Aquela manhã não parecia nada com que a garota de cabelos ruivos havia sonhado, na realidade, parecia mais um sonho bizarro em que se acorda logo após sem saber onde está. Ela coçou os olhos e estreitou a vista, procurando por algum sinal de mudança no ambiente. O cheiro de panquecas queimadas invadiu seu olfato quando bocejou, fazendo com que uma careta estranha se fixasse em seu rosto sardento. 

Os olhos verdes e curiosos procuraram pelo corpo quente de seu, agora, marido James. E ela novamente desabou na cama quando percebeu que aquilo era real. 

Lily estava realmente casada com James Potter. E agora, depois de tanto tempo, as piadinhas com Lily Potter começariam a fazer sentido. Um sorriso involuntário desabrochou em seus lábios ressecados pela noite e o perfume do moreno pareceu inundar seus sentidos quando abraçou junto a si o travesseiro fofo dele, abafando um gritinho agudo que insistia em sair por sua garganta. 

A ruiva se perdeu nas memórias do dia anterior, quando estavam todos juntos celebrando seu matrimônio em uma igrejinha da Londres trouxa. James insistira de que deveriam casar nos dois mundos e isso arrancou sorrisos de seus amigos, familiares e principalmente dela. Havia sido simples mas tão perfeito que com toda a certeza continuaria gravado em sua mente eternamente. 

Assim como o nome que estava gravado em sua aliança.

Sentindo-se revigorada e um tanto apreensiva, a nova senhora Potter calçou os chinelos confortáveis e vestiu o roupão felpudo, rumando seus passos até a cozinha. Ela sorriu e sentiu os olhos pesados de lágrimas com a cena que se desenrolava logo a frente, era como se seu coração desse grandes cambalhotas em seu peito, era todo o amor que sentia por aquele homem simplesmente transbordando por seus olhos cristalinos.

Lily fez um leve som com a garganta para anunciar sua presença no cômodo, ainda com o corpo escorado no batente da porta. Ela riu quando o marido virou o corpo, com o rosto e os cabelos sujos de farinha. James adquiriu uma expressão falsamente zangada no rosto, passando a mão que não segurava a frigideira pelos cabelos bagunçados. Seu olhar encontrou com da esposa e o vinco entre suas as sobrancelhas se esvaiu como um passe de mágica.

— Deveria estar na cama, Senhora Potter. - ralhou, apontando o dedo para a ruiva que fazia sua melhor cara de inocente. — É sério Lírio, o que faz acordada agora? Queria te fazer uma surpresa no nosso primeiro dia de casados. 

James parecia genuinamente aborrecido por ter sido pego desprevenido e a mulher riu do beicinho que se projetava nos lábios dele. A ruiva descruzou os braços e caminhou até a bancada, onde sentou sem fazer muito esforço. 

— Desculpe Jay, o cheiro de queimado acabou me acordando. - riu travessa quando James estufou as bochechas, ofendido. — Estou brincando querido, eu só... 

— Só? - incentivou, parando de frente para a mulher ao segurar suas mãos juntas. 

— Ainda é difícil acreditar que nos casamos, acho que acordei e pensei que tudo não passava de um sonho. - sussurrou, acariciando os cabelos escuros do homem. — Estar com você assim, eu sempre quis... 

Os lábios macios de Potter encontraram com os de Evans, em um ato de carinho. 

— Sei bem, minha flor. Acredite, quando acordei e vi você dormindo ao meu lado foi surreal. Me faz feliz estar com você, assim, juntos. - disse James, virando-se para o fogão que parecia querer incendiar a qualquer momento. — Mas antes preciso desligar aquilo, as panquecas vão ficar prontas logo querida.

[...] 

O dia havia passado tão rápido quanto uma vassoura voando pelos céus em uma partida de quadribol e já era noite outra vez. Os Potter estavam sentados na varanda de sua nova casa, observando as constelações enquanto lembravam das aulas de astronomia que tiveram em Hogwarts, comentando sobre os amigos e professores, sobre o que aconteceria dali para frente. Eram tempos sombrios apesar da felicidade do casal e todos sabiam das ameaças que ainda rondavam a comunidade bruxa, procurando apenas uma brecha para destruir e acabar com a paz ainda existente. 

