Immortals escrita por Lillac


Capítulo 3
I'll be the guard dog of all your favorite dreams,


Notas iniciais do capítulo

Demorei, mas voltei, hehe. Com a minha história principal finalizada, acho que vou poder atualizar essa mais frequentemente. Peço desculpas pela demora, e espero que gostem!



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I'll be the guard dog

Reyna cruzou as pernas, seus olhos escuros indo de uma ponta à outra da folha de papel. Percy aguardou-a terminar clicando incansavelmente o botão da caneta até que ela bufou exasperada e ele pegou o recado.

— Não tem nada demais — ela concluiu, abaixando o documento. — Eles só soam como dois pirralhos bem convencidos falando pelas costas de um adulto.

— Ei, eu não sou tão velho assim — Percy tentou brincar, mas sentia os ombros pesados. Tinha esperança que Reyna encontrasse alguma coisa traduzindo a conversa do mecânico e da assistente, mas... — bem, eu preciso sair para checar uma evidência que encontraram daquele assassinato no centro, o Zhang pediu para ir com ele — disse, levantando-se e vestindo a jaqueta.

— O Sargento Brunner sabe? — ela ergueu as sobrancelhas, incrédula.

— Não — Percy estalou a língua — e ele não precisa.

— Você já tem casos demais empilhados — ela suspirou, mas não tentou convencê-lo — eu falei com a secretaria da escola e consegui uma permissão para pegar os dados do garoto, mas precisa ser pessoalmente. Vou lá agora.

Percy parou com a mão a centímetros do celular que estava carregando.

— Que garoto?

— Dakota — respondeu. — O ex-namorado da Gwen.

—... E você vai sozinha?

— Eu posso pedir para o Nico ir comigo, se você preferir — respondeu, olhando-o confusa. Percy não vacilou. — Tem alguma coisa que você quer me dizer?

— Reyna, você sabe que eu te acho incrivelmente competente...

— “mas”.

— Mas, eu não quero que você saia por aí fazendo investigações sozinhas.

— Não é uma investigação. É um interrogatório. Eu só vou gravar algumas perguntas.

Ele se apoiou na mesa.

— Você é uma policial. Não uma investigadora — relembrou. — E você não tem a minha permissão. Por favor... —

— Você vai dizer que isso é para o meu bem — ela rolou os olhos — que não quer que eu perca pontos porque estou burlando as regras — quando ele ficou em silêncio, ela continuou: — nós dois sabemos que se tivéssemos entrado na academia ao mesmo tempo, eu já seria sua Sargento há meses.

Percy estreitou os olhos.

— Você está fazendo de novo.

— O que?

— Está canalizando sua raiva em mim — ergueu as mãos, de forma defensiva — toda vez que alguma coisa te incomoda, você me relembra o quão melhor você é — a voz dele ficou mais macia. — Eu sei, Reyna. Você seria uma puta juíza do caralho se tivesse como cuidar do seu pai e estudar ao mesmo tempo. Todo mundo sabe disso. Eu não estou tentando te menosprezar.

Por um momento, a bravura de Percy oscilou um pouco. Ele estava falando a verdade, é claro, mas ainda era consideravelmente difícil dizer isso a si mesmo sob o olhar excruciante de Reyna. Havia um motivo pelo qual ela não fizera muitos amigos na academia.

Mas, novamente, o que ele dizia era a verdade. Não queria menosprezá-la. Ele sabia mais que ninguém o quão capaz Reyna era. Mas se ela continuasse se jogando de cabeça em casos sem se atentar à sua posição, então ela teria muitos problemas no futuro. E ele gostaria de poder chama-la de “detetive Ramírez-Arellano” um dia.

— Tudo bem — ela abaixou os papeis — o que você quer eu faça?

— Quero que você pegue as informações desse Dakota.

— Mas... —

— A Beauregard vai com você — ele checou a tela do celular, relendo a confirmação — na verdade, ela está te esperando no estacionamento.

Um mínimo sorriso surgiu no rosto de Reyna, uma visão e tanto. Mas então as sobrancelhas dela se franziram.

— Está bem, o que você quer em troca?

