Nós Partida escrita por Joker Joji


Capítulo 1
Unique


Notas iniciais do capítulo

Só o que peço é que se coloquem no lugar da Débora. Porque a Débora sou eu, e também todos os apaixonados dessa vida.



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A guirlanda pendurada na porta sorriu para mim quando cheguei a casa, também alegre, com os presentes à mão. Havia Papais Noéis na rua, guizos e bengalas doces, uma névoa agradável e o barulho dos sinos. O espírito natalino espreitava os transeuntes nas esquinas, preparando-se para abocanhar sua próxima vítima.

 

Anoitecia, anunciavam o tom róseo do céu e as famílias que ligavam seus pisca-piscas multicoloridos. A cidade, em poucos instantes, tornar-se-ia uma infinidade de fogos de artifício disfarçados de pequeninas luzes, uma massa fermentada de risos e parentes felizes, fervendo com o hálito cálido das crianças ansiosas e dos casais apaixonados.

 

Era Natal, o vento alertava ao requebrar as árvores magras que empunhavam bolas vermelhas e douradas.

 

Alessandro logo chegaria com o algodão, e colocaríamos juntos nossa pseudo-neve naqueles galhos frágeis. Sorri, aconchegando-me sozinha no casaco de lã. A mesa estava posta, os presentes aguardavam os convidados. As nozes espremiam-se numa cesta pequena.

 

Por que esperar? Escolhi uma e parti-a com o abridor, ouvindo o barulho que mais parecia um espatifar de ossos. Tão sólida, mas frágil frente a mãos humanas, frente a meus interesses: comê-la. Pus a noz na boca e, à primeira mastigada, tocou a campainha.

 

- Alessandro!

 

Alessandro com as mãos nos bolsos, cabelos densos e camisa social rosa, Alessandro planava diante de mim. Digo planava porque era simples e leve, Alessandro e seus olhos de encanto. Menino de bons modos, limpo e sorridente.

 

Alessandro, natalino, tão meu.

 

Pulei em seus braços, ao que ele abraçou-me meio sem jeito. “Senti sua falta”. Ele correspondeu-me. Beijei-lhe os lábios com gosto, com sinceridade.

 

- Onde está nossa neve?

 

Ele me olhou com uma cara esquisita, a princípio como se não entendesse a pergunta, e posteriormente como se não houvesse gostado dela. Olhei-o nos olhos. Alessandro estava especialmente bonito no Natal, com um brilho novo no olhar. Era uma sensação boa. Ótima, na realidade.

 

Alessandro fazia-me sentir fantástica, mesmo calado, mesmo parado, mesmo si próprio.

 

- Débora, acho que... – Ele pôs as costas das mãos na boca um instante, calando-se novamente. Não estaria bem? Não me admirava, não dormia direito há noites. Sugeri de irmos ao vizinho um instante, pois era médico. Logo lembrei-me de que era Natal e seríamos inconvenientes.

 

Alessandro negou cada uma de minhas propostas, e mandou-me sentar.

 

Assim o fiz, ao lado da árvore de Natal. Alessandro tinha olhos de avelã olhando-me de cima. Suas mãos mexiam de um lado para o outro, eu as acompanhava com o olhar, ele rodava, eu continuava parada.

 

Peguei uma noz e a quebrei com meus próprios dedos.

 

Mais uma vez o barulho de ossos se partindo.

 

Senti minha pulsação na palma da mão ligeiramente machucada.

 

Alessandro parou e me olhou mais uma vez.

 

- Acho melhor... Darmos um tempo, Deb. – Seus olhos de avelã murcharam. Ou fora minha visão?

 

Peguei mais uma noz e esmigalhei-a. Mas não foram pedaços de sua casca que caíram ao chão. Lembranças esfarelaram por meus dedos e sobraram no tapete. Refletiam, como farpas, esperavam que alguém as varresse. Ou que o vento as levasse para bem longe, para virarem nuvem...

 

Alguém estourou uma champagne num apartamento próximo e foi como se a rolha houvesse me acertado em cheio. Rolha Alessandro.

 

- Estou cansado.

 

“Estou com outra”, seus pensamentos eram claros, numa noite de Natal tudo tornava-se absurdamente mais indiscreto. Alessandro deveria ter escolhido outro dia. Deveria. Deveria.

 

Tudo, menos o meu Natal.

 

- Não concorda que não está dando certo?

 

Peguei mais uma noz. E quando a parti, tornei-me a inconveniente metáfora de suas palavras insalubres. A noz partida, o nós partido. A linha do destino que nos unia era de seda, e a tola acreditara por meses que se tratava de uma corrente de diamante.

 

Mas diamantes eram tão raros...

 

Ele fechou os olhos e se virou, parecia dolorido. Porém, não me tocou uma única vez. O que passava pela cabeça de Alessandro? Que era pior para ele do que para mim? Mas a decisão de amar outra fora dele... A decisão de me abandonar fora dele. E eu agora estava sozinha.

 

Lembrei as palavras de uma amiga minha:

 

“Se é para ter um fim, seria melhor nunca ter acontecido, não é?”

 

Não é?

 

É, sim.

 

Ele ainda estava de costas. Peguei uma noz. Peguei o abridor de nozes.

 

E acabei com “nós” de uma vez por todas.

 

Alessandro vestia-se de vermelho e continuava imensuravelmente belo. Eu havia dito uma vez que ele ainda me deixaria louca.

 

Ah, Alessandro, se soubesse como eu te amo...


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Notas finais do capítulo

Só para constar que eu sou totalmente contra o negócio de "nunca ter acontecido". A vida tem seus ótimos e péssimos momentos, e eu prefiro isso a uma rotina de meio-termos. Mas eu precisava dar um fim em Alessandro XD

Alessandro = Alejandro = Lady GaGa. Primeiro nome que veio à cabeça!

Obrigada aos que leram! ♥