Dilema escrita por Goth-Lady


Capítulo 1
Único


Notas iniciais do capítulo

Presente para Shiori. Parabéns, irmãzinha!



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Suspiros se faziam presentes naquele quarto escuro. A única luz no recinto provinha da janela a qual não foi dado o trabalho de fechar a cortina. Mas quem se importaria com isso no momento? Afonso arfava, seu peito subia e descia deliberadamente por causa de sua respiração descompassada. Seu corpo estava cansado, mas sua mente estava agitada tentando encontrar alguma explicação plausível para o que acabara de acontecer. Ao seu lado esquerdo estava seu namorado, Abel Jansen, e ao seu lado direito estava seu irmão mais novo, Antonio.

Como o português se encontrava naquela situação com seu namorado e seu irmão? Tudo começou quando chegaram àquela maldita mansão. Francis Bonnefoy, um dos melhores amigos do seu irmão, resolvera dar uma festa, o que nunca era bom sinal.

— Ainda não sei como me convenceste a vir. – Reclamou o português.

— Ora, vai me dizer que não queria ver Abel. – Provocou o espanhol.

— Cala-te, Antonio!

— Parece um tomate de tão vermelho.

O português bufou. A peste ao seu lado era Antonio, seu irmão. Antonio era dois anos mais novo que Afonso e além dele, eles tinham mais dois irmãos, Joel, que era quatro anos mais novo que Antonio, e Gabriel, que era seis anos mais novo que Joel. Toda a sua família sabia de seu namoro secreto com Abel.

Afonso e Abel namoravam há três anos quando Antonio descobrira e deixara a informação escapar no jantar em família naquela mesma noite. O primeiro pensamento de Afonso era de matar o espanhol, mas essa vontade foi tomada pela vergonha e ele iria se esconder no quarto, imaginando ser uma decepção para seus pais, mas sua mãe o abraçara e comemorara. Sua mãe era animada e muito compreensiva, talvez mais do que as outras mães a ponto de exigir que o trouxesse para jantar em casa no dia seguinte e de planejar o casamento de ambos, além de perguntar a Afonso se ele preferiria um terno ou um vestido. Já seu pai simplesmente se conformou, pois se era para vê-lo feliz, não se importava, só ficara decepcionado por ele não ter contado antes. Seus pais eram meios-irmãos de pais diferentes, talvez fosse por isso que compreendiam todas as escolhas dos filhos no campo amoroso, até mesmo mandaram plantar aquela árvore no quintal de casa que Antonio cismara ser o amor da sua vida e a nomeara Maria Rosalina, mesmo que isso tivesse acontecido quando o irmão estava completamente bêbado. Disso, Afonso nunca iria esquecer, pois sempre que Antonio bebia além da conta ele fazia o favor de fazer serenatas à árvore. Era difícil acreditar que seu relacionamento com Abel chegara aos cinco anos com uma família como a dele.

— Vamos, Hermano. Não quer deixar seu amor esperando. – Provocou abraçando o próprio corpo e unindo os lábios simulando um beijo.

— Cala-te, Antonio! Isso é segredo!

— Oh, Abel, adoraria casar-te contigo escondido do meu maravilhoso irmão Antonio e dos meus pais.

— Pelo menos não sou eu faço juras de amor a certa Maria Rosalina.

— Isso foi só uma vez!

— Ah, Maria Rosalina, eu te amo mais que os tomates. – Ele imitou a voz e os movimentos que Antonio fizera há pouco. – Gostaria de ser o azeite da minha salada de tomates?

Dessa vez, o espanhol ficou envergonhado. Ele estava tão vermelho quanto seus preciosos tomates na horta que tinha no quintal. O português sorria vitorioso, pois agora Antonio pararia de perturbá-lo, pelo menos por enquanto.

Os dois adentraram na mansão de Francis. As festas de Francis eram sempre regadas de bebida e sexo e o que acontecia na festa, ficava na festa, exceto se fosse um mico de Arthur, um inglês que era amigo de Afonso, pois os micos de Arthur não tinham como não ser lembrados. Foi em uma dessas em que o português conhecera o holandês. A verdade era que nenhum deles queria ir, Afonso tinha sido arrastado por Antonio até aquela festa e Abel tinha ido porque era de graça e não precisaria pagar.

