O Funcionário do Fast-Food escrita por Ellaria M Lamora


Capítulo 18
XVIII — MA'KAÑA


Notas iniciais do capítulo

nome do capítulo é difícil, né? nem eu consegui pronunciar.
quem entendeu ele, já sabe o que vem por aí.
quem não entendeu, é....
prepara.



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 CORPO DE GAARA ESTACOU diante da porta entreaberta. Olhos pálidos fitaram a figura de dois jovens deitados casualmente na cama. O dono das iríses cor-de-céu abraçava confortavelmente o rapaz de fios escuros e — para o espanto do Sabaku — carregava uma expressão serena, num sorriso tranquilo e despreocupado. Pequenas covinhas surgiam em suas bochechas e os globos azulados transpareciam uma leveza contagiante. Ele repousava a cabeça no corpo do outro, rindo de alguma coisa que Sasuke dizia, acompanhando pela melodia de The Cure, da Lady Gaga — proveniente do celular do Uchiha, ao que tudo indicava.

A cor fugiu do rosto de Gaara, quando identificou a mão branca afagando os fios dourados com doçura e zelo. O nervosismo correu por seu sangue ao constatar que Naruto permitia que o gesto continuasse — fechando suas pálpebras vez ou outra —, claramente apreciando aquele tipo de carinho. Um sorriso de canto preenchia a expressão de Sasuke e ele sequer parecia o mesmo rapaz ranzinza e orgulhoso que o ruivo havia topado minutos atrás. Não. Ele entregava-se a luz dócil que irradiava de Naruto, curvando-se ao carinhoso menino, aproveitando a paz que somente o Uzumaki conseguia fornecer.

O toxicômano franziu as sobrancelhas, agarrando-se à maçaneta da porta.

Ele sabia que o Uchiha tinha algum tipo de relação muito próxima com aquele que havia sido seu melhor amigo. Identificou isso no momento que seus olhos pousaram na camiseta dele, encontrando o desenho de um esqueleto gris, na forma de sapo. Uma pequena descolorização próxima a gola revelou ao dependente que aquela roupa era, de fato, a favorita do Uzumaki. Foi impossível não cerrar os dentes quando se lembrou dos ciúmes que o antigo companheiro de aventuras possuía acerca daquela peça. Ele recordava claramente que havia sido o único permitido a usar o tecido, pois Naruto era capaz de travar guerras por aquela vestimenta.  

Não foi necessário quebrar a cabeça para entender o que significava Sasuke estar usando sua roupa favorita. Ele era alguém definitivamente íntimo de Naruto.

A teoria ganhou veracidade quando os médicos anunciaram que o internado estava sofrendo apenas de um grau mais sério de anemia. Entre as lágrimas de Temari, as fungadas discretas de um choroso Sai, um suspirado aliviado de Shikamaru e a expressão chocada de Iruka — que sequer conseguia processar o significado daquelas palavras —, Gaara prontificou-se em estudar a reação daquele estranho rapaz de cabelos profundamente negros. A princípio, ele conseguiu esconder suas emoções, tomando a liberdade de conversar com os médicos enquanto o grupo preocupava-se em comemorar a recente notícia. Sua voz era firme, carregando uma boa dicção.  E foi usando termos estranhos que o Sabaku percebeu que ele causava temor nos médicos. Pela postura corporal dos jalecos brancos, Gaara conseguiu deduzir que Sasuke os intimidava, arrancando todas as informações que precisava.

Dando-se por satisfeito, o Uchiha liberou os doutores — simplesmente acenando com a cabeça, meneando e fazendo pouco caso dos profissionais em sua frente — e voltou-se para o grupo, suavemente sugerindo que Iruka deveria ser o primeiro a visitar o funcionário do fast-food. Os amigos de Naruto prontamente concordaram e, pelo sorriso mínimo que surgiu no canto de sua boca, o toxicômano soube que havia algo mais por trás daquela fala. Suas suspeitas foram confirmadas quando Iruka o agradeceu com carinho, indicando que ele deveria ser o próximo, decorrente de tudo que haviam vivido nas últimas horas. E foi então que Gaara entendeu tudo. Uchiha Sasuke era alguém perspicaz, inteligente e miseravelmente manipulador.

