Como acabar com o amor da sua vida escrita por Ana Carolina Marquês


Capítulo 3
I Legolas I




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Noah

Nove horas. Estou olhando o número quarenta e dois da rua PineCrik há vinte minutos e ainda não tive coragem para bater na porta. Depois de tudo que vi, tenho medo de não conseguir olhar na cara de Ash sem contar tudo, mas preciso me segurar até que meu amigo chegue e me ajude  tomar uma decisão. A guirlanda mediana me incomoda um pouco, estamos no meio de Agosto, isso nem deveria estar aqui. Limpo minhas mãos que estão suadas demais e finalmente toco a campainha.

Escuto algumas vozes mais altas que o normal e depois um silêncio. Me viro para ir embora e Ashley abre a porta abruptamente e depois bate com força. Ela olha pra minha roupa e ergue uma das sobrancelhas, sua boca cheia de gloss se eleva um pouquinho e sei que ela está se segurando para não rir. Reviro os olhos, qual é. Ela nunca viu uma camiseta do Batman?

— Vamos? Cadê seu carro?

Ela desce os dois degraus e segura a manga da minha blusa, me puxando enquanto olha para todos os lados com os olhos semicerrados. Tiro gentilmente sua mão e cruzo os braços.

— Você está com vergonha de alguém nos ver?

Ash balança a cabeça e começa a gargalhar. Dou alguns passos para trás, eu não esperava essa reação. Ela se curva um com a mão na barriga, os cabelos soltos grudam em sua boca e ela mantem os olhos fechados tentando falar alguma coisa no meio das risadas. Vê-la assim faz com que eu comece a rir um pouco também.

— Noah, você é completamente maluco, sabia? — Diz limpando algumas lágrimas que escorrem pelo seu rosto.

— Ué, então porque tá olhando pra todos os lados vendo se tem alguém nos observando?

— Não é isso.

Ashley reseta sua postura e começa se abraçar, os olhos antes brilhantes ficam obscuros e as imagens que recebi no e-mail começam a tomar todos meus pensamentos. Sinto culpa por estar tão perto dela e não poder falar nada, mas não é como se fossemos amigos.

Encaro um pouco antes de me aproximar, essa garota na minha frente não se parece em nada com as que vejo pelos corredores da escola. Está vulnerável, mais real e infinitamente mais bonita. E agora prestando atenção percebo que por baixo da blusa de frio cinza ela está usando uma camiseta da Barbie.

— Eu não tenho carro, ainda.

— E como exatamente vamos chegar na sua casa? Andando? — Mais uma vez ela semicerra os olhos e por causa da iluminação fraca não sei dizer se são azuis ou castanhos.

Abro um sorriso, passando por ela e faço um floreio com as mãos. Minha bicicleta amarela está encostada no portão da sua garagem.

—Vamos com Legolas.

— Você só pode estar brincando.

Ashley diz e começa a rir novamente, passa por mim e começa a encarar a bicicleta. Fico esperando ela virar as costas e ir embora, até porque não tem motivo de aceitar ir comigo, já que seu namorado tem o carro do ano. Só percebo que estou com os olhos fechados quando Ash dá um beliscão no meu braço.

— Nós vamos ou você vai ficar parado aí a noite toda?

A Barbie na sua blusa está deformada, com uma cara distorcida e toda demoníaca. Pego Legolas e levo até a rua, apoio a bicicleta com uma mão e coloco meu pé de apoio enquanto Ash sobe. Ela se  desequilibra um pouco soltando um gritinho.

— Nem pense em me derrubar, eu espero muito de um cara com a blusa do Batman.

Começo a rir, segurando o guidom com mais força pra não derrubar nós dois.

— Ah, é? Você quem deveria ter uma nave, sei lá. A Barbie não é cheia dessas coisas?

Ela revira os olhos, mas solta uma risadinha. Começo a pedalar mais rápido conforme a rua fica mais retilínea e toda vez que passo em uma curva Ashley segura com mais força, consigo perceber isso pela branquidão dos nós dos seus dedos. Tento fazer com que ela relaxa, senão vou acabar ficando mais tenso ainda.

­— Então, já sabe o estilo de música que quer no baile?

Ash vira um pouco a cabeça, me dando uma olhada rápida antes de voltar sua concentração para o rua.

