An Unfairy Tale escrita por LadyAristana


Capítulo 4
O Invencível Homem de Ferro


Notas iniciais do capítulo

Preparem o desfibrilador!!!!



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O Invencível Homem De Ferro

Hey, brother, there’s an endless road to re-discover.

Hey, sister, know the water’s sweet but blood is thicker.

Oh, if the sky comes falling down,

For you there’s nothing in this world I wouldn’t do.

Hey, Brother – Avicii

Califórnia – Estados Unidos, fevereiro de 2008

Residência de Aleksandra Portter em Malibu

Pouco tempo após a morte do tio Howard, eu comecei a ter ataques de pânico e pesadelos a respeito de acidentes de carro. Preocupada, tia Peggy me encaminhou para um psicólogo.

O Dr. Young me aconselhou a tentar escrever sobre os meus sentimentos quando eu sentisse um ataque de pânico vindo.

Acontece que eu nunca fui organizada o bastante para manter um diário, então comecei a fazer as “Listas do Pânico”.

Assim que saí do telefone, após Rhodey me passar todos os detalhes do sequestro de Tony, a primeira coisa que eu fiz foi agarrar meu bloco de notas e começar a fazer uma Lista do Pânico.

*DANE-SE A CALMA!*HORA DE ENTRAR EM PÂNICO!*MAS QUE MERDA???*EU QUERO A MINHA MÃE!*ODEIO. TANTO. O. TIO. HOWARD. POR. FAZER. DO. TONY. UM. RECURSO. POLÍTICO. IMPORTANTE!*Eu quero tanto que o Tony esteja vivo. Tanto quanto eu quero MATÁ-LO por ser sequestrado. Posso querer que ele esteja vivo só para que eu possa matá-lo eu mesma? Danem-se as convenções sociais. Sim, eu posso!*O que eu posso fazer diante dessa situação?*ENTRAR EM PÂNICO!*Entrar em pânico NÃO VAI te ajudar!*Cobre um favor!*A SHIELD te deve um monte de favores!

LIGANDO PRO NICK AGORA!

Assim que larguei o papel todo manchado de lágrimas, apanhei o telefone novamente pronta para ligar pro Nick. No entanto, percebi que o diretor não era a melhor pessoa a se recorrer na situação porque ele não consideraria os meus sentimentos.

Nicholas Joseph Fury nunca considerava sentimentos a menos que eles servissem aos propósitos que ele queria.

Eu precisava do exército, e só tinha uma pessoa dentro do Exército Americano que faria as perguntas certas e me ajudaria.

Meus dedos digitaram o número quase sem a ordem do meu cérebro.

No fundo eu esperava que Norah atendesse, mas eu sabia que não seria assim. Ela havia saído de casa há alguns anos, após dar baixa do treinamento na SHIELD. Ela tivera uma briga catastrófica com o pai, e agora era fotógrafa freelancer e dividia um loft com Addy no Queens.

Reeves.— o homem atendeu com sua voz dura dos anos lidando com soldados insubordinados.

— Tio Jason? Aqui é Aleksandra... Portter. Aleksandra Portter. – falei na voz mais amistosa que eu conseguia no estado em que eu estava.

Inglesinha!— o Tenente-Coronel respondeu com a voz quase animada. – Eu ouvi sobre o Stark. Sei que são muito amigos, sinto muito garota.

— Obrigada, LTC. Era sobre isso que eu queria falar na verdade. Eu preciso cobrar um favor. – respondi engolindo o choro.

Qualquer coisa para a menina da Diretora Carter.— consentiu o militar com uma risada áspera.

— Eu preciso ir para a base de treinamento de Irwing amanhã, ter meu treinamento cortado pela metade e sair com uma patente alta o bastante pra ser mandada pro Iraque com urgência. – mordi o lábio com medo. Jason Reeves era o homem mais correto e honesto que eu conhecia, ele dificilmente me deixaria trapacear no exército, mas eu precisava tentar.

Essa vai ser fácil, garota. Toda a sua ficha de treinamento e anos de experiência na SHIELD são transferidos automaticamente para o Exército Americano, e o seu nível na agência se traduz para uma patente alta. Você vai entrar como no mínimo uma Segunda-Tenente.— o Ten. Coronel explicou e suspirei aliviada. – Qual é o seu nível?

— Eu sou Nível 10. – respondi quase chorando de alívio.

Nos vemos amanhã em Irwing então, Major Portter.— o tom do homem era brincalhão, mas eu sabia o que significava o silêncio triste que se seguiu.