— Vocês chegaram! – Disse o francês os recebendo com um abraço, que não foi muito apreciado pelo português.

— Francis! – Exclamou Antonio retribuindo. – Como está a casa hoje?

— Cheia, como sempre. Se vocês precisarem de um quarto, as chaves estão dentro de um vaso de planta artificial ao lado do quarto.

— Por que disse isso como se eu e essa peste fôssemos dividir o mesmo quarto?

— Hohohoho. Mon cher, eu não tenho culpa se interpretou assim. – Disse dando um sorriso sacana e uma piscadela. – Aproveitem a festa.

Afonso se afastou dos dois. Francis sempre fazia esse tipo de brincadeira com os dois como se eles tivessem alguma coisa. Jamais teria qualquer coisa com Antonio, ele era o seu irmão e de incesto já bastava o dos pais. Afonso e Antonio eram muito parecidos com seus pais, tanto em aparência quanto em personalidade. Afonso se parecia mais com o pai e Antonio mais com a mãe, a última coisa que eles precisavam era acabar como eles.

Enquanto andava pela mansão procurando se distanciar dos dois, o braço de Afonso foi agarrado por uma mão forte. O português foi girado, prensado em algum corpo maior que o seu e teve seus lábios capturados em um beijo longo. Não viu quem tinha feito aquilo e nem precisava, sorriu entre o beijo. Quando seu “captor” separou seus lábios, Afonso exibia o mais belo de seus sorrisos.

— Abel.

— Pensei que não viria.

— Eu também não.

O loiro alto com uma cicatriz acima da sobrancelha sorriu e tornou a beijar o moreno. Afonso se perdia naquela boca maravilhosa que o fazia estremecer sempre que tocava sua pele. Abel o fazia ter pensamentos nada castos e ao mesmo tempo o fazia se sentir como uma adolescente apaixonada que encontrara o amor da sua vida. Talvez Afonso tivesse realmente encontrado e considerasse ceder às fantasias de casamento de sua mãe, mas ele não iria usar um vestido, ainda mais o que a mãe usara no casamento dela. Não que o vestido fosse feio ou vergonhoso, pelo contrário, sua mãe tinha bom gosto e o vestido era tão bonito que ele e seu pai temiam que uma reforma o destruísse, mesmo que bem feita, não seria o mesmo vestido. Talvez ela se ela tivesse uma menina ou o deixasse para uma neta. A quem ele queria enganar? Portugal comandaria o mundo antes que ele ou qualquer um dos seus irmãos pudesse lhes dar uma neta.

— Aqui não. – Disse o português se separando do namorado. – Alguém pode ver.

— Não ligo.

O holandês tornou a beijá-lo, mas o português os separou novamente quando ouviu passos. Foi bem a tempo, pois surgiu um albino. Gilbert era o melhor amigo de Antonio assim como Francis, se ele tivesse visto o beijo, Afonso com certeza estava ferrado.

— Kesesesese Vocês vieram.

— É claro. – Disse Afonso recuperando a compostura.

— Vamos aproveitar!

Sem ser convidado ou darem liberdade para tal, o albino passou os braços pelos ombros dos dois e os guiou para a festa. O ambiente estava escuro de propósito para melhor efeito das luzes multicoloridas que giravam sem parar, bebidas eram servidas no bar e era impossível ver alguém sem um copo na mão, um DJ tocava, Afonso o reconheceu como sendo o amigo cubano de Antonio, Juan Carlos Machado; e pessoas dançavam freneticamente.

Afonso reconheceu alguns colegas e amigos dos tempos de escola e faculdade, entre eles o inglês Arthur e seus irmãos, o brasileiro Luciano, o argentino Martin, os irmãos de Abel, o chinês Yao, o americano Alfred e o outro Alfred, digo, Matthew, a angolana e o moçambicano que ele esquecera os nomes...

Não soube quando ou como aconteceu, ele tinha se separado de Abel. Sozinho na festa, ele foi para perto de Arthur. Não demorou a conversarem e Afonso tomou alguns copos de bebida, sorrindo e rindo com o inglês, que resmungava e falava mal da vida, mas mesmo assim, o português tentava ajudá-lo a levantar o astral. Era seu melhor amigo, mesmo que ele estivesse bêbado e chorasse abraçado ao barman mais tarde, Afonso o consolava, mantendo seu sorriso e seu jeito otimista.

