As Redfield: O Leão, A Feiticeira e O Guarda-Roupa escrita por LadyAristana


Capítulo 11
Capítulo 11




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Quanto mais caminhavam, mais e mais a primavera se mostrava presente. Havia flores por todos os lados e as dríades vinham fazer festa para os humanos com lufadas de cheiros florais e pétalas esvoaçantes.

Em algum ponto, as tranças de glicínias de Clarissa e Lúcia se soltaram com a brisa.

O colorido ensolarado era um descanso para as almas de todos, que foram recebidos no acampamento de Aslam pelo soar solene e alegre de uma trombeta.

Um mar de tendas vermelhas, verdes e douradas se estendia até onde a vista alcançava com diversos estandartes dançando ao vento. Estandartes vermelhos e dourados, com o Grande Leão rugindo como no escudo de Pedro.

Junto do clangor de armas, também podia ser ouvido o trinar de flautas e a melodia de harpas e junto com o cheiro de grama e metal fundido, vinha um cheiro delicioso de ensopado que fez os estômagos de todos roncarem.

Uma última dríade de pétalas cor de rosa passou brincando com os cabelos de Clarissa e Lúcia, que gargalharam antes de acenar.

Os mais velhos se entreolharam quase não acreditando na paisagem gloriosa diante deles. Haviam visto muita coisa em seu curto tempo em Nárnia, e ainda assim ficavam maravilhados com cada nova amostra da magia indescritível do lugar.

As menores estavam encantadas de um jeito diferente. Era como se Nárnia fosse a concretização de tudo aquilo que sua imaginação já criara e mais. Como se as duas tivessem nascido para aquele momento.

Conforme avançavam acampamento adentro, recebiam olhares boquiabertos e solenes. Olhares de pessoas que só tinham esperança da boca para fora. Olhares de quem havia reencontrado a própria fé.

Ora, e não é isso o que acontece com todos nós quando passamos por um período muito difícil? Nossa fé passa a ser da boca pra fora, porque no fundo do coração não acreditamos de verdade que as coisas vão melhorar até que acontece um milagre.

Pois os narnianos conheciam muito bem esse sentimento, e bem diante deles estava seu milagre. E porque havia-lhes sido devolvida a fé, seguiam os humanos como os seguiriam para batalha e para vitória ou derrota. Seguiam seus milagres.

— Por que estão olhando pra nós? – perguntou Susana com um sorriso sem graça.

— Talvez achem você engraçada. – Lúcia respondeu com um sorrisinho de moleca arrancando risos de todos.

— Talvez achem a Sofia bonita. – brincou Pedro logo antes de ficar da cor de um tomate.

— Claro que acham a Sof bonita. Ela se parece comigo afinal de contas. – disse Clarissa espertinha.

— Eu concordo com a Lúcia. Eles acham a Susana engraçada. – falou Sofia sabendo que todos podiam ver o rubor em suas bochechas.

— Uma de nós tem que ser, porque você com certeza não é. – Susana disse em defesa própria esbarrando de leve no ombro da amiga, que riu junto com ela.

Continuaram avançando acampamento adentro, Sra. Castor tentando pentear o próprio pelo desesperadamente diante de tantos olhares.

— Ei! Deixe de bobagem. – repreendeu o Sr. Castor. – Você está linda!

Quando finalmente chegaram diante da tenda principal, foram recebidos pelo olhar de escrutínio de um majestoso e imponente centauro.

Pedro tomou a frente e desembainhou a própria espada a levantando à frente, talvez em uma tentativa de se sentir mais confiante e parecer tão imponente quanto o centauro.

— Nós viemos para ver Aslam. – declarou o Pevensie aliviado que sua voz não tremera.

Após um segundo de silêncio, a resposta do centauro foi olhar para a entrada da grande tenda vermelha e amarela com lindos bordados dourados.

Os olhares dos humanos seguiram, até que o barulho de metal raspando em metal os fez olhar para trás, onde toda a multidão que os seguia colocava-se de joelhos.

Quando voltaram a olhar a tenda, dela saia um dourado e majestoso leão. O maior leão que já haviam visto.

