Dragões do Norte escrita por Snowfall


Capítulo 29
Asas negras, palavras negras.


Notas iniciais do capítulo

Olá, gostaria de agradecer a todos os desejos de melhoras e dizer que estou bem, graças a Deus. O motivo de não ter postado no dia 20 foi um evento no serviço que me deixou numa correria.
Obrigado pela paciência e espero que gostem desse capítulo assim como eu gostei de escrever



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Mil duzentas e cinquenta catapultas.

Cada uma cobrindo uma extensão de quatrocentos metros da Muralha.

Jon vistoriara cada uma pessoalmente. Todas contavam com um arsenal de cem bolas incendiarias. Um número impressionante.

E nem de longe, suficiente.        

Gostaria de ter o triplo disso. E teria se o inverno esperasse só um pouco. Apenas alguns meses. Todavia, a cobertura de neve que cobria a Dádiva e chegava a Winterfell fazia com que a cada dia a urgência pesasse mais sobre seus ombros.

Jon era rei. O último Rei no Norte se perdessem na Grande Noite. Sentia um consolo tenebroso quando pensava que em caso de derrota, ninguém estaria vivo para lhe culpar.

Desceu de Morghon no meio de seu acampamento na Dádiva e dirigiu-se ao Represeiro onde Folha se encontrava acocorada como sempre. Entalhava algo em uma das pedras que circundavam a árvore.

Desde que voltara de Meereen, passara seu tempo se dividindo entre a Dádiva, a Muralha e Winterfell. Seus deveres encurtavam seus dias e suas preocupações prolongavam suas noites. 

Sentou-se pesadamente e esperou que Fantasma chegasse para enfim sentir-se inteiro.

— O tempo está próximo – vaticinou a Criança da Floresta, como se Jon necessitasse de algum aviso para perceber que os dias estavam cada vez mais frios.

— E não estamos mais preparados do que estávamos quando cruzamos a Muralha – poderia parecer pessimismo de sua parte, porém não tinha grandes motivos para sentir-se otimista.

Tinham catapultas incendiárias, mas sua munição talvez durasse uma semana no máximo.

Tinham três dragões, que teriam que cobrir quase cento e sessenta e sete quilômetros de Muralha cada um.

Tinham um exército de quase trezentos mil guerreiros, entre o Povo Livre, nortenhos e sulistas. Porém não tinha as armas necessárias para que tivessem uma chance.

— Muito foi feito – lembrou Folha.

— E muito ainda falta ser feito – não havia nada que pudesse aplacar a falta de obsidiana. Tudo que faziam seria inútil sem um meio de matar os Vagantes.

— Um caminho sempre é aberto diante daqueles que procuram.

— Procurar é tudo que faço. Até agora a busca foi uma sequência de decepções. – Nunca esqueceria da empreitada além da Muralha que custara a vida de Styr.

— Salvou a gente. Nosso povo ainda existe porque fez aquela viagem.

— Por vezes sinto que apenas ganhei alguns dias a mais para vocês e para o Povo Livre. Que só adio o inevitável.

Folha riu. E nesse momento ficou evidente o quanto não-humana ela era.

— Homens sempre veem o que falta. Nunca o que foi dado. Os deuses deram mais a você, Jon Snow, do que a qualquer outro. No entanto, você só percebe o que não tem.

Já ouvira algo semelhante antes e Jon sentiu-se o mais ingrato dos egoístas nesse momento.

Então, resolveu falar o que estava no âmago de sua apreensão.

— Tenho medo – admitiu - Medo de falhar e ser aquele que causará o fim de tudo.

— Se o fim chegar, não será você o causador. E sim o Rei da Noite e nós que o criamos. Não carregue um fardo que não é seu. Se tudo acabar não será por causa de sua falha hoje, será por causa de nossa imprudência em um tempo que você não passava de pó girando no jardim dos deuses.

Folha deixou Jon para se juntar as irmãs que nunca estavam longe. Sempre um pouco afastadas do resto das pessoas. Pelo que soube, as Crianças se embrenhavam na floresta e eram impossíveis de achar se assim o quisessem.

Um fato que Jon achou estranho, uma vez que sempre estavam junto a seu trono quando chegava.

Quando comentou isso com Tormund foi informado que elas sempre se juntavam na Árvore Coração um pouco antes de Jon chegar e voltavam à floresta quando ele se ausentava. Saindo apenas para receber os materiais para fazer seus projeteis.

Elas, assim como todos no acampamento, trabalhavam dia e noite.

