Sede de Poder escrita por Mermaid Queen


Capítulo 27
Capítulo 27


Notas iniciais do capítulo

escolham seus lados, pró travis e anti travis



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Não houve mesmo escapatória do banho.

Mas o pior era não poder fugir da própria cabeça.

Não havia sido a primeira vez que Katherine pensava ouvir a voz de Evan, mas era primeira vez em que ela tinha certeza de que estava acordada. Achava que estava começando a alucinar. Não era possível se manter sã sem saber o que seria dela dali a dez minutos, ela não tinha por que se enganar. Estava tudo bem enlouquecer.

Mas era doloroso mesmo assim.

Katherine pensava ouvir uma sombra da voz de Evan às vezes, quando estava pegando no sono. Tinha a impressão de ouvi-lo falar coisas ininteligíveis para ela, e acordava sobressaltada. Achava que era uma nova modalidade de pesadelo que ela vinha experimentando.

De todas as peças que a mente de Katherine já pregara nela, aquela era uma das mais cruéis. Ela sabia o quão aterrorizante podia ser ficar imaginando Alex em todas as esquinas e cômodos escuros, mas a voz de Evan dava esperança a Katherine. E aquilo doía muito.

O coração dela disparava e ela tinha dificuldade para respirar quando acontecia. Criava as teorias mais malucas, mas a imagem dele não podia desaparecer. Katherine vira Evan morto, e aquilo não podia ser mudado.

Estendeu a mão trêmula para fechar o chuveiro e tentou contar até 20, depois 50 e então chegou a 100, para não pensar em nada enquanto se enxugava e se vestia. Não suportava mais. Estava exausta de culpa. Não via saída.


Katherine puxou o cinto de segurança sobre o peito e encarou a rua. Não havia dado a partida ainda porque, como tudo na nova vida, precisava de autorização. E instruções. Ela não tomava banho se não lhe dissessem que estava na hora, só comia quando Serpente sentisse que estava na hora.

Ficou olhando para a rua deserta sem ouvir nada além do som da própria respiração.

Era a segunda vez que sairia para sequestrar pessoas e levá-las àquele lugar sobre o qual ela não estava autorizada a falar. Não podia questionar muitas coisas.

Olivia se debruçou na janela do passageiro e Katherine se virou para encará-la.

— Amarre a boca deles dessa vez – avisou, com o indicador apontado. – Ele está até agora resmungando sobre como você simplesmente acreditou que eles não gritariam.

— Eles não gritaram – retrucou Katherine, dando de ombros. Não queria se gabar das ameaças que fizera, mas haviam sido convincentes.

Pelo menos uma vez na vida, Olivia ficou quieta. Apenas lançou um olhar de aviso e se afastou da janela. Deu um tapinha na porta do carro, que Katherine entendeu como a autorização para partir.

Ela deu a partida e o aparelho de GPS acendeu, iluminando o interior do carro. O GPS só mostrava duas paradas, e ela suspirou e se afastou do meio-fio.

Katherine tentou se tranquilizar dizendo a si mesma como era forte. Estava se familiarizando à força e confiando nos reflexos conforme os utilizava mais. E Serpente aparentemente precisava dela. Não podia deixar que ela morresse. Então ela não estava em perigo de verdade.

O GPS indicou a primeira parada e ela encostou o carro. Estava novamente com a roupa do governo, e definitivamente deveria tentar entender isso. Abriu o porta-luvas e pegou as tiras de pano que separara para fazer mordaças improvisadas, e as enfiou no bolso.

Quando chegou à casa, Katherine realmente cogitou entrar pelos fundos ou por uma janela e surpreender a vítima, mas desistiu. Derrubara uma porta na noite anterior. Não havia muito que uma família pudesse fazer quando ela batesse à porta da frente.

E foi isso que ela fez.

Um garoto abriu a porta. Devia ser um ou dois anos mais novo que ela, e bem magrelo. Estava com um controle de videogame na mão e uma cara que dizia “quem bate na porta de madrugada?”. Ficou ainda mais confuso quando a viu.

E quem abre a porta de madrugada?

