O Enterro do Lince escrita por Nathália Paixão


Capítulo 4
Meu Único


Notas iniciais do capítulo

E chegamos no final da trama!
Acabei me inspirando em uma música que conheci hoje cujo se chama My Only One (Meu Único) do cantor Mikey Wax. Ela combinou bastante com o sentimento que eu queria transparecer em certas partes do capítulo.
Espero que ele seja inesquecível para todos!

Admito que fiquei na dúvida de qual rota eu seguiria nele.
Em minha cabeça tinha três opções:

— Eiji foge de casa por um tempo deixando todos preocupados.
— Eiji comete suicídio, fator que é bem comum no Japão, infelizmente.
— Eiji segue uma vida parcialmente normal, mas com depressão.

Quer descobrir qual fiz?
Boa leitura.



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Tic Tac.

O ponteiro do relógio prateado pendurado em uma parede cor palha parecia ser incensante demais de acordo com a situação que naquele momento estava sendo igual a um filme de suspense interminável e grotesco.

A atmosfera tranquila agora estava pesada.

Quão doloroso era escutar a voz familiar daquele que se encontrava do outro lado da linha proferir palavras tão tremendamente fatídicas e surreais. O que significavam elas mesmo? Não tinha mais ideia. O corpo estava fraco. Imaculado pelo tempo doente. Debilitado. Completamente ferido não só pela notícia extravagante quanto pelos dias em que ficou sem ela.

Tic Tac.

Era um sentimento estranho. Abalador. Na verdade parecia que não sabia mais o que exatamente sentir na hora. Por outro lado o corpo respondia. Os olhos estavam vidrados em um ponto fixo do lençol de algodão bordado à mão enquanto os pés até a cintura eram cobertos por ele. O pijama listrado branco e cinza cabia perfeitamente no ser perplexo, cujo segurava o telefone com sua mão destra sem conseguir assimilar direito as palavras proferidas pelo conhecido dos Estados Unidos. A mão canhota apertava com força o tecido da blusa no peito com suor gélido.

A
 cabeça girou. 
O
 ar faltou. 
Coração falhou. 

Tic Tac. 

Quantos meses haviam passado? Será que já tinha dado um ano?

━ EIJI! Aguenta! EIJI? POR FAVOR, ESCUTA! EIJI! ━ Proferiu a voz de Sing desesperado na linha telefônica cujo após não obter sucesso com a resposta decidiu desligar.

━ Irmãozinho, o que houve? Espera! Fica calmo!

Sing discou em disparada o número de Max que depois de atender a ligação foi instruído pelo menino a ligar para alguém que estivesse próximo de Eiji devido o mesmo ter contado sobre o falecimento de Ash e o garoto japonês não ter recebido a notícia muito bem.
Alguns minutos prosseguiam.

A campainha ressoava no apartamento sendo apertada de forma frenética. A menina caçula corria para a porta abrindo-a após notar que quem estava adentrando quase que em disparada era Shunichi sem fôlego mostrando que havia corrido muito para chegar o mais rápido possível no lugar.

━ Eiji! Você é a irmã dele? Como ele está? Cadê ele? ━ Perguntou sem tempo para tirar os sapatos.

━ Você é o tio Ibe? Nos ajude! Ele não está querendo me ouvir. Ele surtou do nada! Mamãe e papai não estão em casa. Eu não sei o que fazer! ━ Dizia a pequena menina em prantos.

━ Onde fica o quarto dele?

━ Eu te mostro!

━ Eiji, está me escutando? Olhe pra mim. Vamos te levar no hospital agora. Eiji!

A voz de Ibe parecia estar longe. A consciência esvaia-se aos poucos junto as falhas batidas do coração infartado. Era doloroso. Doloroso demais. Não podia ser verdade. Sing só podia estar brincando. Ash? Morto? Não.