Aquele mesmo sentimento voltou, tocando cada um em seu íntimo e compreenderam que estavam diante de um soberano. Do Soberano.

E compreenderam que assim como toda a multidão se curvava em respeito e humildade perante o Grande Leão, deviam fazer o mesmo, pois assim como era rei sobre Nárnia, Aslam era – de alguma forma – rei sobre eles também. Então dobraram os joelhos diante dEle.

— Bem-vindo Pedro, Filho de Adão. – a voz de Aslam pairou sobre eles como uma brisa suave e seu olhar foi a confirmação de que tudo ficaria bem. – Bem-vindas Susana, Lúcia, Sofia e Clarissa, Filhas de Eva. E sejam bem-vindos, Castores. Agradeço a vocês. Mas onde está o outro?

Nenhum dos humanos se atreveu a olhar para Aslam diante daquele questionamento. Levantaram-se com os olhos pregados no chão.

Sofia sentiu um gosto horrível na boca. Um gosto de vergonha e culpa. Ela fora má e mesquinha com Edmundo de propósito e agora, diante de Aslam, seus motivos para tal pareciam ser simplesmente idiotas.

— Por isso viemos, senhor. – a voz de Pedro atraiu a atenção de Sofia. – Precisamos de ajuda.

— Nós... Tivemos um problema pelo caminho. – disse Susana.

— Nosso irmão foi capturado pela Feiticeira. – falou Pedro e imediatamente arrependeu-se da mentira.

— Capturado? – Aslam questionou sabendo bem o que realmente acontecera. – Como aconteceu?

 Talvez Edmundo recebesse misericórdia se não achassem que ele era um traidor, mas atingiu Pedro a realização de que exatamente por ser um traidor, Edmundo receberia muito mais misericórdia. O rapaz abaixou a cabeça, tão envergonhado que perdera a coragem de falar.

— Ele... Os traiu, Majestade. – disse o Sr. Castor e uma comoção de rugidos, rosnares e grunhidos tomou a multidão.

— Então traiu todos nós! – o centauro pronunciou-se finalmente, absolutamente indignado.

— Paz, Oreius! – ordenou Aslam com um breve rosnar antes de voltar-se para os humanos. – Sei que existe uma explicação.

Clarissa abriu a boca para falar, mas fechou novamente, percebendo que aquele não era o momento para dizer algo de seu extenso repertório de coisas ruins que pensava sobre Edmundo. A menina começava a entender que Edmundo não era de todo mal, e que na verdade ele fora levado a fazer tudo o que fazia por não saber como lidar com o quanto a situação da guerra o assustava.

— Foi minha culpa. – declarou Pedro. – Fui severo com ele.

— Todos nós. – disse Susana apoiando a mão no ombro do irmão em conforto.

— Não pode assumir toda a culpa por algo que não fez sozinho. – Sofia concordou direcionando a ele um sorriso fraco.

— Senhor, ele é nosso irmão. – disse Lúcia. Era uma afirmativa, mas também um pedido.

— Eu sei minha querida. – Aslam respondeu com os olhos cheios de amor e pesar. – Mas isso torna a traição pior ainda. Será mais difícil do que pensam.

Uma nuvem escura pareceu se instalar sobre os Pevensie, e Clarissa alternou o olhar entre Aslam e a cara chorosa de sua melhor amiga.

— M-mas vai ficar tudo bem, não vai? – ela questionou. – Nós, e o Sr. Tumnus e o Edmundo... Vamos ficar todos bem, não vamos?

— Sempre existe esperança, querida. – disse Aslam com um olhar carinhoso para as pequenas, antes de recuperar sua postura de imponência. – Oreius, providencie que sejam acomodados.

— Sim, Majestade. – concordou o centauro com uma breve reverência e fazendo sinal para que o seguissem.

— Sofia. – Aslam chamou antes que ela pudesse se juntar ao grupo. – Caminhe comigo.