— Norah está bem. Está feliz. Fotografou o casamento de alguma socialite semana passada que pagou uma nota preta pra ela. Pediu pra eu ficar de olho no senhor. – informei sem que ele precisasse perguntar. Jason tinha uma relação complicada com Norah desde a morte de Camilla, mas se preocupava como todo pai. – Tio Jason, você precisa falar com ela.

Fácil falar, difícil fazer.— ele resmungou. – Amanhã às sete em ponto! Não se atrase!

***

Iraque – Oriente Médio, março de 2008

Base Militar Americana em Tikrit

O helicóptero militar pousou levantando areia ao seu redor, e eu esperei que abaixasse antes de descer.

Rhodey me esperava do lado de fora, com as mãos na cintura e uma expressão apática pra mim.

— Coronel! – sorri batendo uma continência desleixada.

— Sabe, quando me disseram que a maior patricinha da América era a melhor franco-atiradora e combatente corpo a corpo de Irwing e que saiu de lá com a patente de Major, eu não acreditei. – Rhodey falou com os olhos semicerrados. – E uma Stryker? Ah, dá licença, Leks! Você comprou essa patente!

— E o que te faz sugerir isso, Coronel? – perguntei me aproximando com uma sobrancelha arqueada. – Achou mesmo que descobriu tudo o que tinha pra saber sobre mim em dez anos, Rhodey? Ou esqueceu quem me criou?

— O que você está fazendo aqui, Leks? – ele perguntou deixando os ombros caírem e deixando a postura defensiva de lado.

— Garantindo que meu irmão vai estar em casa para o meu aniversário. Ele não perdeu os últimos 26 aniversários e eu não vou deixá-lo perder esse. – respondi determinada. – Se não o acharam até agora, significa que precisam de uma ajudinha.

Quando tirei o distintivo da SHIELD de dentro do uniforme militar, tanto Rhodey quanto os outros soldados que estavam junto deram dois passos para trás.

— Desde quando? – Rhodey perguntou com a sobrancelha arqueada.

— 1993. Não conta pro Tony. – falei guardando o distintivo. – Chega de conversa fiada. Não vamos achar o Tony parados aqui.

— Não se engane pela folha dourada no uniforme dela. Ela pode até ser uma Major, mas por dentro essa garota nasceu pra ser General. – ouvi Rhodey comentar com um soldado enquanto eu entrava na base.

As buscas depois que cheguei duraram cerca de um mês, e até tia Peggy já me ligara implorando para que eu entregasse os pontos e admitisse que Tony estava morto.

Você precisa voltar, querida! Sem o Tony, a dona das Stark é você!— ela insistiu com um longo suspiro.

— Eu não posso desistir dele, mãe! – retruquei indignada. Desde o acidente que matou tio Howard em 1991, eu havia desenvolvido o hábito de chamar tia Peggy de “mãe”. Nas primeiras vezes ela parecia emocionada demais para fazer qualquer coisa além de me abraçar. E então, conforme nos acostumamos com isso, ela passou a me tratar como se eu realmente tivesse nascido dela. – Faz só dois meses! Quantos anos levou pra você e o tio Howard desistirem de procurar Steve Rogers?

Céus, Leksie! Você precisava mesmo ir direto para a jugular, não precisava? — ela riu e eu tinha certeza de que havia revirado os olhos. – Você tem mais um mês antes que eu mesma vá até o Iraque te buscar, ouviu bem mocinha?

Eu havia assentido, mesmo que ambas soubéssemos que enquanto não encontrássemos Tony eu não voltaria para casa. Tia Peggy me conhecia muito bem, e sabia que eu era uma advogada do pior tipo – ou melhor, depende da situação -: eu precisava estar sempre certa e nunca sabia a hora de largar o osso.

Rhodey e eu decidimos nos revezar nas missões: uma vez ele saia para procurar em campo e eu ficava na base checando os sinais de rádio, na próxima eu ia e ele ficava. Isso também me ajudava a manter meu trabalho em dia e não deixar a empresa colapsar na nossa ausência.

Obadiah era um recurso absolutamente essencial e estava sendo de grande ajuda, e apesar de eu não gostar das assistentes do Tony como via de regra, Pepper estava sendo extremamente prestativa e me passando relatórios perfeitos. Ela era sim um pouco chata e neurótica, mas não podia negar que era uma ótima profissional.