O mundo de Eiji parecia desabar aos poucos. Um grande vazio inundava o coração ferido assim como o sombrio e fúnebre escuro perpetuava na mente infeliz. Em sua cabeça um ponto de luz nasceu de forma dissimulada. Os olhos abriam-se com lentidão em uma atmosfera diferenciada e via-se o rapaz deitado por sobre os trigos onde alguns os espetavam, mas que notoriamente não surtia efeito na pele alva.

━ Sinto cheiro de relva. ━ Pensou.

━ Eiji.

━ Ash? É você? ━ Escutou uma voz familiar que se aproximava por entre a paisagem.

━ Sim, Eiji. ━ Sorria o loiro, passando os braços pelos ombros do moreno, abraçando-o enquanto ele erguia-se do solo com fraqueza aparente. ━ Eu preciso ir.

━ Ir pra onde, Ash? Espera, isso é um sonho? Você está bem? ━ Dizia-o apalpando o maior nos braços a fim de ter certeza se era real.

━ Eiji, saiba que os momentos que passei com você foram os melhores da minha vida. Obrigado, você me ensinou o que é amor. Me ensinou o que é voar. Meu único.

━ Ash... Eu...

Lágrimas transbordavam desesperadamente sobre a face branca com olheiras profundas e roxas. As mãos do moreno cobriam agora os olhos castanhos, seus ombros estavam inclinados para frente com a coluna curvada. Tamanha era a dor que sentia naquele momento. Não podia entender. Era sua culpa. Não era para ter ido embora sem antes tê-lo visto. Acreditava que ele estava seguro. Onde foi que errou? Quão inocente tinha sido em acreditar que Ash ficaria bem?

━ Os meus também, Ash. Os meus também. Você... ━ Era difícil falar. ━ Você morreu? É verdade?

━ Shhhh. Não diga isso. Não me pergunte, ok?

━ Mas para onde você está indo?

━ Não me responda com outra pergunta, idiota. ━ O loiro ria de nervoso, aproximando sua testa do mais baixo encostando ambas ao sentir o outro erguer um pouco a cabeça. ━ Você não fez nada de errado. Não se culpe. Promete pra mim que vai ficar seguro? Que não vai fazer nenhuma loucura? Promete que não vai me seguir? 

━ E-Eu... 

━ Promete?

━ Prometo.

━ Ótimo. ━ Sorriu, fechando os olhos verdes. ━ Promessa é promessa.

━ Ash?

A distância que sentiu ao ter o contato terno cortado foi aparente. Eiji olhava para frente e para os lados a procura de algum resquício do amigo naquela relva tão bela e ensolarada marcada por um pôr do sol magnífico. O lugar era calmo. Os trigos balançavam conforme a brisa percorria. 

━ Minha alma sempre estará contigo. Sempre, Eiji.

━ Ash? Por favor, não vá embora. Não me deixe. Eu preciso de você. Espera!

━ Viva. ━ Falou o loiro como último veredito. 

O
 vento chicoteava e uivava no ambiente alaranjado. 
A
 voz sumia conforme a visão de Eiji se embaçava. 
​A
 mão estendida para frente cansava-se, não ajudando no apoio quando o corpo pereceu na grama.

━ Os batimentos dele retornaram! Passe a seringa! ━ Disse um homem de máscara e jaleco com uma voz suave e esperançosa. ━ Ele está abrindo os olhos. Muito bem, garoto. Muito bem.

O medidor de batimentos cardiorrespiratórios que antes permanecia em um soar único e agudo contínuo agora cantava o som esperançoso de pausas sucessivas demonstrando que a vida havia voltado ao recém falecido. Eiji por um breve segundo abriu os olhos castanhos com dificuldade observando o teto branco e luzes ao seu redor que assemelhavam-se a holofotes. O cheiro de plástico e ferro era forte, sua mente ainda estava em branco, pois não possuía forças para raciocinar em algo naquele instante que fora marcado pela sua ressurreição. A máscara de oxigênio incomodava-o um pouco.

Queria dormir de novo. Queria vê-lo. 
Tocar em Ash.

