APOLO

Eu estava com uma sensação super desconfortável de que era só uma questão de tempo até um raio cruzar todos os obstáculos possíveis até me atingir em cheio na cabeça da forma mais dolorosa possível. Deuses não deveriam se meter assim diretamente entre os mortais e meu pai, Zeus, tinha especificamente tido para deixar os semideuses se virarem (nenhuma novidade nisso). Ainda assim, lá estava eu lançando uma flecha bem nas costas de Nyx. Se Nyx não me matar por essa, certamente meu pai terminará o serviço.

Cheguei meio tarde talvez? Bem, considerando que Kayla pediu desesperadamente minha ajuda enquanto tentava curar alguém, que algumas Ceres (bichinhos irritantes e que recomendo evitar qualquer luta) voavam ao redor de Nyx enquanto ela ativava uma magia bem roxa que, tenho que admitir, era até bonita, certamente eu estava meio atrasado. Mas em minha defesa, primeiramente, não se acorda um belo dia e simplesmente fala-se “ah! Que belo dia para desobedecer Zeus”. Segundo, eu encontrei algumas pessoas precisando de carona no meio do caminho.

Quando cheguei no interior do hotel com minhas duas companheiras de carona, a primeira coisa que fiz foi atirar nas costas de Nyx a melhor flecha que eu conseguia no momento. A primeira coisa que minhas companheiras de carona fizeram foi correr na direção do pequeno prédio que concentrava toda a confusão. Embora Nyx estivesse voando sobre um obelisco que não parecia nem um pouco de fato milenar, os demais pareciam estar sobre um prédio que parecia ser uma exposição de Titanic. 

E, enfim, tinha muita coisa acontecendo ao mesmo tempo. Nyx se virou na minha direção e me encarou claramente bem irritada. Eu tinha pensado em ir até lá com minha forma de Apolo, Apolo mesmo. Adulto, grande, bonito, loiro, fortão e tudo mais. O eu idiota de 5 minutos atrás achou que seria mais intimidador encarar Nyx como Apolo do que como  Lester. Mas pela cara dela, eu poderia surgir ali como Zeus ou… sei lá… Tânatos… ou Cronos, que não teria diferença alguma. 

Grover estava pendurado pela beirada do prédio, quase caindo. A única coisa que o impedia de cair era Percy segurando-o pelo braço. Mas, sem apoio algum na parede reta, Grover parecia ter dificuldade em conseguir se impulsionar para subir novamente. Dependia de Percy puxar ele pra cima. Não dava muito para ver como estava o resto da galera lá em cima por causa do ângulo mas, consegui ver uma garota que não conhecia se levantando e também Kayla sentada aparentemente desesperada antes de olhar na minha direção.

— NÃO MATEM AQUELAS COISAS FEIAS COM ASAS! - alertei gritando para que todos ouvissem - SE MATAREM ALGUMA MALDIÇÃO DE ALGUÉM QUE VOCÊ DERROTOU CAI SOBRE VOCÊ!

— GROVER! - gritou minha passageira de carona mais jovem, Meg, preocupada com o sátiro quase caindo.

— Eu consigo! - garantiu Percy gritando para Meg enquanto puxava Grover cada vez mais para a segurança - Apolo… ajude Annabeth! Rápido! Por favor!

— PAI! - gritou Kayla ao mesmo tempo que Percy - RÁPIDO!

— Vamos subir lá! - motivou minha segunda passageira, Reyna. 

— Tem uma escada que leva para um alçapão por dentro do prédio se precisarem! - gritou a garota que eu não conhecia enquanto se preparava para aparentemente atacar Nyx.

Mas você acha que Nyx tava afim de atacar garota? Nem. Não mesmo. Assim, as Arai horripilantes dela até estavam, mas Nyx parecia mais interessada em me fazer virar um monte de pedacinhos. Eu com certeza queria curar Annabeth o mais rápido possível, mas estava sendo muito desejado no momento, o que em situações completamente diferentes é até bom, ser desejado, mas aquela era só uma das piores possíveis, pois não era no bom sentido.

— APOLO! NÃO ME ATRAPALHE! - gritou Nyx toda nada simpática pulando na minha direção.