De quando em quando Natasha ligava para checar se eu já havia ficado louca – ao que eu revirava os olhos e respondia que o dia em que eu ficasse louca seria o dia em que estivéssemos em um asilo trocando bengaladas e tacando as dentaduras uma na outra –, Lily ligava pra me manter a par de como nossa mãe estava – ela entrara em uma depressão crônica após a morte de papai – e Addy apareceu na base assim que ficou 100% recuperada de seu encontro com o Soldado Invernal.

— Lily falou e eu vou repetir: vocês estão apaixonados, por isso não se matam. – falei no dia em que Tony foi encontrado, os pés apoiados displicentemente no console do rádio, uma caixinha de yakissoba pela metade numa mão e os hashis na outra.

— Vocês viajam sabia? – Addy perguntou de boca cheia com seu próprio yakissoba. – O cara é um assassino soviético sem sentimentos. Ele tem um braço de metal, pelo amor de Deus!

— Mas e aquele mês em 1991? – perguntei enquanto minha irmã colocava sua caixinha de yakissoba vazia de lado.

— Eu era refém dele. – foi a resposta acompanhada de um dar de ombros enquanto Addy pendurava um de seus cigarros aromáticos na boca e começava a acendê-lo.

— Ah, isso é sério? – resmunguei com uma careta pro cigarro. – Se os caras que tentam te matar todo dia soubessem que você já está se matando sozinha, eles não se dariam ao trabalho.

A ruiva se limitou a encolher os ombros. Eu provavelmente já falara aquilo tantas vezes nos últimos 20 anos que ela passara a ignorar.

No começo ela dizia que ia parar, que queria parar, que ia ficar limpa, que ia cortar tanto o álcool quanto a nicotina de sua vida, mas uma semana depois sempre acontecia alguma coisa que lhe dava o direito de ser auto condescendente e fumar um cigarro e virar algumas doses de uísque.

Então um cigarro e algumas doses de uísque se transformavam em vários maços de cigarro e várias garrafas de qualquer bebida alcoólica que ela achasse até que – após se “arrepender” de sua fraqueza -, meses mais tarde, ela decidisse ficar limpa de novo.

E o ciclo se repetia. Sempre a mesma coisa, mas eu continuava me repetindo, porque amava minha irmã e queria que ela fosse plena consigo mesma sem vícios.

— Se vai fumar, faça isso lá fora! Eu não sou obrigada a ser fumante por tabela. – mandei ranzinza enquanto Addy se levantava e saía, não sem antes soprar uma nuvem de fumaça com cheiro de cravo, canela e tabaco na minha direção e sair com uma risadinha.

— Tem um helicóptero pousando lá fora. Deve ser o Rhodey. – ela falou por cima do ombro enquanto eu fazia careta e abanava a fumaça de cigarro pra longe de mim.

Meus músculos se contraíram de tensão e ansiedade. Talvez dessa vez... Mas nunca era.

Quando saí da base em direção ao heliponto, meus ombros já estavam caídos e minha linguagem corporal inundada de desesperança.

Foi quando eles desceram uma maca do helicóptero. E Rhodey me encarou sorrindo, não com a mesma expressão desanimada de sempre.

Minhas mãos voaram pra minha boca pra segurar um soluço.

Eles o acharam. Ele está vivo. Tony está aqui e está vivo!

Me aproximei correndo da maca e segurei a mão do meu irmão, que me sorriu por trás da máscara de oxigênio antes de tirá-la.

— Ei Coisinha. Sentiu minha falta? – ele perguntou rouco e cansado, e eu estava tão ocupada engolindo o choro que me limitei a apertar sua mão e assentir com a cabeça. – Numa escala de pescotapa a bomba nuclear, quão brava você está?

— Meteoro cataclísmico. – respondi com a voz embargada, mas um pequeno sorriso.

— E se eu disser que todos os dias eu passei pensando em você e em como voltar pra minha irmãzinha? – ele perguntou com um sorrisinho de “eu sei que aprontei, mas olha como eu sou fofinho e o quanto você me ama”.

— Então acho que só vou dar uns berros e ficamos bem. – falei com uma pequena risada.

— Ok. – ele assentiu antes de colocar a máscara de volta e a equipe médica o levar.

Sorri antes de sentir a mão de Rhodey no meu ombro. Me virei e o abracei com força, ambos rindo e chorando ao mesmo tempo.

***

Califórnia – Estados Unidos, abril de 2008

Mansão Stark em Malibu

Depois dos meses sumido, era um alívio descer as escadas para a oficina da mansão e ver Tony ali aprontando alguma através das paredes de vidro.