Relutante, porém firme, Katherine avançou rápido e prendeu o garoto contra a parede. Ela o ouviu gemer, e isso doeu, porque parecia que ele estava tão assustado que não conseguia gritar. Ele a fez lembrar que quando invadiram sua casa para aplicar a substância nela, e no quanto ela ficou aterrorizada.

Terminou de amarrá-lo e colocou a mordaça, tentando não deixar que aquilo a abatesse. Fez sinal de silêncio para ele, colocando um dedo na frente dos lábios e tentando não soar tão assustadora. Deu para ver que funcionou muito bem, já que a única resposta do menino foi chorar baixinho.

Katherine suspirou e se levantou. Passou a mão pela coxa para se certificar de que a faca estava ali, e as cordas e mordaças estavam no lugar. Tudo sob controle por enquanto. Deixou o menino sentado perto da porta e seguiu casa adentro.

O menino tinha um cheiro… na hora, não chamou tanta atenção, mas conforme avançava pela casa, Katherine voltou a senti-lo mais forte. Estava por todo o lugar. Era diferente, mas também era bom. Tentou não deixar que aquilo a distraísse.

Andou com cautela pela casa e decidiu seguir para o andar de cima. Conseguia ouvir uma respiração, mas ouvir não era a palavra certa. Quase sentir. Como um ronco que fazia o peito dela reverberar, mas não se fazia ouvir.

Seguiu a sensação, e com ela o cheiro ficava mais forte. Chegou a um corredor e sabia que encontraria o que procurava na segunda porta à direita. Empurrou a porta e, mesmo com todas as luzes apagadas, conseguia distinguir as duas silhuetas na cama. Mas elas não tinham o mesmo cheiro, e Katherine sabia disso de alguma forma.

No segundo em que pisou dentro do quarto, o homem abriu os olhos. E, com uma velocidade assustadora que só podia significar uma coisa, ele se sentou na cama, abriu a gaveta do móvel que ficava ao lado e agarrou um revólver.

— Merda – Katherine sussurrou, e o corpo dela pareceu derreter. Via o brilho metálico na mão dele e não sabia o que fazer.

Katherine congelou quando ele apontou o revólver para ela.

O homem engatilhou a arma e aquele som despertou alguma coisa nela. Katherine disparou na direção dele, tão rápido que seus olhos não conseguiram acompanhar o borrão que o quarto se tornou. Ouviu a arma explodir e o quarto se iluminou, mas a única coisa que sentiu foi o impacto do corpo do homem trombando contra o dela.

Os dois se chocaram contra a cabeceira da cama e a mulher acordou gritando. Dava para ouvir que o homem estava tentando ajeitar a arma para atirar de novo, enquanto Katherine procurava a corda às cegas para amarrá-lo e com o peso do corpo tentava segurá-lo contra a cabeceira da cama.

A mulher puxou a trança de Katherine e a afastou do homem. Quando ele se viu livre, ele a chutou para fora da cama e ela caiu no chão. Tentou fugir, mas ouviu outra explosão, o clarão, e em seguida uma pressão insuportável. Ficou cega de dor.

Puta que pariu— berrou ela, rolando no chão. Tentou agarrar o ombro esquerdo e tirou a mão encharcada de sangue.

Pelo canto do olho, viu o homem conduzir a mulher em direção à porta. Katherine saltou do chão e gritou, como um alerta. Quando os dois olharam para ela, já com a mão na maçaneta, ela fez algo que não imaginaria. Algo que pareceu primitivo, animal.

Katherine mostrou as presas e rosnou.

Ouviu a mulher berrar, e o marido arregalou os olhos. Katherine já havia percebido que ele era um vampiro, mas não entendeu o choque no rosto dele. Sem tempo para pensar sobre isso naquele momento, ela se teletransportou e foi parar atrás dele.

Jogou-o no chão de barriga para baixo, e rapidamente amarrou as mãos dele. Jogou a arma, vendo-a deslizar para o outro lado do quarto. Enquanto isso, a mulher a olhava, estupefata, sem saída e como se estivesse vendo uma assombração. Ou um monstro. E estava, de certa forma.

