O quinto ano finalmente se iniciara para Hermione. Fazia apenas uma semana que haviam voltado e ela já se encontrava enfiada nos livros da biblioteca outra vez. Obviamente aquilo estava muito errado. Gina soltou um suspiro. Não podia deixar as coisas assim. Desencostou do batente da porta de entrada e foi caminhando na direção da amiga.

— Oi, Mione.

— Gina. – A mais velha fez um aceno com a cabeça.

— Não vai nem olhar para mim?

Apertou os lábios nervosa. Sabia sobre o que a ruiva queria falar, sabia que ouviria reclamações e sabia também que elas tinham fundamento. Ok, talvez fosse bom conversar com alguém, já que estava há horas sentada naquela mesa e mal conseguira ler um capítulo.

— Vamos lá fora. Só vou arrumar minhas coisas.

— Vou te esperar ali na frente. E nem pense em tentar fugir, Granger!

Ótimo. Respirou fundo antes de terminar de guardar o que precisava na bolsa e ir para os jardins com sua amiga. Melhor amiga, na verdade, desde o ano passado, quando começou a ajudá-la a “superar Harry”, entre aspas, porque para ela estava mais para “pegar geral”. Não que pudesse julgar. Os caras não se importavam, Gina também não, e ela estava feliz e isso era o que importava.

— Pode ir contando tudo!

— Não sei do que você está falando, Gina.

— Veio até aqui só para me enrolar?

— Eu não estou enrolando!

— Tá bom! Se você não fala, eu falo: por que tá me evitando desde o começo das férias?

— Eu não estou te evitando!

— Você não respondeu nenhuma das minhas cartas.

— Eu estava ocupada.

— Nas férias?

— Sim. Você sabe que eu gosto de ler alguns livros antes de...

— Tá, tá. Você não falou comigo depois que voltamos pra Hogwarts também.

— Eu estou ocupada.

— Lendo também? Porque não parecia que você estava fazendo isso lá na biblioteca.

— Eu me distraí um pouco, só isso!

— Com o que?

Pronto. Era a pergunta matadora. As duas sabiam bem do que se tratava e qual seria o rumo da conversa desde o início, mas Hermione era cabeça dura demais para admitir assim de cara e Gina sabia que se não cutucasse com cuidado, a amiga não abriria o bico.

— Você sabe...

— Tem a ver com os seus sumiços na semana em que um certo alguém foi embora?

— Talvez...

— Hermione!

— Tem! Satisfeita?

— O que aconteceu? Vocês transaram?

— Ginevra!

— Fala logo!

— Eu não sei por onde começar. E não, nós não fizemos sexo!

— Que sem graça...

— Gina, chega!

— Desculpa. Mas vocês ficaram pelo menos?

— ... – Assentiu com a cabeça, apesar de não dizer uma única palavra.

— Eu sabia! Pode contar com detalhes!

— Você lembra do bilhete que ele me enviou?

— Aquele pedindo para te encontrar em algum lugar com privacidade? – Riu.

— Esse mesmo. – Sorriu lembrando. – Nós marcamos de nos encontrar a semana toda no mesmo lugar, no mesmo horário, já que era a última semana dele. E bom, você sabe...

— Não, não sei.

— Ah, o Viktor é uma pessoa bem reservada e isso sempre foi bem óbvio. Nunca foi de falar muito. Geralmente ele só ficava sentado, me vendo estudar, então quando nos encontramos sozinhos, sem aquelas garotas o perseguindo...

— E sem os livros para atrapalhar... – Interrompeu.

— Então, aí é que está o problema. Nós não conseguimos conversar direito.

— Mione, desde que me entendo por bruxa, quando se beija alguém a língua está ocupada demais para você conseguir falar.

— Mas nós não nos beijamos!

— Pera, que eu estou confusa. Vocês não ficaram?

— Sim, mas foi só um dia.

— Deixa eu adivinhar: no último.

— Não seja chata.

— Eu ainda não entendi o problema. Por que você quase tromba com todo pilar no corredor e não consegue nem estudar mais?

— Você não me deixa contar!

— Desculpa. – Abraçou a castanha.

— Nós marcamos a semana toda, com exceção da sexta, já que ele precisava arrumar as coisas para ir embora no sábado. Nós conversamos um pouco todas as noites e eu estava ótima. Até que foi legal.