A moça assentiu, sem ousar questionar e lançou um breve sorriso aos outros antes de juntar-se ao Grande Leão, que a guiou pela borda do acampamento na direção oposta em passos lentos. Ela permaneceu quieta por alguns momentos, refletindo sobre o quanto a majestade de Nárnia era pequena perto de toda a glória que Aslam exalava.

— O senhor deseja falar comigo? – perguntou Sofia trançando as mãos um tanto quanto insegura.

— Eu falo com todos aqueles que têm o coração aberto a me ouvir. – respondeu Aslam. – Você veio com seus amigos para ajudar Edmundo, minha querida?

— É o que disse a mim mesma por um tempo, sim. – Sofia começou hesitante, após ter pensado um pouco. – Também disse a mim mesma que queria ajudar nosso amigo, o fauno Tumnus, o que não é mentira. O senhor vê: ele sim foi capturado pela Feiticeira por ter ajudado as pequenas.

— Em tempo devido, prometo ajudar seu amigo. Mas pela forma como falou, nenhum desses é seu real motivo. – disse Aslam com um tom de sorriso em sua voz.

— De fato, não... – a menina franziu a testa antes de prosseguir. – Acho que em minha cabeça estava inventando explicações que seriam razoáveis para os adultos, porque eu na verdade não quero ir embora.

— Mesmo com todas as desventuras que tiveram desde que chegaram em Nárnia? – perguntou o Leão.

— Ora, mas todas essas desventuras aconteceram apenas porque Edmundo não foi sábio ao escolher seus amigos. – ela respondeu. – Embora não se deva supor o que teria acontecido se esse não fosse o caso. É sempre muito ruim pensar no que teria acontecido. Evito fazê-lo sempre que posso.

— É uma decisão muito inteligente, Sofia. – concordou Aslam, e então parou, olhando diretamente para a menina. – Existe algo que pesa em seu coração, minha querida? É a profecia?

— Oh, não! – Sofia apressou-se em negar. – A profecia não pesa tanto sobre mim quanto pesa sobre meus amigos, porque são eles quem devem governar. Eu... Eu sou apenas uma conselheira. O que me incomoda mesmo é... Aslam, por que recebi espadas como presente?

— Eu entendo seu dilema, Sofia. Assim como você, eu também escolheria que ninguém se machucasse se eu pudesse. Infelizmente, vivemos em tempos em que precisamos machucar uns para cuidar de outros. – falou o Grande Leão olhando a menina nos olhos. – Você, sempre evitando o conflito, recebeu espadas, minha querida, para que aprenda que alguns inimigos devem ser encarados de frente, com assertividade e coragem. Não digo isso porque quero que se torne impiedosa, mas sim para que se torne uma melhor conselheira.

A moça assentiu, o sentido daquilo tudo se formando em sua cabeça:

— Uma boa conselheira real sabe ser diplomata e soldado, para que assim se balanceie um com o outro. Por isso também recebi o diário. A pena e a espada.

— É uma menina muito astuta, Sofia. – disse Aslam, Sofia podia jurar, sorrindo.

— Não sei se quero ser conhecida por ser astuta, Aslam. – ela sorriu com sinceridade. – Aqueles conhecidos por astutos são conhecidos também como traiçoeiros. Se for para ser um dia conhecida como alguma coisa, prefiro ser conhecida como boa e sábia. E mais do que ser conhecida como sábia, quero ser sábia.

— Suas palavras provam que já é, minha querida. – dessa vez junto com um sorriso, havia um brilho satisfeito no olhar de Aslam. – Vai encontrar sua tenda na próxima esquerda. Ela tem lírios, margaridas, gipsófilas e lavandas bordadas. Descanse, sua jornada foi longa.

Sofia sorriu e acenou indo na direção em que fora indicada, perguntando-se como sabiam que suas flores favoritas eram gipsófilas.

Dentro da tenda estavam Susana, Lúcia e Clarissa, todas em vestidos narnianos.

Susana usava um bonito vestido verde escuro, Lúcia um vestido azul claro e Clarissa um vestido de um tom adorável de rosa.

Sobre uma das camas, estava disposto um vestido de um vermelho terroso, que ela supôs que fosse pra ela.