Sua magia de fogo seria de muita serventia. Jon tinha planos de armar os homens com esferas incendiárias. Até então, a única arma útil que podia oferecer.

Por ordem dele, as Crianças trabalhavam sozinhas, pois não queria que tal conhecimento chegasse a mãos humanas. Os homens não se encontravam nem perto de estarem preparados para tal poder.

Já conheciam maneiras de se matar o suficiente.

Naquela tarde, recebeu uma carta de Daenerys Targaryen.

Quebrou o selo e riu quando se deparou com a enxurrada de títulos que sucediam o nome da tia. Com certeza, ela havia feito grandes coisas e tinha tudo por escrito para que ninguém esquecesse.

Fora as linhas que citavam suas proezas, a carta era sucinta.

A legítima rainha dos Setes Reinos havia chegado e queria que Jon fosse até ela para um encontro familiar. E para se ajoelhar, é claro.

— O que a Rainha Dragão escreveu? – perguntou Tormund se aproximando com dois cornos de cerveja, que fora extraviada de Castelo Negro em algum momento.

— Reconheceu o selo? – admirou-se que homem estivesse tão ciente dos brasões westerose.

— O corvo balofo não parava de tremer quando gaguejou que havia chegado uma carta da garota dos dragões.

— Minha tia - ressaltou Jon, aceitando a bebida.                      

— O que é uma merda. – Jon riu, engasgando-se com a cerveja. Tormund tinha um talento único para resumir situações complexas em uma única frase.

Era uma merda que Daenerys fosse sua tia. Um grau de parentesco que impedia que a visse como a inimiga que potencialmente, ou certamente, era.

Nunca seria Assassino de Parentes. Nunca atentaria contra a última de sua linhagem materna.

— Ela acha que tem direito a todo o reino.

— Até a sua parte.

— Até a minha parte – concordou tomando outro gole da bebida que desceu queimando pela garganta. – Minha querida tia deseja me conhecer e quer que eu jure fidelidade.

— O Rei-pra-lá-da-Muralha não ajoelha.

— Não – concordou com firmeza.

— Bom. Não criei um ajoelhador. – sorriu o outro simplesmente.

Podia ser a cerveja ou as palavras de Tormund, mas Jon recostou-se no assento sentindo-se um pouco mais em paz.

— Escreverei a ela dizendo que se deseja mesmo me conhecer; a minha distância até ela é a mesma dela até a mim. E é a Rainha dos Dragões, pode vir voando. – falou mesmo sabendo que tais palavras nunca chegariam ao papel.

Tormund gargalhou:

— Não esquece moleque, que ela é sua tia. Pode muito bem lhe puxar as orelhas – disse terminando a cerveja. – Quando retorna ao sul?

— Desço a Winterfell quando receber os novos carregamentos em Atalaia Leste. Espero por alguns navios carregados de óleo.

Abastecer todos os castelos com lamparinas suficientes para passar um inverno de tempo indeterminado estava se mostrando uma tarefa excruciante. Sempre que pensava que tinha óleo o bastante para acender o mundo, via que precisava de muito mais.

Felizmente, muito do óleo que recebia era presente. De vários “homens importantes” que souberam de seu interesse e desejam cair em suas graças.

Recebia todo tipo de coisa. De Westeros e de Essos. Não era tolo para não perceber as verdadeiras intenções por trás daquelas cortesias. E não era imprudente para rejeitar qualquer coisa que pudesse significar uma vantagem contra os Outros.

Quando o verão chegasse se preocuparia com o preço que pagaria por tudo aquilo. Nada nesse mundo é verdadeiramente de graça. Essa, no entanto, era uma questão para a primavera.

Ficou certo disso em Atalaia Leste no fim daquela semana enquanto recebia o óleo. Um emissário braavosi, Beren, consciente de sua necessidade de iluminar a Muralha, lhe ofereceu um carregamento de velas “se”, nas palavras dele: O rei no Norte livrasse o mar de algumas pragas.

Que seriam, no caso, alguns piratas que vinham causando perturbações nas águas do Mar Estreito. Os Krakens atormentavam todos que tentavam fazer a travessia. Quase todos, na verdade. Nenhum navio seu foi atacado até então.

O homem usou palavras tão humildes e exaltou tanto as qualidades de Jon que alguém talvez deixasse de perceber o fato de o braavosi está tentando contratar seus dragões para um serviço.

Usando velas como moeda.

Jon sentiu-se meio ultrajado e abriu a boca para expressar exatamente como se sentia em relação a essa proposta quando Sor Davos pediu uma audiência a sós.

