HASHIREEEEEEEEEEEEE!!! escrita por Setsuuukita


Capítulo 9
Capítulo 9: "aquele dia do mês" ruim em todos os sentidos.


Notas iniciais do capítulo

Se correr o bicho pega; se ficar... o bicho... AFFF!!! O QUE FAREMOS AGORA, QUE EU ME SINTO TÃO NULA?!!!



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                                                   I

— Como nos encontrou aqui? — Rikki sibilou. Estava com olhos surpresos.

— Foi fácil encontrar vocês. Com quem pensa que está falando?

— Beleza. Mas, como nos encontrou?

— E isso realmente importa? Para onde vão não precisarão saber desse detalhe. Preocupem-se apenas com o sofrimento eterno que aguarda por vocês, quando deixarem este mundo.

— Mas que demônio otário. — Makoto coçou a região abaixo do lábio inferior.

— Sim. Um babaca. — Lin sorriu de orelha a orelha.

— Deixa eu te falar uma coisa, cornão...

Makoto tomou a dianteira de todos, mesmo em meio à pressão na atmosfera causada pelo youki que Niú-De-Tóu emanava do corpo para coagi-los.

— O bandidão que tá tomando conta desse pedaço aqui é eu. Vai ter que vir com um bonde mais pesado que isso se quiser tomar meu morro.

— Então é bom que esteja preparado para ser o primeiro dos três a morrer, viadinho.

— E ów cara...  — Fez uma pausa sarcástica. — ‘Cê tá preparado também, seu peso morto na terra?

— E eu ainda quero saber como esse desgraçado nos achou!

Rikki continuou a se questionar.

O pequeno tanuki estava tão inquieto, mas tão inquieto, que a fangonesa conseguia, facilmente, ler na expressão dele que havia preocupação mútua dentro da sua cabecinha. Tinha uma manivela girando desesperadamente por causa da maquinação pesada dos pensamentos do amigo, rodando do lado de fora da sua têmpora. Era incontestável ela pensar que: CLARO, PORRA! O desgraçado surgiu inesperadamente, contrariando as estatísticas todas do rolé que eles pretendiam dar em breve. Tipo alguém chegar trazendo a notícia de que você está com AIDS, ou câncer, ou qualquer outra enfermidade anátema que nunca imaginaria ter na sua vida. Então ficou evidente que o bichinho estava sofrendo por aquele supetão do caralho, daquele diabo ter quebrado as pernas deles três ali mesmo, e sem pena. Daí, também, não tanto quanto o amiguinho, mas, TAMBÉM, ela se pôs a cheirar a mesma essência de atormentamento que Rikki já estava cansado de ter ficado ébrio de tanto aspirar.

— Achar vocês foi à coisa mais fácil desse mundo, como eu já disse antes. E tudo isso graças a você, Rikki. — Niú-De-Tóu fez questão de esfregar aquilo na cara dele.

— MAS POR QUE MINHA CAUSA?!

— Sua maldição, obviamente. Já devia ter pensado nisso antes.

— Não acredito nisso.

— Foda-se.

...Silêncio por alguns segundos.

— Pense da maneira como bem quiser. A escolha é sua, assim como também teve a escolha de voltar para perto da joia. Você teve a oportunidade de viver livre dela e não a aproveitou.

O tanuki ficou em silente, azoado.

— Então a gente vai resolver essa parada agora ou nem?

Makoto buscou por respostas.

— O que você acha?

— Que você vai arregar, claro.

— Não está em condições de pensar que pode me fazer recuar, bichano.

— Suave, então me prova.

— Você é um verme, e eu estou prestes a esmagá-lo com uma das minhas solas.

— E você vai fazer parte do meu churras de fim de semana, Ushi-san.

— Então já chega de conversa. Vou mostrar-lhes algo, para que fiquem mais espertos.