Digitei minha senha quase sem pensar a respeito. Eu usava aquela senha no mínimo 5 vezes por dia todos os dias. Assim que entrei eu pude ouvir o som pesado de alguma banda de metal que eu não ligava para o nome.

— Eu estou aqui. Jarvis, por favor, você já sabe a playlist que eu quero. – anunciei, a porta fechando atrás de mim e as primeiras notas de Drive My Car, dos Beatles, substituindo a música anterior. – Me chamou?

— Olha só se não é a minha Coisinha favorita no mundo. – Tony sorriu recostado em uma cadeira que lembrava uma cadeira de dentista, vários eletrodos grudados no peito e o apito latente de um medidor cardíaco. – Me mostra as suas mãos.

— Estou sendo presa? – perguntei mostrando as mãos e as virando algumas vezes. – O que raios está fazendo?

— Ótimo. Mãos pequenas. Exatamente o que eu queria. Me ajuda aqui! – ele chamou, mal se mexendo e segurando um círculo brilhante na mão. – Vai ser rápido.

— Isso aí é um reator Ark? – perguntei parando diante dele e observando o buraco que ele tinha no peito agora. – É o que te mantem vivo?

— Era. Agora é uma antiguidade. Igual seus livros de papel. – ele provocou apesar de estar sério. Então me mostrou um novo reator na sua mão. – Esse é o que vai me manter vivo no futuro próximo. Só que na hora de trocar por um mais atualizado eu dei com uma lombada.

— Uma lombada? – arqueei a sobrancelha. Eu tinha a leve impressão de que ele ia me pedir pra enfiar a mão ali. Tony tinha a mesma expressão de quando dizia “me passa a chave Philips”.

— É. Um empecilhozinho. Tem um fio exposto debaixo desse dispositivo e está encostando no soquete e causando um pequeno curto. – ele falou tirando o reator que estava no peito dele e me entregando enquanto eu arregalava os olhos.

— O que eu faço com isso? – perguntei pegando o dispositivo com cuidado e muito medo de levar um choque.

— Põe isso na mesa. É irrelevante. – Tony respondeu enquanto eu colocava o reator antigo na mesa. – O que eu quero é que você alcance o fio e o levante gentilmente.

— Você quer que eu o quê? Eu por acaso tenho cara de cirurgiã cardiologista pra você? – ralhei com as mãos na cintura. – Isso é mesmo seguro seu idiota?

— É sim. É igual jogar operação. É só não deixar o fio encostar na parede do soquete ou ele faz um bipe. – Tony falou meio desconsiderando minha bronca.

— Eu não devia pelo menos... Sei lá... Usar uma roupa esterilizada? Luvas no mínimo? – perguntei alcançando um frasco de álcool em gel e colocando uma quantidade generosa na minha mão, esterilizando ambos os meus braços até os cotovelos.

— Eu fiz isso aqui em uma caverna no meio do deserto sem pegar nenhuma infecção. Eu vou ficar bem. Só levante o fio gentilmente, tudo bem? Ótimo. – ele falou me apressando enquanto eu retirava meu anel de quinze anos, meu anel de formatura e me preparava pra enfiar a mão no peito dele.

Eu estava prestes a enfiar a mão quando amarelei e saí de perto.

— Quer saber? Eu não sou minimamente qualificada pra fazer isso. E se der merda? Eu devia ligar pro 911. – justifiquei balançando a cabeça.

— Não não não! Tá tudo bem. Você é a pessoa mais capaz, qualificada e confiável que eu conheço. Vai se sair muito bem. – Tony encorajou antes de me olhar profundamente nos olhos e dar um sorrisinho. – Meu coração já é seu, Coisinha, mas se você não for logo ele vai parar de bater. Será que é pedir muito? Eu realmente preciso da sua ajuda aqui.

— Ok! Ok! Tia Maria devia ter te dito alguns nãos! – bufei antes de respirar fundo e começar a enfiar a mão no buraco. A primeira coisa que senti foi uma meleca quente e fiz careta. – Ai credo! Por que eu sempre acabo enfiando a mão em alguma coisa melequenta com você, hein? É bom essa porcaria não ser pus!

— Não é pus. É uma descarga plásmica inorgânica do dispositivo, não do meu corpo. – Tony respondeu mantendo a voz muito calma, provavelmente porque de gente surtando ali já bastava eu. Apesar de em algumas partes da sentença eu notar um tom de desconforto, assim como movimentos de desconforto.

— Fede. – continuei fazendo careta, revirando aquela gosma asquerosa atrás do fio. – Para quieto, Anthony!