Custou muito para que convencesse o velho marinheiro a aceitar ser seu Mestre dos Navios. Alegou está cansado da politica de Westeros e de seus nobres.

Jon compartilhava tal sentimento.

Contudo, no fundo, Davos era um homem de negócios e nunca recusaria uma boa barganha. E percebia as vantagens de ser um conselheiro do Rei no Norte.

— Pensei que a Frota de Ferro tivesse se aliado a Daenerys.

— Yara e Theon Greyjoy se aliaram a ela por falta de alternativa – esclareceu Davos – A Rainha Dragão era o único lugar para o qual podiam correr. Euron retornou e expulsou os sobrinhos das Ilhas de Ferro. Há rumores que ele jurou fidelidade a Cersei Lannister.

Jon pensou por um instante nas implicações de agir abertamente contra um aliado do Trono de Ferro.

— Não demorará muito até que nossos navios sejam alvo de ataques piratas. – lembrou o antigo contrabandista – Euron não se contentará com navios braavosi por muito tempo.

— Uma semana – decidiu por fim – Diga a Beren que espere uma semana e terei uma resposta a sua proposta.

— O que acontece em uma semana?

— Antes de deixar a Dádiva escrevi aos lordes do reino para que se reunissem em Winterfell para discutir a chegada de Daenerys Targaryen. Lá também decidiremos o que fazer com a lula.

Navegou com Davos à Porto Branco. E na viagem contou sobre o conteúdo da carta da Rainha Dragão.

— Todos comentam da chegada dela – informou seu conselheiro enquanto desfrutavam de uma refeição de faisão. Outro presente que recebera. Esse veio do Vale.

— Cersei não ficará parada enquanto Daenerys a espreita em Pedra do Dragão.

— Me pergunto quanto tempo conseguirá manter-se no poder.

— Nesses últimos anos, Cersei perdeu o marido, o pai e três filhos. Mas continuou sendo rainha dos Sete Reinos. Não será fácil para Daenerys tomar o Trono de Ferro, com ou sem dragões.

— E não há amor restante pelos Targaryen, apenas o medo causado pela lembrança do reinado de Aerys, o Louco. Que Cersei usará a seu favor.

Alguns se perguntariam por que Jon havia escolhido um contrabandista e antiga Mão de um rei inimigo como conselheiro. Só quem não conhecia o cavaleiro fazia tal questionamento.

Davos conhecia o mundo e melhor ainda, conhecia pessoas. Seu talento para diplomacia só era superado por sua habilidade para “interpretar” as situações a seu favor.

— Daenerys tem uma lista de proezas que se estende por quase uma página inteira. Tenho certeza, que saberá encontrar seu caminho até o trono.

— Sem sua ajuda?                                          

— Não ajudei o suficiente? – Jon não gostava do brilho no olhar de Sor Davos, parecia tentar encurralá-lo em uma rede de pesca – Cumpri minha promessa a Meistre Aemon. Promessa que nunca deveria ter feito. Não devo nada a Daenerys Targaryen além do respeito devido a um parente distante que nunca vi na vida.

— Talvez, ela...

— Talvez, ela seja louca como o pai – interrompeu – Ela coleciona títulos mas ouvi rumores de muito mais do que está escrito na carta que recebi.

— Rumores também correm a seu respeito.

— Sim. E espero que Daenerys tenha as mesmas reservas quanto a mim. Até agora, Cersei Lannister mantém sua parte no acordo que firmamos. Não arriscarei meu povo em uma nova guerra com as tempestades de inverno batendo à porta. Não sem um motivo forte o suficiente.

A conversa tomou outro rumo e seguiram a viagem com ventos favoráveis.

Pensara em deixar Davos em Porto Branco por alguns dias para cuidar de seus deveres. Mas a notícia da chegada da Rainha Dragão havia alcançado o Norte e causado a comoção que lhe era devida.

Por isso, montou em Gaothrax e levou seu conselheiro consigo. Um apoio bem-vindo quando tivesse que lidar com os lordes nortenhos e seu ressentimento do nome Targaryen.

Chegaram em Winterfell antes da hora do lobo. Desceram no Bosque Sagrado, escondidos pela noite sem lua.

Lorde Stark aguardava com uma tocha e uma expressão preocupada.

Jon esperava dormir antes de ter que lidar com qualquer coisa, porém sabia que essa conversa não esperaria até a manhã seguinte.