Ao olhar para a pista de dança, que ficava cada vez mais cheia de bêbados conforme a noite avançava, os olhos de Afonso arregalaram. Seu irmão bebia cerveja de um barril através de uma mangueira sendo incentivado por um monte de bêbados. Sem pensar duas vezes, Afonso foi até ele, o agarrou pelo pulso e o puxou dali. Se ele ficasse bêbado não era muito grave, mas se ele ficasse muito bêbado, iria procurar pela árvore para dedicar serenatas a ela e isso significava que ele iria perturbar Afonso, a casa e os vizinhos. Quando estavam longe, Afonso virou o mais novo de frente para si e o segurou pelos ombros.

— O que te deu na cabeça, seu idiota?!

— Fonfon!

Antonio se atirou em seus braços, o abraçando e levando a boca para perto da de seu irmão. Era possível sentir o cheiro de álcool em seu hálito. Afonso se assustou e o empurrou por impulso, deixando o espanhol caído no chão, resmungando qualquer coisa. O mais velho suspirou pesadamente, ergueu o mais novo e começou a andar. Ficou aliviado ao encontrar o holandês.

— Ainda bem que te encontrei.

— Aconteceu algo?

— Fonfon, eu não me sinto bem. – Murmurou Antonio abraçando o irmão.

Optaram por procurar um quarto vazio, pois o ambiente não ajudava. A maioria dos quartos estava ocupada, constataram isso ao ver alguns vasos de planta derrubados ou sem chave. Felizmente conseguiram achar uma das chaves em um dos vasos e adentraram em um dos quartos. O quarto o qual se encontravam era uma suíte e possuía uma espaçosa cama de casal, além de uma sacada. Não prestaram atenção à decoração, pois correram com Antonio até o banheiro para que ele pudesse vomitar no vaso. Vendo esta cena lastimável, Afonso se perguntava o que Antonio andava bebendo, pois ele nunca ficara daquela forma, pois ele realmente estava mal.

Quando Antonio parecia estar bem, Afonso o deixou para vascular os armários, encontrou um enxaguante bucal e obrigou o irmão a bocejar para tirar o gosto ruim, isto foi na terceira tentativa, pois nas duas tentativas anteriores, Antonio tinha engolido o líquido. Repetiu o processo por mais três vezes até achar que estava bom e começou a retirar a camisa do mais novo. Guiou Antonio até o chuveiro, abriu o registro, constatou se a água estava fria e o pôs parte do tronco dele debaixo d’água.

— Fonz...

— Você vai ficar bem, Tonio.

— Te quiero. – Afonso arregalou os olhos e piscou várias vezes antes de responder.

— Você está bêbado.

— Não, eu te quero e quero agora.

Antonio se virou, segurou o mais velho e o puxou para si, colando ambas as bocas em um beijo. A boca do mais novo tinha gosto de menta artificial muito forte do enxaguante que Afonso usara para tirar o gosto horrível, apesar disso, a boca de Antonio era viciante, talvez fosse o fato do mais novo beijar bem. Um arrepio subiu pela espinha do português quando sentiu a língua do espanhol invadir sua boca, aquele foi o estímulo que Afonso precisava para compreender a situação em que estava e parar.

Em que ele estava pensando?! Antonio não podia beijá-lo assim do nada! E querê-lo então... Céus, eles eram irmãos! Ele não deveria tê-lo beijado e Afonso tampouco o correspondido. Agora que ele parava para pensar, o que dera nele que o fizera corresponder àquele beijo? Não amava Antonio, não dessa forma, e não o queria também, afinal, era o seu irmão e a última coisa que precisavam era de outro incesto naquela família, mas só de pensar em como os lábios dele se moviam de encontro aos seus... Droga, no que ele estava pensando?!

— O que deu em você, seu idiota?! – Proferiu, sua mente se encontrava em meio a um turbilhão de pensamentos.

— Você não me quer também? – Perguntou cabisbaixo fazendo biquinho.

Aquela maldita cara de cão sem dono deixava Afonso sem reação. Ele sempre fazia quando estava triste demais. Será que Antonio gostava dele? Há quanto tempo? Em que ele estava pensando, isso era impossível! Antonio gostava da árvore e sabia que Afonso estava com Abel há cinco anos! O nome do holandês soou como um título de filme de terror na mente do português. Ele beijara seu irmão na frente do seu namorado! Maldito Antonio, se não fosse por ele, Afonso nunca teria ido àquela festa, não o teria beijado e não estaria no chuveiro todo molhado com seu irmão.