Eu apressadamente preparei outra flecha em meu arco e atirei contra ela bem no peito. Tudo que ela precisou fazer foi dar um tapa na flecha para ela mudar de direção completamente se tornando inofensiva. Mas assim, eu sabia que isso ia acontecer. Foi por isso que no milissegundo seguinte eu lancei uma flecha contra a barriga dela também.

A flecha não seria suficiente para fazer muito dano dela, eu sabia disso. Mesmo considerando que o brilho da flecha parecia quase queimar um pouco a pele dela. Mas foi o suficiente para ela mudar a direção do pulo dela e pousar no chão à certa distância de mim ao invés de com as mãos ao alcance do meu pescoço.

Eu não via as Arai e gritos que não conseguia entender vinham de onde os outros estavam. Essa combinação de coisas era horrível. Eu queria ir lá pra cima logo e acho que Reyna também sentiu a necessidade disso pois se colocou entre eu e Nyx e, com uma coragem sinceramente bem invejável, começou a lutar contra ela. A espada de Reyna cortou o ar mirando na cabeça de Nyx aproveitando que ela estava de joelhos, mas tudo que a deusa da noite fez foi segurar a lâmina com a palma das mãos apesar de ter uma pequena expressão de dor no rosto dela.

— Apolo, vá lá para cima, rápido! - gritou Reyna - Leve Meg também!

— T-Tá! - disse enquanto me virava para buscar Meg - Meg! Meg?

O problema, foi que ela não estava mais em nenhum lugar. Provavelmente já tinha entrado correndo dentro da exposição do Titanic para encontrar o tal alçapão que a garota falou. Torcendo para ter sido isso mesmo, eu corri e simplesmente pulei para o topo do prédio e… a situação estava horrível, mas acho que poderia estar pior também.

Kayla estava sentada de joelhos suja com um sangue que claramente não era dela. Isso porque ela estava segurando Annabeth, semi-desmaiada, nos braços enquanto tentava desesperadamente curar um corte no pescoço dela. Esse corte era com certeza a fonte do sangue nas mãos e roupas de Kayla, e também em vários pontos do chão. Mas não todos, porque todo mundo ali parecia ter ao menos algum pequeno corte em algum lugar feito por garras afiadas. 

Percy também estava logo ao lado preocupado e falando algo para Annabeth provavelmente tentando motivá-la a continuar lutando pela vida. Aparentemente Percy tinha conseguido resgatar Grover, pois ele também estava logo ali perto de Annabeth tão preocupado quanto os demais. Hazel, por outro lado, parecia assustada e encolhida enquanto Piper segurava sua mão e gritava com as Arai. 

— VÃO LUTAR ENTRE SI! ME ESCUTEM! - gritava Piper ofegante mas apenas duas das Arai decidiram ouvir sua ordem apesar de algumas outras ainda parecerem confusas.

Mas a expressão de Hazel, com olhos arregalados e parecendo que viu um fantasma, era tão preocupante quanto o fato de ela aparentar não querer se mexer. Acho que os créditos de todos estarem ainda vivos, apesar de alguns ferimentos, vão para a garota que agora eu chutava ser uma maga. Ela tinha levantado uma barreira circular mágica ao redor de si mesma e de todos e as Arai não pareciam gostar tanto assim dessa barreira mágica.

Grover tocava sua flauta tentando confundir as Arai e afastá-las da barreira, mas meu método foi mais eficiente. Eu não precisava me preocupar com as maldições das Arai, assim, atirei algumas flechas certeiras. As flechas brilharam fortemente quando atingiram seus alvos e isso foi o suficiente para deixar as outras Arai que não foram atingidas bem confusas com o fato de alguém não ter medo de matá-las. Sem falar que elas não gostaram do brilho também. Isso foi o suficiente para elas se afastarem ao menos por enquanto.

— Deixe ele entrar na barreira! - pediu Percy apressadamente ao me ver - É Apolo!

Sem nenhuma barreira para me impedir de chegar até eles, eu fui até Annabeth. Assim que entrei, a barreira se fechou novamente pois as Arai restantes já estavam voltando a ficar interessadas em nós.

— Você foi muito bem Kayla! - eu disse apressadamente ao me ajoelhar ao lado de Annabeth e notar que Kayla chorava enquanto ainda cantava e clamava meu nome tentando curar a amiga - Tenho certeza que mais um pouco e você conseguiria sozinha mas isso não é hora de testar a teoria.