— Eu gostaria de ter essa discussão acompanhada de uma bebida quente, se não for pedir demais – Seu tom fez o rosto de Lorde Stark relaxar um pouco.

Recebeu algo muito melhor que uma bebida quente: uma tigela de sopa de cebola da Velha Ama, acompanhada de pão.

— A situação no Sul se complica cada vez mais – começou o pai.

— Sempre soubemos que Daenerys chegaria.

— O problema não é esse. E sim, não sabermos se ela chegou como inimiga ou aliada.

— Não tenho motivos para vê-la como nenhuma das alternativas.

— Não podemos ser indiferentes às tormentas que ameaçam se abater sobre o reino.

Embora achasse as anedotas exageradas, Jon concordava. E também sabia que imparcialidade nunca seria uma opção para ele. Teria que tomar uma decisão logo.

— Quando todos os senhores do reino chegarem, reunirei um grande conselho. Prefiro decidir o futuro do Norte com os nortenhos.

— Creio que saiba que a decisão caberá a você no fim. Nunca haverá consenso em um assunto como esse.

— Mas estarão todos cientes da situação.

No dia seguinte, quando foi encontrar Meistre Luwin para pedir que enviasse cartas a Correrrio, acabou por receber uma outra mensagem.

Da Capital.

Cersei Lannister lhe alertava sobre a ameaça em Pedra do Dragão e pedia sua ajuda para evitar outro reinado de terror dos Targaryen.

— Não precisa mandar a carta às Terras do Rio, Meistre. Não temos tempo de esperar sua resposta. – virou-se ao pai – Reúna os senhores que já estão em Winterfell e nos arredores. Discutiremos nosso futuro essa noite.

Jon entrou no grande salão franqueado por Lorde Stark e Meistre Luwin, assim como Robb. Assumiu o centro da mesa e os murmúrios cessaram.

Ainda em pé, depositou as duas cartas.

— Meus lordes foram chamados aqui por causa de asas negras e palavras negras. Duas rainhas escreveram a mim. Daenerys Targaryen chegou à Westeros e reclama o trono do pai. Cersei Lannister reúne aliados para combatê-la.

As vozes se alteraram como esperava que acontecesse.

— A questão, meus senhores – falou mais antes que se exaltassem demais - É que essa oportunidade não pode ser perdida. – frasear as palavras dessa maneira teve o efeito desejado e os homens pararam para ouvir – Devem estar cientes que podemos garantir a vitória de qualquer uma das rainhas. A questão é: Quem queremos no Trono de Ferro?

 Por incrível que pareça, houve um instante de contemplação em que ninguém falou nada enquanto ruminavam o que acabaram de ouvir. Naquele momento, todos compartilharam a encruzilhada em que Jon se encontrava.

Porém, não conheciam todo o contexto. Não sabia do laço de sangue que tinha com Daenerys. Não sabiam o que ele havia feito por ela.

— A mim parece que a Lannister é o menor dos males – começou Lady Mormont – Se a Rainha Dragão tomar o trono, seu passo seguinte será tentar conquistar o Norte.

— Deixe que venha – argumentou Lorde Glover - Ela não é Aegon, o Conquistador e o Rei no Norte também tem dragões. Ela não passaria do Tridente.

— Mesmo assim teríamos que lutar uma guerra às vésperas da Grande Noite – contrapôs Lorde Umber. – Um desgaste que pode muito bem nos custar tudo.

Grande Jon mudara. O homem que conhecera há dois anos não veria a situação por esse ângulo.

— A filha do Rei Louco não pode chegar ao Trono de Ferro – Lorde Karstark falou com a convicção de alguém que viveu o reinado de Aerys Targaryen.

— Ao menos sabemos que Cersei Lannister não tentará invadir o Norte – acrescentou Robb.

—Cersei nunca terá como impedir os dragões.- Lorde Umber vira de perto o que dragões podiam fazer em uma guerra -Podemos confiar que é apenas uma questão de tempo até a rainha Targaryen tomar a capital. Talvez seja melhor garantir uma aliança com o lado vencedor enquanto podemos.

— Um Lannister nunca deve ser subestimado – garantiu Lady Mormont – Não podemos tomar Cersei como derrotada ainda. Ela não tem escrúpulos e joga esse jogo desde o berço.

Tal comentário foi retrucado com argumentos e contra-argumentos. Numa discussão sem fim.

Jon dispensou os lordes quando percebeu que não chegariam a um consenso naquela noite, assim como previra o pai.