— “Até que”? Deixa só as outras garotas saberem disso: Hermione Granger passou uma semana se encontrando com Viktor Krum todas as noites e “até que” achou legal. Eu já disse, você não pode esperar atitude de todos os caras, Mione. As mulheres têm que fazer isso também.

— Cala a boca, Gina! Enfim, meio que nos despedimos na quinta. Ele me deu um abraço e beijou minha mão, como sempre. Só que na sexta eu recebi uma carta dele pedindo para me encontrar uma última vez.

— E você ficaram.

— Sim.

— Foi bom?

— Foi muito bom... e estranho. Ele parecia meio nervoso no começo, estava falando mais do que de costume. Foi ótimo, a conversa fluiu melhor e então... – Começou a ficar vermelha.

— Vocês se pegaram.

— Eu não achei que ele pudesse ser assim.

— Assim como?

— Ele pegou na minha bunda descaradamente, Gina! E ainda me chamou de gostosa!

— E pela sua cara você nem gostou, né? – Ergueu uma sobrancelha.

— Não vem ao caso agora. O ponto é que eu não consigo tirar essa noite da minha cabeça. Foi tão... sei lá. Trocamos algumas cartas nas férias e até nos encontramos uma vez, mas não aconteceu nada.

— Como eu disse, as mulheres também têm que tomar a dianteira, Mione.

— É, eu sei. Só que não aconteceu.

— Talvez eu devesse retribuir a sua ajuda?

— Ah, não! Eu não vou sair por aí beijando todo mundo!

— Você não precisa fazer isso para superar ele! Nós podemos te arranjar alguém legal.

— Um só?

— É. E se não der certo, procuramos outro.

Hermione revirou os olhos. Já podia imaginar o que viria pela frente.

ϟ

Duas semanas desde o início das aulas e não tinha pegado ninguém ainda. Tudo bem que sua fama era baseada em mentiras – ou pelo menos uma parte –, mas não era esse o problema. Não conseguia tirá-la da cabeça. Por que tinha que ser tão malditamente bonita? Tão excitantemente inteligente? Por que tinha que beijar tão bem? Soltou um longo suspiro, que não passou despercebido pelo amigo.

— O que aconteceu, cara?

— Nada, Blás.

— Quase acabou com o oxigênio do mundo nesse suspiro.

— Idiota.

— É falta de irritar a Granger?

— O que quer dizer com isso? – Sobressaltou-se. O moreno lia mentes por acaso?

— Foi só uma sugestão. – Indicou, com a cabeça, a garota passando ali perto.

Ah, ele com certeza não perderia essa chance por nada no mundo. Correu até ela, deixando o outro para trás.

— Olha só, se não é a santinha sabe-tudo.

— O que você quer, Malfoy?

— Onde estão o cicatriz e o cabeça de cenoura? Esqueceram de pagar a babá? Por isso desistiu do emprego? Ou será que cuidar deles estava difícil até para você?

— Antes cuidar deles do que de alguém que não tem cérebro. Aliás, sempre quis saber: o que aconteceu com o seu? Encolheu tanto que caiu pelo nariz?

— Ora sua...

— Se precisa de ajuda para achá-lo, vá pedir para alguma das suas amiguinhas. Não tenho tempo para isso.

— Não é só porque você não pega ninguém que tem que falar nesse tom, Granger.

— Quem disse que eu não pego ninguém? – Amaldiçoou-se no mesmo instante. Hermione Granger e sua boca enorme.

— Pega alguém decente, pelo menos?

— Mais decente do que você, certamente. Apesar de que isso não é difícil.

— Por favor, você adoraria me beijar.

— Não sei em qual universo.

— Engraçado você dizer isso, quando parecia estar gostando tanto.

— Do que você está falando?

— Lembra de quando ficou com o Krum?

Pela varinha das varinhas, como é que ele sabia disso? Engoliu em seco. Não importava.

— Lembro, por quê?

— Poção Polissuco.

O loiro mordeu o lábio inferior, numa tentativa completamente falha de segurar um sorriso. Os olhos de Hermione se arregalaram e seu queixo foi ao chão.

— Não é possível.

Draco deu um passo para frente, chegando bem perto da garota.

— Pode tirar a prova quando quiser. – Foi tudo o que disse antes de se virar e ir embora.