— É melhor sairmos e darmos um jeito nessas roupas ou iremos pegar um resfriado.

Não podiam ir para casa, eles tinham vindo de táxi e entrar em um estando os dois molhados estava fora de questão. Podia ligar para o pai buscá-los, mesmo com 25 anos, Afonso o fazia quando não tinha mais nenhuma opção, ou seja, quando Abel não podia busca-lo e ele não podia contar com Arthur ou Antonio. Contudo, devido à situação que se encontravam, iriam tomar uma bela bronca. Poderiam voltar andando e inventar uma desculpa qualquer, a mãe pegaria todas as toalhas da casa para secá-los quando chegassem em casa, mas da forma como Antonio estava, ele poderia agarrar Afonso na frente dos pais, piorando a situação.

Por esta razão, os ibéricos se encontravam em cima da cama somente de cueca, as roupas estavam estendidas em uma escrivaninha para secar. Antonio se encontrava deitado, dando sossego ao português. Afonso estava sentado, encarando com o namorado. O silêncio reinava no quarto.

— Não precisa se desculpar, se é o que está tentando fazer. – Comentou o loiro.

— Mas eu... Você não está bravo?

— Não com você.

O holandês enlaçou sua cintura, segurou sua nuca e o beijou. Apesar de tê-lo beijado tantas vezes, dessa vez o beijo estava diferente. Afonso notou que Abel estava um tanto possessivo e muito mais desejoso do que antes. Estaria com ciúmes? Não houve tempo para pensar, um arrepio percorreu sua espinha quando sentiu uma boca percorrer suas costas com beijos e morder seu ombro esquerdo. Surpreso, ele quebrou o beijo e descobriu que o autor da façanha era Antonio. Antes que ele pudesse protestar ou dar uma bronca no irmão, o espanhol capturou seus lábios, cheio de desejo. Abel não deixou barato e desceu para o pescoço de Afonso, onde chupou com força, o fazendo gemer. Seja lá o que tinha naquela bebida, não fizera bem a Antonio e o deixara mais descarado a ponto de esfregar a mão por sobre a cueca do mais velho e apertar-lhe o Malaquias.

Aquilo devia ser um pesadelo, só podia ser um pesadelo. Seu namorado e seu irmão na mesma cama, o acariciando daquela forma ao mesmo tempo em que entravam em uma disputa não-verbal para ver quem arrancava mais gemidos do português. Não queria acreditar naquilo, mas não podia negar que estava gostando de cada toque em seu corpo. Seria uma longa noite e algo lhe dizia que iria acordar todo dolorido na manhã seguinte.

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Suspiros se faziam presentes naquele quarto escuro. A única luz no recinto provinha da janela a qual não foi dado o trabalho de fechar a cortina. Mas quem se importaria com isso no momento? Afonso arfava, seu peito subia e descia deliberadamente por causa de sua respiração descompassada. Seu corpo estava cansado, mas sua mente estava agitada tentando encontrar alguma explicação plausível para o que acabara de acontecer. Ao seu lado esquerdo estava seu namorado, Abel Jansen, e ao seu lado direito estava seu irmão mais novo, Antonio.

Afonso nunca imaginou que estaria em uma situação como aquela. Tinha acabado de fazer sexo com seu namorado e seu próprio irmão e tinha que admitir, tinha sido ótimo. Os dois se mostraram adversários formidáveis e ao mesmo tempo em que eram quentes, também eram carinhosos com ele. Nunca pensou que Abel seria sádico e comeria a bunda de seu irmão após fazer o mesmo com a sua e Antonio, Afonso tinha que admitir, era intenso do tipo que só pararia quando esgotasse todas as forças, o que o surpreendeu.

Ele se encontrava deitado no meio dos dois amantes. Sentiu Abel abraçá-lo e puxá-lo para si, o beijando carinhosamente. Não precisava dizer nada, pois Afonso sabia que ele o amava e o quanto o amava. Antonio se aninhou nos braços do português e o beijou delicadamente os lábios do mais velho.