Dirigiu-se para o Bosque Sagrado e deixou que Lorde Stark fizesse sala para os convidados. Robb o acompanhou.

— O que você precisa realmente para tomar uma decisão? – indagou o irmão – Todos sabemos que os lordes do reino seguirão você em qualquer resolução.

Seguiriam mesmo?

— Mesmo que eu decidisse apoiar uma Targaryen? A família que o Norte sangrou para destronar? Ou me apoiariam se fizesse o contrário e desencadeasse a próxima Dança dos Dragões?

— Sim – Robb sustentou seu olhar, convicto. – Então, pergunto novamente: o que precisa para tomar uma decisão?

Jon encarou o rosto na árvore e falou em uma espécie de prece:

—Preciso de um motivo. Uma razão para arriscar a vida do meu povo e a segurança do meu reino por uma contenda sulista.

— Essa contenda sulista pode invadir as nossas fronteiras rapidamente se a Rainha Dragão chegar ao Trono de Ferro.

— Então devo começar uma guerra hoje para evitar uma guerra amanhã? Sabe muito bem que esse não é nosso jeito.

Robb não sabia de seus outros impedimentos. Do vínculo familiar que o impedia de calcular a situação como normalmente fazia. Não sabia que Jon não era imparcial quanto deveria em relação a essa questão.

Por isso, precisava de um sinal. Uma direção.

“Um caminho sempre é aberto diante daqueles que procuram.”

As palavras de Folha se mostraram proféticas quando na manhã seguinte, Jon recebeu uma carta que fez pender a balança. Um motivo ele pediu e os deuses lhe mandaram o maior de todos.

Um corvo chegou com a resposta para seu maior problema. Enquanto se preparava para tomar café com alguns senhores e discutir alguns assuntos relativos ao inverno foi abordado por Meistre Luwin que segurava um pedaço de pergaminho na mão e esperança no rosto.

— Uma mensagem chegou de um conhecido na Cidadela – esclareceu o Meistre – Pedi a ele que procurasse qualquer informação que pudesse ajudar na busca por Vidro de Dragão.

Jon baixou a camisa que tentava vestir e encarou o Meistre em expectativa:

— E? –sua voz saiu estranhamente calma, embora estivesse se contendo para não puxar a carta da mão do Meistre.

— Segundo Arquimeistre Marwyn, está relatado que Pedra do Dragão é uma ilha vulcânica com uma reserva substancial de obsidiana.

A cabeça de Jon girou um pouco. O antigo assento do Targaryen estivera desocupado desde a morte de Stannis Baratheon, mas agora abrigava Daenerys, sua talvez inimiga.

— É claro que o que mais precisamos está no lugar mais perigoso para se ir.

— Não precisa ir – argumentou o outro – Pode barganhar daqui. Tem muito a oferecer. Escreva uma carta.

Percebeu que Meistre Luwin temia por ele. Jon ponderou um tempo antes de responder.

— Não. Pedi uma direção e os deuses me mostraram o caminho. Não hesitarei mais.

Durante o desjejum no Grande Salão, achou melhor contar aos lordes de sua viagem logo de uma vez. A comida impediria que a reclamação fosse demasiada.

— Meu rei não pode confiar na filha do Rei Louco! – bradou Lorde Glover.

— E não confio – assegurou.

— É muito perigoso – ressaltou lady Mormont- O lugar do Rei no Norte é no Norte.

Jon levantou-se e encarou a mulher.

— O meu lugar é aonde for preciso, minha senhora – achou melhor esclarecer – Alguma vez, dei a intender que estou pedindo autorização? Sei que temem por mim e agradeço por isso. Mas me entregaram uma coroa que não pedi e não me tornarei escravo dela. O que precisamos para vencer o inimigo está em Pedra do Dragão e é para lá que irei. Não falei de minha viagem à procura de sua aprovação, apenas para que estejam cientes.

Jon não sentia prazer em usar esse tom com aqueles senhores. Tinha grande estima pela maioria deles, contudo se via tendo que impor limites muitas vezes.

Aquelas pessoas se ajoelharam diante dele e achavam que tinha o direito de tentar ditar sua vida.

O que um rei devia vestir. O que um rei devia beber. Com quem um rei devia casar.

Jon tinha que deixar claro que ele ainda era o único senhor da própria vida. E que como rei, era seu papel guiar seu povo, não ser guiado por ele.

Tal atitude desagradava a muitos. A maioria, porém, já havia aceitado que tinham um rei selvagem.

Quando ficou sozinho com Lorde Stark, foi a vez do pai expor suas preocupações.