Niú-De-Tóu estava prestes a revelar-lhes algo indesejável. Era essa a sensação que eles tinham; o palpite daquilo era de ser algo indesejável. Óbvio que era INDESEJÁVEL. Mentalmente, imploravam para que não fosse outra peça circense da Makailândia. Ele levou o punho destro cerrado até o centro da testa e abriu calmamente os dedos. Uma das pontas de suas garras tocou o local, que começou a se desmaterializar aos poucos, ganhando um aspecto de aura rubro-negra e quando ele afastou o braço para o lado — abrindo-o na horizontal — o elmo taurino desapareceu como fumaça brilhosa, deixando apenas os chifres. Para surpresa de todos, o que estava por debaixo do que acabara de desaparecer era um rosto com feições humanas; mas um rosto assombrosamente pálido e hepático. Seu nariz era afilado e protuberante. Os lábios eram tão finos que só era notório que eles estavam ali por causa do seu suave tom arroxeado, e caninos vampirescos evidenciados. O cabelo negro e onduliforme do demônio ganhava mais destaque também.

Quando o suposto algoz abriu seus olhos...

As crianças viram um mar de fogo mefistofélico vibrando dentro de suas íris.

Um vermelho morto, apático de todas as criaturas vivas, contra o fato de todas elas estarem vivas.

— O réquiem de vocês está propínquo, crianças. Mas antes que ele comece a soar, eu farei vocês sofrerem uma eternidade dentro do pouco tempo que pretendo levar para matá-los.

Meteu à bronca.

Niú-De-Tóu, naquele mesmo instante, dava início aos trabalhos a que veio.

Se antes o ar estava constrito o suficiente para fazê-los se sentirem impotentes de se manterem firmes e fortes enquanto de pé, por pouco a sensação não se tornou como a de estarem vestindo uma roupa de manicômio, absurdamente pesada, que quase restringia-nos 100% de seus movimentos. Logo eles notaram que havia um tipo de aura de trevas os envolvendo, no formato de uma serpente com chifres e olhos assassinos. Ela os cingia, os dominando por completo.

Vendo aquilo, Niú-De-Tóu se avantajou com o olhar de um tirano frio e psicopata.

Tudo ficou mais difícil para eles. Aquele elmo do demônio servia como um selo que trancava sua verdadeira força, e nem Lin, nem Rikki e nem Makoto poderiam afirmar que pararia de crescer por ali.

A fangonesa estava vivendo um drama sanguíneo por dentro. Quando ela ficou exposta a verdadeira identidade do caçador vil, tentou de todas às maneiras decifrar se o tal era uma entidade qualquer ou não, vinda dos bastidores do submundo, e de tanto pensar ela chegou à conclusão de que reconhecia aquela silhueta:

— Não dá pra acreditar nisso... V-você... Você é Baal, não é?! Maldito... — Lin silvou quase sem forças para falar. — Vem de uma dimensão muito mais abissal que até mesmo a de Shabranigdo!

— Óh... — O demônio lambeu os lábios, surpreso.

— Você tem certeza disso, Lin-sama?! — Rikki perguntou.

— Ngh! Tenho total certeza!

— É mesmo uma mocinha muito estudiosa, Myung Lin... Mas é por buscar tanto conhecimento desta competência, que seus pais são desgostosos de você... — O cornudo motejou.

Lin se abalou com ele. Suas pernas já estavam para lá de fracas. Ela já não tinha mais forças para respirar, assim como seus companheiros também não tinham. Caiu sobre seus joelhos, mas não tirou os olhos do demônio. O olhar dela era solitário, assim como ela voltou a se sentir ao ouvir o que ele acabara de dizer. Era como se Baal tivesse jogado sal na sua ferida mais dilacerada e profunda, e importava mesmo se sentir daquela forma justamente durante aquele show? Lembrar de sua vida afetiva com sua família era mesmo conveniente para aquela discussão? Buscar pelo pólo mais obscuro e supliciado dos espíritos das pessoas formava a tática mais comum utilizada por todo demônio e ela sabia disso; mas mesmo assim, mesmo assim... Aquilo sempre a atingia de uma maneira que nem ela conseguia entender bem, e o tempo... O tempo de voar era muito curto para abandonar sua frieza cirúrgica. Lin não podia deixar aquilo a consumir, pois aquele sentimento pungente seria sua sentença e o punhal a esquartejar suas vísceras.

