Como acabar com o amor da sua vida escrita por Ana Carolina Marquês


Capítulo 9
I Fogueira I


Notas iniciais do capítulo

* Aproveitem e preparem os corações!



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Noah

 

Fiquei dando replay no vídeo algumas vezes de madrugada e tinha esquecido que havia desligado a internet do celular. Era um show de horrores: Ashley seria coroada a princesa do baile, mas no meio do caminho até o palco Heather fez com que ela tropeçasse e algumas pessoas— incluindo Victor— começaram tacar alguns líquidos e coisas estranhas. Algumas pessoas ao redor ficaram horrorizadas enquanto outras filmavam e apontavam dedos.

Aperto o celular e coloco o e-mail nos arquivados, não sei se consigo ver isso sem vomitar. Apesar de tudo consegui dormir mais que o suficiente e agora fico rodando de um lado pra outro da cama, esperando o almoço ficar pronto. Domingo é sempre um dia melancólico e esquisito. Ligo o Wi-Fi e várias mensagens começam a apitar. Ash e Trevor devem achar que eu morri.

Localização: PineCreek

08:34 –

Barbie: planos pra hoje?

09:01 –

Barbie: isso foi um não? Ótimo!

09:13 –

Barbie: Te vejo na festa mais tarde, vou enviar o endereço depois do almoço

Primeiro de tudo: quem em sã consciência acorda tão cedo no fim de semana? E festa? Mando uma mensagem rápida para Jack dizendo que estou vivo e que ele não precisa comprar um terno rosa para o meu funeral e ele me responde com alguns emoticons raivosos. No fundo ele só quer esse terno.

Localização: Desconhecida

11:34 –

Me: Eu só estava dormindo, o mundo finalmente começou a acabar? Amanhã temos aula.

 

Localização: PineCreek

11:34 –

Barbie: Não vamos ficar até tarde, só uma festaaaaa

 

Me sento na cama e mando um ok pra Ash que me manda todos os emoticons possíveis. Se for pra encarar algo assim, Jack vai ter que ir comigo, por isso, já envio uma mensagem dizendo que temos uma festa para ir e ele deve ser o cara mais rápido do mundo— desculpa, Flash— porque nem dá tempo de bloquear o celular e ele já começa a vibrar.

— Olá, Coringa? Gostaria que devolvesse meu melhor amigo, ele tem hábitos estranhos.

Reviro os olhos e me jogo de costas na cama, rolando para o outro lado e desligando o abajur.

— Você vai ou não?

Jack resmunga e escuto barulho de portas se abrindo. Se conheço bem meu amigo ele vai ter uma “crise” e irá me obrigar a ir comprar roupas ou ajudá-lo a escolher alguma coisa para vestir. Começo contar mentalmente, já estou no sétimo segundo quando ele solta um gritinho.

— Estou sem roupas, mas posso me virar com o que tenho. Vou te mandar algumas fotos e você me ajuda escolher, ok? Passo na sua casa nove e meia.

— Mas começa as oito!

Ele ri e consigo escutar quando começa jogar várias coisas no chão, que imagino serem roupas e cabides. Como alguém consegue ter tanta coisa e achar que não tem nada para vestir?

— Noah, você é realmente um anjinho, sabia? Ninguém chega no início e provavelmente ainda chegaremos cedo.

Reviro os olhos, começando a sentir minha ansiedade aumentar enquanto olho para o meu próprio guarda-roupa que está aberto e extremamente bagunçado. Eu é que preciso de ajuda.

— Desculpa se eu não li o manual de como ir e se comportar em festas.

— O que você seria sem mim? Preciso ir, vou começar me arrumar. Tchaaaaau.

O barulho chato quando alguém desliga na minha cara é sempre irritante. Jogo o aparelho na cama e começo a encarar meu reflexo no espelho. Ainda é cedo, mas... Preciso descer para almoçar, retocar o esmalte que já está todo descascado e dar um jeito de cortar as pontas do meu cabelo que já estão atrapalhando minha visão. É a primeira vez que sou convidado oficialmente para uma festa no ensino médio e me sinto estranho. Uma mistura de euforia e medo, todos vão estar lá. O celular vibra e quando vejo é uma mensagem de um número desconhecido, mas pela foto de perfil sei que é de Trevor.

É um convite para a festa de voltas as aulas totalmente atrasadas, tem um pequeno textinho falando que devido a uma falha técnica— que nada mais é que: os organizadores levaram suspensão nos primeiros dias— tudo teve que ser adiado, mas eles prometem uma grande festança. O lugar antigo era a casa de Cristal, mas por algum motivo vai ser em uma clareira perto da cidade.