— O queeee — a voz de Percy afinou involuntariamente, e ele limpou a garganta para voltar ao normal — o que te faz pensar isso?

— Você fez a barba de manhã, seu cabelo está arrumado e você está usando o seu par de meias que não está rasgado — ela notou — eu te vi chegando hoje, e você limpou a lataria do carro. Sem falar que você não para de olhar para o celular o tempo todo — uma das sobrancelhas dela arqueou-se, daquele jeito que a deixava extremamente atrativa, mas completamente assustadora também. — Meu palpite é que você tem um daqueles eventos esquisitos hoje e precisa de algum favor.

— Viu? Eu disse que você vai dar uma detetive incrível.

— Percy.

— Ok — ele desistiu — Rachel vai se apresentar hoje, e você sabe que eu detesto ir para essas coisas sozinho.

— Rachel Dare? — Reyna perguntou. — Aquela violinista famosa que você jura que é sua amiga?

— Ela é! — Percy insistiu — Nós nos conhecemos desde pequenos, sério. E ela sempre me convida, então é claro que eu não posso simplesmente furar com ela...

— Está bem, chefinho — Reyna riu — o que você quer?

— Que você e o Nico me ajudem a sobreviver à três horas de recital clássico com uns ricaços que cheiram igual a minha vó.

— E em troca eu posso fazer essa parte da investigação sozinha?

Percy sorriu amarelo.

— Sim?

Reyna riu mais uma vez, dessa vez com sinceridade.

— Você tem sorte de eu ser inescrupulosamente ambiciosa. Tudo bem.

— Isso! Olha, eu vou até escrever uma carta de recomendação para você.

— Por favor, não — ela tirou a jaqueta da cadeira e começou a vesti-la, as chaves da moto tilintando. Percy sempre achava que ela parecia uma motoqueira saída direta de um filme violento. Sexy, mas assustadora. — Você escreve tão mal que é capaz de perder o seu cargo.

— Tem razão. Eu nem sei o que “inescrupulosamente” significa.

——————

A Academia Júpiter ficava no topo de uma colina fora da cidade e parecia grande e pomposa demais para uma escola, mas Reyna supunha que era com aquele tipo de coisa que a violinista daquela noite estava acostumada. Ela desmontou e preparou todos os documentos que precisava. Assim que alcançou a entrada do prédio de entrada, no entanto, foi parada por um garoto um pouco mais baixo com óculos e uniforme impecável.

— Oficial Ramírez, detetive Beauregard.

— Ramírez-Arellano.

— Ra... ramírez-arelhano — ele se enrolou, e, pela expressão dela, percebeu que não havia gostado nem um pouco — perdão. Eu sou Jason Grace, presidente do corpo estudantil. A diretora me deu a tarefa de guia-las hoje.

Um dos cantos da boca de Reyna subiu.

— Você vai escoltar uma policial, garoto? Uau.

Ele ficou meio vermelho, mas ela notou o olhar azul endurecer. Talvez ele não fosse tão frouxo assim.

— Se você puder me acompanhar.

Reyna gesticulou para que ele fosse na frente. Silena a acertou no braço e murmurou para deixar o pobre garoto em paz.

— Dakota James foi um dos nossos alunos cerca de cinco anos atrás — ele contou, enquanto eles caminhavam pelos corredores abarrotados de quadros, listas de honra e troféus. Troféus demais. A escola pública que ela havia frequentado mal tinha uma bola de basquete para todas as turmas. E ela meio que fedia à urina. — Ele nunca foi muito engajado nos esportes ou competições culturais, e os rumores dizem que era conhecido por distribuir bebida alcóolica.

— Distribuir bebida alcoólica — ela repetiu — termo bacana para “contrabandear bebida para menores de idade”. Embora ele fosse menor de idade também... — Jason diminuiu um pouco o ritmo do passo, e virou para encará-la. — o que? Desculpa, eu só estava refletindo sobre como aparentemente minha investigação está baseada em fofocas de crianças.

— Dakota tinha 18 anos — Jason a lembrou.

— A idade legal é 21. Alguma outra coisa?