— O que foi criança? Eu disse algo absurdo? Por que vive este imbróglio agora, se você sempre se considerou uma pessoa forte e independente? Eu estava enganado esse tempo todo? — O desgraçado chamou os dois companheiros da fangonesa para seus olhos. — Dar-lhes-ei tempo para que a convençam de que sua escolha foi tortuosa demais, e isso a tirou da estrada de sua própria vida.

— Mas o cara do imbróglio é você, Ushi-san. Sua cabecinha de pica é muito confusa... Ora você diz que não vai mais ser bonzinho com a galera; ora quer aliviar a barra, tá ligado? Acho que você não tem vocação pra ser demônio. Já parou pra pensar?!

Makoto armou um tímido, porém irônico sorriso.

— Você é o ser vivo mais linguarudo e ingrato que já vi em todos os meus anos de existência... Acho que isso é mal de híbridos que não possuem discernimento e clareza dos perigos que estão passando.

Ettooo... E espelho em casa, tem? Porque o eloquente da língua de veludo aqui é você, mermão. Não sabia que existiam demônios granfinos, e se bobear, só falta andar de terno Armani, cheirando a perfume Paco Rabanne, igual aqueles burguês safado.

— Você se acha muito esperto, garoto... — O demônio mostrou um sorriso vil. — Eu já sei...

Enquanto mostrava seus dentes afiados, Baal os afetava com olhos assassinos.

— Decidi que quero brincar um pouco com vocês, antes de matá-los!

— E nós vamos brincar de que, seu arrombado? — Makoto se animou.

À exceção de Makoto, que não mostrava abalo algum, Rikki e Lin estavam um caco.

— Vocês terão de ficar vigilantes por suas vidas. Quero que corram e que sintam medo em nível de pavor, e receio a cada esquina que cruzarem. Desconfiem de cada rosto que virem pela rua, de cada silhueta, e desconfiem até mesmo de suas próprias sombras. Se não zelarem por suas vidas e deixarem de tomar qualquer cuidado, eu arrancarei os membros de vocês um a um. E se tiverem condições de correrem novamente farei questão de expor o intestino de vocês ao público, como um saco de merda! Dilacerarei suas vísceras e as comerei utilizando minhas próprias mãos. Igualmente farei com os corações!

— Ah lelek, só pode tá de brincadeira com a nossa cara, né? Até Takashiro Shiraishi é mais malévolo do que você!

— É o que veremos.

FAPT!

E Niú-De-Tóu, ou como preferirem, Baal... Desapareceu sem deixar rastros, levando com ele aquela aura opressora que fora embora junto, mas deixou para eles o temor e um estresse quase fulminante, quase que como uma sequela.

     Logo depois só restou o silêncio que pairou no quarto, dando uma sensação de petrificação da cena. Aquela atmosfera deixada pelo demônio tornava a tentativa deles de dialogarem entre si uma estafa pesada. Tudo ficara mudo e abafado, restando apenas as trocas de olhares dos três. A sensação que indicava que o bicho iria pegar era a única que passava a incomodar mais do que tudo. Parecia que, se eles dessem um único pio, seriam decapitados, ou teriam no mínimo a mão decepada só para começar a tortura.

A fangonesa levantou e voltou ao banheiro após o causador do transtorno ir embora começar aquela palhaçada de suspense. Foi num pé só e retornou a presença deles, seca — exceto pelo cabelo ainda molhado —, limpa da espuma e do sabão; e dessa vez vestida com um short jeans claro e uma blusa amarela que mostrava apenas meio palmo de sua barriga. Sentou-se sobre a cama e calçou o par de allstar vermelho de sempre. Tudo em silêncio.

Aí no instante em que ela terminou de se preparar...

O olhar entre eles voltou a se encontrar, e ficaram se olhando por alguns segundos, quando...

— CARALHO, FUDEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEU!

A expressão de vazio deles virou aquela máscara do filme Todo Mundo em Pânico, na velocidade do apertar de um botão.

Os três finalmente demonstraram o desespero como se deveria demonstrar.