— Oh, finalmente! Só estávamos esperando você para ir explorar! – exclamou Clarissa se levantando de um pulo. – Preciso achar alguém que tenha um jogo de xadrez. Você vem, Lúcia?

— Acho que vou com a Susana até o riacho aqui pertinho. Te encontro lá? – disse Lúcia e Clarissa fez que sim.

— Você vem com a gente até o riacho, Sofia? É logo ali, não dá nem dois minutos andando. – convidou Susana.

— Acho que não. Preciso pensar um pouco. – a Redfield declinou com um sorriso.

— Bom, então vamos deixar você se trocar em paz. Vamos meninas. – Susana chamou sendo acompanhada pelas pequenas. – Clarissa, não demore muito, tudo bem? Se daqui uma hora você não tiver achado ninguém que saiba jogar xadrez, volte até a tenda ou vá nos encontrar no riacho.

— Tudo bem. – Clarissa concordou antes de recolher as saias e voltar para a via principal do acampamento, cumprimentando alguns animaizinhos simpáticos no caminho.

Percebeu que havia muitos animais ali que não eram guerreiros, e que aquele não era apenas um acampamento militar, mas também um campo de refugiados.

— Boa tarde milady! – cumprimentou uma voz animada e ela pode ver um grande e peludo sheepdog que era acompanhado por um par de águias e uma chinchila.

— Boa tarde! – ela parou sorrindo para o pequeno grupo peculiar. – Eu sou Clarissa Redfield, é um prazer conhecê-los!

— O prazer é todo nosso, milady Clarissa. – cumprimentou uma das águias. – Eu sou Aticus e essa é minha irmã Atara. Esses são nossos amigos, Ralph e Ligeirinha.

— Há algo em que possamos ajudar milady nessa bela tarde? – perguntou Ligeirinha em voz fina e apressada.

— Oh, eu estava procurando alguém que saiba jogar xadrez. – respondeu a menina.

— Os centauros e os faunos gostam de jogar xadrez. – observou Ralph. – Eu não posso dizer que entendo. É um jogo muito confuso.

— Mas isso, Ralph, é porque os únicos jogos que não o deixam confuso são aqueles em que se atira um graveto para você buscar. – disse Atara.

— Ora, minha cara, veja bem, esses jogos não são tão simples, pois eu devo calcular a força com a qual se atirou o graveto, se o vento é a favor ou contra, a inclinação do terreno e a atuação da gravidade para que... – começou Ralph em tom muito distinto.

— Pare de tagarelar, sua bola de pelos! – Aticus ralhou bicando o topo da cabeça do cão. – Certamente devemos ajudar Lady Clarissa a achar alguém que jogue xadrez!

— Isto é, se Lady Clarissa quiser ajuda! – disse Atara com um olhar cortante para o irmão.

— Eu adoraria. – a pequena concordou rindo e estava prestes a seguir com sua busca quando um som tomou o acampamento vindo da direção em que ficava o riacho. O som de uma trompa.

— O que foi isso? – questionou Ligeirinha. – Não se parece com nenhuma das trompas que temos aqui no acampamento.

— Susana! – exclamou Clarissa arregalando os olhos e recolhendo as saias de novo antes de sair correndo em uma velocidade impressionante para suas pernas curtas. – E Lúcia!

— Que é que têm as rainhas? – perguntou Ralph.

— Ora, cale-se e siga Lady Clarissa! – bufou Ligeirinha segurando-se nos pelos das costas do cão enquanto as águias já quase ultrapassavam a menina.

Clarissa ficou grata no fundo de ser acompanhada por seus novos amigos, pois apesar de ter seu crossbow consigo, imaginava que as garras e bicos de Aticus e Atara seriam um tanto mais perigosos que ela.

Quando finalmente alcançou o riacho, se deparou com a maior bagunça, pois os lobos da Feiticeira rosnavam para Susana, Lúcia e Sofia, que estavam todas penduradas em uma árvore. As espadas de Sofia – que fora a primeira a chegar lá, pois estivera escrevendo em seu diário na tenda – estavam jogadas aos pés da árvore.

