aquela menina viera de um pesadelo que nem a própria Jean poderia compreender. Só podia começar a imaginar a solidão daquela garotinha, tomada pelo desejo de abraça-la e confortá-la.

— Lucy... As pessoas sempre terão medo do que não podem entender, ou controlar. Com o tempo, você fará amigos, e aprenderão a conhecer esse seu coração puro, e te amar por ele. – Doeu ver a pequena se encolher quando ergueu a mão para acariciar seu rosto. – Eu sei que não acredita em mim, agora, mas as coisas irão melhorar, com o tempo. Somos iguais.

— Não, professora Grey. Não somos. Você é uma mutante, nasceu assim espontaneamente. Eu fui criada para ser uma arma, e todos os que estavam naquele lugar, comigo, sabem disso. – Ela virou o rosto para um grupo de crianças cujos pensamentos eram praticamente berrados em sua mente:

“Aberração.”

“Ela nem deveria estar aqui. Isso é uma escola, não uma prisão para criaturas perigosas.”

“É tão esquisita e perigosa que nem o monstro da mãe dela a quis.”

O último pensamento a encolerizou e, antes que Jean Grey pudesse interferir, a pequena deu dois passos na direção do grupo de jovens entre dez e treze anos, e o menino mais velho caiu de joelhos, segurando a cabeça enquanto a menininha gritava com revolta:

— Não fale da minha mãe desse jeito! Você estaria MORTO se não fosse por ela, pirralho ingrato! – Não lhe importava o que pensavam de si, pois a isso estava acostumada, mas não deixaria que falassem ou pensassem mal de sua mãe, independentemente de ela a deixar ou não, pois apenas por causa de Natasha todos eles estavam livres e vivos. Sua mãe era muitas coisas, Lucy sabia bem: sentira na alma da russa as dores, culpas, uma tristeza sem fim da qual ela própria não parecia consciente, assim como medos lançados para o subconsciente... Mas Romanoff não era um monstro, e qualquer um que pensasse o oposto teria de se ver com ela!

Foi a última coisa que a garota pensou, antes de o mundo se apagar em um borrão negro quando Jean tocou sua têmpora, segurando-a a tempo de impedir que a criança caísse no chão.

*

Natasha estava sozinha com Steve no jardim frontal da mansão Xavier, após ter esclarecido tudo com Hank McCoy. Clint se encarregara de “cuidar” da Dra Lambert, e todos ali sabiam que dificilmente haveria a menor evidência de que um dia a mulher pisara nos EUA, quando o arqueiro terminasse. Em silêncio, a espiã e o soldado se haviam sentado num dos bancos, mãos entrelaçadas discretamente enquanto observavam os chafarizes, aguardando. Era um lugar pacífico, com a rua de seixos claros, os dois labirintos de arbustos cuidadosamente podados, o bosque em redor garantindo privacidade, sombra e o som de dúzias de pássaros cantando sem parar. O tipo de lugar onde quase se podia esquecer que problemas existiam.

— Vai mesmo fazer isso, Steve? – A ruiva perguntou finalmente, voltando-se para o namorado. - Sabe que não precisa.

— Eu quero. – Ele sorriu e acariciou o dorso da mão dela com o polegar, sem voltar o rosto para fitá-la. – Não está me impondo nada. Se você não escolhesse ficar com a pequena, eu seria o primeiro a adotá-la: aquela coisinha é... Especial. Ela merece um lugar para chamar de lar, depois de tudo o que enfrentou.

— Você não tem jeito, Rogers. – A ruiva sorriu levemente, e o casal se beijou, separando-se quando dois adolescentes passaram com risinhos que fizeram o Capitão América corar e sussurrar para sua companheira:

— Eu realmente mal posso esperar para ficarmos sozinhos na Torre, para poder te beijar do jeito que quero.

— Só beijar? Que desapontador, Rogers... Você pode fazer melhor do que isso, não? – Ela perguntou com uma sobrancelha levantada sugestivamente e tom malicioso na voz, deixando Steve três tons ainda mais vermelho.

— Natasha!!!! – Ele tentou segurar um breve sorriso tímido, falhando miseravelmente. – Vamos ter uma criança em casa! Uma telepata!