— Mano! Puta que pariu! Caralho, caralho, caralho, caralho, caralho, caralho!

Makoto bradou.

— Por que você tá se sentindo assim agora, Makoto?! Foi o único a bater de frente com esse demônio filhodaputa! Tá com medinho agora?! VOCÊ QUE PROVOCOU MAIS AINDA A FÚRIA DE BAAL!

Rikki grasnou.

— Olha aqui, vai ti tomá no cu rapá! Alguém tem que ter peito de aço nessa merda, seu Okitanuki safado!

— MAS QUE PEITO DE AÇO O QUÊ! VOCÊ TÁ SE BORRANDO DE MEDO AGORA, DESGRAÇADO! — Rikki devolveu.

— Não... Parem vocês dois.

Lin interferiu.

— Quem o humilhou a ponto dele estar putão da vida, agora, fui eu. Deve ser ultrajante para um demônio do nível dele conseguir ser anulado por uma magia daquela estirpe, que eu usei contra ele no fim da batalha. Ele não teve nem chances de mostrar seu verdadeiro poder, como fez agora. — Lin falava aquilo com lágrimas nos olhos. — MAS EU NÃO ACREDITO QUE, QUEM TÁ NO MEU ENCALÇO AGORA, É BAAL! Ele é mais forte que Shabranigdo! Esse desgraçado vem das camadas mais inferiores do mundo dos demônios! Nem sei o porquê está atrás da joia da catástrofe. Não creio que ele precise disso. Algo deve realmente estar acontecendo.

— De fato. Baal é tão forte quanto todas as outras entidades mitológicas que servem ao príncipe das trevas. Nós não sabemos ainda sobre o quanto esse miserável pode estender seus poderes, mas o que vimos agora, apesar de ser absurdamente forte, não deve ser nada se comparado ao real poder dele, Lin. Tenha noção disso. — Rikki ponderou.

— É verdade, Rikki. Vamos deixar o hotel agora. Não podemos pôr em perigo as pessoas que aqui estão presentes neste prédio. — Lin pediu com diligência.

— Então vamo meter o pé daqui logo. Se pudermos, temos de achar um local isolado da cidade, onde não haja muita gente pra correr perigo.

— E há algo que quero dizer a vocês dois, antes de qualquer coisa. — A garota mostrou um semblante arreliado, ao mesmo tempo em que muito, mas muito preocupado.

— O que, Lin-sama? — Rikki esperou.

— Meus poderes tiraram folga de alguns dias de mim.

— ÉOQUÊ?!

Os dois entoaram sincronizados.

— É isso mesmo. Não consigo fazer nada grandioso enquanto estou assim.

— ASSIM COMO?! — Rikki subiu no ombro direito de Lin.

— Hum, bem... Estou passando por aqueles dias do mês, se é que me entendem.

— Tá de ch-...! — E quando percebeu que estava “pensando alto demais”, o híbrido se calou na hora, antes que Lin percebesse a besteira que estava prestes a dizer. — Isso é sério mesmo? Achava que fosse só um mito. — Makoto completou.

— Mas que droga. O pior de tudo, é que isso realmente acontece. Existia uma sacerdotisa em um templo perto de onde eu moro, que sempre se isolava num período de alguns dias, que não lembro quantos eram, mas toda vez que isso acontecia ela deixava um bilhete dizendo: “manutenção de poderes”.

Rikki arfou.

Que dia, meus companheiros. Tanta reviravolta de altos e baixos que pareciam estar montados num carrinho da Takabisha, aquela montanha russa dos quintos do quintal do Diabo. A fangonesa achava que após ter acordado de sua letargia, provocada pela exaustão de ter utilizado bastante os seus poderes contra Baal e sua horda, ela partiria ao encontro da tal amiga dos novos companheiros que ela acabara de fazer. Talvez o seu germe de esperança tivesse lhe dado uma proporção meio que enganosa, de que conseguiria sair daquela cidade como queria: plena, como uma Lady. Muita pretensão para apenas 1,52 de gente. Ela alimentara demais uma secreta convicção de que nada daquilo poderia ficar pior do que já estava.