ϟ

Havia se passado uma semana e nada de conseguir tirar aquilo da cabeça. Não podia ser, podia? Quer dizer, parecia completamente impossível e ao mesmo tempo fazia todo o sentido do mundo! E o pior é que ele tinha razão: só tinha um jeito de descobrir! Ok, essa parte era mentira. Ela podia apenas perguntar para Viktor, mas e se o que o Malfoy disse fosse verdade? E se essa fosse a oportunidade de repetir aquele puta beijo de tirar o fôlego? E era aí que entrava a parte que estava matando-a lentamente por dentro: ela queria testar. Queria tirar a prova, como ele dissera para ela.

— Hermione, tem certeza que está tudo bem?

— Tenho, Ron! Eu já falei, não tem nada de errado!

— É coisa da sua cabeça, irmãozinho.

Gina piscou discretamente para a amiga, que agradeceu a ajuda. A castanha teria soltado um suspiro, se não tivesse segurado o ar ao avistar o motivo de sua distração passar pelas portas do Salão Principal, coisa que não passou despercebida pela ruiva.

— Acho que já vou. – Levantou, deixando metade da janta no prato.

— Vou com você.

— O que as duas estão tramando? – Harry olhou desconfiado.

— Nada. – A Weasley deu de ombros.

Engancharam os braços e saíram andando sem rumo, até achar um corredor vazio – o que não foi difícil, considerando o horário.

— Pode contar que eu vi.

— O que?

— Vai ser ele mesmo? Eu não sei se é uma boa ideia, Mi...

— Do que você está falando, Gina?

— Tão inteligente, mas adora se fazer de sonsa, né? É óbvio que estou falando do cara que vamos arranjar para você e da olhada nada discreta que você deu para o Malfoy.

— Não viaja, Gina!

— Não estou viajando e não minta para a sua melhor amiga! Na verdade, eu apoio totalmente! Quem é que não gostaria de pegar aquele pedaço de mau caminho? Só acho que deveria tomar cuidado se a sua ideia é ficar com um só, porque esse não parece bem o estilo dele...

— Ficou tão óbvio assim?

— Não. É que eu te conheço bem demais. – Gabou-se jogando os cabelos ruivos para trás. – Sempre achei que vocês deveriam ficar.

— Por quê? – Hermione elevou a voz.

— Fala sério, Mione! Todo esse ódio sem motivo só podia ser tesão reprimido!

— Você entendeu tudo errado, o motivo do meu interesse não tem nada a ver com tesão reprimido.

— O que é então?

— Você não sabe o que ele me disse...

ϟ

Draco saiu da sala distraído. Não tinha prestado atenção em nada do que o professor dissera e nem ouviu os amigos chamando por ele depois do término da aula. Isso tudo porque estava preocupado: não devia ter contado aquilo para Hermione.

No calor do momento, a vontade de provocá-la foi maior, mas agora só via três finais possíveis:

Um - Não acreditou em nada do que ele disse e estava putíssima por achar que foi vista beijando o Krum.

Dois – Falou com o Krum e estava putíssima por descobrir a verdade.

Três – Acreditou em tudo e estava putíssima do mesmo jeito.

Nenhuma das opções era boa, mas ele não esperava que algo diferente pudesse acontecer, por isso, qual não foi a sua surpresa ao ser puxado para dentro de uma sala de aula vazia.

— Granger?

— Malfoy.

O que raios ela estava fazendo? Um lado dela gritava que tinha ficado completamente louca, enquanto o outro repetia as palavras de Gina: “as mulheres têm que tomar atitudes também”. Claro, sem falar na parte do tesão reprimido. Porra, Hermione, agora não dá mais para voltar atrás. E você nem quer mesmo.

— Finalmente decidiu tirar a história a limpo? – Utilizando o habitual tom sarcástico, ergueu uma única sobrancelha.

— Na verdade, sim.

Óbvio. Espera. Seu cérebro não processou as palavras dela com rapidez suficiente, e antes que pudesse questionar qualquer coisa, sentiu sua camisa ser puxada para baixo e os lábios dela encostados nos seus.

Não houve gentileza, delicadeza, ou qualquer paciência. O nervosismo e a ansiedade não deixaram espaço para isso. Antes que pudessem perceber, o loiro havia prensado o corpo dela contra a parede.

O que estava fazendo? Porra, Malfoy! O que aconteceu com você? Draco Malfoy nunca pega a mesma menina duas vezes! Mas lá estava ele, agarrando a Sabe-Tudo pela segunda vez e, esperava ele, que aquela não fosse a última.