— Ora, Sofia! O que pensou que estava fazendo? – bronqueou Clarissa já com uma flecha encaixada em seu crossbow.

— Clarissa, o que você pensa que está fazendo? Corra! – gritou Sofia sentindo o sangue fugir de seu rosto ao ver a atenção de um dos lobos se voltar para a irmãzinha.

— Bem que eu dei falta de uma das garotinhas! – disse Maugrim com um sorriso viperino para Clarissa.

— Fique bem aí onde está! – avisou Clarissa fazendo mira na testa do alfa.

— Que bonitinha. – Maugrim riu antes de se virar para o outro lobo. – Pegue-a!

— Clarissa! – gritou Sofia desesperada ao ver o outro lobo avançar em Clarissa, que no susto tropeçou enquanto disparava a flecha, que meramente acertou de raspão o flanco do bicho.

— Pra trás! – gritou Pedro cruzando o riacho com a espada desembainhada.

— Pedro! – gritou Susana sentindo-se prestes a desmaiar.

— Por favor! Nós já passamos por isso antes! – disse Maugrim rondando o rapaz. – Sabemos que você não tem coragem!

— Pedro, cuidado! – alertou Sofia, que havia conseguido puxar Susana para um galho mais alto.

Clarissa já estava segura, por assim dizer, uma vez que Atara havia dado uma bela arranhada na cara do lobo com suas garras e Ralph rosnava da forma mais ameaçadora que conseguia.

Então, assim como Maugrim, o lobo resolveu que seria melhor atacar Pedro, que não tinha nenhuma trupe de animais raivosos o protegendo. Ou foi o que o coitado pensou, pois assim que moveu o primeiro músculo para dar o bote no rapaz, foi preso contra o chão por uma pesada pata dourada e um rugido sacudiu as árvores enquanto Aslam, Oreius e um grupo de soldados guiados por Aticus chegavam em defesa dos humanos.

Clarissa voltou a carregar seu crossbow e Oreius tinha a espada em riste quando foram parados por Aslam;

— Não! Guardem as armas. Esta batalha é de Pedro!

Tudo o que foi preciso foi olhar para Aslam para que o Pevensie soubesse que conseguia fazer aquilo, então manteve a espada apontada para Maugrim da melhor forma que conseguia.

— Pode pensar que é um rei, mas você vai morrer... Como um cão! – gritou o alfa antes de se lançar sobre Pedro com um rosnado gutural levando ambos ao chão.

— PEDRO! – gritou Lúcia imediatamente pulando da árvore e correndo para o irmão, sendo seguida de perto por Sofia e Susana.

As três tremiam enquanto empurravam o corpo de Maugrim para longe do rapaz, que para o alívio geral sentou-se com a respiração entrecortada de medo antes de puxar as irmãs para um abraço.

Foi só então que Aslam soltou o outro lobo – o pobre miserável estava tendo o pior dia de sua existência -, que saiu correndo com um ganido patético.

— Atrás dele! – ordenou o Grande Leão. – Vai levá-los a Edmundo.

E com o estampido de cascos, o farfalhar de asas e pequenos rugidos dos felinos, lá se foi o grupo de soldados liderados por Oreius e flanqueados por Aticus e Atara atrás do lobo – o pobre miserável sentia-se a criatura mais azarada a colocar os pés em Nárnia.

Sofia tremia quando recolheu suas espadas e não sabia se queria abraçar Clarissa ou puxar-lhe as orelhas quando se aproximou dela.

A verdade é que a Redfield mais velha estava um pouco envergonhada, pois quando percebera que não podia enfrentar ambos os lobos sozinha, jogara suas espadas no chão e subira na árvore atrás de Susana e Lúcia.

— Não há vergonha em fugir de situações que não se pode sustentar, criança. – disse Aslam baixinho de forma que apenas as duas ouvissem antes de voltar-se para os Pevensie. – Pedro, limpe sua espada.

As Redfield se aproximaram um pouco e ficaram de pé próximas a Lúcia e Susana e assistiram enquanto Pedro usava uma das toalhas jogadas ali perto para limpar sua espada e, como fora instruído por Aslam, ajoelhar-se diante do Leão com a ponta da espada cravada na grama.