— Ainda não pensei em nada e agora só consigo pensar em não cair.

—  Eu sou um super-herói, nunca deixaria algo acontecer com a Barbie.

Sua risada é reconfortante e percebo que seus ombros caem um pouco, ficando menos tensos. Faço uma curva mais fechada e começo a frear aos poucos quando estamos na minha rua. Espero que ela desça e começo a levar a bicicleta para o fundo de casa, a garota me segue olhando para todas as várias flores no caminho. Minha mãe é uma jardineira invejável. Deixo Legolas encostada na cerca e quando me viro vejo Ash sentada no balanço que fica na varanda, ela sorri pra mim e sinto um calor pelo meu corpo.

Fico do seu lado alguns segundos até  que minha mãe abra a porta e dá um susto em nós dois. Ashley coloca a mão no peito e seus olhos ficam esbugalhados.

— Desculpa, querida. Não queria assustar vocês, mas acabei de fazer um bolo e vi quando chegaram.

Olho pro avental todo sujo, a frase “melhor mãe do mundo” se camufla no chocolate e farinha espalhados ali em marcas de mãos. Me  levanto dando um beijo em sua testa.

— Tudo bem, mãe. Já íamos entrar mesmo, essa daqui é a Ashley.

Ash limpa as mãos na roupa e abre o melhor sorriso que pode, me deixando hipnotizado.

— Pode me chamar de Ash — diz me lançando um olhar estranho — prazer em conhecê-la, senhora....

Minha mãe ri e segura a mão da garota na sua frente, tenho certeza que quer puxá-la para um abraço e dizer como ela está tão magrinha e encher ela de comida.

— Me chame de Nora, por favor. Nada de senhora por aqui. Vamos?

Aceno com a cabeça e entramos em casa, o cheiro de bolo de cenoura e chocolate faz minha boca salivar e vou direto para a cozinha. As duas conversam atrás de mim, mas minha atenção é toda voltada para o prato que encho de pedaços de bolo e coloco café em uma xícara.

— Você toma café? — digo ainda de costas e Ash solta um “uhum”.

— Tem algum problema comermos lá em cima? Estamos meio atrasados.

— Por mim tanto faz, mas quanto mais rápido terminarmos é melhor.

Não sei porque, mas sua resposta me dá um aperto. Me viro entregando o prato pra ela e com a cabeça indico onde ficam as escadas para irmos.

— Qualquer coisa podem me chamar — minha mãe diz me dando um beijo na bochecha e depois sorri para Ash. — Adorei te conhecer, querida.

Ash retribui o sorriso e com toda concentração começa subir as escadas. Quando entramos no meu quarto ela faz uma expressão de surpresa e sua boca se abre um pouco. Começa encarar todos os pôsteres de filmes de terror e ficção cientifica e a estante lotada de livros e cds do lado da minha cama. Percebo que tudo está meio bagunçado e sinto minha bochecha esquentar.

Deixo a bebida em cima da mesa e recolho alguns papéis cheios de desenhos aleatórios, puxo uma cadeira e coloco do meu lado. Ela coloca o prato e já começa comer um pedaço, fazendo um “hummmmmm” e fechando os olhos quando dá a primeira mordida.

— Sua mãe é a deusa dos bolos de cenoura — diz com a boca cheia.

— Você tem que experimentar as coisas com uva que ela faz.

Tomo um gole de café e abro o notebook criando um arquivo novo para colocarmos nossas ideias. Ela se senta ao meu lado e tira do bolso uma caderneta pequena e uma caneta de glitter rosa com cheirinho de morango.  Ergo uma das sobrancelhas, sério que coisa mais fofa. Nunca imaginaria Ashley desse modo.

— Podemos colocar uma música? — Ash morde a tampa da caneta.

Assinto com a cabeça e pego algumas opções de CD’s que tenho, sabendo que provavelmente ela vai me abominar.

— Você tem quase todos do Panic!, né?

Sorrio, então ela conhece uma das melhores bandas existentes. Pego o mais recente e coloco no rádio antigo que tenho. Assim que a música começa a tocar ela canta usando a caneta como microfone e logo estou acompanhando seu ritmo, fazendo o som dos instrumentos musicais. Enquanto cantamos fico rabiscando algumas ideias e Ash faz o mesmo.