Enfim, não importava mais aquela lamúria toda.

Eles precisavam o quanto antes encontrar a biblioteca antiga mais próxima, — era isso que Lin pensava pelo menos — e não faziam ideia de onde poderia haver uma, e a única alternativa que tinham em meio àquela lama toda era apenas sair e procurar. Nunca que aquela frase dizendo “se correr o bicho pega, se ficar o bicho come”, fez tanto sentido.

Rikki e Makoto tentavam apenas compreender porque tanto ela queria ler livros em plena temporada de caça às suas cabeças. E olha que a cabeça dela era a que mais valia dentre as três…

                                                 II

20:23 da noite, bairro de Lucca Pirlo, Vucinicci.

Sob o aviso prévio da morte e seu silencioso sarro, não existia canseira que pudesse falar mais alto para eles três. O medo se fazia sentinela durante toda a busca deles pela cidade, e eles já não faziam nem ideia de onde estavam pelo fato de tanto correrem a esmo atrás do que queriam. O que os deixavam mais encucados era que: já se fazia quatro horas desde que o desgraçado do Baal havia dado o alerta e eles acreditavam que aquilo seria uma brincadeira de pique-pega, ou pique-esconde, talvez. O que implicava para eles por causa disso era o causticante estresse e afetação em seus psicológicos, que agora estavam tão revirados quanto um quarto bagunçado. Nada estava no devido lugar. Imagine que havia roupas amassadas, dobradas e sujas, espalhadas por todo o cômodo; roupas de cama emaranhadas sobre o colchão e o chão; almofadas fora de seus lugares e todos os utensílios espalhados pelo piso, tapete dobrado, cômoda e afins…

Assim estavam as cabecinhas de cada um deles.

— Os dados na internet precisam ser atualizados. Que merda! É 2.141 e ainda não existe gente competente pra alimentar um sistema na rede! — Makoto tentava não falar alto e terminar de foder com a porra toda, embora, né… Dando ataque de pelanca ou não, acreditava-se que o cornudo os acharia de qualquer forma; mas ele ainda acreditava que se não explodisse de raiva, seria menos pior.

— Não, não é que os dados estejam desatualizados. A verdade é que sempre foi muito difícil de achar mesmo, até mesmo pra nós, feiticeiros, magos e bruxos, ou qualquer outra classe que mexa com magia. — Lin interrompeu os passos repentinamente — Quer saber? Acho que não vai adiantar merda nenhuma encontrarmos uma biblioteca antiga agora.

— Também estava curioso sobre isso, Lin-sama. — Rikki levantou o corpinho, ficando sobre duas patas — O importante é que sobrevivamos. Essa é nossa prioridade do momento.

— Mas como vamos sobreviver se ainda estou sem meus poderes?! Eu acho que precisamos de um plano!

— Ou... — Rikki fez cogitações silenciosas.

— Se está pensando que devemos entregar essa coisa pra ele, é melhor retirar seu cavalinho da chuva.

Lin foi mordaz.

— Mas acho que não temos esc-!

— Cala um pouco essa sua matraca e me ajude a pensar em algo, ao invés de ser um mandrião!

— Mas o que você pensa em fazer, justamente sem seus poderes, Lin-sama? Eu também estou sem os meus e simplesmente não podemos tentar barganhar com um demônio que está decidido a arrancar nossos miúdos e fazer farofa de panko com eles!

— Eu não sei. Mas nós somos OBRIGADOS a pensar em algo, porque se entregarmos isso a ele, não seremos os únicos a morrer!

Enquanto isso, Makoto ficou paradinho, observando a troca de opiniões quase descoroçoada dos dois companheiros e... alguém precisava manter a calma naquele momento.