Nutrindo sentimentos raivosos por alguém tão singular, o dependente químico perguntava-se aonde caralhos o amigo havia encontrado aquele desgraçado, quando foi surpreendido pelo próprio Uchiha que — no momento que os médicos liberaram Iruka visitar o sobrinho —, aproveitou e pediu licença ao grupo, retirando-se. Voltou minutos depois, arquejando e quase sem fôlego. Uma cruel surpresa encontrava-se em seus braços: dois girassóis gigantes, que resplendiam como o sol naquele corredor sufocante e alabastrino. Era a constatação que o Sabaku precisava: só os mais íntimos de Naruto se preocupavam com as medíocres flores, já que elas significavam o mundo para o rapaz.

E Gaara sabia do significado de girassóis. Eles não eram um presente simples, um mísero ornamento ou uma decoração qualquer. Haviam promessas ali. O cintilante amarelo lembrava o Uzumaki que sempre era mencionado como o próprio sol e, como um girassol, dizia que Sasuke iria sempre procurá-lo. Era fácil para o Sabaku ler as entrelinhas, levando em conta que no passado ele próprio presenteara Naruto com centenas daquelas flores.

Não era difícil decifrar a mensagem que o Uchiha queria passar.

Analisando os olhos cerúleos de Naruto, reluzindo tão encabulados, Gaara não precisava refletir por muito tempo para concluir que a mensagem havia sido decifrada. O desgraçado atípico acertara em cheio ao presentear o amante de cafés com aquelas malditas flores. O Uzumaki era devoto das malditas plantas, tanto que era sabido que preferia passar fome a deixar de comprar suas azaleias e bicos-de-papagaio.

Gaara mordeu os próprios lábios lembrando-se daquela informação e girou nos próprios calcanhares, recusando-se a continuar assistindo o agradável momento que os dois compartilhavam. Ele caminhou para um banco próximo, procurando ocultar sua presença para médicos e enfermeiros, fingindo que era apenas mais um enfermo que tinha recebido alta e aguardava pelas papeladas finais de liberação. Os profissionais, diante de sua face doente e miserável, simplesmente o ignoravam e o Sabaku comemorava internamente, agradecendo aos conhecimentos que uma vida preso em hospitais trazia. Fora assim que se arrastara para o quarto do amigo, sem que ninguém o notasse.

Sentando-se no desconfortável assento, o rapaz procurou ignorar o lapso de dor na barriga. Um pequeno presente de um antigo colega de gangue, que quase havia fodido sua vida. Felizmente o desgraçado tinha uma desprezível mira e acertara o tiro no lugar errado, poupando o dono dos fios escarlates de despedir-se tão cedo de seus amigos e família.

Droga, aqueles pensamentos estressantes sempre o faziam querer fumar.

Agarrou as próprias mãos, tentando destruir aquelas reflexões. Não. Ele não poderia ter outra recaída. Devia isso à sua irmã, que o tinha recebido com tanta preocupação, buscando-o no aeroporto e deixando que seus braços o envolvessem em um intenso abraço. O ato de carinho fez Gaara sentir-se cheio de vida, como se pudesse enfrentar o mundo. Ela não o julgou, não o ofendeu, pelo contrário, mostrou paciência ao perdido irmão. Shikamaru seguiu-a, indicando que estariam ali quando ele quisesse conversar e se abrir. Devia isso a Naruto, que o salvara daquelas vis ruas, jogando-se em antigos inimigos, enfrentando uma tortuosa luta corporal, apenas para que Gaara saísse vivo e bem. Não podia magoar o amigo, que escutara suas desprezíveis desculpas. Não podia falhar com ele, que sempre ignorava o mal que habitava o Sabaku, preocupando-se unicamente em exprimir felicidade pela volta do toxicômano.

No entanto, não era fácil.