Ele abriu a boca para responder, entretanto, uma porta atrás deles se abriu, e um rosto surgiu na fresta.

— Grace? Achei ser você. Vamos, entra logo.

Reyna estalou a língua.

— Grace? — Reyna repetiu, olhando para a detetive. Silena pareceu pensar o mesmo — seu pai...

— Ezequiel Grace — ele confirmou — dono da Olympus Air Force.

— Envolvido em um mar de desvios de dinheiro e corrupção — Reyna fez o favor de mencionar — é, eu lembro. Foi um caso estranho.

— Nós tínhamos absolutamente nada nele — Silena contou — e aí de repente um monte de denúncias anônimas começaram a chegar. Nós não podemos usar relatos sem remetente como prova, mas podemos usar como indício.

— E boom. Quase como tirar doce de criança.

— Ei — Silena riu — você está menosprezando as crianças. Mitchell me mordeu na mão uma vez.

— Seu irmão é estranho.

— Sim, meu pai foi preso recentemente — Jason suspirou, entrando no aposento — algum outro comentário?

— Como você ainda está aqui? Nessa escola, eu digo.

— Minha irmã está pagando as mensalidades. Ela é a batedora dos Yankees, Thalia.

Reyna não era uma grande fã de beisebol, então ficou calada depois disso. Mas era difícil olhar para o rosto de Jason, em seus óculos de aros finos e pasta sanfona debaixo do braço e pensar que ele havia crescido sob a tutela de um dos maiores lavadores de dinheiro do país.

Mas quem sabe? Talvez as pessoas não conseguissem olhar para Julian e vê-la também. Famílias eram complicadas.

A secretária da escola era simpática o suficiente, e Jason esperou em silêncio em um banco de estofado de veludo enquanto elas faziam as perguntas e imprimiam as fichas do ex-aluno. Silena, como sempre, havia se debruçado sobre o balcão e estava olhando tão fixamente para o rosto da secretária que Reyna sentiu um pouco de pena dela. Por experiência própria, ela sabia que era difícil estar do outro lado do olhar da detetive.

Mas então a secretária pegou os papeis para entrega-las e Reyna viu aliança que ela tinha na mão esquerda, e como imediatamente depois seus olhos desceram para o decote de Silena. Fechando os punhos, Reyna inspirou fundo.

Adúlteros não mereciam pena. Belona não merecia pena.

— Você já pegou tudo? — perguntou, impaciente.

Silena piscou seus olhos impossivelmente castanhos.

— Ainda precisamos assinar — ela lembrou.

Batendo os pés, Reyna aguardou sua vez. Quando finalmente terminaram, ela notou que o garoto, Jason, havia colocado os fones nos ouvidos e estava conversando baixinho com alguém por chamada. Ela estreitou o olhar para ele, mas tudo o que conseguiu vislumbrar foi um relance de cachos cor de ouro antes dele enfiar o celular no bolso.

Limpando a garganta, ele se ofereceu para escolta-las, mas Silena o dispensou com um afago no topo da cabeça que provavelmente o deixou sentindo-se bastante emasculado.

Ou não, julgando pela forma fria como os olhos dele as seguiram até a porta.

Reyna colocou as pastas com os documentos no compartimento debaixo do banco e montou. Silena subiu atrás dela, ficando um pouco mais perto do que o suficiente.

— Achei que você tinha dito que não gosta de repetir experiências — Reyna riu.

Silena gargalhou também.

— Só estou brincando com você. Vamos logo, eu tenho um encontro.

— Pobre coitado.

Silena apertou um pouco mais, e, mesmo sem querer, Reyna sentiu um formigamento nas pontas dos dedos. Afinal, era mesmo difícil lidar com Silena Beauregard.

— Coitada — ela corrigiu.

Reyna meneou a cabeça e acelerou.

——————

— Eu estou feliz em avisar que a nossa investigação está indo muito bem — Reyna anunciou, entrando no quarto sem bater.

Percy nem sequer bobeou. Ele terminou de subir as calças sociais e passou o cinto. Ela andou até a cama de solteiro dele e levantou a camisa azul escura.

— Mesmo?