— E outra coisa, Rikki: acha mesmo que será fácil recuperar a joia da catástrofe depois que ele puser as mãos nela? Nós nos deparamos com duas hipóteses existentes e... EM NENHUMA DAS DUAS isso vai acontecer! Primeira hipótese, queridinho: eu não tenho acesso à dimensão dos demônios. Não tenho acesso nem a mais rasa, quem diria a que esse filho de uma vaca desbotada pertence; e mesmo que eu tivesse, não pisaria no território inimigo por nada, PORQUE ISSO SERIA SUICÍDIO! Então acha mesmo que nós conseguiríamos persegui-lo após ele conseguir isso? Agora vem a segunda das duas: SE ELE JÁ É FORTE ASSIM, IMAGINA QUANDO ELE CONSEGUIR PÔR SUAS MÃOS NELA?! Será impossível pra nós, ou você acha que irá incorporar Jesus de Nazaré e começará a operar o milagre?

— E enquanto vocês discutem sobre isso, acho que o único apto a operar um milagre aqui — Makoto cessou o bate-papo dos dois, sorrindo de uma maneira que parecia meramente excitada — sou eu...

— Você? O operador de milagres entre os três?

Lin e Rikki ficaram em silêncio, com semblantes despedaçados.

— Você só tem vocação para ser o primeiro dos três a morrer, como eu disse que seria.

Era Baal. Ele finalmente havia aparecido, e Makoto percebeu isso. Trazia com ele mais desespero e pretendia enfiar goela abaixo de suas presas, forçadamente.

E a Lin, a Lin teve uma breve conformação, afinal, aquilo estava para acontecer a qualquer momento e seria utópico demais pensar que o demônio poderia ter desistido de uma caçada tão fácil como esta, e ele não faria isso nem por capricho. Aquele seria o momento ideal para esmagá-los. Logo naquela fase de vulnerabilidade. Foi então que ela engoliu a seco uma saliva com gosto de azar e algo que lembrava desesperação, até que...

Ela viu o felpudo caminhar novamente para à dianteira.

Ele é maluco? Só este pensamento poderia arrematar pela porta de sua mente e a invadi-la, naquela hora.

— Estou ficando bolado com vocês dois... Rikki e Myung-san. Principalmente com você, Rikki, que pelo menos tem ideia do que sou capaz de fazer com esse cara.

— Não seja tolo, Makoto. Ele é Baal! Você perdeu a sanidade? —Rikki perguntou, preocupado com o amigo.

— Ele é Baal, e eu não estou disposto a morrer sem cair atirando, morô? — Makoto encarou o pele-pálida, enquanto falava. — Entendo sua preocupação, mas tenho certeza que se você estivesse com seus poderes agora, estaria aqui na frente comigo pra me ajudar a rebocar esse verme na porrada. Já à Myung-san... Há alguns dias, ela mesma deu um piau nele, por isso que agora ele tá aqui pesadão de ódio.

— Vamos. Não quero mais perder o meu tempo com vocês, reles criaturas inúteis.

— Ah, meu camarada. Cala essa boca, que ninguém chamou você na favela. — Makoto respondeu ao Baal, impaciente.

Algo estava para começar naquela rua pacata, de chão de cascalho, que ganhava uma iluminação de alguns postes de metal negro e formato rústico, de luz amarela e fraca, que em alguns deles estavam até bruxuleantes. Os moradores das casas locais pareciam estar todos dentro das residências, ou se não isso, alguns ainda estavam por chegar de suas rotinas como pais de família nas suas danças diais da vida, pois não havia ninguém lá senão os quatro, porém, um momento preâmbulo de preocupação a batalha sussurrava aos ouvidos de Lin: ataques desferidos poderiam resvalar nas casas e provocar mortes acidentalmente. Não acidentalmente da parte de Baal, em contrapartida. E provocar atribulação a vida das pessoas já estava começando a ser algo com pedido corriqueiro.

— Você só sabe falar e provocar, jovem. Se acreditar mesmo que eu não estou aqui para matar vocês, acho que irá se decepcionar quando perceber que, a partir de hoje, não fará mais parte deste mundo. E... Irá se lamentar mais ainda do quanto poderia viver muito mais do que isso.