— Te amo, Hermano.

Sem esperar resposta, ele dormiu. Afonso não se lembrava mais de nada, suas pálpebras se fecharam de tão cansado que estava. Aquilo doeria amanhã.

===//===

Os primeiros raios de sol adentraram preguiçosamente pela janela. Ainda sonolento, Afonso tateou a cama à procura de alguém, mas estava sozinho. Sentiu alguém acariciar suas costas. Sorriu.

— Bom dia.

— Bom dia!

— Mãe?! – Tamanha foi a surpresa do português que ele deu um salto e caiu da cama. – O que a senhora faz aqui?!

— Vim acordá-lo para o café.

Ele piscou várias vezes e olhou em volta. Estava em seu quarto usando um pijama. A mulher a sua frente possuía pele cor de oliva no mesmo tom da de Antonio, cabelos longos e castanhos e olhos verdes. Era parecida com Antonio e exibia o mesmo sorriso que ele. Assim era Gala, sua mãe.

— Abel o trouxe para casa ontem à noite e eu te pus um pijama. – Afonso corou até a raiz do cabelo, fazendo-a soltar risinhos maliciosos. – Igual quando era mais novo e você dormia no carro.

— Obrigado.

— Se apresse. Estão todos lá embaixo.

Após lavar o rosto e tentar assimilar os últimos eventos, Afonso desceu para o café. Estava dolorido da noite anterior, mas não tanto quanto imaginava. Na mesa estavam seu pai Viriato, um homem com a pele cor de oliva no mesmo tom da de Afonso, cabelo castanho e olhos verdes; deu irmão Joel, que tinha as mesmas características, e seu irmão mais novo Gabriel, a diferença dele para o resto da família eram as grossas sobrancelhas que lembravam as de Arthur.

— Hermano!

Antonio o abraçou por trás, pegando o mais velho de surpresa, fazendo-o corar. Não imaginava que ele tinha tanta energia, ainda mais depois da noite passada. Joel notou, mas não comentou nada.

— Parece um tomate. – Mas o estorvo sim e ainda fez o favor de apertar uma de suas bochechas. – Fica uma gracinha.

— Cale-se, idiota!

— Fica mais fofo ainda zangado.

— Antonio, não me provoque!

— A noite foi boa ontem.

— Antonio! – O português enterrou o rosto nas mãos para esconder a vermelhidão e a vergonha.

— O que foi? Mas é verdade!

— Por culpa sua, seu idiota! Se não tivesse me arrastado para a festa do Francis, nada daquilo teria acontecido!

— Eu sabia!

— Antonio, pare de falar do seu irmão como se ele fosse o prostituto do namorado dele! – Reclamou o pai. – Eu quero comer sem quer te ouvir putaria, posso?

O mais novo soltou o mais velho e se sentou. Eles começaram a comer em silêncio, um tanto constrangedor para Afonso. Gabriel pensou em perguntar, mas Joel fez sinal de que não seria uma boa ideia.

— Você disse festa do Francis, não? – Perguntou a mãe, fazendo Afonso engasgar. – Eu pensei que a festa seria semana que vem.

— Mas é semana que vem. – Lembrou Antonio.

— Para lembrar de festas você lembra, mas arrumar um estágio que é bom e se formar nada. – Alfinetou o pai.

— Eu vou arrumar um estágio, eu juro.

— Na próxima encarnação.

— Mas... – Começou Afonso. – Ontem... Eu e Antonio... – Corou. – Abel não nos trouxe ontem?

— Hermano, você está bem? Ele só trouxe você.

— A gente... Agente não...? Você não disse que a noite tinha sido boa?!

— Para você e o Abel, ora. Não era isso?

— Fonz, você está mesmo bem? – Perguntou Joel.

— É melhor você não ir trabalhar hoje. – Comentou Gabriel.

— É só que eu não me lembro de ontem à noite.

— Era o seu aniversário de seis anos de namoro. – Comentou Viriato. – Disse que iria encontrar Abel depois do trabalho, tanto que eu vim sem você.

— Sim, tanto é que eu pensei que você fosse dormir na casa dele. – Disse Antonio. – Mas você está aqui e não lá.

Afonso piscou várias vezes. No começo estava em choque, mas depois começou a rir sozinho de tão nervoso que estava. Tudo tinha sido um sonho e não mais que isso. Não tinha dormido com Antonio, mas ao mesmo tempo em que estava aliviado, pensar naquele sonho era perturbador.