— Com certeza — disse, percebendo o quão amassada a peça de roupa estava — muito bem lá no fundo do esgoto, que é onde eu vou jogar as fichas do Dakota se eu tiver que as ler mais uma vez.

Percy forçou uma risada. Uma batida ressoou pelo cômodo e Percy pediu que entrasse. Nico abriu a porta cobrindo os olhos.

— Me fala que você não está pelado — ele pediu,

— Não — Percy disse, e Reyna terminou:

Completamente.

Nico suspirou. Ele levantou o ferro de passar que trazia em uma mão, e Reyna soube que não era a primeira vez que tinha que lidar com a falta de responsabilidade do primo. Ela começou a passar a peça de roupa ali mesmo encima da cama.

— Você arrumou o cabelo — notou, com um sorriso.

Nico brincou com o pequeno punhado de fios negros presos atrás da cabeça.

— A Rachel é legal — deu de ombros — não quero que se sinta envergonhada pelos convidados de honra — ele completou, dando um olhar de soslaio para Percy. — E você também não está nada mal.

Reyna sorriu, olhando de relance para o próprio vestido roxo que Hylla comprara para a formatura, tantos anos atrás, mas que cabia perfeitamente nela. O celular de Nico começou a tocar, ele checou a tela, e o atirou no colchão.

— Ei! — Percy chiou, tentando passar gel no cabelo — Cuidado com isso aí.

— Não se preocupa, não tem como esse colchão ficar pior — Reyna garantiu — quem era?

— O Mike — ele grunhiu, caindo sentado ao lado dela — está com raiva porque não foi convidado também.

— Ele não, tipo, detesta música clássica?

— Absurdamente. Mas ele não detesta lugares caros e champanhe de graça.

Reyna mordeu um comentário sagaz. Não era segredo para Nico que ela não gostava do namorado dele, mas havia dito a si mesma que o garoto era perfeitamente capaz de lidar com os próprios assuntos sozinhos. Percy inclinou-se para pegar a camisa recém passada, abotoou, e dobrou as mangas até os cotovelos, colocando a gravata e uma quantidade considerável de colônia em seguida (o que fez o nariz de garoto rico e mimado de Nico se franzir imediatamente).

— Que tal?

— Tirando o fato de que você levou uma surra de um motoqueiro hoje de manhã e seu lábio está estourado — Nico riu — ótimo.

— Ossos do oficio, priminho — ele rumou para a porta. — Ossos do oficio.

——————

O lugar era ainda mais ridiculamente elegante do que a escola, e Reyna sentiu-se ainda mais deslocada. Sabia que se houvesse continuado os estudos, era provavelmente naquele tipo de ambiente que viveria, mas as visões de todas aquelas pessoas com dinheiro demais e empatia de menos a fazia lembrar dos rostos contorcidos e olhares de repulsa que havia recebido quando morava nas ruas.

Não era agradável.

O teatro era enorme, com fileiras e mais fileiras e colunas esculpidas com cenas de histórias gregas. O palco era de carvalho polido, e além da cadeira singular na qual a violinista ficaria, havia uma pequena banda atrás, para acompanha-la quando necessário.

Percy os guiou pelas fileiras com a habilidade de quem já havia feito aquilo antes. Eles se identificaram para os seguranças e entraram no camarim. O lugar estava iluminado e cheio de funcionários, mas identificar quem era a estrela da noite não foi difícil. Ela estava sentada de frente para um espelho, com uma mulher retocando sua maquiagem e um muito, muito longo vestido branco que se desvaia em saias finas e sobrepostas com bordados. Os olhos verdes dela os encontraram pelo reflexo do espelho, e ela girou, de algum modo não borrando o delineador.

— PERCE!

Graças aos deuses, Reyna saiu do caminho. Porque a garota se jogou com tudo nos braços dele no segundo seguinte. Percy riu, devolvendo-a ao chão com o cuidado de não amassar o vestido dela.

— Vocês chegaram cedo — ela comentou.

— Por uma vez na vida — Nico riu.

— Neeks, parece que eu não te vejo há um século! — ela riu, batendo de leve no braço dele — seu cabelo ficou muito bom grande assim.