— É muito provável que esteja caminhando para uma armadilha.

— Não deixo de ter minhas ressalvas. Mas, politicamente falando, acho que o risco é mínimo.

— Como pode saber? Não a conhece.

— Conheço seus conselheiros. Sei que objetarão veementemente contra a ideia de me matar assim que pôr os pés em Pedra do Dragão. Só um louco não veria o que represento como aliado. E pelo que ouvi, ela não é completamente louca ainda. – brincou.

Lorde Stark não parecia convencido, sua testa enrugando em preocupação.

— Eu sou o único parente de sangue que resta a ela. Acho que é o suficiente para que não ordene minha execução logo de imediato.

— Aposta muito alto.

— Os dias estão cada vez mais curtos. A qualquer momento um corvo branco chegará da Cidadela e o que será de nós se não tivermos as armas certas contra os Outros? Tenho que fazer isso.

— Irei com você.

— Não. Preciso do senhor guardando o Norte. É o único com poder suficiente para continuar se algo me acontecer.

Lorde Stark se resignou:

— Quando parte?

— Em algumas semanas. Tenho que dar algum tempo.

— Tempo para quê?

— Para o Kraken morda a isca e para que os conselheiros de Daenerys estraguem tudo.  

..................

Tal como Jon previra, a situação começou a piorar para a garota Targaryen rapidamente. Embora ela talvez não soubesse ainda do que acontecia.

Ned encontrou Jon em seu solar, avaliando o mapa sobre a mesa e as peças sobre ele.

— Euron interceptará a frota dos sobrinhos ainda essa noite – o filho lhe informou movendo os barquinhos com bandeiras de Kraken na direção um do outro. - Pretende capturar os sobrinhos e as mulheres dornesas com um único golpe. A julgar pela maneira como afundou os meus navios, o golpe será duro e letal.

Eddard não perguntou como Jon sabia de todas essas coisas. Conhecia o poder de alcance dos Wargs a serviço do seu rei. O filho tomava conhecimento dos acontecimentos quase no instante em que ocorriam.

—Seus navios?

— Dois navios que retornavam de Volantis. Os poucos da tripulação que sobreviveram contaram que a abordagem foi fulminante.

— Você esperava um ataque – olhou o filho avaliando-o.

— Segundo Sor Davos, era só uma questão de tempo. Que para mim não poderia ser mais propício. Agora posso agir.

— Pretende impedir que o ataque aconteça?

— Não. Salvarei os irmãos Greyjoy e as Serpentes da Areia mas deixarei que seus navios sejam destruídos. Preciso que tenham seu poder reduzido.

— Não entendo. Se tem a intenção se aliar a Daenerys, por que deixar que ela sofra tamanho golpe?

— Pretendo barganhar com a rainha – corrigiu o filho - Quanto mais ela precisar mais eu poderei oferecer. Ela tem o que eu necessito, se Daenerys perceber isso estarei em desvantagem. Não gosto de negociar assim.

Ned avaliou o mapa.

— O que acontece na Campina?

— Jaime Lannister marcha até Jardim de Cima. Ele pretende fazer com que Daenerys pense que está se dirigindo a Rochedo Castely para combater os Imaculados. Na verdade planeja anular a principal fonte de recursos da Rainha dos Dragões.

— Parece uma coisa que você faria.

— Sim – o filho sorriu – Cersei não acredita que Daenerys usará fogo de dragão contra a capital ainda e se aproveita disso para obter a vantagem.

— Qual o próximo passo então?

— Há alguns dias Olenna Tyrell recebeu um corvo de Lady Stark contando sobre a traição de alguns de seus lordes e o exército Lannister em suas terras.

— Por qual motivo pediu que Cat escrevesse tal carta?

— Entreguei o Vale a Daenerys, a Rainha dos Espinhos desconfiaria menos de uma carta de sua esposa e do que de uma minha. Lady Tyrell já recolheu suas riquezas e fugiu para o Tridente.

— O Vale, é claro, ofereceu abrigo.

— Certamente. Mas isso não é importante. Duvido muito que chegue ao Vale. Jaime Lannister dará perseguição.

— Por que se deu ao trabalho de avisar Lady Olenna se sabia que ela não conseguiria?

— Pode ser que consiga. Pelo que ouvi, a Rainha dos Espinhos não ganhou esse título por ser fraca de mente ou de espírito.

— Jon – seu tom deixava claro que via que seu filho tinha algo em mente.