━ Ash. ━ Proferiu deixando duas lágrimas escorrerem pelas laterais dos olhos antes de pegar em um sono profundo.

O mundo parecia não fazer mais sentido. Que angústia dolorosa. Dor reprimida. Que vontade de não pertencer mais a este lugar tão solitário e sem felicidade. Semente de sofrimento esta que enraizava no eterno. A universidade não tinha mais um real significado, mas isso não fez com que o estudante diminuísse suas notas, muito pelo contrário. Continuou em sua rotina desmotivada de fotógrafo a fim de finalizá-la logo para assim poder concretizar o desejo que mais determinara realizar. Único motivo de fazê-lo continuar vivendo. A passagem já tinha sido comprada. Três longínquos anos andaram em uma linha sem curvas. Já possuía em torno de seus vinte e três anos quase virando-os para mais um ano. Sua independência como ser humano havia sido conquistada com louvor. As bagagens já prontificadas, o celular mudo vibrou.

━ Eiji?

━ Olá, Sing. Quanto tempo.

━ Então você...

━ Sim, vou morar aí.

P
recisava estar perto do lince. 
Não podia ficar mais tempo longe. 
Não ousaria recuar da realidade. 
Dar-lhe mais uma vez a maior parte de seu amor sincero. 
De sua proteção. 

A viagem foi fria, anômala e mais demorada do que sua volta para o Japão. Descia a rampa com as malas em mãos vendo o chinês cinco anos mais novo o esperando no hall internacional com as costumeiras mãos nos bolsos de uma jaqueta nova. Continha em seu rosto juvenil um sorriso triste, mas ainda assim receptivo. Estava mais alto e provavelmente após mais alguns poucos anos passaria o mais velho. Seu olhar expressava carinho e preocupação. O interior do peito estava rasgado. Sangrava deliberadamente devido a uma alto mutilação imaginária que ele mesmo se propôs a sentir depois de ter feito Eiji padecer com a notícia impactante. Não contara para ninguém, preferiu deixar em sigilo, entretanto havia sim lido a carta que Eiji escreveu para Ash milhares e milhares de vezes. Queria permanecer com ela para sempre. Poder ter o gosto de ler aqueles votos de amor tão puros. De almas destinadas a ficarem juntas, mas que foram separadas tão brutalmente. Sabia que ele não era a pessoa que Eiji queria ver naquele momento, porém isso não faria com que o mesmo não o recebesse da forma mais acolhedora possível. 

━ Ash, meu único. ━ Eiji sussurrou olhando para o vidral grande e distante atrás de Sing no aeroporto, admirado com o coração partido e sem uma metade sendo preenchido aos poucos com tal visão.

Ele notou as nuvens límpidas, céu azul e claro sem quaisquer defeitos. Era um dia lindo. Glorioso demais. O sol fresco e aquecedor iluminava o lugar que aparentava estar aguardando especialmente a sua chegada. Era como se um anjo estivesse ali. Era como se ele estivesse ali. 

Cabelos loiros bem arrumados. 
Olhos verdes ariscos e profundos. 
Sorriso verdadeiro e belo. 
Cheiro bom de banho tomado. 
Braços abertos aguardando um abraço que não viria. 

Eiji sorriu. Andou com pesar e arrumou os óculos de grau que passara a usar.

━ Eu voltei.


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Notas finais do capítulo

E fim gente! Estou tão feliz.

Não sei se o último capítulo ficou tão bom quanto eu queria, mas espero que tenha pelo menos emocionado o coração de vocês. Acho que deu para notar que meu objetivo foi fazer um “começo” da linha de Garden Of Light já que nele, pelo que entendi, Eiji foi morar nos States. Futuramente, talvez, eu faça um final seguindo a trama de Garden Of Light de igual modo.

Link (Música): https://youtu.be/f4CwyNJ-IQ0

Beijos e até a próxima! Obrigada por terem acompanhado.
Vocês são uns amores.



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