Enquanto a amarrava, Katherine percebeu que era dela que aquele cheiro vinha. Cheiro de humana.

Conduziu os dois para baixo, agarrou também o braço do menino e os levou para o carro. Ouviu o garoto chorar enquanto andava pela calçada. A mulher e o menino ficaram no porta-malas, enquanto o homem foi no banco de trás.

Quando se sentou no banco do motorista, ela abriu o porta-luvas e pegou um pedaço de atadura para cobrir o ombro. Não estava doendo tanto quanto ela esperava.

Aquilo era perturbador. A resistência à dor, junto com a velocidade, e a visão no escuro. E o que tinha sido aquele rosnado? Mostrar os dentes, então feito um… é, era essa a palavra que ela queria. Feito um animal.

E nunca havia sentido nada tão bom na vida quanto o que passou pelo corpo dela naquele momento. As sensações de adrenalina, poder e instinto que se juntaram e fizeram dela vampira.

E era viciante ser vampira.


A segunda parada foi rápida e sem muita ação, só duas pessoas na casa e eram um casal de idosos que estavam dormindo. Katherine se sentia um pouco aliviada, mas parte dela queria experimentar mais daquilo. Levar um tiro? Provavelmente a coisa mais insana que ela já tinha feito.

Lembrou-se de súbito que a coisa mais insana que já fizera na vida era na verdade assassinato. A culpa a mordeu de novo, deixando-a com aquela sensação de buraco negro no peito.

Depois de deixar as pessoas que ela graciosamente sequestrou naquele endereço que era uma espécie de fazenda, desceu do carro e deixou que a vendassem e a levassem de volta à sua prisão.

Quando chegou ao quarto, surpreendeu-se com Travis parado à porta. Os guardas que a conduziam deram meia volta e desceram pelo elevador, deixando-a relativamente sozinha com ele. Com exceção dos outros dois no fim do corredor, e mais um no outro lado.

— Garota – cumprimentou Travis, segurando uma caixinha branca. – Ouvi falar que você é selvagem.

Katherine estava constrangida demais para olhá-lo nos olhos. Sorriu para ele com desânimo e entrou no quarto, sem saber o que ele faria. Para sua surpresa, viu que ele entrou atrás.

— E então? – perguntou ela, erguendo as sobrancelhas para ele e a caixa. – Eu recebo visitas agora?

— Pense em mim como a sua comissão técnica de luta. E me disseram que você se feriu, então já trouxe os primeiros socorros.

Aquilo não estava diante dos planos de Katherine. Ela deixou os ombros caírem e se sentou na cama. Após uma madrugada como aquela, ela planejava algo como questionar o que restara da sua natureza humana, culpar-se e chorar. Talvez tudo ao mesmo tempo.

Travis não se deixou abalar. Andou na direção dela e se sentou ao seu lado. Abriu a caixa de primeiros socorros no colo e então voltou a atenção para o ombro dela. Estava próximo demais. Katherine ficou com medo de estar respirando rápido demais, e de ele poder perceber.

Ele desfez o nó da atadura no ombro dela e puxou devagar, olhando-a nos olhos. E começou a aproximar o rosto do dela enquanto baixava a gola da blusa para expor o ombro. Katherine podia sentir o cheiro dele. Achou que se ele a beijasse, ela teria um ataque de pânico. E mesmo assim, deixou que os narizes se encostassem.

O barulho metálico a fez engolir em seco. Olhou para baixo e viu o que parecia ser uma moeda caída entre os dois. Travis se agachou e pegou do chão, e Katherine viu o queixo dele cair.

— É uma bala.

Em seguida, os dois olharam para o ferimento no ombro nu dela. E não havia mais nada. Só uma cicatriz circular, uma lembrança do que havia sido um tiro horas atrás.

— O machucado cuspiu a bala – sussurrou ela, olhando estupefata para a cicatriz. – Sumiu.

— Esquece esse papo de vampira – respondeu ele, com a voz assombrada. – Acho que você é o Wolverine.


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Notas finais do capítulo

a rainha do trocadilho ta online



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