— Está vendo esse ponto no mapa – seu rei mostrou a intersecção entre a Campina e o Tridente – Se tudo correr como o esperado, o exército Lannister o cruzará em dois dias.

— E então?

— Quebra de acordo – respondeu ele empurrando a estatueta do leão um pouco mais para o norte.

Ned, às vezes, tinha certo medo de como a mente do filho funcionava.

Segundo o acordo de trégua firmado com o Trono de Ferro, nenhuma armada real sulista poderia cruzar as fronteiras do reino de Jon. Se alguma vez isso acontecesse, seria visto como ato de guerra.

O tratado com o Trono de Ferro não servia mais a Jon. O Rei no Norte, então, usou Jaime Lannister para se livrar dele.

— Está manipulando a guerra para que nenhuma das rainhas tenha vantagem completa.

— Sim.

Ned foi acometido com certeza de que o filho tomaria o mundo para si se quisesse. Deu graça aos deuses por Jon não querer. Não se permitia nem pensar, no que uma mente como essa faria em alguém com o coração negro.

— Posso contar que cuidará do reino em minha ausência? – Jon o retirou de seus devaneios - Não sei quanto tempo passarei em Pedra do Dragão.

Ned assentiu:

— Por favor, cuide-se. O Norte estará aqui esperando seu retorno.

Jon vestiu a sua capa de pele.

— Muito bem. Está na hora de ganhar um carregamento de velas.

.............

Não se tornaria a Rainha das Cinzas. Fora isso que dissera a Olenna Tyrell.

E uma estratégia foi traçada, um plano foi criado e posto em prática por sua Mão.

E isso quase lhe custou três aliados.

— Euron veio à noite – informou Yara, ainda lambendo as feridas – Seus piratas abordaram nossos navios rapidamente. Se não fossem os dragões...

Os dragões de Jon Snow. Os navios Greyjoy, os dois que restaram e retornaram à Pedra do Dragão, ainda cheiravam a fogo.

— Euron está morto – afirmou Theon – Vi quando foi engolido pelo fogo vivo.

— Gelo fez com que os navios encalhassem – continuou Yara – Um alvo fácil para os outros dragões. Euron tentou apontar uma espécie de besta, mas não teve tempo de sequer engatilhar a arma.

— Uma besta? – Essa parte lhe pôs em guarda.

— O meu finado pai tentou esse truque no Rochedo – Tyrion falou pela primeira vez na noite. Mantivera-se calado desde o retorno dos seus aliados. – Cersei deve ter armado os navios de Euron com os tais arpões. Uma tolice. Tal armadilha não funcionou a primeira vez, quando foi surpresa e certamente não funcionará agora com Jon Snow de sobreaviso. Minha irmã sempre tentou emular nosso pai. Até em seus erros.

Dany lançou lhe um olhar que fez com que Tyrion se calasse novamente e voltasse sua atenção a sua taça de vinho.

Ela não queria ouvi-lo. Muito menos para escutar suas particularidades familiares. Estava cansada de Lannisters. Inclusive, nesse momento, daquele que estava a seu serviço.

Ellaria pigarreou para quebrar o silencio que se prolongava.

— O ponto é que Euron não é mais uma ameaça.

— E Cersei não tem mais uma esquadra – completou Yara.

— Nem vocês – Daenerys achou melhor ressaltar – A não ser que conte as duas naus restantes.

— As Ilhas de Ferro estão lá para serem tomadas novamente, minha rainha – Theon apressou-se em falar- Com sua permissão, Yara e eu...

— Levarão Lady Ellaria e as filhas a Dorne primeiro como foi combinado.

— É claro , vossa graça – Theon curvou a cabeça em reverência.

— E dessa vez garantiremos que a viagem transcorrerá como o esperado, não é mesmo? – Deitou o olhar sobre Tyrion novamente, que se remexeu desconfortável.

Do penhasco de Pedra do Dragão, Danny acompanhou sua partida. Dessa vez, cercados da melhor segurança que podia oferecer.

Se tudo ocorresse como deveria, em breve contaria com um exercito dornês pronto para bater à porta da Fortaleza Vermelha.

Enquanto observava os navios sumirem no horizonte e Drogon sobrevoar a orla, ponderou sobre tudo que havia acontecido.

Cersei não contava mais com uma esquadra.

E Daenerys devia ainda mais a Jon Snow. O Rei no Norte que ainda não havia respondido sua carta. O sobrinho que todos conheciam menos ela.