O sorriso de Nico alargou, e Reyna gostaria de ter gravado o comentário para esfregar na cara estúpida de Michael Kahale da próxima vez que ele implicasse.

— Ah, Rachel, vocês não se conhecem — Percy gesticulou para ela — essa é Reyna, nós trabalhamos juntos.

O sorriso da mulher não vacilou. E, caramba, que sorriso. Os fios que escapavam no intricado penteado pareciam refletir nos olhos verdes dela. Talvez fosse a maquiagem, ou talvez Rachel Dare fosse tão impossivelmente bonita assim mesmo.

— Rachel Elizabeth, prazer — ela estendeu uma mão — Percy me contou muito sobre você.

— Percy tem uma boca grande — Reyna segurou a mão dela.

— Bem, essa boca grande vai buscar alguns drinks para enchê-la — ele riu, apontando para si próprio — alguém quer alguma coisa?

— Vodca — Nico disse, mais do que depressa.

— Água — Reyna comentou.

Percy assentiu e saiu pela porta. Rachel fixou o olhar neles.

— Já que estamos nos apresentando... — ela viu alguma coisa na porta, a julgar pela expressão — Will!

Era um rapaz vestido em um terno escuro e com o cabelo loiro meticulosamente penteado para trás. Apesar do esforço para parecer arrumado, Reyna conseguiu ver, pelos maneirismos (e pelo nó da gravata) que ele era meio desleixado.

Ele os cumprimentou com um sorriso tenso.

— William Solace.

— Eu te conheço? — Nico inclinou um pouco a cabeça para o lado.

Will e Rachel trocaram um olhar.

— Você já esteve em Yale?

— Minha irmã mais velha faz Medicina lá.

Um olhar analítico e um momento de hesitação, e Will concluiu:

— Bianca? Nós apresentamos um seminário juntos no semestre passado.

O sorriso de Nico se alargou. Reyna ficou plantada ali, meio confusa. Nico nunca era tão receptivo com estranhos.

— Bem, eu tenho que terminar minha maquiagem — Rachel disse — Will, quer leva-los aos assentos deles?

A expressão de Will desabou por um único segundo, mas foi o suficiente para Reyna notar. Ele logo se recuperou, piscando as bonitas órbitas azuis estendeu um braço para ela.

— Se me permite.

Reyna respirou fundo, e eles saíram do camarim.

——————

— A vodca é para você ou tem alguma garota barra pesada te esperando?

— OK, você está definitivamente me seguindo. — Percy riu, virando-se no balcão.

Annabeth abriu um sorriso de canto.

— Você não é tão interessante assim.

— Interessante o suficiente para ter um convite VIP para um recital de...

Ela ergueu as sobrancelhas.

— ...de?

— Bethooven?

— Quase — disse. — Você só errou o compositor, o ano e o gênero.

— Quase.

— A maior parte do repertório é uma releitura de Heitor Villa-Lobos — ela disse, em uma pronuncia tão perfeita que Reyna sorriria orgulhosa — mas Srta. Dare adicionou os seus próprios toques especiais.

— Claro que adicionou — disse. — Quando ela era criança, o pai dela precisava suborna-la para que ela tocasse de acordo com a pauta. Sempre mexia em uma nota. Ou quinze.

Annabeth o olhou meio impressionada. Percy tentou não encarar. Não sabia como diabos ela estava ali, mas estava, e como estava. O vestido de alças finas ia até um pouco depois dos joelhos e os saltos a deixavam quase da altura dele. O cabelo estava armado em um volumoso coque, com mexas emoldurando seu rosto como fios de ouro. A maquiagem esfumaçada e escura em torno dos olhos fazia com que os cinzas das órbitas parecessem ainda mais tempestuosos.

— Você é uma fã de música clássica? — ele tomou um gole da vodca de Nico, tentando parecer legal, mas sentiu sua garganta queimando.

Foi mal, Reyna, pensou, antes de engolir a água dela em dois goles rápidos.

 — Não exatamente — ela tomou um gole generoso do seu gim, sem vacilar — mas sou uma grande fã da artista.