Coloquei as minhas mãos apressadamente sobre as de Kayla e deixei o poder fluir. Aquela maldição era bem feita e tinha uma sensação greco-egípcia um tanto familiar que me fez lembrar de Alexandria, mas curar Annabeth era mais importante no momento do que analisar aquela sensação.

— Ela vai ficar bem? - perguntou Percy apressadamente.

— Vai. - garanti rápido - Eu cuido daqui! Vai com a garota aí da magia ajudar a Reyna com a Nyx! E pede pra Meg vir pra cá se vir ela perdida por aí!

— Me chamo Zia! - se apresentou a garota - Como você vai impedir essas coisas de te atacarem?

— Eu me viro! Só vão antes que Nyx mate a Reyna! - pedi desesperadamente enquanto notava o rosto de Annabeth voltando lentamente ao normal.

Provavelmente Percy viu a mesma coisa que eu, porque eu duvido que ele teria saído do lado de Annabeth sem qualquer prova de que ela fosse ficar de fato bem. 

— Não ousem se aproximar! - ordenou Piper apontando para as Arai enquanto Zia desfazia a barreira e rapidamente prendia algumas Arai em cordas mágicas.

— Kayla - chamei sério poucos segundos antes de tirar as minhas mãos de cima das dela - É com você agora. Você consegue. 

— Ok. - respondeu ela me olhando de um jeito tão cheio de determinação que eu me enchi de orgulho. MINHA FILHA!

Percy e Zia desceram pelo alçapão, Piper continuou a gritar para as Arai não se aproximarem ou brigarem entre si, Grover tocava sua flauta tentando confundir as Arai e atirei nelas o mais rápido que conseguia. Não podíamos deixar elas chegarem perto demais. Mas, no meio de tudo isso, ainda tinha outro problema.

— Hazel, o que tem com você?! - perguntei apressadamente sem desviar os olhos dos meus alvos.

— Estou presa… Eu não vejo… - gaguejou ela com uma voz de choro - Estou presa e não vejo.

— Você não está presa. Já disse. - disse Piper rapidamente - Estou aqui, ao seu lado.

— Ok. Nada mortal pelo menos. Resolveremos isso em breve. - prometi ao mesmo tempo em que escuto mais alguém se juntando à nós.

— PÊSSEGO! - gritou Pêssego pulando em uma das Arai com seus dentes a mostra pronto para rasgar ela ao meio.

— Não mate ela, Pêssego! - alertei apressadamente - Ou alguma maldição vai cair sobre você…… apesar de não saber se maldições funcionam com frutas.

— Pêssego não é uma fruta! - ralhou Meg saindo do alçapão e já indo para o meu lado brigar comigo - Ele é um Karpos, espíritos de grãos! Você sabe disso.

— Tá, tanto faz. - eu disse.

— Essa maldição não te afeta? - perguntou Meg - Você também deve ter sua lista de gente que está com raiva de você.

— Tenho certeza que tenho uma lista dessas. - respondi enquanto eu atingia uma Arai bem na cabeça - Felizmente, não. Faz parte das vantagens de ser um deus imortal de novo, mas não nego que sinto uns calafrios a cada Arai que derroto.

Então, atrás de nós, Annabeth repentinamente tossiu. Me virei automaticamente achando que era alguma coisa ruim acontecendo, e isso abriu uma brecha para a última das Arai pular na minha direção. Felizmente, Pêssego pulou em cima dela arrancando-lhe as asas e fazendo ela cair no chão nos meus pés. 

— Toma isso seu bicho feioso idiota! - disse Meg chutando seguidas vezes a Arai, já que não podia matar a monstrenga

— Valeu Pêssego - eu disse enquanto atirava uma flecha bem na cara da Arai de uma distância que certamente doeu muito e até rachou o chão logo embaixo da sua cabeça.

— Pêssego. - disse Pêssego.

— Ele disse que estava mais me salvando do que te salvando… - corrigiu Meg com um sorriso desafiador - Afinal estou bem do seu lado.

— Prefiro acreditar que lá no fundo ele gosta de mim e quis me salvar também. - acrescentei enquanto me virava para confirmar o que eu tinha visto rapidamente antes.

O motivo da tosse foi porque agora Annabeth estava bem. Ela tossia, provavelmente tentando se livrar de alguma sensação desconfortável de ter tido a garganta cortada mas, estava sentada parecendo bem viva enquanto colocava a mão sobre onde antes havia o corte. Ao lado dela, Kayla parecia exausta, mas muito feliz e orgulhosa de si mesma.