Os pensamentos corriam por lugares perigosos, lembrando-o da paz acolhedora que seus olhos contemplaram naquele quarto tão próximo. Afundando as mãos no bolso da calça, foi inevitável a Gaara não sentir inveja. No entanto, um cruel questionamento tomou conta da corrente de reflexões. A princípio, o rapaz tentou fugir, cessando-o, mas a semente já tinha sido plantada e restou deixá-la crescer, guiando-o pelo caminho que construía com seu florescimento, trazendo à tona memórias e lembranças.

Sim, era notório o quão íntimo Sasuke era do Uzumaki.

Entretanto, ele nunca veria o brilho tão divertido que tomava conta dos olhos que reluziam como o céu, quando um simples cigarro brincava na ponta de seus dedos. O perspicaz rapaz jamais visualizaria Naruto deitado, com um edredom cobrindo sua cintura, exclamando em prazer quando o simples sabor do chocolate explodia em sua boca, preenchendo seu paladar. Naquele tempo, eles eram livres e aproveitavam ao máximo sua condição.

Deixando que as memórias fluíssem, Gaara foi transportado ao passado.

Naqueles dias mais simples, eles dividiam um quartinho numa espelunca pútrida e era comum que encontrassem as roupas largadas pelo chão, já que os dois ocupavam-se em passar o máximo de tempo possível na cama. Eram odiados pelos vizinhos que — por incontáveis vezes — esmurravam a velha porta de madeira, furiosos pelos barulhos altos que suas músicas produziam, evidenciando o sexo e a demais obscenidades. Para a infelicidade dos moradores, eles não se importavam, aprisionados na densa fumaça que preenchia o quarto por completo.

Algumas vezes Naruto tentava despistá-la, ligando o ventilador e abrindo a janela. Contudo, Gaara não se importava, já que ficava fascinado em como as órbitas do amigo pareciam dois planetas brilhando na escuridão constante que ela trazia. As esferas reluziam, extraordinárias e belas, naquele estilo de vida que levavam. Elas pareciam silenciar os monstros que acompanhavam Gaara, desaguando no mar frio e gélido que eram seus próprios olhos. Naqueles momentos, os olhos de Naruto traziam calor e aqueciam a vida do rapaz de cabelos escarlates.

Ele gostava de como o amigo o fazia sentir-se útil nas coisas mais simples, como quando se curvava para si, trazendo em seus lábios um bico birrento e infantil. O Sabaku sempre sorria, contendo uma sonora gargalhada, quando encontrava em suas mãos o pequeno bong de vidro dos dois já preparado com água e abastecido. Quando isso acontecia, Gaara rapidamente buscava seu cigarro, ajudando-o a colar os lábios no bocal e permitindo que o fogo consumisse a erva no fornilho (cujo sempre lhe lembrava da aparência de um funil). Não importava quantas vezes fizesse aquilo, sempre caía em êxtase quando o Uzumaki fechava as pálpebras e inalava lentamente a fumaça. Com calma, ele a segurava dentro de seus pulmões e então relaxava, erguendo a cabeça e abrindo os olhos, soltando-a na forma de pequenos círculos, que preenchiam o quarto e se dissipavam gradualmente no ar. Sempre agradecia, afirmando o quão complexo e difícil era segurar o purificador, usar o isqueiro e fumar ao mesmo tempo.

Na verdade, tudo não passava de uma questão de prática e experiência, mas Gaara via-se incapaz de dizer qualquer coisa, seduzido por aquele puro menino que começava a mergulhar nos efeitos da poderosa planta. O índigo adquiria uma profundidade atraente e ele encostava-se melhor na cabeceira da cama, fitando o teto e deleitando-se na própria vibe.

— Bateu? — O ruivo lembrava-se de sussurrar cheio de expectativas — Quer que bole outra? Posso bolar um cigarro, se quiser.

— Está bom assim. — A resposta vinha num tom sonolento, mas adorável.

Os dois sorriam e Sabaku via-se seguindo os passos dele, encontrando-se largado no colo do Uzumaki minutos depois. Naruto dedilhava seus fios escarlates com carinho e eles riam sem saber o porquê. A maconha produzia uma paz confortável para aqueles dois que raramente podiam desfrutar do sossego e da tranquilidade.

