Entreguerras escrita por Qualquer coisa


Capítulo 4
Capítulo IV - Coração de Nova York




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/754611/chapter/4

Capítulo IV

Coração de Nova York

 

Em algum momento, Stark parou de xingar e reclamar e deixou-se admirar a cidade. Estava acostumado a sobrevoa-la por milhões de motivos. E já tinha visto boa parte dos Estados Unidos dentro da armadura. Contudo, era a primeira vez que estava completamente vulnerável. Sentia o vento cortante no rosto e o corpo dolorido por estar agarrado a Steve, mas havia alguma coisa de belo em estar voando desprotegido. Conseguia sentir a cidade. Sentir o ar que respirava. Principalmente, sentir a si mesmo. E aquela sensação de paz voltava forasteira, saindo dos encaixes da armadura para se instalar em seu corpo. Até que soasse simplesmente natural estar voando nos braços de Capitão Rogers. E, desta vez, não afastou a sensação.

Sob as estrelas – e em completo silêncio, senão pelas conversas de Steve com Jarvis – encantaram-se com o Central Park e com a Times Square; rodearam a estátua da liberdade e o Empire State Building. Em algum momento, passaram extremamente perto da ponte do Brooklyn, observando os carros que ainda iam para algum lugar e um ou outro transeunte que parecia perdido.

— Você veio do Brooklyn, né? — Tony acabou perguntando.

— Vim... — Steve murmurou, voltando ao ponto de partida.

— Sente falta daquela época? Da sua época?

— Os anos quarenta foram difíceis..., não sinto falta da época... sinto falta do que eu perdi...

— Sinto muito pela agente Carter... não conheci ela, mas depois do que houve... bem, acabei descobrindo sobre... — Por algum motivo, Howard sempre protegera a mulher. Chegou até pensar que poderia existir algum envolvimento romântico, mas o homem morria de amores por sua mãe.

— Não é só ela... é tudo...

— Tudo?

— Eu perdi a vida toda que deveria ter sido minha...

— Mas agora tem a chance de ter ela de volta!

— Não é a mesma coisa...

— Por que não? — Sem perceber, Tony se exaltava. — Era pra você estar morto! E você não está! Deveria aproveitar isso... não sabe quanto tempo sua vida ainda vai durar...

Quando Steve não respondeu, Tony teve certeza de que disse algo de errado. Engoliu seco e tentou encarar a cidade, fugindo da culpa. Não queria magoar o Capitão... ou cair novamente naquele abismo profundo que costumava a mantê-los distantes... e, ainda assim, não sabia o que dizer para afastar aquele clima. Olhar a cidade não ajudava, pois todo seu brilho soava insignificante sem a admiração da companhia. No fundo Nova York se tornava bela por estarem se aproximando, de alguma forma, não por todas suas torres exageradas ou pessoas frágeis. Estar ali em cima com o Steve foi um dos poucos momentos em que não se preocupou em salvar o mundo... em que não sentiu aquele tão comum pavor da vida... não queria deixar aquela paz ir embora. Steve era a única paz alcançável no momento.

— Desculpe...

— Você tem razão... — interrompeu-o. — Eu tenho uma segunda chance... uma chance pra fazer diferente... pra ver diferente... pra sentir diferente... mesmo com tudo o que eu perdi, de alguma forma, Deus ainda me deu essa chance. Sei que não acredita muito, tudo bem, mas eu acredito. E eu acredito que essa é a chance que eu tenho pra fazer as coisas certas... pra consertar o que eu não vi se quebrar... pra ser...