— Fede mesmo. Eu estou quieto! Não é a coisa mais confortável do mundo ter a mão de alguém enfiada no seu corpo. Agora cala a boca e me escuta, Coisinha! – ele mandou antes de voltar ao tom calmo e sério. – O fio de cobre, entendeu?

— Ok. Achei. – falei começando a puxar o fio com as mãos levemente trêmulas.

— Ótimo! Agora não deixe ele tocar as... – Tony se interrompeu com um grito de dor enquanto as máquinas bipavam em alerta. – LATERAIS! As laterais quando estiver puxando, era o que eu ia dizer.

— Desculpa! Desculpa! – exclamei após eu mesma quase ter morrido do coração eu mesma e voltando a puxar o fio com mais firmeza.

— Ok, tudo bem. Agora, quando você puxar garanta que não vai tirar o... O IMÃ NO FIM! – ele berrou bem quando eu tirei o fio todo com imã e tudo e o medidor cardíaco começou a bipar freneticamente. – E você acabou de tirar. Deus que me defenda! Escuta antes de fazer, Coisinha!

— Eu tenho cara de Christina Yang pra você por acaso? – perguntei meio em pânico. – O quê eu faço? Ponho de volta?

— NÃO PÕE DE VOLTA! – Tony falou enfático chiando de dor.

— O que aconteceu? O que eu faço? 911? – perguntei desesperada, as máquinas fazendo uma barulheira que só aumentava meu pânico.

— Nada, eu só estou tendo uma parada cardíaca porque a dona Aleksandra Portter não sabe como ouvir. – meu irmão respondeu, porque nem pra morrer ele perdia a piada.

— O QUÊ? VOCÊ ME FALOU QUE ERA SEGURO SEU PALHAÇO! – gritei além de desesperada, furiosa.

— Shiu! Se apressa! Pega isso! Pega, pega, pega! – Tony me deu o novo reator. – Troca bem rápido, mas faz essa porcaria direito!

— Tudo bem, vai ficar tudo bem, vamos ficar bem... – murmurei mais pra mim que pra ele posicionando o conector dentro do buraco com a minha mão esquerda, que era dominante, e segurando o reator em si com a mão direita. – Diz o que eu tenho que fazer que eu tô mais perdida que cego em tiroteio!

— Prende o conector na placa base. – Tony instruiu e graças ao bom Deus eu tinha passado tempo o bastante naquela oficina com ele pra ter noção do que ele estava falando. – Tenha certeza de que você... AAAAAAAU!

Ele não conseguiu terminar, porque eu conectei o novo reator bem na hora, causando um breve barulho de curto e fazendo as máquinas voltarem ao normal.

Respirei fundo aliviada.

— Pronto, seu idiota! Salvei sua vida! – ofeguei encaixando o reator do jeito que devia.

— Viu só? Foi difícil? Eu achei divertido. Aqui, deixa comigo! – ele falou ajeitando o reator ele mesmo. – Nice.

— Você tá bem? – perguntei o olhando e ainda assim mantendo as minhas mãos gosmentas bem longe de mim.

— Eu tô ótimo! – Tony respondeu devolvendo meu olhar antes de começar a rir da minha cara. – Você tá bem?

Fiz uma expressão exasperada antes de começar a rir junto.

— Palhaço, tapado, idiota! – ralhei dando tapinhas leves em seu ombro com a mão que estava mais melecada. – Você nunca mais me peça pra fazer uma porcaria dessas, ouviu bem?

— Eu até gostaria de prometer isso, Coisinha. Mas eu não tenho ninguém além de você. – ele me olhou sério novamente com o mais próximo que aquela cara de safado dele podia chegar dos famigerados puppy eyes.

— Mentiroso! Você tem a Addy, o Rhodey, a tia Peggy, o Happy... – listei com algo entre uma bronca e um sorriso.

— Você entendeu, Coisinha. Você é a única pessoa em quem eu posso confiar 100% sem reservas. – Tony deu um sorriso de canto, começando a se levantar. – Você é minha irmãzinha.

— O que a gente faz do reator antigo? – perguntei lavando as mãos na pia que eu o havia convencido a instalar no canto da oficina onde ficavam a máquina de café e o frigobar.

— Destrói. Joga fora. Taca fogo. – ele respondeu dando duas batidinhas no reator novo antes de vestir a camiseta.

— Sabe, um dia você vai ficar velho e querer ter guardado tudo o que você joga fora! – provoquei secando minhas mãos. – E eu estarei lá para te dar uma bengalada na cabeça e falar “eu te avisei”! Você sabe que eu estou certa!