Aslam pousou a pata direita sobre um ombro de Pedro e depois o outro antes de dizer em um tom orgulhoso:

— Levante-se, Sir Pedro Ruína dos Lobos, Cavaleiro de Nárnia.

Havia um novo ar de coragem sobre Pedro quando ele se levantou, olhou para as meninas e então para Aslam antes de embainhar sua espada.

Junto com o entardecer, fogueiras foram acesas pelo acampamento e havia uma aura renovada sobre todos.

Os lobos não seriam mais um problema, Edmundo seria resgatado e tudo ficaria bem.

— Lúcia! – Clarissa chamou puxando a amiga consigo. – Esses são meus novos amigos, Ralph e Ligeirinha.

— Olá! É um prazer conhecê-los! – disse Lúcia sorrindo para o cão e para a chinchila. – Eu sou a Lúcia.

— Majestade! – os animais disseram em uníssono curvando-se.

— Oh... Não precisam se curvar! – exclamou Lúcia surpresa.

— Eles fazem isso. Me chamam de milady pra cima e pra baixo. – disse Clarissa dando de ombros. – Também conheci Aticus e Atara. São águias. Foram com Oreius buscar Edmundo.

— Oh, esplendido! – sorriu a Pevensie. – O que fazem para passar o tempo?

— Não querendo me gabar, Majestade, mas considero a mim mesmo um especialista em gravetos e na física de lançá-los. – respondeu Ralph em um tom muito nobre e orgulhoso.

— O que ele quis dizer é que gosta que lancem gravetos para que ele apanhe. – disse Ligeirinha em sua voz fina e rápida, e as meninas tiveram que prestar atenção extra para entender o que ela dizia.

— Oh, mas eu jamais perderia a compostura de tal forma diante de Vossa Majestade e de milady! – afirmou o sheepdog parecendo muito constrangido.

— Vossa Majestade e milady deveriam atirar um graveto de uma vez para ver o que acontece. – sugeriu Ligeirinha com uma piscadela travessa.

As meninas gargalharam antes que Lúcia se abaixasse e apanhasse um graveto no chão.

— Acha que esse serve? – perguntou a pequena rindo.

— Oh, não! Majestade, eu imploro! – disse Ralph, mas tinha os olhos fixos no graveto, a postura tensa e pronta para correr, e abanava o rabo de um lado para o outro rapidamente.

Com uma risadinha, Lúcia atirou o graveto longe e ambas as meninas caíram na gargalhada quando o cachorro saiu correndo atrás com um cavalinho de pau e a língua de fora.

Não querendo de jeito nenhum perder a diversão, ambas ergueram as saias acima dos joelhos e saíram correndo atrás.

Os mais velhos voltaram para a via principal do acampamento junto com Aslam, que riu com ternura da imagem das pequenas correndo atrás de Ralph.

— Alegrem-se, meus caros. Tudo há de ficar bem. – disse o Grande Leão antes de seguir para a própria tenda, deixando os três para fazer o que melhor lhes aprouvesse.

— Eu vou atrás daquelas duas antes que desmontem o acampamento. Melhor que ficar segurando vela para vocês dois. – disse Susana olhando Sofia e Pedro de cima abaixo antes de ir pela direção na qual Lúcia e Clarissa haviam se enfiado.

Os dois se entreolharam antes de voltar a caminhar a esmo.

— Então... Cavaleiro de Nárnia? – disse Sofia com um pequeno sorriso.

— Acho que sim. – Pedro riu constrangido com as mãos cruzadas atrás de si. – É meio irreal... Aslam conversou comigo, mas ainda assim é tudo um pouco confuso. Como foi sua conversa com ele?

— Esclarecedora. – ela respondeu brincando com a fivela que segurava suas espadas às costas. – Acho que é por isso que você vai precisar de conselheiras reais.

— Eu não preferiria mais ninguém. – disse Pedro sorrindo diante do tom brincalhão dela.

— Fico muitíssimo honrada, Majestade. – a moça disse sorrindo e fazendo uma reverência graciosa e exageradamente floreada.