Baal começou a sobrepujá-los novamente, causando pressão na atmosfera com seu youki. A fangonesa e o tanuki se ajoelharam no mesmo instante, subjugados pela força malévola da aura, feito que embrulhou seus estômagos pela ideia de que estavam passando por aquilo de novo — coisa que não queriam passar jamais novamente. Mas algo levemente aliviou seus corpos e mentes: outra aura limpa lhes deu uma sensação de proteção, mesmo que não absoluta, e diferente do youki inimigo, era um reiki anil e com ar benévolo. E este reiki, claro, era nada mais, nada menos que de Kamizaki Makoto. Ele acabou servindo de escudo para que os músculos dos membros perdessem a fibra travosa e o peso condenatório que os fizeram se curvar à soberania do ímpio rei. E Makoto olhou-os de soslaio, ao virar o rosto levemente para trás, como se estivesse querendo dizer que a partir daquele momento, ficaria tudo bem.

Sorriu, olhando para frente, novamente.

— Eu vou enfrentar você meu camarada. Seremos só nós dois. Eu e tu. Mano a mano à moda antiga. No fim, a gente não perde a amizade.

Makoto avisou.

E Baal...?

Não disse nada. Apenas levantou o braço na vertical e, com o movimento, causou surpresa aos três pela rapidez do ataque: fez o híbrido ter de segurar uma onda bruta e desordenada de youki, que fora lançada com a intenção de atirá-los para longe, quebrando seus ossos e causando todo tipo de estrago possível com isso; mas, o queridinho de Lin e Rikki conseguiu aparar o golpe, mesmo que sendo com uma felicidade extremamente rara de sucesso. Fez isso segurando a trombada com as duas mãos e os pés quase que cravados ao chão, e todos os seus músculos fortificados com reforço de reiki.

Wo de yangxiong...

Disse Lin, suspirando.

— Deem o fora daqui, agora! — Makoto bradou, ainda segurando a onda de choque, tendendo a ser arrastado para trás.

O chão já estava começando a se desfragmentar sob o apoio de seus pés, fazendo barulho de rochas se partindo.

A fangonesa nem pensou duas vezes e pegou o guaxinim pela pelanca do colarinho e breve meteu o pé de lá.

— SOBREVIVA, BICHANO! PELO MENOS ATÉ A GENTE PODER FAZER ALGO POR VOCÊ!

— RIKKI, SEU INSENSÍVEL! O que a gente poderia faz-!... — A garota se calou ao virar a esquina, relutando. Teve um estalo, de repente. — Será que ele irá sobreviver? — Ela então parou. Um filme contraditório começou a ser exibido na gigantesca sala de cinema que ela chama de mente, e o filme mostrava que ela poderia, SIM, fazer algo — embora que aquela situação fosse deveras compósita de inúmeras desgraças e limitações estorvas. Bem. A discrepância, nesse momento, simplesmente deu a ela um choque térmico pelo balde d’água fria virado sobre sua cabeça, em vista de que sua decisão do momento anterior foi por pura efusão. — Eu acho que você tem razão, Rikki...

E quando olhou para trás, Baal já estava tocando o chão com a ponta do seu pé direito, chegando de um salto rápido.

— Você não vai a lugar algum, Myung Lin. — Baal falou com certeza assassina.

— Não acredito que... Makoto... — Os olhos dela marejaram, mas as gotículas se partiram por mais uma surpresa estupidamente afanada: após um rastro de eletricidade triscada, — que fez curva logo à frente de Baal —, o camarada apareceu, MAIS UMA VEZ, para resguardá-los, acertando um chute potente no rosto do demônio, o mandando para alguns instantes dali, cambaleando.

— Vem tranquilo. Não vem afobado não, meu consagrado!

Makoto zombou, fazendo gesto de Bruce Lee.

E ao calar de todos, o que sobrou foi o finalzinho do som de faísca.

— Mas que merda de caminho sem volta que a gente foi se meter... — Rikki já estava pronto pra dar no pé, de novo, mas dessa vez com suas próprias patas.

— Prossigam. Ele não vai mais passar daqui, garanto.

— Não posso abandoná-lo assim. Sei que minhas pernas agiram por instinto e me fizeram atender ao seu pedido, mas isso não seria justo.