— Assumindo que eu vou viver até lá. – Tony deu de ombros olhando pra um de seus robôs. – Ei, Butter Fingers, o que é essa bagunça na minha mesa? Pode arrumar.

— Butter Fingers, se eu descobrir que você jogou fora mais alguma foto do tio Howard eu vou doar suas peças pro ferro velho! É sério! – ralhei e o robozinho abaixou a “cabeça” acuado. Então olhei Tony séria. – E aí, está pronto pra falar comigo sobre o que aconteceu no Iraque para pararmos de produzir armas?

— Ah, tava demorando! – Tony suspirou revirando os olhos. – É uma história longa.

— Eu limpei a minha agenda essa semana. – lancei a ele uma piscadela, me sentando na minha cadeira.

Só tinha duas cadeiras utilizáveis naquela oficina. A minha e a do Tony, que logo a ocupou e deu um longo suspiro antes de começar a me contar a história toda, detalhe por detalhe.

***

Na semana seguinte aconteceu algo inédito. Meu acesso à oficina foi negado.

Isso só podia significar que Tony estava aprontando alguma das peripécias que tia Peggy indicava como a causa dos cabelos brancos dela.

— Jarvis, diga ao Tony que ele tem um minuto pra permitir meu acesso à oficina antes que eu vá no sótão buscar o rifle de caçar elefantes que o tio Howard nunca usou e o estreie nesse vidro. – falei alto o suficiente para Tony ouvir do outro lado do vidro.

Aquele era o meu dia de folga, o que normalmente significava ficar com Tony na oficina mexendo no motor de algum carro, jogar conversa fora, dar conta de algumas cervejas, ouvir música velha e no fim do dia aprontar alguma bagunça nova na cozinha.

A verdade era que apesar de eu ter minha própria casa, quando Tony não estava viajando, eu praticamente morava aqui com ele. Ambos ficávamos solitários demais em nossas casas grandes demais para uma pessoa só, e com esse esquema estávamos sempre por perto um do outro.

Eu não tinha a perspectiva de uma vida sem o Tony. Ele era meu irmão, meu melhor amigo, meu cúmplice e eu sabia que se no fim das contas eu nunca achasse o cara certo e o resto da família não me perturbasse o suficiente pra eu me casar pelo cansaço, era o suficiente envelhecer enchendo o saco do Tony.

Um bipe e o som da porta abrindo me tirou dos meus pensamentos. Entrei na oficina, que estava com as luzes baixas e a mesa holográfica ativa com o desenho de algo que eu conhecia muito bem pela história que Tony havia me contado.

— Fui pego! – ele me deu um sorrisinho amarelo.

— Em que estamos trabalhando? – perguntei abrindo o armário da pequena copa da oficina e tirando duas canecas, uma vermelha e uma amarela, para nos servir de café. – É uma arma? Achei que não fazíamos mais isso.

— Pera aí! – Tony me olhou incrédulo. – Você não vai surtar, arrancar os cabelos e me dar uma bronca?

Suspirei profundamente, me aproximei, encostei o quadril na mesa, entreguei a caneca amarela para ele, dei um gole no meu café e girei o holograma lentamente, absorvendo todos os detalhes.

— Tony, você passou por uma experiência traumática. Eufemismo, aliás. Você foi ao inferno e voltou. Você viu coisas horríveis. Você viu gente morrer. Você matou gente. Isso faz coisas com a mente de uma pessoa. – pousei a mão livre em seu ombro. – E você podia ter se tornado um louco traumatizado e deprimido. Podia passar o dia na cama dopado de Rivotril e trocentos outros antidepressivos. Ninguém ia te culpar por isso porque você esteve no inferno e voltou. Mas eu te conheço e conheço esse olhar. Você está determinado a pegar todas as coisas horríveis que viu, viveu e fez e transformá-las em algo bom para o mundo. E eu vou estar com você. Ao seu lado e te apoiando, em cada passo do caminho. Em que estamos trabalhando?

Tony me deu um sorriso pequeno, porém sincero, antes de dar um gole em seu café e separar o holograma em três partes, jogando duas fora e deixando só a mecânica principal da armadura. O esqueleto.

— Eu quero manter isso só entre nós dois por enquanto. – ele começou a explicar. – Nas mãos erradas isso poderia fazer mais mal que bem. Ninguém pode saber. Nem a tia Peggy.