— Ai que bom… - disse Grover aliviado parecendo que ia cair de joelhos ali mesmo.

— Grover! - exclamou Piper repentinamente - O frasco do Aqueronte ainda está com você, né?! Temos que levar até os outros e ajudar eles com Nyx!

— A-Ah… sim… claro! - lembrou Grover repentinamente pegando no bolso um frasco muito parecido com aqueles frascos de laboratório.

— A gente cuida das coisas por aqui. - disse Meg como se fosse, novamente, a líder daquilo tudo.

— Cuida da Hazel, por favor. - disse Piper apressadamente enquanto ela e Grover corriam para se juntar na luta contra Nyx.

E assim, só tendo Nyx e aquele pilar de luz roxa mágica para lidar, Piper e Grover me deixaram com Meg, Pêssego, Annabeth, Hazel e Kayla. Kayla e Annabeth pareciam exaustas sentadas no chão, Hazel estava encolhida em seu cantinho como se estivesse presa em um infinito pesadelo e Meg e Pêssego pareciam prontos para lutar contra mais algum inimigo.

— Acho que eu vou ver se eles precisam de ajuda com Nyx. - disse Meg antes de sair correndo me deixando basicamente sozinho com os exaustos e feridos.

— Hazel… - eu disse me aproximando de Hazel lentamente até me ajoelhar diante dela.

— Me tira daqui! Me tira daqui! Me tira daqui! - repetia ela de um jeito que dava dó.

— O que aconteceu com ela? - perguntou Annabeth com a voz rouca ainda passando a mão no pescoço como se a garganta coçasse ou como se tentasse convencer a si mesma de que tudo estava bem agora.

— Ela matou uma Arai. Acho que é uma maldição. - disse Kayla - As maldições não necessariamente envolvem algo mortal? Ela não parece estar prestes a… você sabe… 

Annabeth negou com a cabeça para a pergunta enquanto eu tocava o ombro de Hazel. Hazel se encolheu imediatamente ao toque como se minha mão estivesse pegando fogo. Eu encolhi a mão um pouco e respirei fundo. Hazel nem parecia se dar conta totalmente de onde estava e o fato de os olhos estarem apontando para qualquer lugar, menos para mim ou para as garotas, dedurava que ela de fato não estava nos vendo ali.

— Hazel… sou eu, Apolo. - eu disse com calma - Não precisa ter medo. Você não está em perigo. Só vou curar você ok?

Eu tentei novamente e de novo Hazel se encolheu, mas um pouco menos. Isso me motivou a continuar, especialmente quando ela segurou meu pulso bem forte. Comecei então a curar ela apesar de não entender direito o que ela estava sentindo. Percebi que, de fato, a maldição tinha levado a visão dela, mas tinha algo a mais. 

— Apolo… - disse ela um pouco mais calma enquanto sentia que ela já estava ao menos 50% curada da maldição.

— Eu mesmo. E então, tá melhorando? - perguntei - Como está se sentindo?

— Melhor… - disse ela suspirando pesadamente - Ainda está um pouco escuro mas… está melhorando. Eu… não sei o que deu em mim. Ficar sem ver nada no meio de uma luta é assustador mas… isso pareceu algo mais profundo e intenso. Nunca tive medo de escuro mas... não sei. Foi diferente. Era como se eu estivesse numa caixa pequena demais para mim. Uma claustrofobia desesperadora.

— Deve ter sido coisa da maldição. - disse Annabeth.

— Concordo. - opinei - Até porque Hades… Plutão...tanto faz… não ia deixar uma fila dele ter medo de escuro assim tão fácil.

Hazel revirou os olhos com meu comentário mas vi um sorrisinho aparecendo no rosto dela. Eu julguei aquilo como uma vitória bem aceitável e terminando de curar ela, me virei para ver como estavam Annabeth e Kayla. Pareciam bem. Por ali, entre nós, as coisas claramente estavam sob controle novamente, mas o grito de raiva de Nyx que ocupou todo o hotel nos lembrou que tínhamos mais com o que nos preocuparmos.

— É TARDE DEMAIS! - gritava Nyx - NÃO ADIANTA!

— Não temos tempo para descansar. - lembrou Annabeth se levantando com a força que lhe restava.