Tenho quase certeza que esse motivo envolve: bebidas, polícia e adolescentes, mas tento não me prender nisso ou vou acabar desistindo da ideia. Volto a olhar meu reflexo e decido ir comer antes do meu estomago morrer de vez.

♡ ♡ ♡ ❤ ♡ ♡ ♡

Ash

Termino de tirar a maquiagem e começo a hidratar meu rosto, faz um tempo que não consigo usar sombra ou qualquer coisa mais pesada. Sem querer derrubei suco no vestido que estou usando e o rosa acabou ficando marrom, o que é péssimo já que estava pensando em usar ele para a festa de hoje. Deixo o celular tocando uma música enquanto penso no que vestir, mas apesar de estar muito ansiosa não consigo evitar de sentir fadiga. Um sentimento ruim, igual tive no primeiro dia. Levo um susto quando minha mãe da algumas batidinhas na porta e meu coração acelera ainda mais. Estou evitando uma conversa com ela desde o dia que meu pai se foi.

— Ashley, preciso falar com você.

— Tudo bem, desço daqui a pouco.

Espalho o creme de qualquer jeito e estalo os dedos. Quando saio do meu quarto preciso respirar fundo, desço os degraus o mais devagar que consigo. Assim que começarmos a conversa tudo vai ser oficializado e não sei como vou conseguir lidar com isso. Sinto o creme escorrer um pouco por causa do suor e começo a morder a boca.

Consigo ver minha mãe no sofá, ela está de cabeça baixa e a pena não para de balançar. Seus cabelos antes sedosos parecem ensebados e desgrenhados. Quando ela percebe que estou ali levanta a cabeça e me encara.

— Senta aqui.

Sua voz sai baixa e um pouco rouca. Tento me obrigar a andar e me sentar ao seu lado. Os olhos dela estão vermelhos e marejados, isso vai ser mais difícil do que imaginei. Meu coração bate cada vez mais forte e ela segura minhas mãos que tremem.

— Eu sei como isso deve estar sendo para você, é complicado para nós também. Não queremos que você pense que não nos amamos mais, o amor continua aqui. Só não é da mesma forma.

Não consigo responder nada, todas as palavras que guardei, todas as perguntas e questionamentos somem. É como se nada fizesse sentido, como posso me sentir estranha aqui? Tudo continua igual: o tapete preto ainda tem a marca onde eu e Cristal queimamos, o sofá permanece com uma manta onde meu gato estragou e minha mãe ainda é minha mãe, mas só consigo sentir frio. Engulo as lágrimas e tento me controlar.

— O papai ia embora sem se despedir.

Ela aperta um pouco mais minhas mãos e faz com que eu olhe nos seus olhos.

— Eu sei e ele sente muito por isso, foi tudo no momento da raiva. Seu pai nunca iria embora sem se despedir de você, nós ainda somos amigos, mas ele está com vergonha do que fez e quer falar com você. Só está dando seu próprio tempo e espaço.

Dessa vez deixo que as lágrimas venham e começo a soluçar. Tudo que guardei por esse tempo parece querer sair de uma vez: meus pais, Cristal e aquele maldito anuário, Prince e toda mentira que tento esconder. Minha mãe me abraça e começa a acariciar meus cabelos.

— Tudo vai dar certo, desde que fiquemos juntas.

Estou com os olhos fechados e tenho certeza que vou deixar a camisa dela toda encharcada, mas mesmo sem vê-la sei que também está chorando. Consigo ouvir sua fungada e sentir seu peito tremer enquanto deve tentar segurar as lágrimas. A aperto ainda mais e consigo sentir um alívio. Estamos juntas e só isso importa agora.

— Eu te amo, mãe.

Consigo dizer e ela finalmente começa a soluçar junto comigo. E eu sei que no final tudo vai ficar bem.

♡ ♡ ♡ ❤ ♡ ♡ ♡

Noah

Já são dez horas e Jack ainda não chegou. Estou dando mais uma volta no espelho para ver se tem alguma coisa fora do lugar, é a primeira vez que uso essa combinação de roupas— minha mãe e ele me ajudaram a escolher—: calça preta, all-star mostarda e uma blusa vermelha. Dobro as mangas dela até o cotovelo e passo a mão no cabelo mais uma vez. Estou prestes a surtar ou ligar para Jack quando escuto a buzina. Pego a carteira e o celular e desço as escadas correndo, parando só para dar um beijo na minha mãe, que está assistindo novela, e saio.

Assim que entro no carro quase morro sufocado com o perfume, dou uma tossida— mais por drama do que por necessidade — e Jack sorri fingindo passar mais perfume.

— Você está um gato, mas falta uma coisinha.