— Filho, você está mesmo bem? – Perguntou o pai.

— Sim.

— Então por que está rindo que nem um caduco?!

— Nada pai. É bobagem.

— Você teve um sonho erótico com o seu irmão e não quer nos dizer? – Perguntou a mãe do nada.

A mesa toda estava em silêncio. Afonso tinha ficado pálido e depois corado, sem reação. Diziam que mãe descobria as coisas, mas nunca pensou que fosse acertar tanto. O silêncio foi quebrado pelo pai, que limpou a garganta antes de se pronunciar.

— Vão se arrumar ou vão pegar um ônibus.

===//===

O carro tinha parado na porta da faculdade, sendo que Afonso se encontrava no banco da frente. No caminho, Viriato tinha deixado Joel e Gabriel na escola e agora deixava Antonio na faculdade e seguiria para o trabalho, como de costume. Gala era atriz e possuía horários diferenciados que muitas vezes a impossibilitavam de deixar os mais novos na escola e muitas vezes a faziam chegar tarde em casa. Joel e Gabriel ainda estavam na escola, mas não por muito tempo. Com 19 anos, Joel tinha que prestar vestibular e ele ainda não sabia o que queria da vida. Antonio fazia faculdade de agronomia, já Afonso era formado em engenharia naval e trabalhava com o pai  em uma empresa que projetava navios de cruzeiro.

— Hasta padre, hasta Hermano! Cuidado para não pensar em mim o dia todo. – Disse em tom malicioso e concluiu com um sorriso sexy e uma piscadela marota.

— Pare de encher o saco do seu irmão e vai arrumar um estágio, porra!

Antonio bateu a porta do carro e caminhou até o prédio, rindo da brincadeira. Viriato ligou o motor e os dois foram para o trabalho em silêncio, como era costumeiro, mas daquela vez, Afonso estava inquieto.

— Eu quase esqueci. – Começou o pai. – Os investidores adoraram o seu projeto e querem iniciar a construção do seu navio.

— Verdade? – Perguntou com os olhos brilhando de excitação.

— Você tem talento, sempre teve, mas eu estou duvidoso quanto ao nome que você escolheu.

— O que tem de errado? – Dessa vez soava mais sério e um pouco magoado.

— Filho, você está mesmo bem quanto a isso? Quero dizer, faz muitos anos... Acho que chamar o navio de Sebastião seja uma péssima ideia.

Afonso sentiu um aperto enorme no coração. Doía e muito. Sebastião foi o seu primeiro namorado e amante nos tempos do colégio. Era mais velho que ele e fora com ele que tivera seu primeiro beijo e sua primeira vez. Ele o amava tanto, até fizeram uma promessa de que se casariam assim que Afonso terminasse a escola, mas esse era um detalhe que ninguém de sua família sabia. Sebastião entrou para a marinha portuguesa para juntar dinheiro e construir uma vida com seu amado, mas em uma incursão pelo atlântico, o navio em que estava desapareceu em uma tempestade violenta. O corpo nunca foi encontrado, tanto que forem enterrados caixões vazios, mas Afonso cultivara uma pequena esperança de que ele estava vivo. Passaram-se anos, Sebastião não retornava e Afonso se tornava cada vez mais melancólico. Se não fosse por sua família e não tivesse conhecido Abel, não queria nem pensar o que seria dele.

Agora estando ali, com seu pai dizendo ser uma má ideia nomear um navio que homenagearia seu amado era uma facada direta no coração.

— Não digo isso por seja lá quais motivos você tenha em mente. – Pronunciou. – Digo isso por seu bem estar. Você o amava tanto que dava para ver o brilho no seu olhar quando voltava para casa. Está mesmo pronto para isso?

— Estou.

— De verdade?

— Acha que não sou capaz?

— Capaz você é Fonz, eu nunca disse o contrário. Eu te amo e você sabe disso. Só não quero que antigas feridas sejam abertas e você se martirize. Então eu te pergunto: está emocionalmente pronto para isso?

— Sim.

— Então vamos construir um navio. – Viriato sorriu e pousou a mão no ombro do filho. – Juntos.