— Você irá me atrapalhar se ficar aqui, cabeçuda!

AIYÃ! Eu simplesmente não posso sair daqui enquanto você sai na porrada com esse monstro miserável!

— Mas não era você que estava tentando ser racional há minutos atrás, aho?!

— E eu continuo a ser racional, como sempre fui... seu baichi!

— Nenhum de vocês são seres racionais. Não temem pela própria vida; não possuem o mínimo de razoabilidade para se colocarem em suas devidas insignificâncias e aceitarem que sou maior que vocês; são desprovidos de massa encefálica, acredito, pois, se tivessem algo assim com vocês, não estariam perdidos nessa ignomínia de coerência e do bom senso.

Voltou a entrar no campo de percepção de todos eles, o demônio.  Baal vinha caminhando sem pressa alguma, com chamas lentamente trêmulas rodopiando seus dois antebraços esguios.  A flama tinha uma tonalidade de sangue bem ávida, que só de olharem, já provocava arreceio em todos os nervos dos três.

E é claro que o cornudo pretendia reduzi-los a cinzas, a qualquer custo. Ele estava pronto para atacar sem distinção ou ordem, sem que nenhum deles escapasse, de preferência, e Makoto já se prontificou novamente para proteger seus amigos, criando postura para segurar o próximo ataque.

Para Makoto, seria tão melhor se eles tivessem conseguido fugir, e o meio-felino já guardava o início de um pouco de fadiga mental, por causa da fangonesa turrona que não querer ir para longe dali. Maldita hora de querer fazer compilação de valores morais em nome da amizade. Só queria que ela enxergasse isso pelo apuro da enrascada.

Então lá vinha a onda de fogo demoníaco que já era o esperado. O tanuki, com o corpo leve, conseguiu se esquivar para a direita, atravessando a rua e pulando em algumas ameias acima, de uma das casas locais, enquanto Lin recuou para trás, mantendo-se dentro do campo astral feito pelo reiki do híbrido.

O seu defensor, pensando rapidamente, e desistindo da ideia anterior, que era a de aparar mais uma vez o golpe, desapareceu e fez com que a garota desvanecesse sua imagem junto em meio ao barulho e rastro de faíscas estáticas, como há pouco. E o fogo passou lambendo tudo à frente: postes de luz, lixeiras e caixotes de madeira amontoados em alguns cantos; e até um carro estacionado, que acabou explodindo após ser incinerado. A rua — um pouco mais ampla e larga que a anterior — foi tomada parcialmente pelo breu assim que as chamas cessaram sua violência e o curto circuito que provocava clarões intermitentes, com sonoridade e hostilidade elétrica, também.

A única parte que se mantinha bem iluminada era a que o carro reluzia fortemente o fogo que ardia nele.

Como era de se esperar, todo este alvoroço, causado pela luta entre os jovens e o assassino do submundo, já havia sido notado pelos moradores locais e alguns transeuntes que por ali nas adjacências passavam. Não sabiam o real significado da destruição e tanto barulho, até então. Alguns dos moradores saíram de suas residências e isso era o que Lin, Makoto e Rikki mais temiam. Todos poderiam sair para verificar, mas só os mais corajosos se propuseram a vasculhar o evento; outros preferiram manter-se dentro de suas residências com o medo do barulho funesto e adverso para suas vidas.

— Humanos, como sempre... criaturas metediças em assuntos que não são seus. — Fez uma pausa — Chegaram numa ótima hora, expectadores sortudos.

— Não se atreva a tocar um dedo nessas pessoas, seu cretino!

Makoto retornou à cena. Um monte de correntes de força percorriam todo o seu dorso.

Os curiosos corriam grande perigo agora.

Todos ali estavam à mercê do malefício que os atos de Baal trariam, se permanecessem diante dele e do híbrido.

— FAÇA UM TROVÃO, TSUTOMOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOO!


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Notas finais do capítulo

Makai = mundo das trevas.

Ushi = boi.

Wo de yangxiong = meu heroi.

Baichi = idiota.

Aho = idiota.

Reiki = energia espiritual.

Youki = energia espectral.



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