Percy achou a fala estranha. Rachel era certamente muito conhecida na alta sociedade, mas ele não imaginava como uma caixa de loja de conveniências poderia conhece-la. Não era como se ela postasse suas músicas no YouTube ou coisa assim.

Ele quis pergunta-la, mas lembrou a si mesmo que não estava no trabalho. Annabeth não era uma de suas investigações. Ela era só uma garota muito bonita, sorrindo e olhando para ele por cima da borda do seu copo de gim.

— Só por curiosidade, onde é o seu assento?

— Bem, se o universo estiver tirando com a nossa cara, como parece ser o caso — ela riu — provavelmente do lado do seu.

Percy mexeu desconfortavelmente na gravata.

— Ainda falta algum tempo para o recital começar — ele conseguiu dizer — você quer conversar lá fora?

Quando ele terminou de falar, ela já estava até andando. Percy a seguiu até a sacada, onde ela se debruçou na mureta de proteção, mexendo o líquido no copo, e perguntou:

— E então? Qual é sua história?

— Eu sou secretamente o filho bastardo de um grande magnata corrupto lutando para desbancar a indústria por tempo, e me disfarço de policial — disse — minha parceira é uma descendente ninja e o meu primo é um clérigo formado em magia antiga.

Annabeth riu, e tomou um gole.

— Ótimo. Tudo bem.

Ele se inclinou na mureta.

— Você não quer ouvir minha história — falou, um pouco menos humorado — é um péssimo início de conversa.

— Você pode começar pelo seu nome.

Ele arregalou os olhos.

— Caramba! Foi mal, sério. É Percy.

— Muito prazer, detetive Percy — ela fez uma pequena inclinação com a cabeça — e para quebrar o gelo, que tal eu falar um pouco de mim?

— Vá em frente.

— Eu vim de Boston há alguns meses. Dividia um apartamento com o meu primo, mas algumas coisas deram errado e eu tive que começar do zero. Perdi parte dos meus documentos em um incêndio, então as coisas não foram fácies. Uma amiga me ofereceu um apartamento aqui em São Francisco até eu me estabilizar de novo. É por isso que você está vendo uma ex-aluna de arquitetura de Harvard tomando gim em um recital de música clássica e pensando em quantos pacotes de camisinha ela vai ter que registrar amanhã.

Percy piscou com a última parte.

— É sexta à noite, detetive — ela riu — e a loja fica do lado de uma escola.

Ele pigarreou. Annabeth riu de novo, dessa vez bem mais abertamente.

Preparando-se para dizer alguma coisa, ele ouviu um burburinho do lado de dentro. E então vozes histéricas. Annabeth pareceu perceber também, e o lançou um olhar hesitante. Ele caminhou silenciosamente até a porta.

— Ah, merda.

Annabeth deixou o corpo de vidro na mureta e se juntou à ele.

— Parece que o problema te segue, detetive — ela sussurrou.

Percy observou a situação lá dentro. Todos os convidados estavam de joelhos, com as mãos atrás da cabeça, e sendo cercados por um trio de pessoas encapuzadas carregando armas de fogo. Ele agradeceu a todos os deuses por ter lembrado de recarregar o revolver antes de sair de casa. Uma das pessoas tinha a ponta de um fuzil colada na costa de Rachel, no meio do palco.

Buscando com o olhar, ele viu Nico e Reyna entre os reféns, mas o olhar dela encontrou o dele. Percy sabia que ela tinha uma pistola em cada coxa, por baixo do vestido. E conhecendo Nico como conhecia, não tinha certeza se ele estava necessariamente seguindo o limite máximo de armas de um policial à paisana.

Estava torcendo para que não.

— O que você vai fazer?

Ele respirou fundo e olhou para ela. Assustadoramente, não havia medo nas tempestades em seus olhos. Apenas curiosidade e expetativa.

Percy voltou a olhar para os amigos. Reyna acenou imperceptivelmente.

— Salvar o dia — disse — e tentar não morrer.

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Notas finais do capítulo

Agora todos os pares principais (Percabeth, Reychel e Solangelo) já se conhecem. Quais são as opiniões de vocês?
Espero que tenham gostado, comentários são sempre apreciados!