Ergo a sobrancelha e ele abre o porta-luvas tirando uma necessaire enorme dali, pega um potinho azul e abre. Depois lambe a ponta dos dedos e olha para mim.

— É glitter, temos que parecer um casal de melhores amigos, já que você perdeu a pulseira que te dei.

Ok, eu realmente perdi, mas ele acha que foi na piscina e a verdade é que um cachorro comeu enquanto eu corria. Ele me mostra o lado esquerdo do rosto, embaixo da sua bochecha tem um risco curvado ali e ele faz o mesmo comigo, mas do lado direito. Depois de satisfeito guarda tudo e me da um abraço.

— Não estamos um pouco atrasados?

Digo quando o carro finalmente começa a andar, mas Jack não acelera e começa trocar as músicas até chegar em alguma que lhe agrade. Termino de colocar o cinto de segurança e borrifo um spray de menta na boca, minha mãe que me deu e quem sabe eu finalmente beijo Julliete hoje.

— A festa só começa quando eu chego.

Jack pisca para mim e finalmente pisa no acelerador enquanto cantamos o refrão da música.

*

Demora menos de meia hora para acharmos a entrada do lugar, é um caminho de terra todo esburacado e Jack reclama o tempo todo dos pneus novos e do carro ter saído ontem do lava-jato. Não demora para começarmos a ouvir a música alta e alguns gritos animados, além da claridade. Ele estaciona perto de alguns carros que já estão ali e paga com gorjeta alguns rapazes que estão fazendo a segurança do “estacionamento”. Descemos um barranquinho até chegarmos à clareira, lá uma fogueira enorme queima no meio e uma menor está do outro lado, onde algumas pessoas conversam e queimam algum tipo de comida. Algumas pessoas cumprimentam a gente com sorrisos e tapinhas, claramente bêbados já que nos desprezam na escola. Quando olho para trás Jack já está com dois copos na mão, ele me entrega um e dá um gole no outro.

— É só refri, você sabe que não bebo dirigindo.

Ele deixa que eu cheire o copo e pisca para mim. As vezes esqueço o quão responsável nós somos, já o meu tem cerveja e apesar de não beber muito eu gosto do gosto amargo que ela tem. Andamos mais um pouco e vemos algumas pessoas de biquini e sunga, pelo que entendi alguém trouxe uma piscina — ou fez uma piscina na carroceria de uma caminhonete, não entendi muito o que a garota com hálito de vodka quis dizer — a música é agradável, mas não consigo ver Ash ou Julliete.

— Você vai ficar bem por alguns minutinhos? Preciso resolver uma coisa.

Assinto e ele me dá um beijo na bochecha quase correndo em direção ao outro lado. Fico parado e um cara aleatório enche meu corpo e me faz tomar um shot de tequila, estou limpando a boca quando vejo a garota sentada com Becky, uma das “enfermeiras” da escola, assando um tipo de linguiça. Borrifo mais uma vez o spray e começo a andar decidido na sua direção, mas alguém grita meu nome e quando olho para trás vejo Ash.

Ela vem correndo, é a primeira vez que a vejo de biquini — mesmo que seja só a parte de cima — e meu rosto esquenta. Tomo um gole da cerveja para desviar o olhar, ela também usa um short que está quase preto por causa da água.

— Uau, você está quente.

Ash está quase bêbada, ela não para de sorri e quase derruba o copo de bebida em mim quando me abraça.

— Pensei que não tinha vindo, isso aqui foi o que eu pedi de aniversário, obrigado.

— A sua ironia me encanta — ela diz me mostrando a língua — adorei sua roupa, não sabia que você tinha peças tão bonitas.

Coloco a mão no peito me fingindo de ofendido.

— Eu posso abrir uma loja que vai te deixar babando.

Ela inclina a cabeça para o lado e começa a rir, depois pega na minha mão e começa me arrastar em direção a fogueira maior. Perto de lá tem algumas barracas e mais pessoas, ou seja, casais se pegando. Mas também tem algumas caixas cheias de cadernos que parecem antigos.

— Temos uma tradição aqui, você escolhe um caderno e joga no fogo, mas quando fizer isso tem que pedir alguma coisa, geralmente queimamos nossos problemas.

Ash pega um caderno e fecha os olhos, depois joga no fogo e sorri chegando mais perto de mim, tentando sussurrar. O que é impossível por causa da música alta.

— Acho que já queimei uns dez, agora é sua vez.

Faço igual ela fez e penso nos e-mails e em tudo que aconteceu, depois jogo na fogueira e abro os olhos. Ela não para de me encarar.

— Ora, ora, pensei que você não tivesse um problema tão grande.

Dessa vez sou eu quem mostro a língua e ela segura em meu braço de novo, levantando o copo para propor um brinde.