Steve não conseguiu concluir a frase. Tampouco queria. Ainda queria esconder no fundo da alma aqueles sentimentos errados. Apagá-los como apagou quando amou Peggy. Esquecê-los como se pudesse congelá-los pelo resto da vida. E queria acreditar nisso, até certo ponto. Queria voltar à normalidade que sonhou quando esteve ao lado da agente. Por segundos até cogitou que a segunda chance era para que seguisse aquele plano: casar, ter filhos, salvar o mundo no tempo intermédio. Contudo, lembrar-se de Buck e da luta que travaram... de como os olhos dele ainda despertavam algo que não entendia... de como ainda existia alguma coisa dentro do corpo que se impulsionava para salvá-lo, protege-lo... era simplesmente automático querer cuidar dele... querer ele... e se ele estava vivo em algum lugar, talvez essa fosse a verdadeira segunda chance de sua vida. Não aflorar aqueles sentimentos, mas não se afogar na vontade de escondê-los. Aquele século era um completo mundo novo. E tudo soava muito mais simples do que na época em que viveu. Talvez, mas apenas talvez, Deus estivesse dizendo, de alguma maneira, que aquele era o lugar onde poderia ser quem realmente era. E se não fosse com Buck, seria na torre Avengers, salvando a Terra com tudo o que podia e se deixando sentir-se bem por ter Stark nos braços... por poder proteger alguém, mesmo que por segundos, mais uma vez. No fundo ainda era um homem das antigas, gostava de cuidar.

— O que você quer ser? — Tony só teve coragem de perguntar quando pousaram no topo da torre, o mesmo lugar no qual Loki abriu um buraco nos céus. Péssimas lembranças.

Sem responder, Steve soltou o homem no chão e pediu que Jarvis abrisse a parte do rosto da armadura. Agora podia ver apenas Stark e as estrelas da madrugada que dominava o céu. Estranhamente, era uma visão linda.

Stark suspirou, frustrado por não obter a resposta. Odiava ser ignorado. Contudo, não cortou o clima que seus olhares causavam. Aquela paz voltava a preencher o lugar, como se não estivessem a céu aberto. Moveu a mão para que a armadura saísse do corpo forte e ficasse montada num canto mais afastado, afinal, talvez fossem precisar dela.

— Eu quero ser eu mesmo... — Steve respondeu repentino, parando de olhar a imagem como infinito para ter os olhos apenas no homem de ferro. — Longa história. — Deu de ombros.

— Eu te ouvi falar por horas da Hydra, não tem como ser mais longa que isso! — Brincou e Steve riu nasalmente, negando com a cabeça.

E mais uma vez ficaram apenas se olhando. Contudo, Tony estava cansado demais para não se entregar àquela paz desta vez. Já não aguentava mais sentir medo o tempo todo, sempre imaginando que a qualquer momento iria perder todos que amava. Não iria aguentar nenhuma perda e sabia disso. E esse medo começava a tomar proporções tão irracionais que imaginava Steve caindo nas chamas onde antes viu Pepper. Imaginá-lo queimando para morte, mas sem o final épico da volta, era torturante. Pior, mas torturando que perder a ex-namorada. Precisava assumir a si mesmo que os sentimentos pela Potts se tornavam cada vez mais afeição e cada vez menos amor. Em algum momento aquela paixão se foi, ficando apenas a admiração e o orgulho para não terminar. Mas ela já dera o passo inicial, bastava apenas que aceitasse.

Dentre tantas coisas que precisava aceitar, também estava a beleza daqueles malditos olhos azuis. E sempre odiou a cara perfeitinha de Steve. Aliás, dizia odiar. Havia algo naquela gentileza que o irritava ao ponto de tentar desprezá-lo. No fundo, desde que o conhecera, queria apenas aumentar aquele abismo entre os dois porque seria mais fácil para lidar. Se não amasse, não iria precisar temer tanto perder alguém. Sempre gostou de Pepper, mas nunca temeu a morte dela. E agora estava querendo criar inteligência artificial por ter pesadelos com Steve morrendo. Era loucura. Era quase problemático. Contudo, sempre fora um cara cheio de problemas, óbvio que iria querer o homem congelado por setenta anos que não sabe diferenciar mensagem de spam.

Sem perceber, riu baixo, desviando o olhar para baixo. E, infelizmente, o abaixo dos olhos eram os lábios rosados e meigos do Capitão. Há meses tentava afastar quaisquer pensamentos envolvendo qualquer parte do corpo daquele homem. Fingia que o corpo delineado não era um colírio para os olhos, ou que os sorrisos não eram artes em exposição.  Fingiu por muito tempo. Apagou cada faísca que ansiava se ascender e afogou todas as sensações no fundo da alma que não tinha. E agora estava ali, em frente aqueles lábios chamativos, próximos o suficiente para poucos passos transformar aquele abismo num beijo. Queria ter coragem de avançar no jovem cristão, mas não conseguiu mover-se um passo, mesmo quando voltou a se perder no azul daqueles olhos que não se desviavam nem para piscar. Ele também parecia hipnotizado e não sabia se era mútuo ou se ele estava apenas pensando.