— Ei, pensei em algo engraçado. — Era comum que o dono dos fios dourados murmurasse, deixando que seus olhos repousassem no companheiro. Gaara arrumava sua posição e dedicava toda a atenção do mundo a ele, deixando que soubesse que estava genuinamente interessado em suas teorias e conspirações — É sério, vai revolucionar o mundo, tebbayo!

— Igual aquela vez que você disse que a fumaça e os efeitos circulavam no nosso corpo eram como setas? Setas amarelas, vermelhas e azuis? E que somente os protozoários conseguiam enxergá-las? — Questionou, recordando-se como o Uzumaki o levara a acreditar que sua teoria fazia sentido e era, de fato, verdade.

— É melhor ainda. — Afirmou risonho e foi difícil não ser seduzido por ele.

— Manda.

— É sobre nossa vida. — Começou, meio hesitante. Gaara segurou sua mão, encorajando-o — É como se houvessem gigantes faróis vermelhos em todos os lugares. Estão todos com um gigante vermelho lampejando para nós. — Murmurou e o timbre de sua voz soou falho. O Sabaku o abraçou, incentivando-o a continuar — E há nós. Eu sou um fusca amarelo e você um fusca vermelho.

— Quero ser um Camaro. — Protestou preguiçoso, achando graça do modo como Naruto enxergava os dois — Um potente e radiante Camaro.

— Não, cabeça-de-fósforo! Nós somos fuscas! — Afirmou, manhoso. Gaara riu — Enfim, nós seguimos por um monte de ruas, avenidas, estradas, trilhas... Andamos por montanhas e vamos até pelo mar. E lá estão eles, os faróis vermelhos, brilhando furiosamente para nós.

— E o que isso significa?

— É uma mensagem do Universo — Explicou com respeito ao Cosmos — Ele quer que fiquemos por aqui. Não precisamos fazer muita coisa, estamos bem um com o outro. Quando tentamos nos mover, dá tudo errado e voltamos para a estaca zero... Pois é aqui que devemos estar. — Concluiu, usando os braços para indicar aquele quartinho. Usando os dedos para apontar para ele e o companheiro.

Gaara lembrava-se de seu coração batendo mais forte com a possibilidade do significado daquela informação. Ele nunca iria se esquecer de como ele e Naruto rolaram pela cama, após aquela declaração, permitindo-se explorar o corpo um do outro, deixando que os toques modestos — mas intensos — anunciassem o que as palavras não podiam explicar.

Por isso, Sasuke nunca iria entendê-lo como o próprio ruivo. Os toques do Uchiha jamais iriam captar o que havia por debaixo da pele de Naruto. Por mais que aprendesse o significado de cada cicatriz que habitava o corpo do loiro, nunca compreenderia sua verdadeira essência, pois havia sido Gaara a estar presente — acompanhando os machucados e os hematomas que maculavam a pele do Uzumaki — recusando-se a abandoná-lo. Ele que cuidara, com dedicação e zelo, de cada parte de Naruto. Nas noites que o companheiro se curvava perante as dores e maldades da vida, era Gaara que estava lá para ampará-lo. No pior momento de todos, havia sido o Sabaku a ajudá-lo. Sasuke nunca aprenderia sobre isso. Quando descobrisse sobre a tatuagem perfeitamente delineada em sua barriga, não desconfiaria dos motivos que levaram o loiro a escolhê-la. Sequer se passaria por sua cabeça que aquele desenho carregava o peso do mundo em seu significado, sendo produzido no momento mais doloroso da vida daquele que tinha em seus olhos o paraíso.

Além do mais, ao contrário do pomposo Uchiha, Sabaku no Gaara e Uzumaki Naruto haviam criado uma conexão que nem mesmo a morte seria capaz de separar. Nos longínquos dias livres, infernais e divertidos, além de promessas e segredos compartilhados, eles cravaram na própria pele o resultado disso.

O kanji rubro de amor em sua testa e o desenho complexo do loiro em sua barriga eram os símbolos vivos da aliança entre eles.

Gaara tocou-o com afeição.


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