— Que toda essa merda realmente funcione.

Ergo o meu corpo e brindamos. Se ela soubesse que metade dos meus problemas a envolvem... Consigo ouvir alguém a chamando e mesmo sem ver a pessoa sei que é Cristal, a voz dela me da enjoos. Ash vira o rosto procurando e parece ver alguma coisa no meio das árvores, ela fica na ponta dos pés e me dá um beijo rápido na bochecha. Fico me perguntando se ela vai lembrar disso amanhã e sai meio cambaleante atrás dos gritos que ficaram mais altos. Penso se devo ir atrás dela, mas provavelmente eu ficaria perdido e ela conhece isso aqui muito melhor que eu.

Fico olhando o fogo mais um pouco e tomo coragem de tentar falar com Julliete. Sinto meu corpo quente pela bebida e estou um pouco lento, por isso, caminho mais devagar ou vou acabar caindo e passando o maior mico na frente da garota que eu acho que quero conquistar. Pensar nisso faz meu estômago embrulhar. Estou a alguns metros e ela me vê, abre um sorriso e faz menção de se levantar, mas a música para do nada e começamos a ouvir gritos furiosos.

Estou quase no meio da clareira quando vejo Jack e Trevor, logo atrás Cristal filma com o flashback ligado e em segundos eles estão quase perto de mim. Prince segura um dos braços do amigo e fala alguma coisa, mas não consigo ouvir. Meus ouvidos estão quentes por causa da adrenalina.

— ... não tem esse direito.

Consigo voltar a escutar Trevor gritando, ele empurra Jack que não para de andar para trás.

— Ah é? Eu tenho nojo do que você se tornou, fica rodeado de mentiras. É isso que você quer?

— Você não sabe nada sobre mim!

Corro até onde eles estão e fico entre os dois. Trevor mantem os punhos fechados, se controlando, mas consigo ver seu peito subir e descer em uma velocidade apavorante. Os dois estão com os olhos vermelhos e cabelos amassados e as roupas sujas de terra. Tento encostar em meu amigo, mas ele não vê que sou eu e puxa o braço me fazendo perder o equilíbrio. Consigo ficar de pé e Ash aparece do meu lado, ela parece tão perdida quanto eu.

Prince entra no meio de Trevor e coloca uma das mãos para frente, fazendo Jack se afastar mais.

— Acho que é hora de você ir embora.

Jack balança a cabeça e passa por mim, sem me olhar. Fico atônito olhando para Trevor que volta para o meio das árvores e Prince que me encara, nem percebo que no meio disso tudo Ash está segurando meu braço. As pessoas ao nosso redor começam a rir e logo em seguida voltam para onde estavam com suas bebidas, a música também volta, mas nós ficamos ali. Cristal se aproxima de mim, ela tira o pirulito da boca e sorri para mim.

— Primeira vez que você participa de uma vez e isso acontece, deveria vir mais vezes.

Não consigo responder, as palavras não saem. Talvez seja pelo álcool ou pela surpresa nisso tudo. Preciso ir atrás de Jack e ajudá-lo.

— Deixa ele em paz!

Ash empurra a garota e Prince segura ela por reflexo. Ele nos olha com a sobrancelha arqueada e solta os braços de Cristal, chegando mais perto.

— O que você tá fazendo?

Ele pergunta baixinho para a namorada e meus sentidos voltam com tudo. Meu coração começa a acelerar e acho que vou vomitar. Dobro um pouco o corpo e começo a tossir, sinto mãos em minhas costas me guiando para longe.

— Estou fazendo o que os amigos fazem, Prince.

Escuto ela dizer e não consigo ver mais nada. Tudo fica preto por alguns instantes e quando percebo estou no banco de trás do carro, com a cabeça pendura em cima do cinto e um Jack chorando enquanto dirige. Ash está do meu lado, ela passa a mão nos meus cabelos quando vê que acordei e me da uma garrafinha de água.

— Obrigado.

Consigo dizer e ela só assente. Está usando a blusa de frio que eu trouxe e tinha deixado no carro. Minha cabeça ainda gira e não consigo dizer mais nada para Jack e talvez isso seja bom. O silêncio pode ajudar muito nessas horas. Tombo a cabeça e encosto a testa no vidro, cantarolando baixinho a música e fechando os olhos.


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Notas finais do capítulo

Demorei? Demorei, mas aqui está um capítulo maiorzinho explorando um pouco de todo mundo. Teve festa, teve choro, briga e fofura. Espero que tenham gostado e vou amar ler os comentários de vocês. E aí, o que vocês acham que vem daqui pra frente? Por que rolou essa briga?



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