Lily soltou um muxoxo quando sentiu os dedos calejados do marido passarem por seus fios de cabelo, emaranhando-se ali ao fazer um carinho. A mulher olhou para o céu e depois para o moreno, fixando-se apenas nele. O ar parecia pesado quando ela entreabriu os lábios, soltando uma lufada quente contra as próprias mãos em um ato nervoso que, aos olhos de James, era uma maneira de escapar do assunto que os rodeava desde o início do dia. 

O moreno continuo pacientemente acariciando os fios ruivos, sentindo sua esposa quase ronronar como um felino pelo ato. 

— Você sabe que eu sei o que tentou esconder, certo? - questionou o moreno, com a voz mansa e baixa. — E sabe que não tem problema me falar em voz alta, Lírio...

E naquele momento Lily soube que nada mais importava além da família que estava construindo com o homem que amava, mesmo se seu destino estivesse selado após a guerra bruxa, mesmo que por ventura acabasse partindo antes da hora, o que realmente importava era o que estavam compartilhando. Com os amigos, com a família, os colegas de trabalho e os vizinhos. Com o mundo. Lily soube que não deveria temer o futuro incerto, pois a sua certeza estava logo ali, acariciando-lhe os cabelos enquanto tentava conforta-la, sua certeza estava nas risadas que Marlene McKinnon e Dorcas Meadowes arrancavam dela e nos chocolates que dividia com Remus Lupin e Peter Pettigrew. Estava nas horas cozinhando ou pescando com Euphemia e Fleamont Potter, ou então nas noites em que voou com Sirius por Londres, na moto enfeitiçada de Black.

Sua certeza era o pequeno bebê que crescia em seu ventre, que por um tempo foi segredo e agora estava pronto para ser finalmente revelado. Lily sabia que aquele tipo de amor era difícil de encontrar e nunca se sentiu mais satisfeita na vida.

— As coisas vão complicar agora, querida. Sei que vão, mas nós daremos um jeito, tudo bem? Também sei que está grávida, Lils. Caso tenha esquecido... reparo em você desde nosso primeiro ano na escola. - sorriu brincalhão, vendo as profundezas esverdeadas da mulher se tornarem pequenas lagoas brilhantes de lágrimas. — Nosso amor será capaz de passar por todas as coisas ruins, você verá. E nosso bebê nunca estará sozinho. 

E então ambos choraram, de felicidade e de medo. 

E o nó que prendia Evans pareceu se dissolver como o açúcar no chá, fazendo a mulher soluçar forte contra o peito do marido. Ficaram abraçados por longos minutos, até que uma fina garoa os enxotou para dentro de casa. James sorriu largo para Lily quando se deixou cair de joelhos para beijar o ventre dela, ainda pequeno. E uma nova esperança surgiu daquele momento. 

— Já amo você tanto, tanto pequeno. - murmurou James, com a bochecha esquerda encostada na barriga lisa de Lily. — Saiba que por mais difíceis que as coisas pareçam quando você nascer, por mais estranho que o mundo esteja ou mais rabugenta que sua mãe fique... - brincou, ouvindo o riso da ruiva ecoar pela sala. — Você nunca estará sozinho, nunca! Nós sempre estaremos com você, nem que seja em seu coração. 

— Harry, a mamãe ama tanto você. - sussurrou Lily, sentindo o olhar castanho se fixar em seu rosto. — Nós amamos tanto você, você é tão amado Harry.

— Um lindo nome para um lindo garotinho, espero que ele tenha seus olhos Lírio. - sorriu James, levantando do chão. — E também espero que ele possua toda a pureza do seu coração. 

— Vai ser complicado escolher os padrinhos e é por isso que essa tarefa será sua, amor. - disse a ruiva, dando de ombros ao se recompor. — Vou preparar chá.

— Está vendo Harry? É assim que sua mãe me trata, seu pobre pai que terá que apartar os Marotos em uma futura briga. - disse divertido, esquecendo-se completamente do peso que ainda pairava fora de seu lar.  

Foi então que Lily soube que sua única certeza era o amor, e isso nunca iria lhe faltar.