Afonso sorriu de volta. Esse seria seu primeiro navio de fato. Não seria como os modelos que ele montava com o pai desde criança, esse era real e levaria o nome de seu amado. Construí-lo junto com o seu pai o deixaria feliz.

— Oh, eu esqueci de avisar. Sua prima Tamina vem da Tunísia passar as férias da faculdade.

— Vou adorar revê-la.

Era sua prima favorita, sempre animada e cheia de energia e ideias que nem sempre acabavam bem, mas os dois se davam muito bem. A tunisiana era mais velha que Joel. Uma moça bonita, diga-se de passagem, extrovertida e educada. Se alguém chegasse perto corria o risco de ser castrado por Afonso.

— E seu primo Masud vem do Marrocos. Ele ganhou seu primeiro milhão com aqueles softwares.

— Antonio vai adorar isso.

— Ele é mais novo que Antonio e já está fazendo dinheiro! Enquanto o puto do seu irmão não arruma nem estágio!

— Talvez ele possa estagiar para Masud.

— O que agronomia tem a ver com computador?

— Nada!

— Está querendo que ele vire prostituto do seu primo, não está?

Afonso riu. Sabia como era seu irmão quando se tratava do marroquino, ele ficava em uma espécie de cio. Como o Marrocos era um país islâmico, não aceitava a homossexualidade, Antonio não pôde se mudar para o Marrocos e viver com o primo. O que era uma pena, pois ele mesmo compraria uma passagem só de ida para Marrocos e se livraria de Antonio.

— Oh, eu quase esqueci! Guta está de casamento marcado. É com um libanês que trabalha para Masud e seus sócios.

— A Guta?! Mas ela é muito jovem!

— Ela já é maior de idade. Se é o que ela quer, só nos resta zelar por sua felicidade.

— Lembre-me de ligar para ela depois do trabalho para dar os parabéns. – E esclarecer que história era aquela.

— Ela quer que você seja o padrinho.

Novamente, um sorriso. Augusta, ou Guta para os íntimos, era a filha mais velha de sua madrinha, Pilar. Gostava dela e a notícia de que ele seria o padrinho de seu casamento o deixava feliz, mas se o noivo não fosse um bom marido, iria tornar a vida dele um inferno.

— Puta merda, eu quase esqueci!

— Anda muito esquecido, meu pai.

— Com a confusão no café da manhã não pude dar as notícias. – Ele ficou em silêncio como se tivesse esquecido alguma coisa. – Isso me lembra, você teve um sonho erótico com o seu irmão, não teve? – A espinha de Afonso gelou.

— O céu está bonito, não acha?

— Então você teve...

— Não vamos falar disso, está bem?!

— Como era esse sonho?

— Pai!

— Afonso, estou realmente preocupado com este sonho. Toda vez que alguém da nossa família tem um sonho parecido, é sempre mau presságio.

— Isso envolve Antonio?

— Talvez não, o que me lembra que sua prima Angelina virá estudar na mesma faculdade de Antonio.

— Angelina?! O que ela fez dessa vez?!

— Parece que tacou fogo em mais um pretendente durante o noivado. Você sabe como ela é.

— Por que a tia simplesmente desiste de arranjar casamento para ela? Já estamos cansados de saber que ela não quer casar.

— Você sabe como é por lá. A família do noivo que escolhe a noiva e se o noivo aceitar, o noivado está marcado, nem precisa da participação da noiva. É tudo arranjado. As famílias só procuram Angelina porque ela é bonita porque o que ela tem de beleza tem de problema.

— Podemos colocá-la no quarto do Tonio.

— Temos um quarto de hóspedes. Ela vai morar com a gente por um tempo.

— Antonio vai adorar.

Angelina era sua prima da Argélia, era mais nova que Masud e mais velha que Tamina. Realmente era muito bonita e tinha feições angelicais, mas de anjo ela só tinha o nome e a aparência. O que ela tinha de beleza, ela tinha de boca suja e teimosia e um belo gancho de direita. Pelo menos era a mais qualificada para ajudar Afonso em seu plano de castrar os pretendentes de Tamina, e do noivo de Guta se ele fosse má pessoa.

— Espero que esse mau presságio seja a vinda de Angelina e nada mais.

— Eu também.