Os adolescentes riram em conjunto e continuaram andando um pouco mais até serem abordados por um alegre grupo de faunos, dríades e animais falantes que faziam o jantar ao redor de uma fogueira.

— Majestade! Lady Sofia! Juntem-se a nós! – chamou um dos faunos.

— O que acha, minha conselheira real? – o rapaz perguntou em tom de brincadeira.

— Bem, Aslam disse para nos alegrarmos! – respondeu Sofia e com uma risada puxou Pedro consigo, de forma que o grupo de narnianos comemorou.

Sentaram-se em um tronco caído não tão perto do fogo e permaneceram em silêncio observando os narnianos alegres cheios de sorrisos e gargalhadas. Logo, o grupo tomava o acampamento todo, e Susana, Lúcia e Clarissa haviam se juntado, assim como os Castores, Ralph, Ligeirinha e mesmo o próprio Aslam.

Clarissa havia achado um centauro com quem jogar xadrez, e agora jogavam uma partida acirrada com direito a uma torcida devota que batia palmas e festejava a cada movimento bem sucedido da menina.

— Xeque-mate! – anunciou a pequena Redfield derrubando o rei do centauro com sua torre e os narnianos todos comemoraram alto.

Após jantarem o melhor cozido que já haviam comido – que fora feito sob o olhar severo da Sra. Castor -, os humanos todos sentaram-se enquanto os faunos e as dríades arrumavam harpas, flautas e tambores e começavam a tocar uma linda e animada música. Aqueles que não tocavam faziam uma bela e intrincada dança com os padrões mais lindos jamais vistos.

A música mudou, e junto com ela a dança, que era agora bem mais simples.

— Venham! Venham! – chamaram duas dríades puxando Susana e Sofia para dançar também.

Havia uma magia a respeito da música que deixava a proposta simplesmente irresistível, de forma que as duas riram com gosto antes de juntar-se aos faunos, dríades e até alguns animais falantes.

— Sabe, em vez de ficar aí olhando todo apatetado, você devia ir dançar com ela. – disse Clarissa olhando enfadada a forma como Pedro não tirava os olhos de Sofia.

— Ela tem razão, Pedro. Você fica aí olhando a Sofia desse jeito desde que chegamos na casa do professor e nunca toma uma atitude. É de dar pena! – Lúcia concordou.

— E o pior é que aposto que fazia a mesmíssima coisa na escola. – completou Clarissa.

— Vocês duas são muito espertinhas! – disse Pedro surpreso com a perceptividade das duas.

— Ora, o que está esperando, rapaz? – disse o Sr. Castor se intrometendo na conversa. – Está na cara que ela também gosta de você.

— É verdade! – Sra. Castor assentiu. – Ela fica de olhos brilhantes, toda sorridente e corada quando fala com você!

— Vocês não vão me deixar em paz até eu ir lá, vão? – Pedro perguntou tentando esconder uma risada.

— Não. – afirmaram os quatro em uníssono.

— Bem, então me desejem sorte. – ele murmurou se levantando.

— Nah, você não precisa de sorte! – desconsiderou Clarissa. – Ela está caidinha, caidinha por você.

Pedro sorriu antes de entrar no meio da dança indo em direção a Sofia, que dançava com um fauno. Era verdade que, depois dos acontecimentos daquela tarde, o rapaz sentia-se anormalmente corajoso e seguro de si.

— Majestade. – o fauno cumprimentou com um inclinar de cabeça.

— Olá. – o rapaz devolveu o cumprimento. – Eu poderia interromper sua dança?

— Claro, Majestade! – o fauno sorriu inclinando a cabeça novamente e logo achou uma dríade com quem dançar.

— Alguém está ficando acostumado com o título de rei. – disse Sofia rindo.

— Me concede a honra dessa dança, Lady Sofia? – perguntou Pedro estendendo a mão com um sorriso brincalhão no rosto.

— Ora, mas é claro, Majestade! – ela respondeu, encaixando a mão na dele e esperando que o escuro da noite e a luz amarela das fogueiras escondessem o vermelho em suas bochechas.