— Minha rainha – chamou a Aranha com seu sussurrar costumeiro – Um corvo chegou. De Lady Olenna.

A julgar pelo tom, não eram noticias boas.

Como era mesmo que diziam? Asas negras. Palavras negras.

Quando terminou de ler a mensagem foi tomada por um acesso de raiva.

Não serei a rainha das cinzas. Repetia para si mesma tentando se acalmar.

— Diga a Tyrion que preciso falar com ele. Preciso falar com todos vocês agora- Amassou o papel em sua mão enquanto se dirigia novamente a sala de guerra.

— Um exército liderado por Jaime Lannister tomou Jardim de Cima – falou quase como uma acusação, jogando a bolinha de papel sobre a grande mesa - A mensagem fala de como um aviso vindo do Vale fez com que Olenna deixasse a Campina e procurasse abrigo nas Terras do Rio.

— Um aviso vindo Vale? – repetiu Missandei – Como eles saberiam de tal ataque?

— Uma ótima pergunta – Danny encarou Varys – Como saberiam e meu Mestre dos Sussurros, não?

— Já é sabido em toda Westeros que Jon Snow tem meios indeterminados de descobrir o que acontece. Meios mais rápidos do que meus passarinhos – A Aranha tentou se justificar. Pena que Danny tinha pouca paciência para justificativas no momento.

— Pensei que fosse o melhor em sua função.

— Minha rainha...

— E também pensei que sua irmã tentaria reaver Rochedo Castely – interrompeu voltando-se para a Mão que permanecia calado.

— Falhei em prever...

— Não quero ouvir sobre falhas – interrompeu – Quero ouvir soluções.

— Precisamos recuperar a Campina imediatamente.

— E como pretende fazer isso? Pedindo ao seu irmão que saia pacificamente? Ou devo usar meus dragões contra ele?

— Nós temos um plano. Ainda é o melhor plano.

Dany levantou-se e encarou sua Mão.

— Seu plano quase nos custou tudo que conquistamos até aqui.

— Os Imaculados conquistaram o Oeste. Rochedo Castely...

— Não passa de um monte de pedra derretida que não significa nada para sua irmã. E por certo não significa nada para mim.

— Não podemos nos precipitar – argumentou ele.

Dany estava a ponto de mostrar o que significava precipitação quando foi interrompida por uma batida na porta.

Um dothraki entregou uma mensagem a Missandei e se retirou:

— O que foi? – indagou quando percebeu a hesitação dela.

— Jon Snow está vindo, minha rainha – respondeu ela – O Rei no Norte pede uma audiência.

Daenerys sentou-se novamente. A raiva que sentia a pouco se esvaiu, levada pela surpresa.

O silencio se espalhou pela sala e de repente, ela desejou que ninguém estivesse ali.

— Essa reunião está encerrada – declarou – Continuaremos amanhã. Espero, então, ouvir soluções concretas para recuperar o terreno que perdemos.

Houve um instante de arrastar de cadeiras.

— Missandei. Fique por favor.

Por alguns momentos, Dany apenas encarou o fogo crepitando na lareira.

— Por que ele viria agora? A mensagem que mandei não obteve resposta, e então. ele pede uma audiência.

— Pelo pouco que conheço de sua graça, ele deve ter um motivo forte para vir. Cersei vai saber o que aconteceu com Euron Greyjoy. Ela saberá que Jon Snow escolheu um lado. Fazer isso depois de tomar tantas medidas para passar incógnito em Meereen só pode significar algo muito sério. O rei não é dado a decisões impensadas.

E mais uma vez era lembrada que não o conhecia. Isso a irritava mais do que deveria.

— Não intendo o que ele pode querer. O que poderia querer de mim?

— Ninguém pode responder essa pergunta a não ser ele próprio. Mas saiba minha rainha, que não creio que ele venha se ajoelhar.

Naquela noite, Daenerys não dormiu. Algo que só poderia descrever como ansiedade afastou o seu sono. E na manhã seguinte, encontrava-se já irritada com o alvoroço que a chegada iminente de Jon Snow causara no castelo.

As pessoas, até os dothraki, volta e meia olhavam para o céu a espera do Rei no Norte e seus dragões.

Mas ele não chegou naquela manhã.

Apenas no final da tarde, um pequeno navio alcançou a orla.


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Notas finais do capítulo

Nas próximas três semanas terei um periodo de correria no trabalho. Então o próximo capítulo será postado no dia 27. Se tiver tempo de escrever postarei antes então fiquem de olho.
Obrigada por acompanharem. Bjs.



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