— Eu sou uma advogada. Manter segredos é o meu trabalho. – sorri levantando o mindinho. Sempre tivemos a mania de usar promessas de mindinho, desde que eu era bebê. Os anos passaram e a mania ficou.

Passamos as próximas semanas trabalhando incansavelmente com mecânica, hidráulica, repulsão, propulsão e todos os tipos de física em que eu só não havia reprovado no Ensino Médio porque Tony fez as melhores colas da história pra mim.

Discutimos energização, sinal à distância, comunicações, sistema de localização, scaners, radares, sensores de movimento, pressurização ideal para voo, sistemas de segurança, flaps de emergência, sistema anti incêndio, ligas metálicas apropriadas e leves e mais mil coisas que eram necessárias para fazer valer o ditado “seguro morreu de velho”.

Fizemos testes, testes e mais testes. Gravamos absolutamente tudo. Tony ficou com incontáveis hematomas, o pequeno robô que batizamos de Dummy ligou o extintor de incêndio em cima de Tony mais vezes do que podíamos contar.

Trabalhamos com protótipos holográficos, protótipos reais, fizemos moldes de papelão, plástico, borracha, exaurimos a impressora 3D e nos tornamos os clientes favoritos do China In Box.

Eu dava conta do meu trabalho na empresa quase completamente em casa, e havia trocado a saia lápis, a camisa social e os saltos por leggings regatas e tênis, às vezes eu até trabalhava descalça.

No meio tempo consegui fazer uma encomenda via Internet – que na época ainda era discada, mas estávamos falando de Tony Stark, então tínhamos o melhor sinal de internet do mundo – que provavelmente chegaria logo.

Começamos a discutir o sistema de defesa da armadura e decidimos que queríamos alimentar tudo a partir do reator Ark. Era energia limpa. Não adiantava nada criar algo para salvar o mundo sem ser algo ecológico.

Eu precisei me ausentar por uma semana para uma reunião do Conselho em New York e consegui brigar com todos eles por quererem isolar Tony. Principalmente com Obadiah.

Se havia alguém em quem eu confiava para manter as coisas no melhor interesse de Tony e não da empresa era Obadiah, mas aparentemente o foco do meu tão dito “mentor” estava no que dava mais dinheiro, e não no que era certo.

— Saia já do meu piano! – rosnei para Obadiah após ter tomado um banho e trocado de roupa para voltar a trabalhar na armadura com Tony.

— Garota, eu sei que você está brava, mas... – Obadiah tentou se explicar.

— Brava? Eu estou furiosa! – bati a tampa do piano fechada, mal dando tempo para Stane tirar as mãos do caminho e trancando o instrumento, guardando a chave no cós da calça. – Pepper, Tony está lá embaixo?

— Sim, Srta. Portter. Inclusive, sua encomenda chegou. Eu deixei lá embaixo. – Pepper informou prestativa. – Todos os relatórios da semana foram enviados para o seu arquivo digital.

— Ótimo, Pepper. Obrigada. – assenti começando a descer para a oficina. – Diga ao Happy que eu mandei remover o Sr. Stane da propriedade e que ele não é bem-vindo até segunda ordem.

— Aleksandra, pelo amor de Deus! – Obadiah exclamou indignado.

— Desculpa, eu não falo a língua dos abutres. – falei já quase no fim da escada, me fechando na oficina com Tony.

Não precisamos trocar palavras. Apenas nos olhamos e voltamos a trabalhar movidos pela força da nossa raiva.

E continuamos a trabalhar até acharmos a propulsão certa para as botas e luvas da armadura em 2,5% da capacidade e ralharmos muito com Dummy quando ele ameaçou apagar um incêndio que nem estava lá.

Então passamos da mecânica para o design, e eu consegui surrupiar da SHIELD um traje de kevlar térmico corta-fogo para Tony usar por baixo da armadura.

Usamos referências históricas para o elmo: sério e determinado, linhas quadradas e marcadas, feito para assustar os inimigos.

E então estávamos prontos para o test-drive, e Tony levaria a armadura para uma voltinha enquanto eu ficava na oficina com um headset e monitorando os níveis via computador.

Tony colocou o elmo e a diversão começou.

— Jarvis? Você está aí? – Tony perguntou. – Você me ouve, Coisinha?

— A seu serviço, senhor. – Jarvis respondeu.

— Auto e claro. O display funciona? – perguntei ajustando algumas falhas que achei na projeção de imagem remotamente no computador.

— Vamos ver. Ativar display de alerta. – Tony comandou.