Seria mentira dizer que Pedro e Sofia não eram bons dançarinos, mas de fato não eram o par mais gracioso ali, pois ao contrário dos faunos e dríades, eles não conheciam a coreografia daquela música de cor. Nem a da próxima. Muito menos a da terceira.

E quando finalmente se cansaram, Susana já havia levado as pequenas para a tenda, para dormir.

— Vamos, eu vou com você até a sua tenda. – disse Pedro sorrindo e oferecendo o braço a Sofia.

— É muito gentil. – ela sorriu e aceitou, e caminharam em silêncio por um tempo, sorrindo. – Foi muito assustador?

— O quê? – Pedro perguntou sem entender.

— Matar aquele lobo... Foi muito assustador? – Sofia reformulou a pergunta.

— Acho que... Acho que na hora eu estava com mais medo do que ele poderia fazer com vocês. – o rapaz respondeu devagar, sendo plenamente sincero. – Não é algo bom... Matar alguém. Mas então... Então eu olhei nos olhos de Aslam e entendi que nem sempre o necessário é bom. Que às vezes precisamos enfrentar os maus pra defender quem é bom.

— Aslam me disse mais ou menos a mesma coisa mais cedo. – disse ela olhando para Pedro. – Eu cheguei lá primeiro, sabe? Mas não tinha como lutar contra os dois sozinha, então eu subi na árvore. Eu não fiquei com tanto medo dos lobos porque sabia que alguma hora alguém ia chegar. Quando a Clarissa apareceu e então você... Foi aí que eu fiquei apavorada.

— Estamos todos bem, e é isso que importa. – Pedro falou, soltando a mão de Sofia de seu braço para poder abraçá-la de lado. – Prometemos ser corajosos juntos e eu pretendo estar aqui pra cumprir essa promessa quando chegar a hora.

— O mesmo vale pra mim. – Sofia sorriu apoiando a cabeça no ombro de Pedro antes de sair de seu abraço assim que chegaram diante da tenda. – É aqui. Boa noite, eu acho. Não se meta em confusão no caminho até a sua tenda.

Compartilharam um sorriso, mas havia um sentimento de que aquela despedida não era o suficiente. Faltava algo.

E porque sentia-se atipicamente corajoso, Pedro perguntou a si mesmo o que estava esperando. Chegando à conclusão de que era burrice esperar mais e fingir que não sentia seu coração acelerar toda vez que estava perto de Sofia, provavelmente no movimento mais corajoso que fizera aquele dia inteiro, Pedro inclinou-se devagar e vendo que Sofia não iria se afastar, a beijou.

Um beijo doce, simples, inocente, mas cheio dos sentimentos mais crus. Ambos estavam cansados, assustados, confusos, mas achavam um pouquinho de segurança e certeza um no outro, e aquilo sim era suficiente.

— Boa noite, Sofia.

— Boa noite, Pedro.

 


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Notas finais do capítulo

***

Pode surtar, Redfield Stan! A tia deixa!

Eu estou de volta e comigo vem o doce som de um semestre quase finalizado, provas feitas, trabalhos entregues e uma universitária em paz.

Os eventos que tem se desencadeado pelo nosso mundo têm me feito refletir muito, e eu tentei do melhor jeito que consegui abordar essa situação de forma discreta e sensível nesse capítulo de muitas formas, até que cheguei à conclusão de que a melhor forma de abordar isso foi mostrando a diversidade dos narnianos e como apesar de suas diferenças, são todos unidos e amigos.

Admiro muito C. S. Lewis pela forma tão sensível com a qual ele abordou o problema do preconceito em As Crônicas de Nárnia, constantemente colocando de forma sutil que todos devem ser respeitados – quer você concorde com sua ideologia de vida ou não.

A maior revolução de todas é o amor. Ame não porque o outro merece ser amado, e sim porque você faz de você mesmo alguém melhor espalhando o amor.

Como muito sabiamente dito pelo admirável criador de Nárnia: “O amor nunca é desperdiçado, pois seu valor não está na reciprocidade.”

Beijos de Luz, Shazi.



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