Refúgio dos sonhos. escrita por Helen


Capítulo 2
Parte II




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Nos tornamos tão amigos! Meus pais não faziam ideia da existência de Maria. Eu escondia isso muito bem.

Depois do almoço, eu subi de novo no sótão. Conversei com a boneca sobre tudo. Sobre meus amigos, sobre a escola, sobre as professoras, sobre meus desenhos favoritos. Levei uns papéis. Desenhei pra ela o meu melhor amigo e o gato que dava de comer às vezes. Ela gostou muito dele.

Aliás, ela sabia desenhar muito bem. Desenhou outras bonecas, vestidos, flores, gatos, cachorrinhos. Todos muito bonitos. Eu não sabia como reagir. Só conseguia elogiar. E sentir um pouco de inveja também. Mas ela dava uma risada, e dizia que era porque só fazia desenhar quando estava sozinha. E ela ficava muito tempo sozinha.

Quando o dia começou a escurecer, eu me despedi dela e fui jantar. Quando voltei, ela já tinha dormido...

...

No outro dia, trouxe alguns brinquedos meus. Mas não trouxe bonecos. Fiquei com medo de ela me achar rude. Brincamos a manhã toda de carrinho. Uma hora eu era o policial do futuro perseguindo o bandido do futuro, e nossos carros voavam, correndo pelas paredes, fazendo um barulho danado. Não sei como ninguém se incomodou na casa.

Então veio o almoço. Desci, e meus pais me perguntaram se eu não queria sair. Eu disse que não (sair com eles, nem a pau!). Acho que eles ficaram pensando que eu era só mais um menino viciado em celulares, por isso os rostos decepcionados. Mas não me impediram, e voltei ao sótão de novo.

— Ei, Antônio. — disse Maria quando entrei.

— Diga.

— Já foi no jardim?

— Que jardim? — pelo que eu tinha visto, só tinha mato naquele lugar.

— Ora, então você não sabe do jardim? — ela botou as mãos na cintura, incrédula. — Pois a gente vai nele hoje!

Ela me puxou e começou a descer as escadas quando eu a parei.

— Espera! Espera aí!

— O que foi? —perguntou ela.

— Meus pais estão aí fora!

— Que é que tem?

— Eles não podem te ver! —puxei ela de volta.

— Por quêê?? — ela olhou pra mim.

— Porque não!... Olha, vamos pra esse jardim quando meus pais não estiverem por perto, por favor...

—Ok... Se você insiste... — ela subiu o restante das escadas e ficou no sótão.

Continuamos brincando o resto da tarde. Tica-tica, corrida de carrinho, quem construía a maior casinha de blocos, adedonha, tica-bicho (tinha que perseguir o outro imitando um bicho), estátua, elefante colorido, e ela até me ensinou a fazer um coelho de papel. Brincamos com eles depois.

Me chamaram para a janta. Eu fui, e disse que quando voltasse iríamos para o jardim. Dito e feito. Jantei rápido, apesar de tentar esconder minha ansiedade. Fui correndo como uma flecha para o sótão, e lá, Maria me esperava no meio da escada, banhada pela luz da lua na janela, pescando de sono.

— Ei, Maria, vamos!

—Vamos, vamos sim! — ela sobressaltou-se, acordando com a minha voz.

E fomos. Tomei cuidado pros meus pais não me verem andando com ela. Mas eles estavam discutindo na cozinha. Eu escapuli com Maria para fora. Lá, a lua iluminava um pouco do lugar. Andamos por um tempo até chegarmos a um riacho. Passamos por ele através de uma ponte de madeira bem bonita que havia ali. Então, chegamos ao jardim.

Um caminho de pedras bonitas começou, repentino, na grama. Ele nos guiou até um arco de flores, que ficava entre dois baixos muros de pedra. Passamos pelo arco e entramos no jardim.

Tinha tanta flor bonita que chega minha boca abriu. Arbustos, árvores, todos eles perfeitamente arrumados, exalando um perfume que ficava ainda mais delicioso com a brisa refrescante da noite. O caminho de pedrinhas continuava, e vimos mais arcos enfeitados de flores. Olhei para os lados e percebi fontes feitas de pedra, onde a água refletia a luz da lua. Rapaz. Eu não tinha visto um lugar tão lindo desde que me levaram na sorveteria, no meu aniversário.

Achamos um banquinho de madeira perto de uma das fontes. Sentamos nele, e ficamos admirando tudo aquilo.

— Você nunca tinha vindo aqui? — Maria perguntou.

— Não... — respondi

— E nem fazia ideia?

— Não mesmo...

— Caramba, ainda bem que eu te contei.

— É...

— Ei! A minha parte favorita desse jardim vai ser daqui a pouco!

— O que? Como assim?

— Espere um pouco.

E eu esperei.

— É... Maria...?

— Shhhh! —ela me interrompeu. E sussurrou: — Espere!

E eu esperei mais uma vez. Ia falar de novo, mas vi uma pequena luz sair de um arbusto. Quando ia comentar, ela sumiu. Cocei a cabeça, confuso. Então a luz apareceu novamente, em outro lugar.

—... Maria... — sussurrei. — O que é isso?

— Calma... — ela sussurrou. — Ainda estão tímidos...

— Quem?

Ela não respondeu. Não precisou. Eu, pouco depois, percebi outras luzes sumindo e depois reaparecendo. Eram azuis. Voavam por todo o jardim, suavemente. Uma dessas luzes se aproximou de mim, e eu percebi que eram...

— Vaga-lumes? — olhei para a criatura, impressionado. — Azuis?

— São lindos, não acha? — Maria sorriu.

— São... — e olhei pra ela. — Que nem você!

Maria olhou pra mim, um pouco surpresa. 

— Obrigada! — ela me deu um sorriso. Não sei porquê, mas sorri também.

E eu ouvi um grito ao longe. Era minha mãe, e me chamava de volta pra casa.

— Eu... eu preciso ir. — disse, triste que só.

— Tudo bem. Vou ficar aqui mais algum tempo. — disse Maria.

Ela se levantou do banco junto comigo e me acompanhou até o primeiro arco de flores. Paramos embaixo nele, e nos olhamos. Eu não queria ir embora. De jeito nenhum. Maria percebeu minha tristeza, e aproximou o seu rosto do meu. Senti sua boca de madeira encostando na minha bochecha.

— Até amanhã, Antônio.

— A.... Até amanhã, Maria. — eu não conseguia parar de sorrir.

Saí correndo do jardim, todo sem jeito. Quando minha mãe me perguntou o motivo da minha alegria, disse que tinha visto vaga-lumes. E ficou por isso mesmo.


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