— Afirmativo. – o I. A. respondeu.

— Importar preferências da interface principal, J. – falei começando a transferir alguns dados manualmente.

— Sim, senhorita. – Jarvis confirmou.

— O display é ótimo. Como estamos? – Tony perguntou.

— Programa carregado. Estamos online e prontos. – respondi. – Tudo certo, Jarvis?

— Sim, senhorita. Todos os sistemas em perfeito funcionamento. – Jarvis confirmou.

— Iniciamos o passeio virtual? – Tony perguntou.

— Importando preferências e calibrando ambiente virtual. – Jarvis prontamente obedeceu.

— Checar controles. – comandei.

— Como quiser. – Jarvis respondeu.

Os controles da armadura foram checados se movendo graciosamente e sem empecilhos.

— Teste completo. Desligar e diagnosticar. – Jarvis falou por fim.

— Ah, quer saber, faça uma verificação de tempo e tráfego. Escute o controle de solo. – Tony falou. Ah, ele sabia e eu também.

Aquela armadura estava pronta pra voar.

— Senhor, são terabytes de cálculos antes de um voo... – Jarvis começou. Claramente nosso I. A. era mais ajuizado que nós dois.

— Jarvis! – Tony interrompeu. – Às vezes você tem que correr antes de poder andar.

— Pronto? – perguntei ajustando alguns níveis manualmente. Tony assentiu. – Em 3... 2... 1.

Os propulsores ligaram e Tony saiu pela entrada da garagem. Ouvi algumas exclamações e dei um sorrisinho de canto. Em uma tela adjacente aparecia tudo o que ele via.

— E então? – perguntei com uma voz de moleca atentada.

— Funciona como um sonho. – foi a resposta de Tony. Ele deu uma voltinha pela costa e uma criança derrubou seu sorvete embasbacada antes do bilionário descrever uma linha reta para cima. – Ok, vamos ver o que ela pode fazer. Qual o recorde do SR-71?

— O recorde de altitude de aeronave de asa fixa é 85mil pés. – respondi. – O que você vai fazer, seu pateta?

— Recordes são feitos barra serem quebrados! – Tony respondeu. – Vamos lá!

— Você está ciente de que é provável que você congele depois de determinada altura? Eu provavelmente vou acabar perdendo a conexão e o Jarvis também. – falei observando alguns níveis de energia. – Isso é um não maciço!

— Só continue! – Tony falou desconsiderando os riscos como sempre. – Mais alto!

Não levou nem meio minuto para eu perder a conexão.

— Merda! Esse idiota vai se matar! – resmunguei tentando reestabelecer a conexão. Pareceram horas, mas foram segundos antes da conexão voltar sozinha. – Tony?! Você está bem?!

— Isso foi incrível! – ele falou em uma voz animada e ofegante de quem vai pela primeira vez numa montanha russa.

— Volta pra casa! – mandei com um suspiro aliviado.

— Sim senhorita! – Tony respondeu rindo. – Jarvis, desligue.

Ri junto. A próxima coisa que ouvi foi um estrondo e Tony caiu em cima de um de seus carros caros trazendo consigo pedaços do heliponto, do teto, da sala e do meu piano.

Todos os alarmes dos carros dispararam e Dummy não falhou em conter um possível incêndio quando me levantei correndo para ver se Tony estava bem.

Ele abriu o elmo com um sorriso besta e o começo de um galo na testa. Suspirei em parte brava, em parte aliviada antes de apoiar as mãos na cintura e ralhar:

— Anthony Edward Stark, você me deve um piano!

 


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Notas finais do capítulo

Cheguei com mais um capítulo e um enorme pra compensar a demora!
Enchi mesmo esse capítulo de emoções e fiz ele inteirinho a respeito da minha amizade favorita de escrever: IronIce!
Eu ainda estou parcialmente destruída por Ultimato e trabalhando pra consertar o plot. Como vocês viram bem nesse capítulo, Aleksandra não vive sem o Tony!
A respeito dos nomes dos robôs que o Tony tem na oficina: acho que na dublagem em português eles vieram como Mão Furada e Idiota, mas eu preferi manter Butter Fingers e Dummy por serem “nomes próprios” e eu ter chilique com tradução de nomes próprios por causa de Harry Potter e O Senhor Dos Anéis (nunca vou perdoar a Rocco por “Tiago Potter” e a Martinsfontes por “Scadufax”).
Acho que é isso! Me digam o que acharam!
Amo vocês 3mil!
BEIJOS DE REFERÊNCI, SHAZI!



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