— Tem alguma ideia? Posso fazer um desenho pra gente visualizar mais ou menos as coisas. — digo me virando para ela.

— Pensei em alguma coisa mais anos oitenta ou um baile de máscaras.

— Caramba, um baile de máscaras seria incrível!

Me levanto e pego meu caderno de desenhos, começando fazer alguns rabiscos de como imagino o ginásio organizado.

— Enquanto eu desenho, você pode ir escolhendo umas músicas. O que acha de ao invés de usarmos anos oitenta, nós não usamos algo mais 2009? Emo, pop e tudo mais?

Os olhos dela se iluminam e solta um gritinho animado. Começa a escrever vários nomes de músicas e artistas, consigo ver um My Chemical Romance, Paramore e outros tão famosos na época emo. Volto a desenhar, talvez essa atividade não me dê só notas extras.

❤❤❤❤

Ash

Desço de Legolas, minhas pernas ainda estão meio bambas por causa da quase queda que tivemos voltando. Noah tentou desviar do buraco, mas meu grito acabou assustando ele. Coloco a mão no bolso pra ver se não perdi nenhuma das folhas com nosso projeto e sinto um alivio quando tudo está lá.

— Obrigada por me ajudar. — Digo enquanto Noah vira a bicicleta.

— Suas ideias foram muito boas também, fazemos uma ótima dupla.

— Batman e Barbie, que crossover mais engraçado.

Ele sorri e pela primeira vez noto que tem uma covinha no canto esquerdo do rosto, é bem funda e diferente das  que já tinha visto.

— Amanhã te levo o CD com algumas músicas da que escolhemos.

Assinto e num impulso dou um beijo rápido na sua bochecha e começo a correr em direção a minha casa.

— Boa noite. — Grito entrando e fechando a porta.

Sinto meu coração bater mais forte que nunca e respiro o mais controlado que consigo. Nunca fiz isso e não sei o que deu em mim, nem somos amigos. E se ele não gostar desse tipo de contato? Escuto os passos da minha mãe e ela chama meu nome, já sei que vem bronca por aí. Volto a correr, dessa vez subindo as escadas e me trancando no meu quarto, ainda com o sorriso no meu rosto.

O baile pode ter me dado um novo amigo, diferente de todos que eu já tive e tenho. Meu celular começa a vibrar, nem tinha me tocado que deixei em casa. Vejo que tem algumas ligações perdidas e Cristal e Prince e algumas mensagens, ignoro elas de inicio e mudo o nome de Noah no meu celular. O aparelho vibra mais uma vez e abro a notificação.

Localização: Cruels Hotel

21:43 -

BadBitch: Ei, ta tudo bem? Não nos falamos desde aquele dia. Sei que fiz merda, ñ sei onde tava com a cabeça. Podemos ir no shopping amanhã?

 

Respiro fundo e leio as mensagens anteriores, todas são pedidos de desculpas e algumas tentativas de me comprar com roupas e comidas. Sei que não deveria, mas não sinto tanta raiva assim de Cristal, aliás ela é minha amiga e as pessoas erram, eu não deveria esconder tanto meu passado.

 

Localização: PineCrik

21:47 -

Me: Tá sim, podemos falar disso amanhã? Tô cansada, bjs

 

Envio a resposta pra ela e vejo algumas de Prince, mando quase a mesma coisa pra ele.

 

Localização: Desconhecida

21:51 -

Batman: Ei, ei! Chamado de emergência, a senhorita Barbie esqueceu sua caneta na BatCaverna.

 

Começo a rir com a mensagem de Noah e respondo com várias figurinhas que nunca tinha usado, inclusive uma da Barbie bêbada. Incrivelmente sua mensagem me deixa feliz e leve, mando um boa noite e coloco meu pijama pra dormir. Assim que deito na cama algo estala na minha cabeça e pego o celular, vou direto nas mensagens de Cristal e reparo em sua localização. Cruels Hotel, é onde Prince mora. A casa de Cristal é do outro lado da cidade. Sinto um aperto no coração, mas resolvo deixar isso para depois. Talvez ela só estivesse com Trevor no momento e Trevor e Prince são melhores amigos.


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