Ao chegarem no trabalho, Viriato estacionou na vaga de costume. Assim que os dois adentraram no prédio, Afonso deu de cara com Abel, que lhe sorriu sutilmente. Abel trabalhava no setor administrativo da empresa, sendo assim, eles podiam se ver todo dia.

— Eu esqueci que deixei alguns papéis na minha sala. Precisarei deles antes de encontrarmos com o representante da companhia que encomendou seu navio.

— Documentos?

— São algumas licitações. Pode pegar para mim? Talvez precise da ajuda do senhor Jansen para identificá-los, já que minha sala está uma bagunça. A reunião começa em 20 minutos e eu tenho algumas coisas para resolver.

— Ah, claro.

— 20 minutos, não demore.

Era tudo mentira, os papéis estavam na pasta do seu pai. Ele nunca deixava documentos importantes na sala dele, sempre os colocava na pasta e levava para casa. Afonso sorriu, tinha o melhor cúmplice. Assim que entrou na sala com Abel e trancou a porta, os lábios de Afonso foram tomados, o português erguido e posto sentado na mesa, totalmente livre. Não podiam perder tempo, arrancaram as roupas de imediato e buscaram mais contato.

===//===

Fazer sexo no trabalho era excitante. Nunca sabia se iriam ser pegos, havia sempre riscos, principalmente na sala de Viriato, que era sempre visitada, afinal, ele era o dono da empresa, mas não podia negar que gostava e muito. Uma vez foram pegos, mas foi por seu pai, que estava acompanhado de sua mãe. Ela foi visitá-lo e eles iriam fazer a mesma coisa naquela sala. Foi um encontro estranho, mas ficou pior quando a mãe pegou a câmera para registrar o momento do “bebezinho” dela que estava crescendo e iria colar em seu álbum. Desde esse dia, Afonso passou a se comunicar mais com seu pai para que essas coisas não acontecessem e verificar se tinha de fato trancado a porta.

Se vestiram, espalharam alguns papéis em uma bagunça montada para simular o que seu pai dissera antes. Saíram da sala do dono e foram para a sala de reuniões. Ao adentrarem, o queixo de Afonso caiu. O representante estava lá, trajando um belíssimo terno, mas não era isso que chamava sua atenção.

Sorrindo ternamente, ele se aproximou, o abraçou e tomou seus lábios. Afonso correspondeu enquanto uma lágrima solitária escorria por seu rosto. Aquilo deveria ser um sonho, era surreal demais para ser verdade. Tão logo o beijo se iniciou e foi bruscamente quebrado. Abel o tinha afastado e agora se encaravam mortalmente.

— Se-Sebastião?

— Fonz, lembra-se de mim? – O representante segurou sua mão. – Eu voltei, meu amor. Voltei para ti.

— Bastião, eu...

— Afonso não é mais seu. – Abel retirou a mão de Afonso das de Sebastião e abraçou fortemente a cintura do namorado, arregalando os olhos do outro.

— Fonz... Isso, é verdade?

— Não estão vendo que ele não está bem?! – Interviu Viriato.

Sem dizer mais nada, o homem pegou Afonso pela mão e o puxou até sua sala como se ele fosse uma criança. Lá, ele trancou a porta e colocou o filho no sofá. Ele o abraçou fortemente. Afonso não aguentou e chorou no ombro do pai enquanto este afagava seu cabelo. Respirava descompassadamente pela boca, louco por ar. Aos poucos sua respiração se normalizou e o pai desfez o abraço para olhá-lo nos olhos. Ele ainda não parecia bem.

— Tire o resto do dia de folga. Vou ligar para sua mãe vir te buscar.

— M-Mas... A gravação... A gravação dela é importante.

— Então eu te levo para casa.

— E o seu trabalho?

— Afonso, você é mais importante que o meu trabalho. Sabe disso.

O pai o retirou do prédio e colocou no carro, dirigindo até em casa. Já em casa, retirou o filho do carro e o colocou deitado no sofá.

— Descanse um pouco. Você precisa.

— Mas e a negociação?

— Não se preocupe com isso, se preocupe com você. Você tem problemas maiores para se preocupar do que uma negociação.

Ele estava certo. Agora, mais do que nunca, Afonso teria que resolver o que faria de sua vida. Seu pai disse que sonhos eróticos naquela família significavam maus presságios e o seu era o início de um longo pesadelo.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenha gostado. ♥



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