— Crianças têm que dormir, Capitão. – Ela sorriu daquele jeito que fazia o americano sentir borboletas no estômago e seu coração acelerar, e nessa hora ele realmente lamentou não poder beijá-la como se o mundo fosse acabar. A russa ia dizer algo mais, quando Jean Grey adentrou o jardim com Lucy inconsciente nos braços; seus olhos pousaram de imediato na russa, e as palavras dispararam com extrema seriedade:

— Precisamos conversar.

*

Quando Lucy acordou, estava deitada no sofá da sala do diretor. Tinha sua mãe sentada ao seu lado, e as memórias do que fizera a atingiram com a rapidez de um raio, fazendo-a se sentar abruptamente:

— Desculpe! Desculpe! Eu não queria machucar ninguém, mas ele pensou coisas ruins de você e... Foi tão injusto, porque se estão vivos é por sua causa... Eu fiquei com tanta raiva que... Foi um acidente, me desculpe!

— Shhhh, está tudo bem, Lucy. – Assegurou Natasha, segurando a mão da filha. – A professora Grey já me explicou tudo. É normal perder o controle, às vezes: não foi certo o que fez, mas você reconheceu o erro. Sei que não vai repetir.

— Não, não vou. – Assegurou a menina, percebendo então a presença de Steve Rogers e Jean Grey na sala. Com ar culpado, dirigiu-se aos dois. – Acho que devo desculpas a vocês, também.

— Como sua mãe disse, você já entendeu o erro, pequena. Mas não se preocupe, não terá muito contato com aqueles jovens, nas suas aulas, e eles serão repreendidos. Embora sua pequena retaliação tenha sido bastante eficaz em ensinar boas maneiras e gratidão, suponho. – Um olhar de Natasha advertiu a telepata mais velha a não encorajar aquele tipo de comportamento, o que a fez dar um leve sorriso. – Não se preocupe, Agente Romanoff: ensinarei Lucy a controlar suas habilidades, quando estiver aqui.

As palavras não passaram despercebidas à pequena, que colocou os pés para fora do sofá a fim de se sentar corretamente, e indagou:

— Como assim, quando eu estiver aqui? Não vou ficar aqui?

Natasha pegou uma pilha de papéis sobre a mesa, antes de olhar para Lucy com algo similar a ternura:

— Você vai frequentar o Instituto como escola, sim, mas acho que me apeguei demais a você, mini-widow. – E antes que a criança abrisse a boca para perguntar se isso era por causa do incidente. – Não, Lucy. Eu dei entrada no pedido da sua guarda e no reconhecimento de maternidade assim que você saiu por aquela porta. – A espiã se sentou novamente ao lado da filha, e lhe mostrou o documento de guarda. – Por esse papel, sua guarda é minha até os testes de DNA comprovarem que você é minha filha. Então... Você é minha, e eu vou transformar em uma peneira qualquer um que tente te levar embora.

Steve revirou os olhos para a forma torta de Natasha de tentar passar segurança a uma criança, mas de certa forma era até fofo, vindo da espiã. De qualquer jeito, Lucy captou menos as palavras do que o significado e emoções por trás delas, e seus bracinhos se lançaram em redor da mãe, abraçando-a com força enquanto a garotinha sorria e seus olhos se enchiam de lágrimas. Não houve comunicação por palavras, mas deixou que a mãe sentisse o alívio, a felicidade e a gratidão que a inundavam com a surpresa. O que pensara ter sido apenas um breve sonho, agora era verdade: tinha uma família, uma mãe... Um lar!

Sem conseguir evitar o sorriso, Natasha pousou uma das mãos nas costas da pequena e acariciou seus cabelos com a outra até a filha se afastar, quando então beijou sua fronte e a levantou no colo, apoiando-a no quadril.

— Vamos, filha: hora de ir para casa.


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Notas finais do capítulo

E então? Gostaram? Odiaram?
Capítulo seguinte já vai ter ação (provavelmente, senão vai pelo menos iniciar a treta), então se preparem, está bem?
Obrigada a todos que leram! Espero realmente estar agradando!