Até que ele se afastou alguns passos, rindo desconfortável, abaixando a cabeça, coçando a nuca. Parecia afetado. Algo entre os dois deveria ter queimado a santidade do católico rapaz. E apenas não o provocou porque os passos afastados quase o deixaram na beira do prédio, então precisou ser rápido o suficiente para segurar Steve pelos braços e puxá-lo para si. Poderia ter se afastado, claro, mas preferiu colar os corpos já que tinha uma desculpa.

— Quer morrer é? — Fixou os olhos nos dele mais uma vez. Agora a proximidade era tanta que sentia não só a paz, mas o calor que emanava daquele corpo.

Não saberia dizer se infelizmente ou felizmente, mas quando Steve abriu a boca para responder colou os lábios aos dele. No fundo quase se sentiu culpado. Deveria ter perguntando antes. Sabia o quanto a cabeça dele poderia queimar com os pensamentos do século passado. E apenas quase porque Steve envolveu os fortes braços em sua cintura, colando de vez os corpos antes de aprofundar o beijo. Finalmente entendeu o que ele queria dizer com não estar morto. Definitivamente, ele não estava. E ainda beijava bem para porra!

Não teve vergonha alguma ao estender a mão para a nuca dele, puxando-o para que pudesse guiar o beijo também. A outra mão apertou o braço forte ao redor do corpo, quase ofegando ao sentir o quão gostoso ele era! Se pudesse, ficaria naquele beijo o resto da noite, do dia, da vida... ficaria! Era bem possível respirar pelo nariz, ou nos momentos em que se afastavam com selinhos porque nenhum tipo de beijo soava o suficiente naquele momento. Ali percebeu que Steve também estava se afogando por muito tempo e, juntos, finalmente, encontravam libertação. E a liberdade tem gosto do paraíso!

— Senhor?

Quando jurou que poderia ficar a eternidade beijando Steve, a voz de Jarvis pareceu sair de dentro da própria mente. Ignorou, mesmo quando o Capitão quase se afastou para atender ao chamado. Maldito certinho! Por sorte conseguiu prendê-lo na própria língua quando não deixou o beijo parar. Jarvis que se fodesse!

— Senhor, desculpe interromper, mas acaba de receber uma mensagem muito importante.

E, apenas para não parar o beijo, Stark ergueu o dedo do meio como se Jarvis estivesse tagarelando logo atrás de Steve. Sabia que se parassem ali, talvez nunca mais voltassem! Talvez aquela liberdade fosse ser esquecida, afogada novamente. Sabia que era muito para a cabeça do Capitão, era muito para a própria! Então nem ferrando que iria deixar aquele momento acabar, mesmo com Steve rindo ao tentar se afastar. Em pouco tempo já sabia onde ele gostava de sentir a língua para voltar ao beijo em instantes.

— Senhor... parece ser importante... acho que vai querer ver... é sobre o Cetro de Loki...

No mesmo instante o beijo foi esquecido. Havia apenas uma coisa maior do que estar se agarrando com Steve, o pavor que a luta de Nova York o trazia. Afastou-se do corpo quente para caminhar em direção a entrada. O corpo ainda queimava e a mente ainda estava dominada pela presença do Capitão, mas não podia abandonar o trabalho por amor.

— Como sabe disso? — perguntou, sabendo que era seguido por Rogers.

— A mensagem é de Thor...

— Thor? — Steve não conseguiu se conter. Também se preocupava. O suficiente para não precisar pensar sobre aquele longo beijo.

— Ele mandou uma mensagem enquanto estavam fora, mas não quis interromper... o momento...

— Jarvis, só mostre a mensagem!

Algum dia, talvez não tão próximo, teriam que conversar sobre o beijo. Contudo, naquele momento, ambos concordavam que salvar o mundo – de novo – era mais importante. Ainda mais envolvendo aquele maldito cetro novamente!


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

FIIIIIIIIM....
Sem cena pós-crédito porque, né... não mito tanto quanto a Marvel..., mas espero que tenha gostado Camy... mesmo...



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Entreguerras" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.